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sexta-feira, 30 de junho de 2023

Indiana Jones e a Relíquia do Destino (Indiana Jones and the Dial of Destiny, 2023)


Indiana Jones e a Relíquia do Destino (Indiana Jones and the Dial of Destiny, 2023). Dir: James Mangold. ATENÇÃO: AVISO DE SPOILERS Não me lembro há quantos anos estão falando deste filme... mas são muitos. Meu filme favorito é "Caçadores da Arca Perdida" (1981) e gosto muito de "Indiana Jones e a Última Cruzada" (1989). Não sou muito fã de "O Templo da Perdição" (1984), embora tenha várias ótimas sequências “legítimas” de Indiana Jones. O quarto filme, "Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal" (2008) é... ok; tem partes boas, tem partes muito ruins. Todos estes foram dirigidos por Steven Spielberg e produzidos por George Lucas e, na real, a série deveria ter terminado com a cavalgada em direção ao pôr-do-sol do final de “A Última Cruzada”.

Bom, o tempo passou, a Disney comprou a Lucasfilm e um novo Indiana Jones chega agora aos cinemas. É bom? Hmmmm. A direção é de James Mangold, um cara bem competente, e Harrison Ford está de volta ao papel, com quase 80 anos. O começo do filme, passado no final da II Guerra Mundial, é bastante bom e seria tudo que a gente gostaria de ver em um filme de Indiana Jones. Com um detalhe que atrapalha um pouco: Harrison Ford foi rejuvenescido digitalmente, e é bastante estranho olhar para ele. O rosto dele está bem mais jovem e, no geral, está bom, mas o seu cérebro sabe que alguma coisa está errada. A cabeça às vezes é grande demais, o olhar é meio perdido. Mas é um bom começo de filme. O mestre John Williams (91 anos!) compôs a trilha e James Mangold faz o que pode para emular o estilo de direção de Steven Spielberg. E é sempre um prazer ver Indiana Jones esmurrando nazistas.

Pulamos então para 1969, o ano do pouso dos astronautas na Lua, e Indiana já é um senhor. Os colegas da faculdade em que ele leciona fazem uma festa de aposentadoria ao som de "Garota de Ipanema", de Tom Jobim. É então que uma figura do passado reaparece na vida de Indy, Helena (Phoebe Waller-Bridge), uma afilhada de Jones e filha de um amigo. Ela está procurando por uma "máquina" criada por Arquimedes que estaria em poder de Indy (ou metade de uma máquina). Ao mesmo tempo, os nazistas estão na cidade, também à procura do mesmo artefato. O líder deles é interpretado pelo grande Mads Mikkelsen.

É um começo promissor... parece haver uma ligação afetiva entre Indy e a moça; os nazistas são apropriadamente maus e ameaçadores. Phoebe Waller-Bridge (de "Fleabag") é boa atriz e um bom páreo para Indiana Jones, só que a personagem dela, ao invés de ser a companheira de Indy que imaginamos que ela seria, acaba se tornando uma estranha antagonista. Ela rouba a peça de Indy para tentar vender em um leilão no Marrocos, e há um bocado de conflito desnecessário entre ela e Indiana Jones. É estranho também que Indy carregue seu chapéu, camisa e chicote em uma malinha, como se fosse um uniforme de super-herói, que ele veste quando precisa "virar Indiana Jones". Há várias sequências em que se nota a falta que Spielberg faz (pouca gente sabe movimentar uma câmera como ele).

A tal "relíquia do destino" não me pareceu um objetivo tão interessante quanto os dos outros filmes e, sinceramente, nunca havia ouvido falar sobre ela. Embora tente emular os Indiana Jones anteriores, o filme tem falhas estranhas, como não começar usando o símbolo da Paramount no cenário; as icônicas cenas dos mapas não aparecem por metade do filme e, de repente, são usadas aleatoriamente. E apesar de todos os filmes terem um momento “sobrenatural” em que questões como fé e razão são questionadas, há uma cena no terceiro ato deste filme que, para mim, forçou demais a barra. Tá, Indiana Jones já presenciou nazistas serem destruídos pela Arca da Aliança, já conversou com um cavaleiro medieval “imortal” , já viu um cara ter o coração arrancado do peito e coisas do tipo... mas há uma sequência em “Relíquia do Destino” em que tudo é simplesmente absurdo demais (assim como o rosto em computação gráfica de Harrison Ford parece fora de lugar, a cena simplesmente não cola). Mas...ok, acho que depende da tolerância de cada espectador. 

Valeu a pena ver “Indiana Jones e a Relíquia do Destino”? Mais ou menos. É bom ver Harrison Ford vestido de Indy novamente? Sim... embora seja um pouco triste também. Heróis de verdade desaparecem no pôr-do-sol, como Spielberg queria ao final de “A Última Cruzada”. Lucas insistiu tanto que acabaram fazendo o “Indiana Jones vs Aliens” que ele sempre quis fazer em “Reino da Caveira de Cristal”. O pior pecado neste novo Indy é o fato de ser totalmente desnecessário, mas isso a gente já sabia desde que a ideia foi levantada. Harrison Ford, consciente da própria mortalidade, reviveu seus principais personagens nos últimos anos, seja Han Solo, Deckard ou, agora, Indiana Jones. É nostálgico e agridoce. Nos cinemas. 

