sábado, 29 de maio de 2010

Tudo pode dar certo

Fundo preto, letras brancas, trilha sonora de jazz. "Written and Directed by Woody Allen". Simples, direto, familiar. Depois de fazer alguns filmes na Inglaterra e mesmo em Barcelona, Allen volta à velha e conhecida Manhattan para mais uma comédia sobre pessoas extremamente cultas, de classe alta e neuróticas. Allen faz isso há tanto tempo e tão bem que praticamente já criou um gênero próprio, a "comédia de Woody Allen", e os fãs não se cansam disso.

A única coisa que muda é o fato de que o papel de Allen, aqui, é feito por outro ator, Larry David, outro neurótico que foi co-criador e escritor da série de TV "Seinfeld". David está ótimo no papel, usando do recurso de narrar a história olhando diretamente nos olhos do espectador. Ele é Boris Yellnikof, um auto-proclamado gênio que é um especialista em Mecânica Quântica e que já foi considerado para o Prêmio Nobel. Como bom personagem de Woody Allen, Boris é rabujento, hipocondríaco, sofre de síndromes de pânico e se considera acima dos outros pobres mortais. Ele manca de uma perna devido à uma tentativa sem sucesso de se matar pulando da janela (ele aterrisou no toldo do prédio). Uma noite, voltando para casa, ele é abordado por uma jovem "caipira" do Mississippi que lhe pede algo de comer. Ela fugiu de uma cidade pequena e partiu para Nova York em busca da felicidade. Os dois acabam formando um casal improvável, mas divertido. Ele tem um QI de 200, é físico e super qualificado. Ela atende pelo nome de Melody St. Anne Celestine (Evan Rachel Wood) e mal frequentou a escola porque a mãe a vivia colocando em concursos de beleza. Com o tempo e a convivência, porém, os dois acabam encontrando uma vida em comum e chegam até a se casar, para horror da mãe de Melody, Marietta (Patricia Clarkson) que, inesperadamente, chega à Nova York em busca da filha.

Allen usa e abusa de sua habilidade com diálogos que misturam de forma hilária o conhecimento científico de Boris com a ignorância de Melody. Preste atenção quando ela tenta explicar o "princípio da incerteza de Heisenberg" para um jovem ator que se apaixonou à primeira vista por ela. Ou como Allen alfineta a esquerda sulista americana, com seu fanatismo religioso, sua ignorância e intolerância. A "boca suja" de Boris vomita suas idéias pessimistas sobre a natureza humana, sobre a exploração religiosa de Deus, sobre as ilusões amorosas e uma infinidade de assuntos, alguns em debates com outros personagens, outros com o próprio espectador.

O título brasileiro não dá conta de traduzir o original, "Whatever works", que seria melhor traduzido como "O que te fizer feliz". A frase funcionaria melhor com a filosofia tanto de Boris quanto do próprio filme. As mudanças pelas quais passam Melody, sua mãe e, mais tarde, o pai dela, são muito engraçadas. Boris, aparentemente, permanece o mesmo sujeito de sempre, apesar de "amaciado" pelo contato com Melody e mais aberto a aceitar fatos do mundo, como a sorte e o papel do destino. Divertido.


quinta-feira, 27 de maio de 2010

Cinema 3D vs Cinema Alternativo

Matéria produzida para o programa TJ-PUC, da PUC-Campinas. Trata do crescimento do mercado 3D no Brasil e no mundo. Como contraponto, o chamado cinema alternativo tem um público relativamente pequeno mas fiel, culto e formador de opinião. Agradecimentos à rede Cinemark e ao Cine Topázio, de Campinas.

terça-feira, 25 de maio de 2010

O que resta do tempo

O diretor Elia Suleiman conseguiu um feito. Uma comédia extremamente sutil lidando com a delicada situação entre israelenses e palestinos. Tão sutil, na verdade, que demora para o espectador perceber o humor da situação. O filme começa com um tom fantasioso, quando um taxista desconfiado pega um passageiro no aeroporto, à noite, e ruma para a estrada. No caminho, uma forte tempestade o faz parar no meio fio e o motorista, claramente assustado, se pergunta o que está acontecendo. A situação parece um sonho e abre uma janela para o passado e para as lembranças de Suleiman, o passageiro do táxi. Voltamos para 1948, ano da criação de Israel e da ocupação da cidade de Nazaré. O pai de Suleiman, Fuad (Saleh Bakri) faz parte da resistência palestina e é um fabricante de armas. Ele é preso e torturado pelos israelenses, e imaginamos que estamos para ver um filme pesado de guerra.

