sexta-feira, 26 de outubro de 2012

007 - Operação Skyfall

O espião 007 completa 50 anos de vida nos cinemas e volta em um filme que faz um mergulho na história do personagem. Daniel Craig, o sexto ator a encarnar o espião, está mais maduro e à vontade com o papel que já interpretou em "Cassino Royale" (2006) e em "Quantum of Solace" (2008). "Operação Skyfall" é dirigido pelo competente Sam Mendes (de "Beleza Americana", de 1999) e tem os ingredientes comuns à franquia, como locações exóticas, mulheres bonitas e muita ação.

Como o filme pretende explorar mais o caráter de James Bond, nada melhor do que "matá-lo". Após uma grande cena de ação pelos prédios de Istambul, Bond é alvejado acidentalmente pelo tiro de uma agente que seguia as ordens de M (Judy Dench, ótima como sempre). Ele é dado como morto e tem até o obituário publicado. Na verdade, Bond, abalado pela suposta traição de M, resolveu tirar umas férias (em cenas que, a bem da verdade, lembram muito "A Identidade Bourne"; estaria o criador seguindo os passos da criatura?). Enquanto isso, na Inglaterra, a organização MI-6 é alvo de um atentado terrorista engendrado por um hacker internacional chamado Silva, interpretado por Javier Bardem (de "Onde os fracos não têm vez" e "Mar Adentro"). Silva tem um passado em comum com Bond e, principalmente, com M, de quem quer se vingar. Bond volta do exílio um homem diferente, cheio de dúvidas quanto a seu papel e desconfiado que M esteja escondendo alguma coisa.

Roger Deakins é o diretor de fotografia de "Operação Skyfall" e, visualmente, o filme é um dos mais belos da série. Deakins é um mestre da luz e há uma sequência passada em Shangai que impressiona. Logo em seguida, as lentes de Deakins e a direção de arte de Dennis Gasner criam um cassino flutuante em Macau, com centenas de lanternas vermelhas iluminando a noite que é de encher os olhos. Falando em beleza, Bond tem seus tradicionais affairs com duas mulheres neste filme; Eve (Naomie Harris) é uma companheira de trabalho e Severine (a francesa Bérénice Marlohe) é a namorada do vilão, Bardem. Ralph Fiennes também está no elenco, como o novo diretor da MI-6 e Albert Finney é um antigo empregado da família de Bond. O filme homenageia a série com citações aos outros filmes de 007, que inclusive usa um dos carros antigos do espião. Javier Bardem faz um vilão que, desta vez, não quer conquistar (ou destruir) o mundo, mas sim resolver pendências pessoais. Há sequências difíceis de acreditar, como esperado, e o final é um  tanto anticlimático. "Operação Skyfall", no entanto, é um bom episódio para comemorar os 50 anos da série que começou com "O Satânico Dr. No", em 1962, em que Bond era interpretado pelo eterno Sean Connery. Visto no Kinoplex Campinas.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Felicidade (Glück, 2012)

Difícil definir este filme da diretora Doris Dörrie, do poético "Hanami - Cerejeiras em Flor". Em exibição na 36ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, "Felicidade" provocou as mais diversas reações, de lágrimas de tristeza a gritos abafados de aversão. Não é um filme comum. Alba Rohwarcher (de "Que mais posso querer", "Um Sonho de Amor") é Irina,  uma refugiada de guerra que, após ser estuprada e ver os pais serem mortos, foge para Berlim, Alemanha. Para sobreviver, ela se torna uma prostituta, ganhando 50 euros por programa. Nas ruas ela conhece um rapaz chamado Kalle (Vinzenz Kiefer), que vive de pequenos furtos e esmolas, e nasce um amor quase infantil entre eles. Ela se recusa a falar sobre o passado trágico e ele finge não ligar para o fato de que ela transa com outros homens para ganhar a vida.

