Os Quatro Paralamas (2020). Dir: Roberto Berliner e Paschoal Samora. Netflix. Documentário que foca na amizade entre os três membros dos "Paralamas do Sucesso", Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro, além de um quarto personagem, o empresário José Fortes. O doc começa com um bate papo entre os quatro na casa de Bi Ribeiro e parte para um monte de imagens de arquivo, algumas com qualidade bastante ruim, mas válidas como registro, de ensaios, turnês, shows e conversas do grupo em quase 40 anos de história. Talvez falte um pouco de profundidade, mas é como ser uma mosca na parede escutando a conversa entre eles, entrecortada por apresentações musicais, cenas de bastidores, etc. Não podia ficar de fora, claro, o trágico acidente de ultraleve de 2001 que matou a mulher de Herbert, Lucy, e deixou o guitarrista à beira da morte. Contra todas as previsões, ele não só sobreviveu como voltou a tocar e cantar e se apresenta até hoje.
Eu vi uma versão um pouco melhor desta história (dirigida pelo mesmo Roberto Berliner) no Festival de Paulínia em 2009; o documentário se chamava "Herbert e eu" e, pelo que me lembro, era mais aprofundado, embora o foco fosse realmente Herbert Vianna, e não os Paralamas. Não que haja muita diferença. "Os Quatro Paralamas" é nostálgico e bem feito. Tá na Netflix.
Um Herbert Vianna jovem, cheio de si, anda em volta de uma piscina e fala diretamente para a câmera. Ele diz que tem certeza de que, se uma tragédia acontecesse, ele poderia começar tudo de novo em algum lugar, onde quer que fosse. A imagem é intercalada por um Herbert Vianna nos dias de hoje, careca, cicatrizes no crânio, que assiste a si mesmo com expressão divertida. “Esse mané não sabe muito o que está falando”, diz ele. Será mesmo que não sabe?
Herbert Vianna, guitarrista e cantor da banda “Paralamas de Sucesso”, passou por uma tragédia; em um acidente com um ultraleve que pilotava em 2001, sua esposa morreu e ele foi praticamente dado como morto quando chegou ao hospital. Eu me lembro da primeira notícia que escutei no rádio a respeito do cantor. O locutor dizia que Herbert tinha menos de dez por cento de chances de sobreviver. O tempo e a tenacidade dele provaram o contrário. Ele não só sobreviveu como, contra todas as expectativas, recuperou aos poucos a lucidez, a memória e, mesmo paraplégico, voltou a ser um dos maiores guitarristas do rock brasileiro.
É esta história extraordinária que conta o documentário “Herbert de Perto”, de Roberto Berliner e Pedro Bronz, apresentado dia 15 de julho no II Festival Paulínia de Cinema. Os “Paralamas do Sucesso” (Herbert Vianna nos vocais e guitarra, João Barone na bateria e Bi Ribeiro no baixo) já dariam um documentário fascinante sem mesmo contar a tragédia pessoal de Vianna. De fato, a produtora Conspiração Filmes fez um ótimo retrato do grupo e da história do rock nacional no documentário “Paralamas em Close-Up”, realizado em 1998. Uma das bandas a surgir no início dos anos 80, os “Paralamas” se destacaram pela tenacidade de seu vocalista e principal compositor e pela originalidade de suas músicas. O “power trio” fazia uma mistura de rock com toques de reggae e letras que exploravam as experiências pessoais de Herbert. “Óculos”, por exemplo, o primeiro super sucesso da banda, falava sobre como o acessório causava problemas entre Vianna e as garotas. O baterista João Barone conta como foi a primeira vez que se encontrou com Herbert. “Ele parecia um CDF”, brinca ele. De fato, Vianna tinha um visual de estudante “nerd”, roupas sociais e óculos de grau, que escondiam um músico compulsivo e autodidata que, quando criança, serrou o próprio violão para poder alcançar as notas mais agudas, como uma guitarra.
As imagens de arquivo, em qualidade baixa, mostram três “moleques” que criaram o que hoje são clássicos do rock nacional, como “Óculos”, “Meu Erro”, “Alagados” e dezenas de outros. O rock estourou após o sucesso da banda Blitz, que vendeu mais de um milhão de discos e abriu os olhos das gravadoras para novas bandas como “Titãs”, “Legião Urbana” e os “Paralamas” (a “santíssima trindade” do rock nacional). Nos anos 90 o grupo ainda fez grande sucesso na Argentina e gravou alguns discos em espanhol. Após o relativo fracasso dos discos “Os Grãos” (1991) e “Severino” (1994), a banca começou a se perguntar se a “onda” do rock nacional estava acabada. Como sempre, a história provou o contrario, e o disco ao vivo “Vamo Batê Lata” (1995) vendeu mais de 900 mil cópias. Herbert conheceu, se apaixonou e se casou com a inglesa Lucy Needhan, com quem teve três filhos. Quando o vemos falando com paixão sobre a esposa e sobre aprender a voar em frente ao ultraleve que quase o mataria, a emoção toma conta do filme. Dado Villalobos, membro do Legião Urbana e amigo de Herbert, conta como foi que viu o acidente dele acontecer praticamente à sua frente. Lucy morreu na hora e Herbert chegou ao hospital em um nível de coma considerado irreversível por grande parte dos médicos. Seria mais uma história de morte no rock se não fosse a história de Herbert Vianna. O grupo continua na ativa e eles fecharam o Festival Paulínia de Cinema com um show ao vivo.