Curiosamente, não é o que acontece. Em saltos para frente no tempo, o filme deixa de lado a ação inicial e se torna uma espécie de contemplação do equilíbrio frágil que se instala na região. Suleiman faz uma delicada homenagem ao pai e à mãe na forma de episódios cuidadosamente dirigidos e enganadoramente simples. O espectador acompanha situações cotidianas da família Suleiman e da vizinhança, tudo maravilhosamente fotografado por Marc-André Batigne. Há um vizinho "maluco" que se encharca de gasolina e ameaça se queimar toda semana. Há a tia que faz um prato de lentilha tão intragável que o pequeno Elia Suleiman sempre joga o conteúdo do prato no lixo. Na escola, Elia é frequentemente repreendido por ter falado alguma coisa contra os Estados Unidos. À noite, seu pai e um amigo gostam de pescar em frente ao mar, tendo que explicar para a polícia, todas as vezes, de que não estão fazendo nada suspeito.

É um filme extremamente contemplativo, talvez até demais. A terceira parte mostra o próprio diretor voltando para Nazaré para visitar a mãe doente. Suleiman faz uma espécie de filme mudo (aos moldes de Buster Keaton, que nunca sorria), nos mostrando o lado engraçado de situações absurdas, como um homem que sai para jogar o lixo e parece nem notar o gigantesco tanque de guerra que o mantém sob a mira constante; ou o guarda de trânsito que dança uma coreografia com os carros que passam, ou a mulher com o bebê que, por um momento, para um tiroteio entre a polícia israelense e os palestinos. Suleiman faz sua declaração de amor ao cinema em pequenos momentos, como na exibição de "Spartacus" (de Kubrick) em seus tempos de escola, ou no rapaz que passa na rua assobiando a trilha de "O Poderoso Chefão" (de Francis-Ford Coppola) ou "Três Homens em Conflito" (de Sergio Leone). Uma das melhores cenas, no entanto, é a que envolve o impassível Suleiman, o muro construído por Israel para separar judeus de palestinos e uma vara olímpica.

Uma comédia em que o espectador nunca solta uma gargalhada, mas está sempre sorrindo. A não ser em uma cena inacreditável de karaokê, que vale o filme.


segunda-feira, 24 de maio de 2010

LOST - The End

Acabou. Após seis anos de mistérios, especulações, viagens reais e imaginárias, mortes, renascimentos, mudanças no tempo e no espaço, a história dos passageiros do Vôo 815 da Oceanic finalmente chegou ao fim. O final, a bem da verdade, não explica muito (ou não explica tudo) o que realmente aconteceu nestas seis temporadas. E não poderia ser diferente. "Lost" sempre foi muito mais sobre os mistérios do que sobre as explicações, sobre as perguntas deixadas no ar que faziam a delícia (e agonia) de milhões de fãs no mundo todo.

"Lost" já foi muito bom e muito ruim. Em seu melhor, a série levantava questões sobre a natureza humana, sobre o poder do destino, sobre a validade da ciência contra o poder da fé, o valor da amizade e do companheirismo. Em seu pior, era uma história "nerd" que misturava civilizações egípcias com seres imortais vindos não se sabe de onde e uma "luz da vida" convenientemente criada nos últimos episódios para ajudar a "explicar" tudo. Em suma, "Lost" era uma série ótima quando tratava dos personagens, mas derrapava quando tentava explicar seu lado "nerd". Uma das melhores sacadas dos roteiristas, sem dúvida, foi saber usar do recurso do flashback como nunca. Ao jogar um grupo de personagens em uma ilha, a saída genial de dar cor e vida à série foi mostrar a vida pregressa de cada um deles através de uma série de engenhosos flashbacks, que não só mostravam quem era cada uma daquelas pessoas, como também criava curiosas conexões entre elas. A primeira (e melhor) temporada explorou como nunca o recurso, que ganhou uma "virada" também genial algumas temporadas depois, ao inverter a linha do tempo para o futuro na forma de flashforwards que mostravam os personagens fora da ilha. E que personagens. Jack (Mathew Fox), Kate (Evangeline Lilly), Sawyer (Josh Holloway), Sayid (Naveen Andrews), Hugo (Jorge Garcia), Jin (Daniel Dae Kim), Sun (Yunjin Kim), Locke (Terry O´Quinn), Claire (Emilie de Ravin), Charlie (Dominic Monagham), Desmond (Henry Ian Cusick)... nomes que, ano após ano, se tornaram parte do imaginário dos fãs e parte da "família" de "Lost".

