segunda-feira, 27 de julho de 2009

Há tanto tempo que te amo

Juliette Fontaine (Kristin Scott Thomas) é uma mulher fria. Quando sua irmã Lea (Elsa Zylberstein), radiante de felicidade, vai buscá-la no aeroporto, Juliette a abraça, mas não esboça muita emoção. No carro, a mesma expressão fechada. Lea vai buscar as filhas adotivas na escola e diz a elas que a tia "estava viajando". As crianças tentam se aproximar, mas mesmo elas percebem que há algo "errado" com Juliette.

Kristin Scott Thomas (de "O Paciente Inglês") está ótima neste filme escrito e dirigido pelo romancista francês Philippe Claudel. Juliette é um enigma, mas Kristin aos poucos vai revelando o ser humano por trás da máscara fria e indiferente de sua personagem. Seu cunhado Luc não se preocupa em esconder que não a quer por muito tempo na casa. A irmã pede paciência ao marido. Afinal, ela passou 15 anos longe. Quando Juliette vai fazer uma visita obrigatória a seu agente de condicional (Frédéric Pierrot) é que ficamos sabendo parte da verdade. Juliette não estava viajando, mas sim presa por 15 anos. Qual teria sido seu crime? Por que Luc não a quer sozinha com as crianças? Por que ela é tão calada e fechada?

O filme explora muito bem a relação entre as duas irmãs. Lea é toda sorrisos com a irmã mais velha, mas sua apreensão e ansiedade são perceptíveis. Aos poucos, Juliette vai extraindo dela revelações sobre o comportamento da própria família. Os pais de Juliette obrigaram Lea a se esquecer da irmã, a ponto de começarem a dizer para os outros que Lea era filha única. Quando Juliette pergunta a Lea o porquê dela ter adotado duas crianças, ao invés de ter filhas próprias, a irmã responde que queria filhos, mas não queria gerar um. "É por minha causa", diz Juliette. A natureza do seu crime (que não vou revelar aqui) é tão terrível, e inexplicável, que as pessoas a tratam com desprezo ou medo. Existe crime sem perdão? Alguém que passou 15 anos preso e separado da sociedade tem o direito de tentar recomeçar a vida, quando solto?

O diretor Claudel, auxiliado pelo ótimo elenco, faz um trabalho delicado e sóbrio. Repare como o figurino das irmãs vai ficando mais claro e mais leve à medida que o filme se passa, conforme Juliette vai sendo aceita de volta pela família e por amigos. Curioso também o personagem do sogro de Lea, um senhor que mora com eles e que não pode mais falar por causa de um AVC. Juliette, calada por natureza e por consequência de suas ações, encontra conforto e companhia na presença do velho em algumas suaves passagens do roteiro.

Mais para o final o filme cresce em drama, mas também se perde um pouco. O crime de Juliette ganha uma explicação que pode ser vista como uma forma de "redimir" a personagem, e a cena em que as duas irmãs falam sobre o assunto "proibido" é interpretada brilhantemente por Kristin Scott Thomas e Elsa Zylberstein. O problema é que a tal "redenção" acaba tirando do filme um pouco do seu realismo e crueza e partindo para um clímax emocional contraditório. Por que não ir até o fim com o drama dessa mulher falha, mas fascinante? De qualquer forma, "Há tanto tempo que te amo" é um belo filme, levado com brilho pelo elenco encabeçado por Scott Thomas, em interpretação exemplar.


domingo, 26 de julho de 2009

Inimigos Públicos

De um lado, a Hollywood clássica e o filme de gângster. Anos 30, bandidos com nomes inventivos como "Baby Face" Nelson e "Pretty Boy" Floyd, metralhadoras Thompson, casacos longos, chapéus de feltro. Do outro, um dos diretores mais modernos do cinema atual, Michael Mann, com seu visual perfeccionista e suas experimentações com o cinema digital. O resultado: "Inimigos Públicos", um filme de gângster do século XXI. Mann é um mestre da imagem. Seu estilo é ao mesmo tempo épico e intimista. Ele gosta da câmera bem próxima do rosto dos personagens, como que tentando nos mostrar o que se passa dento da cabeça deles. Ao mesmo tempo, sua tela larga e imagem perfeita criam um mundo próprio. Desde algumas experimentações em "Ali" (sua falha biografia do boxeador mais famoso de todos os tempos) e em "Colateral" Mann têm usado as câmeras digitais Vyper e Sony CineAlta para substituir a tradicional película de 35 mm usada desde sempre no cinema. Se elas funcionavam bem em filmes modernos como "Miami Vice", com seu visual noturno e "sujo", sua utilização em um filme de estilo clássico como "Inimigos Públicos" poderia ser arriscada. Nas mãos de Mann e seu diretor de fotografia Dante Spinotti, no entanto, o resultado é surpreendente: temos um filme clássico que é, ao mesmo tempo, moderno até a medula.

Johnny Depp interpreta John Dillinger, um criminoso que, perguntado o que faz da vida, simplesmente responde: "Sou ladrão de bancos". Dillinger era uma espécie de "pop star" nos anos 30. Fã de cinema e de Clark Gable, vivia apenas para o dia de hoje e realizava seus roubos a banco com rapidez, nunca roubando o cliente comum. Mann e Depp, no entanto, não tentam glamourizar demais o personagem. Ele era cruel com seus inimigos e não tinha respeito algum pela lei. Apaixonou-se por uma garota chamada Billie Frechette (a francesa Marion Cotillard), o que acabou sendo seu ponto fraco. Seu inimigo declarado era Melvin Purvis (Christian Bale), um homem da lei que foi transformado em agente especial pelo diretor do FBI, o afetado John Edgar Hoover (interpretado muito bem por Billy Crudup). Hoover sonhava com uma agência anti-crime composta por homens com "treinamento científico", com técnicas que, nesses dias de CSI e exames de DNA, podem parecer risíveis, mas eram as mais avançadas da época. Purvis já havia matado pessoalmente "Pretty Boy" Floyd e "Baby Face" Nelson e Dillinger se tornou sua obsessão. Ele é interpretado por Christian Bale, que já foi um grande ator, mas ultimamente parece ter estacionado em um mesmo tipo de atuação. Saudade de seus tempos de filmes pequenos. Depp, em contrapartida, está cada vez melhor com seu estilo camaleônico.