Há uma cena terna quando um confessa ao outro que nunca havia estado com outra pessoa por amor antes e, por  um bom tempo, o filme parece que vai ser um romance dramático com momentos de comédia. Irina e Kalle se mudam para um apartamento novo, que ela decora com simplicidade; ele arruma um emprego como entregador de jornais, os dois passeiam pela cidade, brincam no playground e jantam pão de forma com mel todas as noites. Interessante o modo como o filme detalha o tipo de vida dupla e pragmática que levam Irina e Kalle. Toda manhã ela "expulsa" o companheiro do apartamento e, rapidamente, transforma a si mesma e ao ambiente; o quarto aconchegante e familiar se torna "sexy" (naquela forma cafona e distorcida do sexo pago) com a mudança sutil de uma cortina e na iluminação avermelhada.

E, então, o filme dá uma reviravolta bizarra, com uma sequência tarantinesca de violência explícita que rendeu ao filme a classificação etária de 18 anos. Sem revelar detalhes, o fato é que por todo o cinema escutavam-se gemidos e risos nervosos e se viam pessoas tampando os olhos com as mãos. É uma cena gratuita? Depende. O tema do filme é até que ponto alguém iria para não perder o amor da sua vida. Qual o limite? Doris Dörrie faz um filme ousado, um romance terno, violento e chocante como a vida de seus personagens.

Câmera Escura

domingo, 21 de outubro de 2012

O Som ao Redor

Exibido ontem na 36ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, com ingressos esgotados rapidamente, "O Som ao Redor" é o primeiro longa-metragem do pernambucano Kleber Mendonça Filho, que vem de uma longa carreira como crítico de cinema e curtametragista. Ainda inédito no circuito comercial brasileiro, o filme já tem uma carreira internacional consolidada e premiada. Estreou em fevereiro no Festival de Roterdã, na Holanda, e já passou por lugares tão distantes quanto a Austrália, além de vencer festivais brasileiros como o Festival do Rio de Janeiro. Em Gramado levou os prêmios de crítica, púbico, som e direção.

Passado em uma rua do Recife, "O Som ao Redor" poderia ter sido feito em qualquer grande cidade brasileira, em que as casas estão dando lugar a edifícios cada vez mais altos, isolados e guardados. Grades de ferro, aliás, são um dos elementos mais vistos no longa. Em quase todo plano podem ser vistas barras de proteção, câmeras de segurança, vigias ou cães de guarda. De quem estes brasileiros estão tentando se proteger? Filmado em 35mm, com decupagem clássica e elegantes movimentos de câmera, o filme esconde uma tensão que vai crescendo até o final explosivo.

O decano Francisco (W.J. Solha) é praticamente dono de uma rua de classe média alta. Mora na cobertura de um prédio de luxo e tem um engenho de cana-de-açúcar no interior. É com ele que vai conversar Clodoaldo (Irandhir Santos, de "Febre do Rato"), responsável por uma firma de segurança que quer se instalar na rua. Clodoaldo tem a fala mansa e aquele discurso que se escuta de qualquer flanelinha; por uma taxa, ele e uma equipe garantem  zelar pela tranquilidade da vizinhança. Coincidência ou não, no mesmo dia dois carros haviam sido roubados, um deles de Sofia (Irma Brown), namorada de João (Gustavo Jahn), herdeiro do império de Francisco. Já Bia (Maeve Jinkings), mãe de dois filhos, não consegue dormir em paz por causa do cachorro da casa ao lado, que late a noite toda. Os filhos pré-adolescentes estudam inglês e chinês (sinal dos tempo) com uma professora particular. Um humor crítico permeia diversas situações, como quando a compradora de um imóvel pergunta a João se não pode ter um desconto porque uma mulher havia se suicidado naquele prédio. Em uma reunião de condomínio, um garoto de no máximo dez anos é testemunha chave da suposta incompetência do porteiro do prédio; apesar de trabalhar há anos no local, os moradores querem demiti-lo por justa causa e economizar as taxas de rescisão.