Fica claro também que, ao contrário do que alguns fãs defendem, os roteiristas iam decidindo o caminho da série conforme o trilhavam. E mais, o próprio feedback dos fãs, em um volume inédito nesta era da internet, moldou o futuro da série. Mais do que espectadores, os fãs se tornaram verdadeiros co-autores de "Lost" ao discutirem, semana após semana, o que estava acontecendo e o que viria a acontecer com os personagens. É possível notar alguns caminhos experimentados pelos roteiristas conforme a série se desenrolava. Fica claro que, nas primeiras temporadas, "Lost" tinha tudo a ver com a "Iniciativa Dharma" e sua tentativa de "salvar o mundo" através da exploração dos "números malditos" (4, 8, 15, 16, 23, 42). Havia um clima que lembrava algum projeto secreto estilo "Projeto Manhattan" ou os anos paranóicos da Guerra Fria, principalmente na figura de Benjamin Linus (Michael Emerson) e sua vila. Mais tarde o rumo da série mudou para a figura misteriosa de "Jacob", que ninguém sabia exatamente quem era, mas que definitivamente não era a mesma "pessoa" que mostrariam depois. A série abraçou seu lado "nerd" de forma mais forte ao apresentar não só Jacob mas um "irmão" misterioso e, depois, uma "mãe" inexpicada e inexplicável. Pode ter funcionado para tentar solucionar vários mistérios da série mas, infelizmente, Jacob e companhia acabaram tirando perigosamente o foco dos personagens principais e, o que é pior, dava a impressão que eles eram indiferentes ao passado, presente e futuro da ilha.

Especulações, teorias, suposições, apostas... como explicar, afinal, "Lost"? A melhor saída, na verdade, é não explicar. Assim, me arrisco a dizer (e que caia a ira de vários fãs) que Damon Lindelof e Carlton Cuse, os produtores e roteiristas principais (apesar da publicidade concedida a J.J. Abrams) acertaram no capítulo final. Não, não há uma "explicação" definitiva. Entre o lado "nerd" e o lado humano, venceu este último, e o episódio final de mais de uma hora de duração é praticamente uma celebração aos personagens. Acabamos descobrindo que o tal "mundo paralelo", na verdade, não passava de um "não-lugar" que era fruto da imaginação dos personagens, todos mortos. Não significa, atenção, que eles estivessem mortos durante a série (uma das várias teorias sobre "Lost"). Como explica o pai de Jack, Christian, eles não morreram todos ao mesmo tempo, mas estão ali para "se lembrarem...e para deixarem para trás". É assim, na verdade, que deve ser encarado este último episódio da série. Ou mesmo, talvez, toda a sexta temporada. Foi uma temporada para que os fãs pudessem se lembrar dos personagens, de suas histórias, dos que morreram, renasceram, aprenderam a falar outra língua, voltaram a andar, se amaram ou se odiaram...e os deixar para trás.

Sim, é brega, é new age, é produto pop cultural disfarçado de filosofia barata. Mas assim foi "Lost" durante todos estes anos. Se não foi a melhor série de todos os tempos (para mim, o título pertence à "Jornada nas Estrelas" original dos anos 60), chegou bem perto. Com todas suas contradições e buracos do tamanho de crateras, "Lost" contou com histórias intrigantes e, muitas vezes, extremamente inteligentes. Misturou filosofia, antropologia e religião ("Christian Shephard?" pergunta Kate, irônica) com viagens no tempo, sexo, drogas e rock ´n roll, um bocado de violência e atores acima da média (marcados, provavelmente, para o resto de suas carreiras pelos personagens). Mas tudo chega ao fim.

É hora dos fãs deixarem "Lost" para trás.


domingo, 23 de maio de 2010

Vencedores em Cannes

Segundo Kleber Mendonça Filho, direto de Cannes

Palma de Ouro: (Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives) directed by Apichatpong WEERASETHAKUL
Grand Prix: DES HOMMES ET DES DIEUX (OF GODS AND MEN), de Xavier Deaubois
Ator: Javier Bardem, por Biutiful.
Atriz: Juliette Binoche
Roteiro: Poetry
Prêmio do Júri: Un Homme qui Crie
Curta: Micky Bader e Chienne D'Histoire.