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Se estas paredes cantassem (If these walls could sing, 2022)

Se estas paredes cantassem (If these walls could sing, 2022). Dir: Mary McCartney. Disney+. Há um misto de reverência e história neste documentário da filha de Paul McCartney, Mary, sobre o famoso estúdio "Abbey Road", em Londres. Talvez reverência demais e história de menos, mas não deixa de ser um bom retrato do lugar em que foram gravados alguns dos maiores discos de todos os tempos, de música clássica aos Beatles, de Pink Floyd a John Williams.

Com duração de 90 minutos, o filme conta rapidamente a história do estúdio (que começou como EMI) e parte para uma série de entrevistas com os músicos que lá gravaram. Há boas histórias; Elton John conta que comprava seus discos favoritos com o dinheiro que ganhava como pianista contratado. Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, também foi músico contratado do estúdio e estava presente na gravação do tema de "Goldfinger", de 007. Como não poderia deixar de ser, Paul McCartney (e os Beatles) acabam sendo os mais citados no documentário. O filho de George Martin, famoso produtor musical dos Beatles, fala como o pai gravou os álbuns da banda. O primeiro disco (com clássicos como "Love me do" e "Twist and Shout") foi gravado em apenas um dia. Já o famoso "Sgt. Peppers", de 1967, foi quando "os loucos tomaram conta do sanatório", nas palavras de McCartney. Ringo Starr diz que, se não fosse por Paul McCartney, os Beatles teriam gravado só três álbuns, ao invés de oito.

No mesmo ano, no estúdio ao lado, o Pink Floyd (na época liderado por Syd Barrett) gravava seu primeiro álbum, o revolucionário "The Piper at the Gates of Dawn". Em 1973, a banda gravou o clássico "The Dark Side of the Moon", o álbum que mais tempo esteve entre os mais vendidos dos EUA. Curioso que Roger Waters e David Gilmour, inimigos históricos que recentemente trocaram farpas pela internet, façam alguns elogios na gravação do documentário.

O filme mostra também como o estúdio entrou em crise no final dos anos 1970 e teve que vender grande parte do equipamento (McCartney teria ficado com bastante coisa). O estúdio tomou vida nova quando John Williams e George Lucas resolveram gravar as trilhas de "Caçadores da Arca Perdida" e vários capítulos de "Star Wars" em Abbey Road. Há várias outras histórias sobre outros músicos e bandas (sobra até espaço para o imbecil do Kanye West). Como disse, talvez o documentário seja reverente demais em alguns momentos; fala-se muito sobre a "mística" do lugar e sobre como as paredes supostamente estão "encharcadas" com a música gravada lá. A não ser por um senhor chamado Lester que faz a manutenção do equipamento, senti falta do depoimento de mais pessoas que trabalharam lá, como o grande Alan Parsons, por exemplo (que foi engenheiro de som dos Beatles e do Pink Floyd antes de criar a própria banda); mas é um bom documentário. Disponível na Disney+.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Império do Sol e o Cinema de Steven Spielberg

A Rede Cinemark está exibindo vários filmes clássicos e "Império do Sol", de Steven Spielberg, foi o escolhido neste final de semana (ele também será exibido na quarta-feira, 6 de agosto, às 19:30).

"Império do Sol" é um dos filmes em que Spielberg mais investiu na emoção, ao ponto do excesso. Antes dos Oscars e do prestígio atual com  a crítica, Steven Spielberg era sinônimo de filme "pipoca", de puro entretenimento. Após uma série de mega sucessos como "Tubarão" (1975), "Contatos Imediatos do Terceiro Grau" (1977), "Caçadores da Arca Perdida" (1981), "E.T. - O Extraterrestre" (1982) e "Indiana Jones e o Templo da Perdição" (1984) - e até um fracasso, "1941 - Uma Guerra Muito Louca" (1979) - Spielberg resolveu enfrentar temas mais sérios em "A Cor Púrpura" (1985) e "Império do Sol" (1987). Em termos de Oscar, não funcionou, pois ele continuou sendo ignorado até 1993, quando finalmente ganhou o seu por "A Lista de Schindler". Grande parte da crítica caiu em cima de "Império do Sol", considerando-o longo (como, de fato, é), piegas (sem dúvida) e auto indulgente (idem). O caso é que Spielberg é um cineasta nato e se alguém é culpado por querer gritar CINEMA em cada plano de "Império do Sol", este alguém é Steven Spielberg. Em meio aos excessos, porém, há cenas de extraordinária beleza.