Um excepcional trabalho de som enfatiza a ameaça invisível que rasteja por debaixo da aparente tranquilidade destas famílias de classe média. Figuras reais e imaginárias são vistas de relance em alguns planos e até a praia, com seus avisos da presença de tubarões, não está livre de perigos. "O Som ao Redor" é fruto do bom momento do cinema pernambucano, mas funciona como um retrato genérico do Brasil, o país que aparentemente chegou àquele "futuro" prometido, mas que não sabe direito o que fazer com ele.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Tropicália

O documentário de Marcelo Machado poderia ser mais uma colagem de depoimentos sobre os anos 60, com as profundas mudanças culturais e sociais da época. O filme, no entanto, acerta em uma montagem inventiva que acompanha o visual dos diversos momentos retratados; no surgimento do tropicalismo, em 1967, o filme é todo psicodélico, misturando capas de discos com obras e Hélio Oiticica (que cunhou o termo "tropicália"), imagens de "Terra em Transe", de Glauber Rocha, trechos de peças de José Celso, centenas de fotos e trechos de programas de televisão. É uma edição inspirada, que acompanha depoimentos de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, entre dezenas de outros, usando apenas imagens e fotos.

Com a chegada do AI-5, no entanto, o filme muda de tom. Pela primeira vez, as vozes tomam a forma dos personagens como estão hoje, quase cinquenta anos depois. É um choque, depois de acompanhar por quase uma hora as imagens vibrantes dos jovens Caetano e Gil, dos Mutantes, Maria Bethânia, Gal Costa, entre outros, encará-los com 70 anos. Foi uma escolha interessante dos realizadores. É como se a maturidade chegasse junto com a repressão do ato institucional. Há imagens raras de arquivo de Caetano e Gil na Europa, como em uma apresentação para um programa de televisão português em 1969 ou no lendário Festival da Ilha de Wight, Inglaterra, em 1970, onde se apresentaram bandas como Jethro Tull, Supertramp, The Who, Jimi Hendrix e Joan Baez. Há também uma ótima apresentação de Caetano cantando "Asa Branca" para a televisão francesa.

O que fica do documentário é a incrível força criativa que havia na música brasileira (e mundial) naquela época. Ficam também alguns depoimentos surpreendentes de Caetano Veloso, que diz que, na época, ele via com muita desconfiança os movimentos "anti imperialistas" que havia no país e que, no fundo, ele gostava da música americana. Interessante perceber como uma força repressora como a ditadura acabou gerando uma reação cultural extremamente rica. Por tabela, percebe-se também a genialidade dos Mutantes, um grupo que foi musicalmente comparado aos Beatles e que tinha uma força e teatralidade impressionantes. "Tropicália" deve ser visto, de preferência, em conjunto com outros documentários recentes como "Uma Noite em 67", de Renato Terra e Ricardo Calill e "Loki - Arnaldo Batista", de Paulo Henrique Fontenelle. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Procurando Nemo 3D

Quando John Lasseter apresentou "Luxo Jr." (assista aqui), primeiro curta metragem feito pela "Pixar Animation Studios" em uma feira de tecnologia, em 1986, um figurão da área veio conversar com ele. Lasseter já estava esperando alguma pergunta técnica sobre algoritmos mas, ao invés disso, lhe perguntaram se a luminária maior era a mãe ou o pai da menor. Mais do que a tecnologia, o trunfo da "Pixar" sempre foi o lado humano da história, a preocupação com o roteiro. 

"Procurando Nemo" é de 2003 e já pode ser considerado um clássico. A animação está de volta aos cinemas em versão 3D; sim, pode ser considerado mais um relançamento "caça-níqueis" de um estúdio explorando os próprios filmes, mas "Procurando Nemo" é tão bom que vale voltar ao cinema para vê-lo na tela grande. O roteiro é um primor e é possível imaginar o grupo de roteiristas da "Pixar" ao redor de uma mesa jogando ideias como: "E se Dory tivesse um problema de memória?"; ou "Vamos colocar uns tubarões na história, mas que tal fazê-los em uma reunião dos Alcoólicos Anominos?"; ou mesmo "Já que o aquário fica em um consultório dentário, por que não escrever um diálogo em que os peixes discutem as técnicas usadas pelo dentista para tratar de um paciente?". São estes detalhes, e centenas de outros, que sempre colocaram a "Pixar" acima dos outros estúdios de animação. Ou, ao menos, até recentemente, quando o estúdio parece ter perdido a originalidade. Mas esta é outra discussão.