http://cinemascopiocannes.blogspot.com/

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Um Homem Sério

Lawrence Gopnik (Michael Stuhlbarg) está revoltado. Ele é um “homem sério”; mora nos subúrbios, em uma daquelas vizinhanças planejadas dos Estados Unidos do pós-guerra, com a esposa e um casal de filhos. Ele também tem sido um bom judeu, matriculando os filhos na escola hebraica e se preparando para o “bar mitzvah” do caçula. Por que, então, Hashem tem sido tão duro com ele? A esposa (Jéssica MacManus) quer o divórcio. A filha só pensa em penteados e o filho está sempre fumando maconha no banheiro da escola. “Um Homem Sério” é a última produção dos irmãos Ethan e Joel Coen. Os dois têm uma invejável produção que consegue se manter dentro da linha tênue entre o cinema comercial e os produtos intelectuais, destinados a platéias mais exigentes. Os irmãos Coen escrevem, produzem, dirigem e editam os próprios filmes, e têm na carreira títulos como "Barton Fink" (1991), "A Roda da Fortuna" (1994), "Fargo" (1996), "O Homem que não estava lá" (2001) e "Onde os Fracos não Têm Vez" (2007). Por este último, ganharam o Oscar de melhores roteiristas e diretores, além do prêmio de Melhor Filme. O estilo deles é uma equilibrada mistura de um humor fino com bela técnica cinematográfica, além de roteiros provocativos.

“Um Homem Sério” tem todos os ingredientes de um trabalho pessoal dos irmãos. Situado no final dos anos sessenta (1967, para ser exato), o ambiente judaico e as situações vividas pelos personagens têm tons autobiográficos. Não é difícil imaginar os irmãos Coen aprendendo hebraico ou se escondendo para fumar maconha. Lawrence é um professor de física e matemática em uma escola secundária e, apesar de judeu praticante, tem muita fé na Razão e na certeza dos números. Sua vida organizada e “normal” é virada de pernas para o ar com o anúncio da esposa de que ela quer o divórcio. “Mas o que foi que eu fiz?”, pergunta ele, incrédulo. “Nada”, diz ela, “você não fez nada”. O choque do anúncio como que abre os olhos de Lawrence para os problemas de sua vida. Seu irmão Arthur (Richard Kind) mora de favor na casa dele, dorme no sofá e fica horas no banheiro, para desespero da filha de Lawrence. Para complicar, a esposa está tendo um caso com um viúvo (Fred Melamed) que insiste em ser extremamente gentil e compreensivo com Lawrence, que conforme vai ficando cada vez mais desesperado, imaginamos o que mais pode dar errado na vida dele. Como o roteiro dos Coen vai nos mostrar, muita coisa.

O final é abrupto e, assim como em “Onde os Fracos não Têm Vez”, totalmente aberto, o que deve revoltar muitos espectadores. Aparentemente, “Um Homem Sério” pode parecer uma simples comédia excêntrica, mas é muito mais do que isso. O choque enfrentado pelo personagem principal, na verdade, é o experimentado por toda sociedade americana (e também o mundo), nos turbulentos anos sessenta. Lawrence representa o americano médio, religioso, otimista, classe média, que acreditava na prosperidade econômica experimentada pelo país no pós-guerra. De repente, ele tem que enfrentar fatos como a revolução sexual, o feminismo, as drogas e a guerra do Vietnã. Sua fé na Matemática e em Deus (In God We Trust), de repente, não dá conta de enfrentar todas estas mudanças sociais e culturais. Os irmãos também fazem uma brincadeira bem humorada com a imagem do Deus tirano e vingativo do “Torá” (e do Velho Testamento), pronto para castigar aquele que sai do “caminho do bem”. Justo quando as coisas pareciam estar melhorando para o pobre Larry Gopnik. Indicado para os Oscars de Melhor Roteiro e Melhor Filme em 2010.


sábado, 15 de maio de 2010

Robin Hood

A figura mítica de Robin Hood já foi mostrada no cinema em diversos filmes. Já no cinema mudo, em 1922, Douglas Fairbanks encarnou o "príncipe dos ladrões", imortalizado depois por Errol Flynn em filme de 1938. Uma das versões mais modernas trazia Kevin Costner no papel, em 1991, sem se preocupar com o sotaque americano. Até "007", Sean Connery, viveu um Robin Hood de meia idade, contracenando com Audrey Hepburn como Lady Marion, em filme dirigido por Richard Lester em 1976.