Michael Mann é meticuloso na construção de certas sequências, como a que mostra Dillinger fugindo de uma delegacia, atravessando uma a uma as barreiras do lugar, metódica e precisamente. O frenezi da mídia a respeito de Dillinger é mostrado em uma sequência visualmente fantástica, em que o criminoso é trazido de avião, à noite, e iluminado por fogos pelos cinegrafistas da época, tão insistentes quanto os paparazzi modernos. O final é metalinguístico. Dillinger passa seus últimos momentos em uma sala de cinema, assistindo a Clark Gable. Depp observa Gable e, novamente, o moderno dialoga com o clássico. E o cinema continua.


domingo, 19 de julho de 2009

Antes que o mundo acabe

"Antes que o mundo acabe" foi o último filme exibido na competição oficial do II Festival Paulínia de Cinema, no dia 15 de julho e, em minha opinião, foi o filme mais gostoso de ver do festival. Dirigido por Ana Luiza Azevedo, "Antes que o Mundo Acabe" é uma produção da prolífica "Casa de Cinema de Porto Alegre", responsável por alguns dos melhores filmes nacionais dos últimos anos, como "Tolerância" (Carlos Gerbase), "O Homem que Copiava", "Meu Tio Matou um Cara" ou "Saneamento Básico" (todos de Jorge Furtado). Azevedo foi assistente de direção de Furtado e autora de vários curtas da casa, e faz sua estréia na direção de longas metragens. Baseado no livro de Marcelo Carneiro da Cunha, o roteiro foi escrito por Azevedo, Jorge Furtado, Paulo Halm e Giba Assis Brasil (que também é o editor do longa).

O filme conta a história do adolescente Daniel (Pedro Tergolina). Com 15 anos de idade, ele se encontra naquela fase em que os hormônios levam a melhor e tudo parece mudar muito depressa. Sua namorada, Mim (Bianca Menti) está em dúvidas sobre o namoro e pede "um tempo" a Daniel. "Quanto tempo é um tempo?", pergunta ele. Para complicar, ela está interessada no melhor amigo dele, Lucas (Eduardo Cardoso), que é o responsável pelo laboratório de Química no colégio onde os três estudam. Um dia Lucas sai mais cedo e deixa o laboratório sob a responsabilidade de Daniel. Ao descobrir que o melhor amigo está saindo com sua namorada, Daniel destrói o laboratório em um acesso de fúria e a culpa recai sobre Lucas. Além de estar com problemas com a namorada e o melhor amigo, Daniel começa a receber cartas da Tailândia de um fotógrafo que diz ser seu pai verdadeiro.

Tudo isso é contado de forma leve e divertida, sem cair no lugar comum. Daniel tem uma irmã menor chamada Maria Clara (Caroline Guedes) que tem um modo todo particular de ver o mundo. Parte da história é narrada por ela de uma forma que me lembrou muito o tipo de cinema feito por Jorge Furtado desde sua obra prima, o curta metragem "Ilha das Flores" (que consiste em criar "hyperlinks" entre os fatos do filme e informações extra filme). O fato do pai verdadeiro de Daniel ser fotógrafo também se presta para que o visual da obra seja muito interessante. Há várias referências à linguagem fotográfica e cinematográfica, como no brinquedo que Maria Clara tem no quarto (um zootropo, um dos primeiros aparelhos de imagens em movimento da história), ou nas colagens de figuras que ela faz. A narração também fala sobre as sociedades "poliândricas", em que as mulheres podem ter vários maridos, e o pai de Daniel pergunta a ele como isso seria visto aqui no Brasil. Claro que isso faz referência ao comportamento não só da namorada de Daniel como também do de sua mãe. Daniel é um garoto com "dois pais", um biológico e distante e um padrasto presente e gentil.

Tudo se passa na pequena cidade de Pedra Grande (RS), com uma passagem por Porto Alegre. Apesar da maioria da população ainda se locomover em bicicletas e o filme ter um ar que remete a uma vida mais pacata, é interessante notar que a tecnologia moderna não é deixada de fora; ela é representada pelo computador e aplicações da internet que já se tornaram lugar comum, como chats, Google Earth, sites de fotos e de busca (todos abrasileirados e adaptados de forma divertida). Quando Daniel ganha uma câmera fotográfica, é sua vez de registrar o que vê à sua volta e tentar tirar algum sentido disso. Será que tudo é o que parece? Será que o Brasil é tão diferente de um lugar distante como a Tailândia? Ou a globalização está nos deixando todos iguais?

"Antes que o mundo acabe" ganhou o prêmio da crítica no Festival de Paulínia e Ana Luíza Azevedo o de Melhor Direção. O filme ainda levou os prêmios de Melhor Fotografia (Jacob Solitrenick), Trilha Sonora (Leo Henkin), Figurino (Rosangela Cortinhas) e Direção de Arte (Fiapo Barth).

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Herbert de Perto

Um Herbert Vianna jovem, cheio de si, anda em volta de uma piscina e fala diretamente para a câmera. Ele diz que tem certeza de que, se uma tragédia acontecesse, ele poderia começar tudo de novo em algum lugar, onde quer que fosse. A imagem é intercalada por um Herbert Vianna nos dias de hoje, careca, cicatrizes no crânio, que assiste a si mesmo com expressão divertida. “Esse mané não sabe muito o que está falando”, diz ele. Será mesmo que não sabe?

