domingo, 2 de outubro de 2011

Estranhos Normais

Metalinguagem é um recurso que, quando bem usado, eleva a qualidade de uma obra. É frequentemente utilizada em filmes do roteirista Charlie Kaufman, por exemplo ("Adaptação", "Sinédoque", "Quero ser John Malkovich"), com bons resultados. Quando mal empregada, porém, a metalinguagem pode gerar confusão ou, pior, revelar problemas básicos de roteiro. "Estranhos Normais", de Gabrielle Salvatores (vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro por "Mediterrâneo") é um exemplo de mau uso da metalinguagem.

O que não significa que o filme seja ruim. O recurso é apenas inadequado, desnecessário. "Estranhos Normais" conta a história de duas famílias muito diferentes, reunidas em um jantar pelo fato de que seus filhos Filippo (Gianmaria Biancuzzi) e Marta (Alice Croci) pretendem se casar. Eles têm apenas 16 anos e tanto a família classe alta de Filippo quanto a classe média de Marta são contra. Acontece que todos estes personagens são fruto da imaginação de um roteirista chamado Ezio (Fabio De Luigi), recentemente abandonado pela mulher e tentando escrever seu primeiro longa metragem. Ele se inclui na história em uma cena em que atropela Anna (Margherita Buy), mãe de Filippo, que o convida para o jantar. Lá ele conhece Caterina (Valeria Bilello), uma pianista clássica de 27 anos que está deprimida, e se apaixona por ela. A trama é interrompida de vez em quando pelo próprio Ezio que, cansado de escrever e infeliz com o desenrolar da história, fecha seu laptop; mas os personagens ganham vida própria e importunam o escritor, exigindo que ele termine o roteiro. A inspiração claramente vem da peça "Seis personagens à procura de um autor", de Pirandello, que é inclusive citado no filme. O diretor Gabrielle Salvatores tem origem teatral e o roteiro é baseado em uma peça escrita por Alessandro Genovesi, co-autor do filme.

O problema é que as intervenções metalinguísticas raramente servem para algo útil e mais parecem inseridas para esticar a duração do filme. A idéia original é simples e falta material para desenvolver um longa-metragem. Salvatores tenta compensar este fato com montagens musicais regadas ao som de "Simon and Garfunkel" ou com monólogos em que os personagens falam diretamente com a câmera. O elenco tem boas escolhas, como o divertido pai de Marta, interpretado por Diego Abatantuono, um homem de meia idade que fuma constantemente um baseado e se veste de forma estravagante. Há um leve toque de drama e profundidade na história do pai de Fillipo, Vincenzo, que descobre estar com um câncer terminal mas não consegue contar à família; ele é muito bem interpretado por Fabricio Bentivoglio.

"Estranhos Normais", felizmente, melhora conforme avança para o final, o que de certa forma compensa suas falhas. Destaque para o trabalho de direção de arte, que carrega os planos com as cores vermelho, amarelo e verde, remetendo ao semáforo em que Anna é atropelada pelo roteirista, dando início à trama. Visto no Topázio Cinemas.


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