Agora é a vez da dupla formada pelo diretor Ridley Scott e o ator Russell Crowe (que juntos fizeram "Gladiador", "Um Bom Ano", "O Gângster" e "Rede de Mentiras") de darem sua visão da história. Robin Hood é uma lenda com várias versões. Algumas o mostram como um valente cruzado que lutou ao lado do rei Ricardo Coração de Leão e se tornou protetor dos pobres na Inglaterra. Outras o colocam como simples fora-da-lei que se refugiava na floresta de Sherwood, era bom com o arco e flecha e era apaixonado por Lady Marian. Crowe e Scott tentaram criar uma versão diferente para a lenda, mais realista e mostrando o que teria acontecido antes de Robin ser considerado um fora-da-lei. A intenção pode ter sido boa, mas falta foco ao produto final.

Nesta versão, Russell Crowe é Robin Longstride, um arqueiro do exército de Ricardo Coração de Leão (Danny Huston), um decadente rei da Inglaterra no caminho de volta das Cruzadas, após dez anos de campanha. O exército inglês se encontra na França e eles saqueiam tudo que encontram pela frente. As cruzadas (mostradas pelo próprio Ridley Scott em outro filme) são criticadas em um discurso de Crowe, que descreve como os ingleses massacraram mais de duas mil mulheres e crianças muçulmanas em uma cidade. Ricardo Coração de Leão morre de forma estúpida, atingido pela flecha de um cozinheiro francês, e sua coroa deve ser levada para a Inglaterra pelo cavaleiro Robert Loxley. Só que ele morre em uma emboscada de um traidor inglês, Godfrey (Mark Strong, de "Sherlock Holmes") e, por um golpe do destino, a coroa inglesa vai parar nas mãos de Robin Longstride, que assume a identidade de Robert Loxley e parte para a Inglaterra. Lá ele conhece Lady Marian (Cate Blanchett), esposa do verdadeiro Loxley, e Sir Walter Loxley (Max von Sidow), o pai dele.

Robin acaba tomando o lugar de Robert Loxley no coração de Marian e como filho substituto de Sir Walter, mas a situação nunca convence. E, a bem da verdade, será que tudo isso importa? Os personagens "tradicionais" das lendas de Robin Hood estão ali, como João Pequeno (Kevin Durand), o gordo Frei Tuck (Mark Addy), o Sherife de Nottinghan (Matthew MacFadyen) e o Príncipe João (Oscar Isaac), mas a trama, ao invés de focar no herói Robin Hood, envereda por intrigas políticas, longas discussões na corte inglesa e francesa e em um contexto "social" que tenta discutir a opressão da monarquia sobre o povo comum. Tudo muito "nobre", mas será que isso deveria ser o foco principal em um filme sobre Robin Hood?

Ridley Scott, é fato, é um artista, e fotografia, figurino, direção de arte e cenários (que parecem realmente estar lá, ao invés de serem criados em computação gráfica) são impecáveis. Mas roteiro e edição, estranhamente, cometem falhas flagrantes. Há uma gigantesca cena de batalha entre ingleses e franceses que mostra Robin no topo dos penhascos da Inglaterra e, praticamente ao mesmo tempo, cavalgando contra os franceses na praia, lá embaixo. Igualmente confusa é uma sequência em que o vilão Godfrey ataca a propriedade de Lady Marian.

Longo, com quase duas horas e meia de duração, o filme acaba deixando a platéia inquieta pelo passo lento e pelas opções do roteiro. A idéia de dar outra versão à história de Robin Hood pode ter sido boa, mas a execução, infelizmente, fica devendo.


domingo, 9 de maio de 2010

O Preço da Traição

Ok, vamos por partes. Uma ginecologista bem sucedida profissionalmente, mas passando pela crise da meia idade, Catherine (Juliane Moore, magnificamente madura) suspeita que seu marido David (Lian Neeson), um professor de música, a esteja traindo. Ele é charmoso, tem muitas alunas jovens e interessadas e, aos olhos da esposa, flerta com todas as mulheres com quem encontra. No dia do aniversário do marido, ele não aparece na festa surpresa que a esposa lhe preparou porque perdeu o vôo de Nova York para Toronto, onde o casal mora com o filho adolescente. Ou será que ele perdeu o vôo porque teve um caso com uma de suas alunas? Desesperada e insegura, Moore resolve descobrir se o marido a está traindo ou não.