"Procurando Nemo" conta a história de Marlin, um peixe-palhaço que faz de tudo para reencontrar o filho Nemo depois que este foi capturado por mergulhadores nos recifes de coral na Austrália. Marlin (voz original de Albert Brooks) é um pai traumatizado por ter perdido a esposa e centenas de filhotes que foram devorados por uma barracuda. Nemo foi o único sobrevivente e o pai sempre foi excessivamente protetor. A jornada de Marlin do recife de coral até Sydnei, para onde o filho foi levado, é acompanhada por Dory, uma peixinha azul que sofre de memória curta. Quando está com Marlin, estranhamente, ela se sente melhor e é a única que se lembra do endereço dos mergulhadores, que ela leu em uma máscara de mergulho derrubada no mar. A viagem dos dois é uma aventura em que eles enfrentam tubarões, um cardume de águas-vivas, um passeio em alta velocidade por uma corrente marítima e até passam um tempo dentro de uma baleia gigante. Em paralelo, Nemo tem que encontrar um modo de tentar fugir do aquário em que foi colocado, onde encontra peixes como Gil (voz original de Willen Dafoe), um veterano do mar que há anos também tenta escapar. O filme foi escrito e dirigido por Andrew Stanton que, cinco anos depois, faria outra obra-prima da "Pixar", "Wall-E". "Procurando Nemo" e "Wall-E", a propósito, são provavelmente as duas animações mais belas visualmente produzidas pelo estúdio. As cenas passadas no recife de coral, com suas centenas de espécies de peixes, anêmonas, estrelas do mar, arraias, etc, são extremamente realistas e coloridas, e o efeito tridimensional, no caso, até veio adicionar ao encanto.

Interessante como o roteiro é, no fundo, uma homenagem aos contadores de histórias. Marlin começa o filme como um peixe-palhaço que não sabe nem mesmo contar uma piada. Suas aventuras, no entanto, fazem com que ele tenha o que contar e ele narra sua busca pelo filho para vários personagens no caminho. Há uma sequência muito boa em que se vê sua história ser passada para frente pelos peixes até chegar aos ouvidos de Nemo, que sabe que o pai está vindo. Assim, mesmo que seja um relançamento, "Procurando Nemo" vale a visita à telona. Visto no Kinoplex, Campinas.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Os Infratores

"Os Infratores" vale mais pelos aspectos técnicos e pelo elenco do que pelo filme. Passado nos anos 1930 durante a "lei seca", ele é extremamente violento e trata da família Bondurant, formada por três irmãos, Forrest (Tom Hardy, de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"), Howard (Jason Clarke) e Jack (Shia Labeouf, de "Wall Street"). A "lei seca" proibia a fabricação e comercialização de bebidas alcoólicas, o que causou o surgimento de milhares de produtores ilegais de bebida. No condado de Franklin, no estado da Virginia, havia tantos fabricantes que, à noite, as florestas ficavam iluminadas pelo fogo dos alambiques ilegais. A família Bondurant é uma das mais prósperas, e há uma lenda que diz que os irmãos são invencíveis, quase imortais.