Herbert Vianna, guitarrista e cantor da banda “Paralamas de Sucesso”, passou por uma tragédia; em um acidente com um ultraleve que pilotava em 2001, sua esposa morreu e ele foi praticamente dado como morto quando chegou ao hospital. Eu me lembro da primeira notícia que escutei no rádio a respeito do cantor. O locutor dizia que Herbert tinha menos de dez por cento de chances de sobreviver. O tempo e a tenacidade dele provaram o contrário. Ele não só sobreviveu como, contra todas as expectativas, recuperou aos poucos a lucidez, a memória e, mesmo paraplégico, voltou a ser um dos maiores guitarristas do rock brasileiro.

É esta história extraordinária que conta o documentário “Herbert de Perto”, de Roberto Berliner e Pedro Bronz, apresentado dia 15 de julho no II Festival Paulínia de Cinema. Os “Paralamas do Sucesso” (Herbert Vianna nos vocais e guitarra, João Barone na bateria e Bi Ribeiro no baixo) já dariam um documentário fascinante sem mesmo contar a tragédia pessoal de Vianna. De fato, a produtora Conspiração Filmes fez um ótimo retrato do grupo e da história do rock nacional no documentário “Paralamas em Close-Up”, realizado em 1998. Uma das bandas a surgir no início dos anos 80, os “Paralamas” se destacaram pela tenacidade de seu vocalista e principal compositor e pela originalidade de suas músicas. O “power trio” fazia uma mistura de rock com toques de reggae e letras que exploravam as experiências pessoais de Herbert. “Óculos”, por exemplo, o primeiro super sucesso da banda, falava sobre como o acessório causava problemas entre Vianna e as garotas. O baterista João Barone conta como foi a primeira vez que se encontrou com Herbert. “Ele parecia um CDF”, brinca ele. De fato, Vianna tinha um visual de estudante “nerd”, roupas sociais e óculos de grau, que escondiam um músico compulsivo e autodidata que, quando criança, serrou o próprio violão para poder alcançar as notas mais agudas, como uma guitarra.

As imagens de arquivo, em qualidade baixa, mostram três “moleques” que criaram o que hoje são clássicos do rock nacional, como “Óculos”, “Meu Erro”, “Alagados” e dezenas de outros. O rock estourou após o sucesso da banda Blitz, que vendeu mais de um milhão de discos e abriu os olhos das gravadoras para novas bandas como “Titãs”, “Legião Urbana” e os “Paralamas” (a “santíssima trindade” do rock nacional). Nos anos 90 o grupo ainda fez grande sucesso na Argentina e gravou alguns discos em espanhol. Após o relativo fracasso dos discos “Os Grãos” (1991) e “Severino” (1994), a banca começou a se perguntar se a “onda” do rock nacional estava acabada. Como sempre, a história provou o contrario, e o disco ao vivo “Vamo Batê Lata” (1995) vendeu mais de 900 mil cópias. Herbert conheceu, se apaixonou e se casou com a inglesa Lucy Needhan, com quem teve três filhos. Quando o vemos falando com paixão sobre a esposa e sobre aprender a voar em frente ao ultraleve que quase o mataria, a emoção toma conta do filme. Dado Villalobos, membro do Legião Urbana e amigo de Herbert, conta como foi que viu o acidente dele acontecer praticamente à sua frente. Lucy morreu na hora e Herbert chegou ao hospital em um nível de coma considerado irreversível por grande parte dos médicos. Seria mais uma história de morte no rock se não fosse a história de Herbert Vianna. O grupo continua na ativa e eles fecharam o Festival Paulínia de Cinema com um show ao vivo.

Vencedores do II Festival Paulínia de Cinema

Longa-metragen - Ficção:

Melhor Filme ficção: R$ 60 mil: Olhos Azuis, José Joffily.
Melhor Direção de Ficção: R$ 30 mil: Ana Luiza Azevedo, de Antes que o Mundo Acabe.
Prêmio Especial do Júri: R$ 30 mil: O Contador de Histórias, de Luiz Villaça.
Melhor Roteiro: R$15 mil: Paulo Halm e Melanie Dimantas, de Olhos Azuis.
Melhor Ator: R$ 25 mil: Marco Ribeiro, Paulo Mendes e Cleiton Santos, de O Contador de Histórias.
Melhor Atriz: R$ 25 mil: Cristina Lago, de Olhos Azuis / Silvia Lourenço e Maria Clara Spinelli, de Quanto Dura o Amor?
Melhor Ator Coadjuvante: R$ 15 mil: Irandhir Santos, de Olhos Azuis.
Melhor Atriz Coadjuvante: R$ 15 mil: Nívea Magno, de No Meu Lugar.
Melhor Figurino: R$ 15 mil: Rosangela Cortinhas, de Antes que o Mundo Acabe.
Melhor Trilha Sonora: R$ 15 mil: Leo Henkin, de Antes que o Mundo Acabe.
Melhor Direção de Arte: R$ 15 mil: Fiapo Barth, de Antes que o Mundo Acabe.
Melhor Som: R$ 15 mil: François Wolf, de Olhos Azuis.
Melhor Montagem: R$ 15 mil: Pedro Bronz, de Olhos Azuis.
Melhor Fotografia: R$ 15 mil: Jacob Solitrenick, de Antes que o Mundo Acabe.

Longa-metragem - Documentário:
Melhor Documentário: R$ 45 mil: Só Dez Por Cento é Mentira, de Pedro Cezar
Melhor Direção de Documentário: R$ 30 mil: Roberto Berliner e Pedro Bronz, por Herbet de Perto.