É então que entra Chloe (Amanda Seyfried, também em cartaz com "Querido John"). Ela é uma garota de programa que, por coincidências criadas pelo roteiro, se torna disponível para um jogo perigoso criado por Catherine. Ela a contrata para se aproximar do marido para testar a fidelidade dele (o título brasileiro, "O preço da traição", poderia ser trocado por outro igualmente bobo, como "Teste de fidelidade"). Aparentemente Catherine consegue o que quer. Chloe começa a lhe contar os encontros com o marido, com detalhes cada vez mais íntimos, o que provoca reações estranhas em Catherine. Estaria ela excitada com o que está escutando? Será que a idéia de ser traída pelo marido é uma forma dela ter alguma coisa "íntima" com ele, nem que seja pelas histórias contadas por uma garota de programa? Os diálogos supostamente "quentes" lembram "Closer", de Mike Nichols, outro filme em que a expressão "sexo oral" ganha outra conotação, literal, por tratar do sexo como algo mais intelectual do que físico.

O início promissor dá lugar a uma trama que, infelizmente, vai se tornando cada vez mais inverossímil e, a bem da verdade, pouco inteligente. O que estaria acontecendo? Seria a proposta de Catherine a Chloe uma vontade velada de, na verdade, fazer sexo com ela? Estaria o marido realmente a traindo? Será que Chloe é quem ela diz ser? O filme, do diretor Atom Egoyan, poderia ter tratado todas estas questões de forma muito mais interessante, sem ter que partir para uma resolução clichê. De um estudo psicológico adulto, o filme muda para um thriller convencional, no estilo de "Atração Fatal". Filmado no Canadá, em formato televisivo, "O Preço da Traição" talvez seja melhor visto em uma noite de sábado, em DVD. Como cinema, é decepcionante.


domingo, 2 de maio de 2010

Homem de Ferro 2

O primeiro Homem de Ferro foi uma boa surpresa quando saiu dos quadrinhos empoeirados e se transformou em um grande filme de ação e aventura. Robert Downey Jr, que quando jovem era um ator promissor, havia aparentemente se destruído com as drogas e várias passagens pela prisão. Em um bom exemplo de renascimento, Downey Jr transformou o milionário playboy Tony Stark em um cara verossímil e humano, que descobre que armas e guerras não fazem parte do "caminho do bem". O filme foi um grande sucesso não só pelas cenas de ação e ótimos efeitos especiais, mas principalmente pelas relações humanas entre Downey Jr e bons atores como Jeff Bridges, Terrence Howard e Gwyneth Paltrow.

Sucesso estrondoso, é claro que uma continuação seria feita a toque de caixa, e o homem de lata está de volta aos cinemas. Infelizmente, como costuma acontecer, a continuação não está no nível do original. Há, claro, muito mais dinheiro envolvido. O filme é rico em cenas extravagantes que mostram o estilo playboy de ser de Stark, mais egocêntrico do que se julgava possível, abrindo uma feira mundial que leva seu nome, cheia de mulheres, luzes e bandeiras americanas. Um vilão surge na forma deformada de Mickey Rourke, ex-galã dos anos 80 que também renasceu há alguns anos no papel de "O Lutador", pelo qual foi indicado ao Oscar. Rourke interpreta um antigo fantasma da Guerra Fria, um vilão russo, com direito a sotaque carregado e corpo cheio de tatuagens, chamado Ivan Vanco. Apesar dele parecer um monstro descerebrado, o roteiro quer que nós acreditemos que ele é um físico capaz de construir um aparelho semelhante ao coração nuclear do Homem de Ferro. Vanco adiciona uns chicotes elétricos ao objeto e ataca Tony Stark em Mônaco durante uma corrida de automóveis. Stark sobrevive, claro, mas Vanco é contratado por um construtor de armas americano, Justin Hammer (o ótimo Sam Rockwell, feliz em ganhar um alto salário para interpretar uma caricatura), que quer construir réplicas do Homem de Ferro para o governo americano.

O elenco estelar ainda conta com Don Cheadle, substituindo Terrence Howard, e a presença sexy (mas não mais do que isso) de uma muda Scarlett Johansson. O diretor Jon Favreau, provavelmente apenas uma engrenagem em uma enorme máquina de marketing, brinca consigo mesmo interpretando um guarda costas de Stark. O filme nunca chega a decolar. Há uma série de cenas ensurdecedoras de ação entrecortadas por algumas tentativas de deixar o personagem mais sério. O coração tecnológico estaria contaminando seu sangue e Stark acha que está à beira da morte. A seriedade soa falsa e não combina com o estilo de Stark (muito mais verdadeiro no primeiro filme, quando se dá conta do mal que sua fábrica de armas causa).

Downey Jr ainda é a coisa mais interessante na tela, mas Homem de Ferro 2 é apenas diversão rasa, sem muito a oferecer.