Os negócios da família são ameaçados pela chegada do agente federal Charlie Hakes (Guy Pearce, de "Prometheus"), um homem elegante mas extremamente cruel. Vestido sempre com roupas sociais, gravata borboleta e luvas, Hakes tem os cabelos tingidos e a fala suave, mas é um homem corrupto que quer uma parte do negócio dos Bondurant. Forrest, o mais velho, se recusa a colaborar e começa uma guerra particular com o agente federal. O problema é que o roteiro (escrito pelo músico e ator Nick Cave), uma vez estabelecida a premissa da história, não consegue desenvolvê-la direito. Fica clara logo no início a situação de antagonismo entre os irmãos Bondurant e Charlie Hakes mas, estranhamente, nada acontece por boa parte do filme. Ou, quando acontece, não há as consequências esperadas. Há uma sequência, por exemplo, em que Hakes dá uma surra em Jack, o irmão mais novo, interpretado por Shia Labeouf. É de se esperar que os irmãos mais velhos de Jack, cabeça quente que são, ataquem Hakes, mas nada acontece. Não só isso, depois de ser surrado violentamente no rosto, Jack aparece com apenas alguns hematomas na cena seguinte. Para um filme tão cuidadoso na direção de arte e recriação de época, falhas como esta chamam a atenção. Em meio a tanta testosterona, há duas mulheres na trama. Uma é Maggie, interpretada por uma das atrizes mais belas hoje em Hollywood, Jessica Chastain (de "A Árvore da Vida", "Coriolano", "Histórias Cruzadas"). Ela é uma ex-dançarina de Chicago que deixa a cidade grande para, ironicamente, procurar por uma vida mais calma no interior. Ela arruma emprego no restaurante dos Bondurant e, aos poucos, ganha o coração duro do irmão mais velho, Forrest. A outra mulher é Bertha (Mia Wasikowska, de "Inquietos"), a filha do pastor da cidade. Ela atrai a atenção do personagem de LaBeouf, que faz de tudo para impressionar a moça, como comprar roupas novas e um carro caro.

"Os Infratores" é dirigido pelo australiano John Hillcoat e tinha tudo para ser muito bom, mas o espectador fica esperando o filme decolar. Há boas cenas de suspense e tiroteio entre os irmãos e a polícia, e cenas ternas de romance entre Shia Labeouf e Mia Wasikowska, mas é tudo muito longo e, o que é pior, inconsequente. O grande ator Gary Oldman, que faz o gângster Floyd Banner, é simplesmente esquecido pelo roteiro no meio do filme. A lenda sobre os Bondurant serem imortais, ao invés de ser contrariada pelo roteiro, acaba sendo confirmada por várias situações difíceis de acreditar. Jessica Chastain é atacada por dois gângsters violentos em uma cena e, pouco depois, aparece intocada. E o próprio caráter dos Bondurant é incongruente. Eles são vistos praticando atos de extrema violência em alguns momentos, mas são incapazes de fazer mal a Charlie Hakes, cada vez mais sanguinário. Assim, "Os Infratores" pode ter seus bons momentos, mas acaba sendo uma experiência decepcionante. Visto no Kinoplex, Campinas.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Coriolano

William Shakespeare escreveu a peça "Coriolano" em 1608; o grande ator Ralph Fiennes ("A Lista de Schindler", "Quiz Show", "O Jardineiro Fiel"), que interpretou o papel principal no teatro, resolveu estrear como diretor de cinema adaptando a peça de Shakespeare para a tela grande. Originalmente passada na Roma antiga, a versão de Fiennes se passa agora na Europa moderna; as espadas e lanças foram trocadas por automáticas e fuzis, mas a trama política de Shakespeare permanece atual.

Fiennes interpreta o general Caius Martius Coriolanus, um homem tão duro e invencível quanto antissocial. Ele volta de uma guerra contra o país dos Volscos, liderados por Tullus Aufidius (Gerard Butler), e encontra uma Roma faminta e revoltosa. Os tribunos querem honrar Coriolanus com o cargo de Cônsul, mas ele não tem as habilidades políticas necessárias para conquistar a afeição do povo. Nem mesmo a poderosa mãe de Coriolanus, interpretada pela grande Vanessa Redgrave, consegue fazer com que ele aja de forma apropriada e ele acaba banido de Roma. Magoado e carregando cicatrizes de várias batalhas, Coriolanus vai até seu inimigo, Aufidius, e oferece seus serviços. Ele pretende, assim, se vingar de Roma por tê-lo banido.