Curta-metragem - Regional:

Melhor Filme: R$ 20 mil: Spectaculum, de Juliano Luccas
Melhor Direção: R$ 15 mil: Caue Fernandes Nunes, de Quem será katlyn
Melhor Roteiro: R$ 8 mil: Pedro Struchi, de Prós e Contras
Melhor Ator: R$ 8 mil: Alexandre Caetano, de Prós e Contras
Melhor Atriz: R$ 8 mil: Roseli Silva, de Morte Corporation
Melhor Montagem: R$ 8 mil: Caue Fernandes Nunes, de Quem será Katlyn
Melhor Fotografia: R$ 8 mil: Marcelo Mazzariol, de Spetaculum

Curta-metragem - Nacional:

Melhor Filme: R$ 20 mil: Timing, de Amir Admoni
Melhor Direção: R$ 15 mil: Érico Rassi, de Milímetros
Melhor Roteiro: R$ 8 mil: Erico Rassi de Milímetros
Melhor Ator: R$ 8 mil: Fábio Di Martino, de Milímetros
Melhor Atriz: R$ 8 mil: Débora Falabella, de Doce Amargo
Melhor Montagem: R$ 8 mil: Amir Admoni, de Timing
Melhor Fotografia: R$ 8 mil: André Modugno, de Relicário

Prêmio da Crítica:

Melhor Filme de Ficção: Antes que o Mundo Acabe, de Ana Luiza Azevedo
Melhor Filme de Documentário: Moscou, de Eduardo Coutinho.

fonte: Festival de Paulínia

quinta-feira, 16 de julho de 2009

No Meu Lugar

“No meu lugar” marca a estréia de Eduardo Valente (curtametragista premiado em Cannes) na direção de longas metragens. O filme foi exibido no II Festival Paulínia de Cinema na segunda feira, 13 de julho, com recepção mista. Não é um filme fácil, com ritmo lento e estrutura não linear, o que confundiu parte do público.

Uma casa no Rio de Janeiro é o ponto em comum de três histórias interligadas por um crime. O policial Zé Maria (Márcio Vito, muito bem) está sob investigação após um tiroteio em que um homem é morto. Zé Maria é pai de Janaina (Nívea Magno), uma adolescente que não vê com bons olhos a degradação física e psicológica dele. O tiroteio aconteceu na casa de Elisa (Dedina Bernardelli), esposa do homem morto. Ela volta à casa um tempo após a morte do marido, com os filhos e um novo companheiro, Fernando (Licurgo Spinola). A casa está toda empoeirada e ainda apresenta marcas de tiros nas paredes. Elisa e família vieram de Curitiba, onde estão morando agora, para empacotar as coisas e vender a casa. Também acompanhamos a história de Sandra (Luciana Bezerra) e Beto (Raphael Sil). Ela é empregada na casa de Elisa e ele é o entregador do supermercado, e mora na favela. Os dois são namorados e, conforme a paixão aumenta, também aumenta a sensação de impotência diante da pobreza e dos problemas da vida no Rio de Janeiro.

Há um “truque” temporal na montagem que nunca é expresso abertamente, o que gerou certa confusão em parte da platéia. Não é nada exatamente novo, já visto em filmes fragmentados como “Crash”, “21 Gramas” e “Babel” e é uma faca de dois gumes neste filme. A estrutura em quebra-cabeças é interessante, fazendo com que o espectador tenha que prestar atenção para entender como o filme “funciona”. Por outro lado, assim que o “truque” se torna claro (cada trama está sendo vivida em uma época diferente), parte do interesse se perde. O ritmo é tão lento que acaba gerando desconforto em alguns momentos. Há planos que, mesmo após a ação ter sido terminada, continuam por mais alguns segundos na tela sem necessidade aparente. Fica a sensação de que algo está para acontecer, mas não acontece. O elenco é muito bom, mas o clima pesado cria um distanciamento entre os personagens. É tudo muito frio, melancólico, escuro. E o que dizer da relação entre o policial Zé Maria e Janaina, sua filha? Quando os vemos pela primeira vez, na escuridão de uma casa iluminada à luz de velas, temos a nítida impressão de estarmos vendo marido e mulher. E isso se repete por várias cenas até que, de repente, a moça começa a tratar Zé Maria como “pai”. A confusão só aumenta após uma cena em que vemos os dois acordando juntos, de manhã, dividindo a mesma cama de casal. Esta confusão é proposital ou um “erro” do filme? Escutei várias pessoas no cinema expressando a mesma sensação.

O filme é tecnicamente bem feito, com produção da Videofilmes, de Walter e João Moreira Salles. O final também não é do tipo “hollywoodiano”, em que tudo se explicaria de forma clara, o que não deixa de ser um anticlímax. A situação sugerida, mas não mostrada, no início do filme, é vista agora do lado dentro da casa. Fica certa frustração pela decisão de não mostrar o que aconteceu de forma clara novamente. Um filme denso e bem feito em que falta, talvez, um pouco mais de emoção.



terça-feira, 14 de julho de 2009

Moscou

Em “Jogo de Cena” (2007), o documentarista Eduardo Coutinho fez um jogo com a platéia. Contratou atores famosos e desconhecidos para interpretar “depoimentos” que eram intercalados com histórias reais ditas por pessoas comuns. O jogo era descobrir quem era real e quem era inventado. A conclusão que se pode tirar é que, no fundo, não faz diferença. Tudo é “verdadeiro” quando quer dizer alguma coisa.

Coutinho volta agora com mais uma experiência. Por três semanas ele gravou um grupo de teatro montando a peça “As Três Irmãs”, de Anton Tchekhov, mas de forma nada convencional. Com direção teatral de Enrique Diaz, o grupo Galpão fez uma série de workshops diante das câmeras de Coutinho, que novamente mistura ficção com realidade. Há cenas, por exemplo, em que os atores estão decorando as falas enquanto fazem um lanche ou trocam de roupa. Em vários momentos o espectador fica sem saber se os diálogos são dos personagens da peça ou conversas reais entre os atores. O rapaz está passando uma “cantada” na colega atriz ou é um trecho da peça? Conforme o filme avança, as cenas de bastidores vão se tornando mais raras e a peça vai ganhando destaque, embora os jogos continuem. Há um trecho em que dois atores fazem exatamente o mesmo papel, intercalando frases e mostrando duas formas diferentes de fazer o mesmo personagem.