Garotos perdidos

O garoto Jim Graham (Christian Bale, estreando de forma impressionante no cinema aos 13 anos de idade) é o típico "garoto perdido" de Steven Spielberg. Separado da família quando da invasão japonesa a Shanghai, China, no início da 2ª Guerra Mundial, Jim passaria a guerra internado em um campo de prisioneiros japoneses. O tema da busca pela família é caro a Spielberg, que viu os pais se divorciarem quando era jovem e replicou seu trauma em vários filmes; em "E.T. - O Extraterrestre", o garoto Elliot vive em uma família em que o pai se separou da mulher e deixou os filhos com ela. O próprio "E.T." é um "garoto perdido" que foi deixado para trás e passa o filme tentando voltar para o planeta natal. Em "Inteligência Artificial" (2001), o garoto robótico David é abandonado na floresta pela "mãe" humana e também passa o filme tentando reencontrá-la. Situações semelhantes podem ser vistas em "Contatos Imediatos do Terceiro Grau" (1977), "Hook" (1991), "Prenda-me se for capaz" (2002), "O Terminal" (2004) e em vários outros filmes do cineasta. O roteiro de "Império do Sol" (de Tom Stoppard) é baseado na história real do escritor J. G. Ballard, mas são claras as influências pessoais de Spielberg na trama.

A busca pela empatia

Esta busca pelos pais acaba se revelando também em uma grande carência afetiva, que Spielberg expressa em sua necessidade de se comunicar com a platéia. Há uma constante busca pela empatia do público, que Spielberg sabe manipular brilhantemente. Isso pode ser visto tanto quanto um elogio quanto um defeito, mas é inegável o talento do diretor em causar um efeito no espectador. Spielberg agora criar diálogos cinematográficos, seja na conversa musical entre os cientistas terrestres e os alienígenas em "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", ou na ligação física que existe entre Elliot e E.T.. Já explorei esta característica dos personagens dos filmes de Spielberg no vídeo abaixo:



Império do Sol em três cenas

Esta carência e a busca pela família (e por ele próprio) podem ser vistas por toda longa e dura jornada do garoto Jim em "Império do Sol", mas é mais explícita em três cenas do filme.

O avião caído

Jim morava com a família em Shanghai na Concessão Internacional, território ocupado principalmente pelos britânicos na China desde o século 19. Spielberg ilustra as diferenças sociais e culturais entre os britânicos e os chineses em uma ótima cena que mostra vários carros de luxo levando os ingleses até uma festa à fantasia. Em meio ao trânsito caótico e ruas apilhadas de gente podemos ver os britânicos (vestidos como marinheiros, palhaços ou piratas) dentro de carros de luxo, alheios ao caos exterior. Jim é fascinado por aviões, principalmente os lendários caças japoneses "Zero", e leva um planador para a festa. Ele se afasta da casa e encontra um caça derrubado em um campo nos arredores. A cena, apesar de se passar no mundo "real", é claramente montada do ponto de vista fantasioso do menino. Ele ainda está com a família e vive em berço de ouro, em uma casa cheia de empregados e luxos. Jim lança o planador no ar, entra no caça derrubado e, acompanhado pela trilha de John Williams,  enfrenta o avião de brinquedo, fingindo atirar com as metralhadoras do caça. É uma guerra de mentira, uma fantasia do garoto transformada em realidade através da competência de Spielberg em lidar com os fundamentos do cinema, criando uma batalha aérea através de movimentos de câmera (fotografia de Allen Daviau), edição cuidadosa (do colaborador habitual, Michael Kahn) e da música de John Williams. A fantasia termina quando, ao ir buscar o planador do outro lado de um monte, Jim dá de cara com um grupo de soldados japoneses de tocaia. A cena é tensa, mas Jim não consegue ver o japoneses como inimigos, tamanha é sua admiração por eles. A batalha de fantasia entre Jim e seu avião de brinquedo representa a inocência do garoto, ainda querido por pai e mãe e com tudo a seu favor.

Logo após o bombardeio a Pearl Harbor (dezembro de 1941), os japoneses saíram da tocaia e avançaram sobre Shanghai, expulsando milhares de estrangeiros que ainda estavam na cidade. Entre eles estavam os pais de Jim, que acabam se separando do filho no meio da multidão. A perda da infância de Jim é representada pelo simples plano de um aviãozinho de metal caindo ao chão; o garoto se abaixa para pegá-lo e se solta da mãe. Em desespero, Jim vagueia por Shanghai em busca dos pais, depois vai até sua casa, que foi abandonada às pressas e saqueada pelos empregados. Em longas e elaboradas cenas, Spielberg mostra como o garoto tenta manter alguma "normalidade" dentro casa vazia, comendo o que restou dos mantimentos sentado civilizadamente à mesa. Quando o "tic-tac" do relógio para, porém, um close no rosto do garoto mostra que uma parte da vida dele morreu para sempre. É hora de crescer.

Ele volta a Shanghai, onde conhece Basie (o grande John Malkovich), um aventureiro americano que fica impressionado com a educação do menino, que usa palavras rebuscadas ("Opulence", repete Malkovich, rindo sozinho). A atenção do americano, porém, não pode ser confundida com amizade. Ele tenta vender o garoto no mercado negro, mas ele está tão fraco que ninguém o quer. Jim e Basie acabam capturados pelos japoneses e enviados a um campo de prisioneiros, onde acontece a segunda cena chave do filme.