O filme foi rodado em grande parte na atual Sérvia, que ainda mostra as marcas da longa guerra que se abateu sobre o país nos anos 1990. Há um elaborado trabalho de figurino e maquiagem, e a interpretação de Fiennes, com o rosto coberto de sangue, é de primeira. É verdade que causa estranheza a linguagem rebuscada de Shakespeare dentro deste cenário moderno, o que dificulta um pouco o entendimento da trama. Mas depois de certo tempo esta estranheza desaparece. Curioso que o roteiro foi adaptado por John Logan, o mesmo que escreveu o épico "Gladiador", filme de Ridley Scott de 2000. Pode-se perceber várias similaridades entre a trama do filme de Scott e a peça de Shakespeare. Assim como Coriolanus, o personagem de Russell Crowe, Maximus, é um general romano que é banido de Roma após uma batalha e volta para a cidade em busca de vingança. O elenco conta ainda com Brian Cox e Jessica Chastain (de "A Árvore da Vida"). "Coriolano" foi co-produzido pela BBC e está disponível no Brasil em DVD.

Câmera Escura

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Selvagens

O diretor Oliver Stone volta à boa forma com este filme cínico e violento. Stone tem uma carreira com altos e baixos, quase sempre marcada pela polêmica. Fez um dos filmes mais realistas sobre a Guerra do Vietnã, "Platoon" (1986), expôs a cobiça do capitalismo em "Wall Street" (1987), apresentou sua versão sobre o  assassinato do Presidente Kennedy em "JFK" (1991), contou a vida do poeta do rock, Jim Morrison, em "The Doors" (1991), narrou a vida dos presidentes "Nixon" (1995) e George W. Bush em "W." (2008), e assim por diante. Depois do fracasso retumbante com o épico "Alexandre" (2004), fez o comportado "As Torres Gêmeas" (2006) e uma continuação para "Wall Street" em 2010.

"Selvagens" é narrado do ponto de vista de O. (Blake Lively), abreviação de Ofélia, uma "patricinha" loira da Califórnia que é namorada de dois traficantes modernos. Chon (Taylor Kitsch) é um ex-combatente das guerras do Iraque e Afeganistão que trouxe do oriente as sementes para um tipo especial de maconha, cultivada e melhorada por Ben (Aaron Johnson), um "neo hippie" formado em botânica. Os dois são discretos, eficientes e produzem a melhor erva da Califórnia, ganhando milhões de dólares e dividindo o tempo entre surfar, transar com O. ou, no caso de Ben, fazer viagens humanitárias para a África ou Indonésia. Tudo vai bem até que um cartel mexicano resolve entrar no negócio de Ben e Chon e lhes envia vídeos mostrando como eles lidam com os inimigos, degolados por serras elétricas. Chon, o ex-soldado, é partidário de uma resposta à altura; Ben, o humanitário, acha que eles podem chegar a um acordo. Quando eles resolvem fugir para a Indonésia com O., ela é sequestrada pelo cartel, que começa a fazer uma série de exigências. Começa então uma guerra entre o cartel mexicano, liderado por Elena (Salma Hayek) e os dois americanos.

O roteiro, de Oliver Stone, Don Winslow e Shane Salerno, é por vezes atrapalhado pela narração  redundante de O. Tirando este detalhe, ele tem boas sacadas. A personagem de Salma Hayek é uma das mais interessantes; ela tem uma filha na Califórnia que se recusa a falar com ela, e quando O. é sequestrada e mantida em cativeiro surge uma ligação afetiva entre a rainha do crime e a patricinha americana. John Travolta, em um papel diferente do habitual, faz um agente federal corrupto cuja lealdade varia entre Ben e Chon e o primeiro tenente de Elena, um capanga chamado Lado (Benicio Del Toro, apropriadamente asqueroso). Emile Hirsch interpreta um hacker responsável pela lavagem de dinheiro dos traficantes, e há um grande número de bons coadjuvantes. O filme é bastante violento e Oliver Stone usa a trama para cutucar o modo de vida americano. Stone inclusive brinca com os clichês do gênero em um final que, dependendo como se olha, pode significar algo completamente diferente. É discutível se uma dupla de traficantes como Ben e Chon seria tão "nobre" a ponto de arriscar tudo pela vida da namorada em comum, e o filme por vezes esbarra no melodrama. Como é típico de Oliver Stone, a dose de exagero é alta, mas é visível o talento do diretor. Visto no Kinoplex Campinas.

Câmera Escura