O documentário foi exibido ontem no II Festival Paulínia de Cinema e Coutinho, sempre uma “figura”, subiu ao palco e disse que a montagem foi um “inferno”. Ele agradeceu especialmente ao produtor (e também documentarista) João Moreira Salles, por ter visto a montagem inicial (que tinha quatro horas e meia) e conseguido enxergar um filme ali. Após a sessão, Coutinho me disse que havia 70 horas de material para editar.

Fica evidente que Eduardo Coutinho, um dos mais importantes documentaristas do cinema brasileiro, está cada vez mais se aproximando da ficção em seus trabalhos e quebrando aquele modelo tradicional de documentário composto apenas por depoimentos para a câmera. Em “Moscou”, Coutinho não está simplesmente “documentando” a montagem de uma peça. A peça existe para que seja documentada por Coutinho que, por sua vez, cria sua versão de um filme de ficção. O documento, na verdade, é o do trabalho do ator. O espectador acompanha o gradual processo que começa com uma simples leitura ao redor de uma mesa e se transforma em uma cena montada. Aquela ‘mágica’ que acontece quando um ser humano representa outro.

domingo, 12 de julho de 2009

Quanto dura o amor?

O diretor Roberto Moreira surpreendeu com seu “Contra Todos” (2003), um filme que ousava pelo realismo e crueza tanto na trama quanto no estilo simples de produção. Ele volta agora com “Quanto dura o amor?”, exibido hoje no II Festival Paulínia de Cinema. Em muitos aspectos, é um filme melhor e mais maduro.

Silvia Lourenço (que fez sua estréia em “Contra Todos”, vencendo vários prêmios) é Marina, uma atriz do interior que se muda para São Paulo em busca de um papel na peça “Tio Vânia”, de Anton Tchekhov. Ela vai morar com Suzana (Maria Clara Spinelli), uma advogada competente e reservada que é objeto das atenções de Gil (Gustavo Machado), também advogado, que se apaixona por ela. Suzana também se apaixona por ele, mas tem um segredo que pode por tudo a perder. No mesmo prédio também mora Jay (Fábio Herford, muito engraçado), um rapaz que escreveu um livro de poesias e é a personificação do “nerd”, intelectual, de óculos e incapaz de se relacionar normalmente com mulheres. Sua paixão é a prostituta Michelle (Leilah Moreno) que, obviamente, só está interessado nele enquanto ele pode pagá-la. Marina começa a freqüentar a casa noturna de Nuno (Paulo Vilhena), que é namorado de Justine (a cantora Danni Carlos), uma sensual cantora por quem Marina se apaixona e começa a ter um caso.

Estas histórias se cruzam no decorrer da trama de forma natural e interessante. É um filme extremamente urbano, se concentrando na Avenida Paulista e no tradicional Bairro da Liberdade. Foi captado em digital com a nova câmera Red One, que tem uma imagem muito parecida com a tradicional película de cinema, com bela direção de fotografia de Marcelo Trotta. Sílvia Lourenço (que é uma das criadoras do roteiro) está muito bem, assim como todo o elenco. A cantora Danni Carlos se entrega a uma personagem que lembra um pouco Amy Whinehouse no visual e no comportamento. Ela canta várias canções em inglês durante o filme, e imagino que boa parte do orçamento tenha ido para pagar os direitos autorais destas músicas. Há uma boa dose de sexo no filme, mas o roteiro se concentra nos encontros e desencontros amorosos entre os personagens. A aproximação do advogado Gil a Suzana é feita com calma e romance, ambientada no visual oriental da Liberdade. Fábio Herford me lembrou um pouco Paul Giamatti em Sideways, com seu jeito tímido e intelectual.

A cidade de Paulínia foi uma das produtoras do filme através do Pólo Cinematográfico e algumas cenas foram feitas na cidade. O próprio teatro onde o filme foi exibido serviu de locação para as cenas em que Marina faz o teste para “Tio Vânia”. Sua trajetória como aspirante a atriz retrata bem os problemas da profissão. Há uma cena engraçada em que ela tenta um papel em uma propaganda de margarina e é esnobada por uma atriz mirim com provavelmente muito mais experiência do que ela.

Um filme urbano, bem feito e lidando com pessoas que, se não são exatamente “pessoas comuns”, representam sentimentos que podem ser reconhecidos por qualquer um.

sábado, 11 de julho de 2009

Desejo e Perigo

Quando ficamos sabendo, em "Notorious", de Alfred Hitchcock, que Ingrid Bergman terá que se passar por esposa de Claude Rains para espioná-lo, intelectualmente sabemos que ela vai ter que dormir com ele. Mas em um filme de 1946, isto é apenas um detalhe que, na verdade, não podia ser mostrado de fato.

Em um filme de 2007 de Ang Lee, o cinema e a sociedade mudaram o suficiente para que este "detalhe" não seja apenas insinuado. Homens e mulheres se relacionam sexualmente na vida real e, nos dias de hoje, também no cinema. O ato, e suas consequências físicas e psicológicas, mudam quando vemos com nossos próprios olhos. Assim, o sexo em "Desejo e Perigo" está no limite do explícito. Na prática, é bem possível que os atores Tony Leung e Tang Wei, assim como seus personagens, também levaram o ato até o fim.