Outro avião

A chegada de Jim ao campo de prisioneiros é outra sequência cuidadosamente encenada por Spielberg. O que poderia ser um momento trágico para o garoto acaba sendo visto pela mente do menino como um momento mágico. O campo de prisioneiros fica ao lado de uma pista de onde partem vários caças "Zero", e a visão de um deles atrai Jim como uma mariposa a uma lâmpada. Spielberg aumenta a carga visual e emocional da cena colocando centenas de faíscas saindo do avião, do qual Jim se aproxima com reverência. Ele estende as mãos mas mal consegue tocá-lo. O Sargento Nagata (Masato Ibu) grita com o garoto e chega a destravar a arma, quando sua atenção é desviada pela chegada de três pilotos kamikaze, vestindo seus uniformes. É um momento especial para Jim, que faz continência para os pilotos, que se perfilam e respondem à saudação. Ao fundo, pode-se ver o Sol vermelho no horizonte.



Algumas cenas antes, Jim corria pelas ruas de Shanghai gritando "eu me rendo" aos soldados japoneses que ele encontrava. Não era só um pedido de ajuda, mas de atenção. O menino que tinha tudo, de repente, era invisível em meio ao caos da guerra. A continência trocada entre Jim e os pilotos japoneses é a típica cena "spielberguiana" de ação e reação, mensagem e feedback. De elicitar a empatia do público. Para Jim, significa ser aceito entre os ases da aviação que ele tanto venerava.

Cadilac dos Céus

Jim passa três anos no campo de prisioneiros, procurando se manter ocupado. Ele auxilia o Dr. Rawlins (Nigel Havers) no hospital do campo, ajuda o Sr. Maxton (Leslie Phillips) na fila das refeições e cuida de diversas tarefas para Basie, que se tornou uma espécie de líder informal dos americanos internados no campo. A relação de Basie e do garoto continua ambígua. Jim admira a esperteza do americano, que retribui tratando o garoto não como uma criança, mas (aparentemente) como a um igual. Jim rouba sabonetes do Sargento Nagata, alimentos da horta do hospital e cuida da roupa do americano, que retribui não só com revistas "Life", mas permitindo que o garoto participe da sua zona de influência. Quando Basie quer descobrir se o campo além da cerca é minado, no entanto, ele não hesita em enviar Jim em uma missão potencialmente suicida, sob o pretexto de instalar umas "armadilhas" para apanhar pássaros. Outra figura importante para Jim é a Sra. Victor (Miranda Richardson), que Jim vê como um misto de mãe e figura sexual. Há uma cena rara na carreira de Spielberg em que ele mostra Jim, à noite, espiando a Sra. Victor fazendo amor com o marido.

Com a aproximação do final da guerra, aviões americanos são vistos com frequência cada vez maior sobrevoando o campo de prisioneiros. Uma das sequências mais famosas e ambiciosas do filme começa com o nascer do Sol, símbolo do Império do Japão que Spielberg faz questão de enquadrar em momentos chave da trama. Jim havia sido expulso por Basie do alojamento americano; triste e ressentido, ele assiste a uma cerimônia de graduação de pilotos kamikaze do outro lado da cerca. Ele então começa a cantar uma música dos tempos do coral na escola (Suo Gan, tradicional cantiga de ninar do País de Gales), que John Williams mescla à trilha do filme. Os caças japoneses parecem bailar no céu, em frente ao Sol, quando começa o ataque americano.



Jim sobe em um dos prédios abandonados para ver de perto os Mustang P-51, os elegantes caças americanos que realizam o ataque. Spielberg rodou a sequência em um take, utilizando várias câmeras rodando ao mesmo tempo (segundo o documentário "Uma Odisseia na China", que conta o making of do filme, Christian Bale ficou tão impressionado com os aviões que se esqueceu de interpretar; seus closes foram filmados pelo próprio Spielberg rapidamente, em seguida, para se aproveitar da fumaça e do fogo do cenário).

A liberação do campo é, também, a libertação de Jim. Sua devoção pelos ases japoneses é transferida para os pilotos americanos e seus poderosos P-51, que o garoto chama, aos gritos, de "Cadilac dos céus". E aqui também, claro, Spielberg faz um diálogo cinematográfico. Quando Jim está no alto do prédio ele vê um P-51 vindo em sua direção. O piloto, de dentro do avião, também o vê e acena para ele. Jim grita em puro êxtase cinematográfico.




É, também, o momento em que ele volta à realidade; ao ser confrontado pelo Dr. Rawlins, Jim confessa que não se lembra como eram seus pais. Vale lembrar que Christian Bale, que se tornaria um astro no futuro, tinha apenas 13 anos na época e apresenta uma interpretação impressionante.

The End

O filme, provavelmente, deveria ter terminado por aqui, ou um pouco mais para frente. Mas este é um filme de excessos, lembram-se? "Império do Sol" ainda estica por um longo tempo, mostrando o êxodo dos prisioneiros pela China, a descoberta de um estádio cheio dos artigos de luxo saqueados das casas dos britânicos, a morte da Sra. Victor, a explosão da bomba de Nagazaki, a volta de Jim para o campo e assim por diante. Spielberg estava inspirado. Quando finalmente Jim encontra com os pais e a mãe lhe dá um abraço, um close nos olhos do garoto não mostram uma criança, mas um homem velho, que passou pelo inferno para conseguir sobreviver e, finalmente, voltar ao lar.