Isso posto, "Desejo e Perigo" ("Lust, Caution", no original, que descreve perfeitamente o enredo) é muito mais do que sexo. Ang Lee, depois de ganhar o Oscar nos EUA por "O Segredo de Brokeback Mountain", está de volta à China para fazer um dos melhores filmes sobre espionagem, guerra e relacionamentos dos últimos anos. Ele é impecável na recriação da China ocupada pelos japoneses antes e durante a II Guerra Mundial, nos figurinos, na bela direção de fotografia de Rodrigo Pietro e na música de Alexandre Desplat.

O enredo trata da jovem estudante Wong Chia Chi (Tang Wei) que, ao entrar para um grupo de teatro,  também se envolve com o movimento contra a ocupação japonesa. Seus colegas de teatro estão dispostos a matar um colaboracionista chinês chamado Yee (Tony Leung, sempre excelente) e eles trocam as peças de teatro por uma "peça" muito mais perigosa e mortal. Wong Chia Chi começa a interpretar o papel da "Sra. Mak", a esposa de um rico homem de negócios e, nesta condição, consegue se aproximar da família do Sr. Yee. O filme é extremamente detalhado em mostrar esta aproximação e também a enorme e reprimida paixão que surge entre ela e o Sr. Yee. As ações do resto do grupo também são detalhadas e, por vezes, ingênuas. Há uma cena de assassinato extremamente violenta que também me lembrou Hitchcock, quando o grupo literalmente suja as mãos de sangue pela primeira vez e descobre, a duras penas, que matar um homem não é tão fácil quanto parece.

Há uma passagem temporal para três anos depois, em 1941, e a Sra. Mak volta a assediar e espionar o Sr. Yee em Shanghai. É então que a atração entre eles se consuma de forma violenta e apaixonada. Ang Lee não  quer simplesmente nos chocar com as cenas de sexo. Há no ato dos dois algo de desesperado, seja do lado da garota, que tem que se entregar a alguém que ela está tentando matar, seja do lado do chinês que desconfia de tudo e de todos. É como se os dois soubessem que, no fundo, são inimigos, mas há um fogo e uma atração entre eles que os levam ao limite do amor físico. Mas seria realmente apenas físico? É possível se entregar a tal ponto a alguém sem que haja sentimento? Por que a "Sra. Mak" se doa com tanta paixão ao inimigo mas mantém uma relação apenas platônica com seu companheiro de resistência?

O filme não foi bem nos Estados Unidos por causa da classificação NC-17 (geralmente associada a filmes pornográficos) e não repetiu o sucesso de filmes como "O Tigre e o Dragão" ou "Brokeback Mountain", mas Ang Lee venceu o Leão de Ouro no Festival de Veneza. Aqui no Brasil, chegou com dois anos de atraso. (Em Campinas, o filme está em pré-estréia no Topázio Cinemas.)

Irretocável.


Morte Corporation e Vida Vertiginosa

Fico imaginando se foi apenas coincidência que colocaram estes dois curtas no mesmo dia no II Festival Paulínia de Cinema. Um com a morte no título e o outro com a vida? É no mínimo curioso.

Assisti a ambos. "Morte Corporation" é um produto sem muitas ambições, mas divertido. É uma comédia feita em digital sobre a visita da Morte a um homem e a incapacidade dela em levá-lo porque a internet está fora do ar. A direção é de Léo de Castilho e é uma produção bem campineira, da Paprika Filmes e Bank Filmes, além da trilha sonora de Nelson Pinton, da Vitrola Digital, o mesmo músico que trilhou meu curta "Mudanças". Nada de excepcional, mas interessante, com Tony Mastaler e Roseli Silva.

Já "Vida Vertiginosa" é o oposto. Pretensioso e estrelado por Ney Latorraca e Paula Burlamaqui, o curta pretende fazer uma homenagem ao escritor João do Rio. É um curta "de época", com figurino e locações antigas, mas com uma qualidade técnica sofrível, principalmente com relação ao som. Há um amadorismo impressionante na forma como o som muda em cada corte de câmera, como se estivéssemos escutando realmente o áudio do modo como foi captado na hora, sem edição nem equalização final.

O Contador de Histórias

"O Contador de Histórias" sofre de um grande problema. Tem um narrador tão descritivo, óbvio e redundante que, por vezes, parece que estamos assistindo a um filme feito para cegos. Considere a primeira vez que a pedagoga francesa Margherit (Maria de Medeiros) se encontra com o jovem Roberto Carlos (Paulinho Mendes), um interno da Febem. Um plano subjetivo de Roberto Carlos mostra seus pés e o pé da francesa entre eles. O narrador diz o óbvio: "A primeira coisa que vi foi o pé dela". E é assim o filme todo. Não há uma cena que se desenrole de forma puramente cinematográfica, através de imagens e sons, sem que o narrador interfira contando e explicando o que estamos vendo. Há uma cena em que Margherit dá ao rapaz um envelope, e por alguns segundos o espectador imagina o que há dentro dele. Mas o "suspense" não dura porque o narrador, infalível, se faz ouvir para dizer que dentro havia um pedaço de papel com um endereço. Por que não MOSTRAR o papel?

"O Contador de Histórias" é dirigido por Luiz Villaça e abriu a segunda sessão do II Festival Paulínia de Cinema. O filme conta a história real de Roberto Carlos Ramos, um garoto que foi deixado pela mãe na Febem, nos anos 70, pois ela acreditava que ele teria uma vida melhor lá do que na família de 11 filhos. Na instituição, Roberto Carlos aprende a se tornar um "trombadinha" e é um dos campeões de fugas. A obstinada francesa Margherit se interessa pela história dele e o fica seguindo com um gravador seja na instituição ou nas ruas. O garoto a princípio fica desconfiado, mas acaba procurando pela proteção de Margherit após ser abusado por uma gangue de garotos de rua. A portuguesa Maria de Medeiros, que interpreta Margherit, é a figura mais interessante do filme, embora por vezes seja caricata demais. O garoto é interpretado por uma série de crianças diferentes, conforme a idade. A reconstituição de época, mostrando Belo Horizonte no final dos anos 70, é interessante e há cenas no trânsito em que só vemos carros da época.

Mas o filme tem problemas. Um deles, já mencionado, é a narração constante e redundante. Em alguns momentos, quando Roberto Carlos está falando sobre seu passado ou criando alguma memória imaginada, ela é necessária e interessante. Mas, como disse, no resto ela é simplesmente a narração do óbvio. Outro problema é o ritmo e a má utilização do tempo. Há uma sequência passada em um ônibus em que Margherit está levando Roberto para ver o mar pela primeira vez, o que deveria ser uma "surpresa". Para esticar o tempo, o filme usa o recurso amadorístico de usar fades e transições apenas para voltar ao mesmo plano anterior, que mostra a francesa e o rapaz no ônibus. Quando eles finalmente chegam à praia e o rapaz tem a chance de correr para a água, a cena é cortada e voltamos ao confinamento da casa de Margherit, onde se passa quase todo o filme. A mesma coisa acontece quando os dois vão a um jogo de futebol. Quando a trama dá ao filme a chance de levantar voo, voltamos ao interior da casa de Margherit. E, perto do final, há uma cena em que simplesmente ficamos vendo duas mulheres fumando um cigarro inteiro, com música ao fundo, sem a menor necessidade.

Apesar de tudo, o filme agradou à platéia presente ao Teatro Municipal de Paulínia, onde foi exibido. A mim me pareceu formulaico e previsível, necessitando de uma edição melhor e o corte da maior parte da narração.


Caro Francis

Primeiro documentário a ser apresentado no II Festival Paulínia de Cinema, "Caro Francis" é um filme sobre o polêmico crítico, escritor e jornalista Paulo Francis, que morreu de ataque cardíaco em Nova York em pleno carnaval de 1997. Pouco antes da exibição, o diretor do documentário, Nelson Hoineff, subiu ao palco com a equipe para dizer que o filme não era isento e que era claramente um filme em homenagem a um amigo.

Paulo Francis também gostava de dizer que não era isento. Ele abominava a utopia jornalística da "imparcialidade" e era um homem de opiniões, mesmo que elas pudessem lhe causar embaraços ou problemas sérios. Dono de um humor mordaz e sem papas na língua, Francis começou escrevendo críticas de teatro que, segundo um dos entrevistados, contestavam até a lei da gravidade. Trotskista ferrenho, mudou radicalmente da esquerda para a direita quando foi para os Estados Unidos. A mudança é comentada com humor por parte de amigos e conhecidos. O produtor musical Nelson Mota diz que a esquerda brasileira diz que Francis "se vendeu" à direita, mas que isso é uma grande bobagem. O documentário é cheio de depoimentos de todo tipo de pessoas e áreas de atuação, como Fernanda Montenegro, Lucas Mendes, Boris Casoy, Fausto Wolff, Ziraldo, Matinas Suzuki, Hélio Costa e até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o atual governador de São Paulo, José Serra.

O astro principal também está presente, claro, em dezenas de imagens de arquivo de entrevistas ao Roda Viva, na TV Cultura, reportagens, erros de gravação e, claro, sua participação no Manhattan Connection, que fazia com Lucas Mendes, Nelson Mota e Caio Blinder. Alguns episódios chave de sua vida são mais detalhados, como sua saída da Folha de S. Paulo, motivada pela intervenção do ombudsman do jornal, Caio Túlio Costa (chamado por Francis de "lagartixa" e por Diogo Mainardi de "mau caráter"). A coluna de Francis era geralmente escrita altas horas da madrugada e, por vezes, nem mesmo o autor tinha plena consciência do que dizia. "Um bom editor", diz Paulo Francis em uma entrevista, "guardaria meu texto em uma gaveta e me perguntaria depois se eu tinha certeza que queria publicar aquilo". As opiniões consideradas de ultradireita lhe conseguiram o ódio mortal dos petistas, dezenas de políticos e de parte do público, mesmo sendo um dos colunistas mais lidos do país. Sua ida à Rede Globo foi aprovada com uma condição: que ele fosse ao ar apenas no final da noite, no Jornal da Globo, onde poderia provocar menos "estrago".

O maior problema foi quando, no Manhattan Connection, Francis acusou os diretores da Petrobrás de terem dinheiro sujo escondido em contas na Suíça. O diretor da Petrobrás na época processou Francis em 100 milhões de dólares e há quem diga que foi a preocupação sobre este episódio que causou a morte de Paulo Francis. Ele começou a sentir fortes dores no braço esquerdo e seu médico particular o tratou de bursite, sem perceber que ele estava com problemas cardíacos. O médico se defende dizendo que os exames de Francis estavam todos bons. O documentário intercala imagens de arquivo com depoimentos gravados em alta definição e fotografias. Há um momento em que o tom "light" e irreverente do filme dá uma guinada e a música de Gershwin é trocada por Tristão e Isolda, de Wagner, e é neste tom grave que o documentário vai até o final, o que me pareceu um pouco exagerado e melodramático.