"Império do Sol" pode não ser tão redondo como "E.T.", divertido como os filmes de Indiana Jones ou relevante quanto "A Lista de Schindler" mas, em meio a todos os seus excessos, é um dos trabalhos mais impressionante da carreira de Steven Spielberg. A perda da inocência tanto de Jim quanto de Steven Spielberg (que passaria a fazer filmes considerados mais "sérios" dali para a frente) é lenta e dolorosa, mas cinematograficamente espetacular.

Câmera Escura

sábado, 8 de fevereiro de 2014

A Menina que Roubava Livros

Antes de começar, o aviso obrigatório: esta crítica se baseia exclusivamente no filme "A Menina que Roubava Livros", e não no bestseller escrito por Markus Zusak. Não li o livro do Zusak, o que é uma vantagem e uma desvantagem. Por um lado, problemas de roteiro provavelmente seriam menos percebidos se tivesse a bagagem do livro. Por outro, o filme foi visto sem qualquer expectativa quanto a ser fiel ao original ou não.

Isto posto, "A Menina que Roubava Livros", como filme, é apenas razoável. Como pontos positivos, em primeiro lugar está o elenco, seguido por uma boa qualidade técnica, com destaque para a direção de fotografia de Florian Balhaus. O grande mestre John Williams recebeu sua 49ª indicação ao Oscar pela trilha sonora, que infelizmente é bem banal.

Em 1938, na Alemanha nazista, a jovem garota Liesel (Sophie Nélisse), filha de uma mulher comunista, é adotada por um casal alemão, Hans e Rosa Hubermann (Geoffrey Rush, de "O Discurso do Rei", e Emily Watson, de "Cavalo de Guerra"). O irmãozinho de Liesel morrera no caminho para a Alemanha, no trem. O motivo pelo qual ela é adotada pelos Hubermann é um dos vários detalhes que, provavelmente, é melhor explicado no livro. No filme, há uma breve menção a uma "ajuda de custo" que a família receberia pela adoção, mas não fica claro. Liesel, a princípio, não se dá muito bem com a mãe adotiva, Rosa, mas é bem recebida pelo carinhoso Hans, o sempre competente Geoffrey Rush. Liesel também é "adotada" por um garoto vizinho chamado Rudy (Nico Liersch), que gosta dela e passa a segui-la por todos os lados. A garota é analfabeta, mas aprende rapidamente (de forma não muito realista) com o pai adotivo. O primeiro livro que ela lê é um manual funerário que ela roubou do homem que enterrou o irmãozinho dela. Ela se apaixona pela leitura e (após uma hora e dez minutos de filme) começa a roubar alguns livros da biblioteca do prefeito da cidade. Ela rouba os livros para ler para Max (Ben Schnetzer), um rapaz judeu que os Hubermann estão escondendo dos nazistas no porão da casa. (leia mais abaixo)


Apesar de aspectos técnicos como figurino e fotografia serem bem feitos, a rua em que moram os Hubermann é claramente um cenário. Os anos vão se passando, a II Guerra Mundial avança mas, na rua "Paraíso", nada muda muito. A ameaça representada pelos nazistas é mais mencionada do que realmente sentida. Algumas boas cenas se perdem em meio a outras conduzidas sem brilho pelo diretor Brian Percival (da série Downtown Abbey). O pior detalhe do filme, porém, é uma narração monótona feita pela "Morte", que recita as frases com a animação de um GPS. Para complicar, a voz da Morte, feita por Roger Allam, lembra muito a voz de Geoffrey Rush, o que confunde ainda mais o espectador.

Assim, "A Menina que Roubava Livros" resulta em um filme que nunca empolga de verdade e, talvez, só interesse aos fãs do livro original.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Lincoln

Há uma cena em "Lincoln", mais novo filme de Steven Spielberg ("Cavalo de Guerra"), em que vários militares e funcionários da Casa Branca estão aguardando uma notícia ao lado do telégrafo, e o presidente Abrahan Lincoln, cansado de esperar, começa a contar uma anedota. Um dos presentes diz: "Acho que não aguento escutar outra de suas histórias neste momento!".  A cena, de forma proposital ou não, ilustra bem o que significa assistir a este filme: apesar de bem feito e frequentemente interessante, "Lincoln" é lento e verborrágico. É um projeto antigo de Spielberg, que trabalha com sua equipe habitual: Janusz Kaminski na ótima fotografia, Michael Kahn na edição, John Williams na trilha sonora, Rick Carter nos cenários, tudo tecnicamente impecável , o que já era de se esperar. O problema está no roteiro de Tony Kushner e, por que não, na direção de Steven Spielberg, excessivamente baseada nos diálogos. É estranho ver um diretor como ele, que sempre foi um mestre em contar histórias através de imagens, filmar atores trocando longos diálogos por quase três horas. O filme se parece tanto com um especial de algum canal a cabo que vários dos personagens são identificados por letreiros explicativos, do tipo "Fulano de Tal, Deputado por Illinois". É como se Spielberg, um autodidata que cresceu ávido consumidor de cinema e cultura pop, se mostrasse reverente e respeitoso demais com a História com "H" maiúsculo.