De qualquer modo, "Caro Francis" é um bom retrato de um dos jornalistas mais polêmicos e folclóricos da imprensa brasileira. Seu modo de falar arrastado e característico, suas opiniões sarcásticas e sua cultura geral, segundo um dos entrevistados e "vítima" de Francis, fazem falta hoje em dia.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

II Festival Paulínia de Cinema

O II Festival Paulínia de Cinema vai de 9 a 16 de julho de 2009. Grande sucesso em sua primeira edição, com presença de muitos realizadores e artistas famosos, a segunda edição promete muitos filmes e discussão sobre a sétima arte. Ano passado estivemos no festival e assistimos em primeira mão a filmes como "Feliz Natal", de Selton Mello e "Desafinados", de Walter Lima Jr. Este ano o Festival abriu com "À Deriva", de Heitor Dhalia, em sessão apenas para convidados. A partir de hoje as sessões são abertas ao público com entrada franca. Confira a programação a seguir:

Sexta-feira, 10 de julho
18h – Morte Corporation, curta regional de Leo Castillo;
18h15 – Caro Francis, documentário longa-metragem de Nelson Hoineff;
20h – Vida Vertiginosa, curta metragem de Luiz Carlos Lacerda;
20h15 - O Contador de Histórias, longa de Luiz Villaça
Sábado, 11 de julho
18h – Prós e Contras, curta regional de Pedro Struchi;
18h15 – Mamonas, o Doc, longa documentário de Cláudio Kahns;
20h – Relicário, curta-metragem de Rafael Gomes;
20h15 – Destino, longa de Moacir Goes
Domingo, 12 de julho
18h - Quem Será Katlyn?, curta regional de Caue Nunes;
18h15 – Sentido à Flor da Pele, longa documentário de Evaldo Mocarzel;
20h – Doce Amargo, curta-metragem de Rafael Primot;
20h15 – Quanto Dura o Amor?, longa de Roberto Moreira
Segunda-feira, 13 de julho
18h – Spectaculum, curta regional de Juliano Luccas;
18h15 – Moscou, longa documentário de Eduardo Coutinho;
20h – Milímetros, curta-metragem de Érico Rassi;
20h15 – No Meu Lugar, longa de Eduardo Valente
Terça-feira, 14 de julho
18h – A Máquina do Tempo, curta regional de Marcos Craveiro;
18h15 – Só dez por cento é mentira, longa documentário de Pedro Cesar;
20h – Nesta data querida, curta-metragem de Julia Rezende;
20h15 – Olhos Azuis, de José Joffily
Quarta-feira, 15 de julho
18h – Capoeira, curta regional de Matheus Oliveira;
18h15 – Herbert de Perto, longa documentário de Roberto Berliner e Pedro Bronz;
20h – Timing, curta-metragem de Amir Admoni;
20h15 – Antes que o Mundo Acabe, de Ana Luiza Azevedo
Quinta-feira, 16 de julho
20h – Entrega dos prêmios de curta-metragem;
20h30 – Homenagem ao Diretor Daniel Filho
20h45 – Tempo de Paz, longa-metragem de Daniel Filho (exibição hors Concours);
22h – Entrega dos prêmios de longa-metragem;
23h – Show da Banda Paralamas do Sucesso
Mostras Paralelas
Também de 10 a 15 de julho, sempre às 16hs, no Theatro Municipal de Paulínia, acontece
ainda, dentro da programação oficial do Festival, a Mostra Paralela, que exibirá seis longas de
sucesso lançados comercialmente no período que compreende julho de 2008 a junho de 2009.
A entrada é franca.
Sexta-feira, 10 de julho
16h – A Mulher Invisível, de Cláudio Torres.
Sábado, 11 de julho
16h – Divã, de José Alvarenga Jr.
Domingo, 12 de julho
16h - O Menino da Porteira, Jeremias Moreira.
Segunda-feira, 13 de julho
16h – Linha de Passe, de Walter Salles e Daniela Thomas
Terça-feira, 14 de julho
16h – Ensaio Sobre a Cegueira, de Fernando Meirelles
Quarta-feira, 15 de julho
16h – Se Eu Fosse Você 2, de Daniel Filho


sexta-feira, 3 de julho de 2009

A Era do Gelo 3

O terceiro “A Era do Gelo” chega na onda de filmes lançados em 3D dos últimos anos. Felizmente, o recurso é utilizado de forma inventiva e muito bem feita e, o que é uma bela surpresa, é acompanhado por um roteiro muito bom, que lembra o primeiro (e ainda melhor) da série. Dirigido pelo brasileiro Carlos Saldanha, “A Era do Gelo 3” é divertido, bem escrito e tecnicamente impressionante. Após a correria sem sentido do segundo filme, eis um episódio que foca novamente na amizade entre os membros do grupo formado pelo mamute Manny, sua esposa Ellie, o tigre dentes-de-sabre Diego e a preguiça Sid. Além, claro, do personagem do esquilo pré-histórico que, neste episódio, é acompanhado por uma versão feminina, que também está sempre tentando pegar uma noz fujona.

Os mamutes estão esperando um filhote, o que resgata um pouco o sentimento paternal que havia no primeiro filme (por causa do bebê humano que o grupo protegia). Diego, o tigre, se sente posto de lado e pensa em abandonar o grupo. Já a preguiça Sid (que, sinceramente, não sei definir se é macho ou fêmea), inspirada pelo iminente nascimento do filhote de Manny, tem os instintos maternais atiçados quando encontra três grandes ovos em uma caverna escondida. Há cenas muito engraçadas envolvendo Sid e os ovos, principalmente depois que eles chocam e dão à luz três filhotes de tiranossauro, que passam a seguir e imitar Sid. Claro que os filhotes têm uma mãe verdadeira que, gigante na tela 3D, vem buscá-los e os leva, junto com Sid, para um mundo subterrâneo onde moram os dinossauros que não foram extintos. Cabe ao resto do bando ir até lá para resgatá-lo, contando com a ajuda de Buck, uma doninha que perdeu um olho e que é completamente neurótico.

O efeito tridimensional é usado para reforçar as cenas de perseguição e para ampliar o belo mundo subterrâneo encontrado pelo grupo. Há cascatas de lava fervente, florestas tropicais sobrevivendo sob o gelo, plantas carnívoras gigantes, perseguições no lombo de pterodátilos e todo tipo de aventuras que proporcionam uma boa diversão para as crianças, mas que também satisfazem os adultos.