O filme se passa nas semanas finais da Guerra de Secessão (conflito entre o Norte abolicionista e o Sul escravagista entre 1861-1865). O presidente Lincoln (o extraordinário Daniel Day-Lewis) luta para conseguir aprovar a 13ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos, proibindo a escravidão. Não só os estados do Sul, dependentes da mão de obra negra em suas plantações, são contra a medida. A abolição da escravatura é um tema delicado e, na Câmara dos Deputados, o Partido Republicano (de Lincoln) não tem votos suficientes para passar a nova lei. Cabe ao chefe de gabinete William Seward (David Straitharn, de "Boa Noite, Boa Sorte"), tentar convencer membros do Partido Democrata a votar junto com o governo. É interessante saber que, naquela época, os conservadores eram os democratas, contra os "radicais" do Partido Republicano (exatamente o oposto dos dias de hoje). Lincoln e equipe usam de métodos extremamente duvidosos para tentar conseguir este feito, inclusive oferecendo cargos em troca do apoio dos democratas. Outra questão moralmente duvidosa levantada pelo filme é o uso político de Lincoln do conflito entre o Norte e o Sul. Na Guerra de Secessão morreram quase um milhão de americanos e na época mostrada no filme o Sul já estava fraco e aberto a negociações de paz. O problema é que se a guerra terminasse dificilmente a lei abolicionista seria aprovada, então interessava a Lincoln que o conflito continuasse pelo menos até a votação na Câmara. Uma delegação do Sul já estava negociando a paz com o General Grant (do Norte) enquanto Lincoln tentava passar a emenda. O roteiro é detalhista nestas manobras políticas, o que não deixa de ser "educativo" mas, como cinema, é falho. A não ser que Spielberg tivesse à disposição um roteirista bom em diálogos e intrigas políticas como Aaron Sorkin (de "A Rede Social" e da série "The West Wing", passada na Casa Branca), o que não é o caso.

O elenco, é verdade, deixa tudo mais suportável. Daniel Day-Lewis cria um Lincoln que, apesar de todos os esforços do filme para santificá-lo, é extremamente humano. Seu presidente é um homem de fala mansa, carregada de ironias e anedotas, e Daniel Day-Lewis é o virtual vencedor de melhor ator no próximo Oscar (será seu terceiro prêmio). Coadjuvantes como Hal Holbrook, James Spader, Joseph Gordon-Levitt e, principalmente, Tommy Lee Jones, estão muito bem em seus papéis. Já Sally Field, careteira e exagerada, está sobrando como a esposa do presidente. Falando em Oscar, "Lincoln" está indicado a 12 categorias, mas não vem se dando bem em prêmios como o Globo de Ouro, por exemplo, em que perdeu para "Argo", de Ben Affleck (que também levou o prêmio de melhor diretor).

sábado, 7 de janeiro de 2012

Cavalo de Guerra

Steven Spielberg e os animais, via de regra, estiveram em lados opostos em seus filmes. "Tubarão" (1975) registrava o medo do diretor pelos animais aquáticos, assim como "Jurassic Park" (1993) mostrava que a relação de Spielberg com a natureza, como a de Indiana Jones com os répteis, não era muito amigável. Até mesmo o caminhão de "Encurralado" (1971) era visto mais como uma fera do que como uma máquina e, ao "morrer", o caminhão tanque soltava um lamento que lembrava um animal ferido.

Aos 65 anos e o diretor mais popular da história do cinema falado, Steven Spielberg faz seu primeiro filme em que um animal, o cavalo Joey, é o protagonista. Curioso o quanto o filme se parece com a animação "Spirit - O Corcel Indomável" (2002), produzido quando a DreamWorks (estúdio do qual Spielberg é dono) ainda era considerada uma competidora da Disney na animação tradicional. De fato, em muitas partes, "Cavalo de Guerra" parece uma versão em live action do desenho produzido por Jeffrey Katzenberg, o que não é um demérito. Acertadamente, Spielberg trata o cavalo Joey como um animal o filme todo, não caindo no recurso fácil de antropomorfizar demais a criatura, dando-lhe "sentimentos" humanos. Apesar do protagonista ser o cavalo, são as pessoas que chamam a atenção neste belo drama de guerra. A paisagem pedregosa de Devon, no Reino Unido, lembra a de "Depois do Vendaval" (1952), de John Ford (filme referenciado em "E.T. - O Extraterrestre", 1982), e é neste local que nasce o cavalo Joey, assim batizado por Albert Narracott (Jeremy Irvine). O rapaz é filho do teimoso agricultor Ted (Peter Mullen) que, contrariando a vontade da esposa Rose (a ótima Emily Watson), havia adquirido o cavalo em um leilão. Joey é um belo animal, mas não é adequado para arar o terreno que a família aluga do Sr. Lyons (David Thewlis), que ameaça tomar-lhes a propriedade. Interessante como Spielberg opõe "homem versus máquina" ao mostrar Lyons (e seu filho mimado) sempre andando de automóvel, enquanto os Narracott dependem da tração animal para tirar o sustento da terra.

Com o início da I Guerra Mundial, em 1914, Joey é vendido ao exército (contra a vontade do garoto Albert) e parte para a França. "Cavalo de Guerra" então se divide em uma série de "episódios" interligados pelo animal que tem diferentes donos no transcorrer da trama. Spielberg se vale de ótimos atores europeus como Niels Arestrup (de "O Profeta", 2009) ou Lian Cunningham (de "Borboletas Negras", 2011) para interpretar franceses, alemães ou soldados britânicos. Pena que ele não teve a coragem necessária para fazê-los falar em suas línguas originais (todos falam em inglês), mas seria ousado demais para o público médio americano, que abomina filmes legendados. Visualmente, porém, Spielberg está seguro como sempre. Poucos dominam seu olhar para enquadramentos e soluções visuais, e há cenas de extrema beleza, como o ataque da cavalaria britânica em meio a um campo dourado de trigo ou o uso sutil das pás de um moinho para encobrir uma cena de execução. As cenas de batalha são coreografadas milimetricamente em belos deslocamentos de câmera. E quando o cavalo fica preso em arame farpado no campo de batalha, há uma cena tocante e engraçada em que combatentes inimigos se juntam para tentar soltar o animal.

Steven Spielberg nunca teve medo de ser dramático, até piegas, para trazer o público para junto de seus filmes. O final de "Cavalo de Guerra" é uma homenagem ao cinemão hollywoodiano épico, mítico, passado em um pôr-de-sol que parece ter vindo diretamente de uma cena de "...E o Vento Levou" (1939) ou dos Westerns de John Ford. A direção de fotografia, excelente, é de Janusz Kaminski, que colabora com Spielberg desde "A Lista de Schindler" (1993), e a montagem clássica é do veterano Michael Kahn; tudo  acompanhado pela trilha de John Williams, que musicou todos os filmes de Spielberg (com exceção de "A Cor Púrpura",  1985) desde "A Louca Escapada" (1974). "Cavalo de Guerra" recebeu duas indicações ao Globo de Ouro 2012 (Melhor Filme Dramático e Trilha Sonora) e com certeza estará entre as indicações ao próximo Oscar. Melhor do que tudo isso é dizer que "Cavalo de Guerra" é um filme bonito de se ver, de preferência na tela grande do cinema.


quarta-feira, 21 de maio de 2008

Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal



A espera finalmente terminou. Após 19 anos de rumores, fofocas, boatos e roteiros cancelados, o maior aventureiro do cinema, Indiana Jones, está de volta. E a boa notícia é que "Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal" é tudo o que se podia esperar de um bom filme de Indiana Jones.


Pessoalmente, considero "Caçadores da Arca Perdida" (1981), o primeiro filme da série, o melhor filme de aventura de todos os tempos. O personagem, o arqueólogo aventureiro Indiana Jones, nasceu da vontade de Steven Spielberg de dirigir um filme da série James Bond. Um dia ele comentou isso com o colega George Lucas, que lhe falou da idéia de recuperar a magia dos antigos seriados de aventura do cinema usando da tecnologia moderna de efeitos especiais e um grande orçamento. Lucas se juntou a Philip Kauffman para criar o roteiro de "Caçadores", que foi um grande sucesso quando lançado. O filme tinha aventura sem parar, um personagem humano o suficiente para ter medo de cobras, vilões detestáveis (na forma de nazistas interessados em artefatos religiosos), a produção de George Lucas, direção de Steven Spielberg e música do mestre John Williams. Claro que se tornou um clássico instantâneo. Para interpretar o herói, Harrison Ford, grande sucesso como Han Solo na outra série de Lucas, Guerra nas Estrelas. A princípio Lucas não queria Ford no papel e pensaram em chamar Tom Selleck, da série Magnum, para seu lugar. Quando o contrato de Selleck apresentou problemas, Ford assumiu o posto que lhe cabia de direito e deu vida ao personagem.


Indiana Jones voltaria em "O Templo da Perdição", em 1984, com menos brilho. George Lucas queria um filme mais sombrio e assustador que o anterior e ele apresentou cenas muito violentas para as crianças que lotaram os cinemas. Spielberg não ficou satisfeito, Harrison Ford teve problemas nas costas durante as filmagens e ficou afastado por semanas, e o filme sofreu com isso. O que não impediu que fosse um grande sucesso de bilheteria e tivesse grandes sequências de ação, como a perseguição dentro de uma mina abandonada.


Em 1989 eu entrava no cinema para ver a estréia de "Indiana Jones e A Última Cruzada", que conseguiu recuperar o "clima" do primeiro filme, o bom humor e, de quebra, trazia James Bond em pessoa, Sean Connery, para viver o pai de Indiana Jones. O filme era ótimo e aparentemente encerrava a série com chave de ouro, com os personagens partindo em direção ao pôr do sol ao som da marcha de John Williams. Era o final da trilogia Indiana Jones. Harrison Ford disse que não voltaria ao personagem, Spilberg partiu para projetos mais sérios e Lucas voltou para a série Star Wars (com resultados duvidosos).


Mas os anos foram passando, Spielberg foi ganhando Oscars e Harrison Ford, com excessão de "O Fugitivo", de 1994, nunca mais fez um filme que agradasse ao público de verdade. George Lucas criou uma série de TV, o "Jovem Indiana Jones" que, apesar de bem produzida e de lidar com temas históricos, não tinha muito a ver com o espírito do personagem. A internet começou a espalhar rumores de uma continuação. Os temas eram vários: Indy ganharia uma filha e partiria em aventuras com ela. Indiana Jones iria enfrentar os russos durante a Guerra Fria, ou talvez fosse investigar o suposto OVNI que caiu em Roswell, Novo México, em 1947. Ele iria procurar pela cidade perdida de Atlântida ou, quem sabe, iria atrás da mítica Eldorado. Supostos roteiros vazavam na rede, nomes de roteiristas eram anunciados e desmentidos, até que, finalmente, era oficial. Frank Darabont, renomado diretor e roteirista de "Um Sonho de Liberdade", "À Espera de um Milagre" e "Cine Majestic", entre outros, havia sido contratado para escrever o roteiro. Spielberg ficou satisfeito com o resultado e até Harrison Ford gostou e disse que vestiria de novo o chapéu pelo roteiro de Darabont. Mas George Lucas, na última hora, e ainda envolvido com seus filmes sobre Star Wars, vetou o projeto.


Se você leu até aqui e não quer saber detalhes do novo filme, sugiro que pare por aqui e volte depois de ver o filme.

Finalmente a espera acabou. Indiana Jones está de volta em um roteiro (escrito por David Koepp) que, incrivelmente, conseguiu juntar várias das teorias pensadas acima na forma de um grande filme de aventura. Assim, estamos em 1957 e Indiana Jones não está mais lutando com os nazistas. Estamos na Guerra Fria e o clima de paranóia contra os comunistas está à solta nos Estados Unidos. Os russos levam Indy para a famosa "área 51", para um galpão cheio de caixas que são imediatamente familiares para os fãs da série: foi ali que a Arca da Aliança, encontrada por Indy em "Caçadores", foi guardada. Cate Blanchett interpreta a vilã, uma soviética chamada Irina Spalko, que faz Indiana Jones encontrar os restos do suposto alien que caiu em Roswell dez anos antes. O roteiro parte disso e nos leva para uma série de situações, uma mais deliciosamente absurda que a outra, até terminar no meio da Floresta Amazônica. Indy enfrenta um teste nuclear no estado de Nevada (do qual ele foge de forma inusitada), conhece um rapaz arrogante (Shia LaBeouf) que o leva até o Peru atrás de uma "Caveira de Cristal" que teria poderes místicos e que levaria à Eldorado. De quebra, reencontra um amor antigo, Marion Ravenwood (Karen Allen, de Caçadores da Arca Perdida, considerada pelos fãs a "verdadeira" namorada do herói) e descobre que o rapaz é seu filho. Claro que nada pode ser levado à sério. A começar pelo fato de que Harrison Ford estava com 64 anos durante as filmagens. Apesar disso, Ford recuperou o antigo "charme" e o personagem está de volta, com o mesmo modo de andar, falar e esmurrar os adversários.


Colaboradores antigos como Denholm Elliot (que morreu em 1992), que interpretava Marcus Brody, ou John Rhys-Davies (Sallah), não estão mais presentes. Também não está de volta Sean Connery como pai de Indiana Jones, por motivos óbvios. Mas a adição de Shia LaBeouf como filho de Indy foi uma escolha acertada. LaBeouf está "quente" em Hollywood no momento e tem participado de produções de sucesso como "Transformers" e "Paranóia". Cate Blanchett, sempre talentosa, está apropriadamente exagerada como a vilã soviética de sotaque carregado e Ray Winstone faz o papel de um amigo não muito confiável de Jones. Para completar o elenco, John Hurt faz o papel de um arqueólogo meio maluco que originalmente descobriu a Caveira de Cristal.


Spielberg dirige com segurança e está em casa nas cenas de perseguição à pé, de moto, de carro, caminhão, barco e qualquer coisa que se mova que acontecem no filme. O clima de matinê reina absoluto e há cenas absurdas, mas divertidas, como uma perseguição em que os personagens ficam pulando de um carro para outro, ou até mesmo duelando com espadas à toda velocidade, desviando por mágica das árvores da floresta. As Cataratas do Iguaçu mudam de local e vão parar lá no Amazonas, para mais algumas cenas absurdas. E tudo termina em uma seqüência espetacular de efeitos especiais, com Indiana Jones em primeiro plano, testemunhando uma mudança na paisagem realizada pelos mágicos da Industrial Light and Magic, a veterana empresa de efeitos especiais da Lucasfilm.


Confesso que me surpreendi com a receptividade do filme durante a pré-estréia em que fui. As duas sessões em que estive (sim, vi o filme duas vezes) estavam lotadas, e grande parte do público me pareceu jovem demais para sequer ter nascido antes dos 19 anos que se passaram desde o último filme. Prova de que Indiana Jones se tornou parte da cultura popular e já é um clássico do cinema. "Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal" é uma boa pedida. A espera, afinal, valeu a pena.