quinta-feira, 22 de maio de 2014

O que os homens falam

Você, provavelmente, vai ver este filme por causa de Ricardo Darín, o incansável ator argentino de filmes como "O Segredo dos seus Olhos", "Um Conto Chinês", "Elefante Branco", entre outros. Apesar de Darín estar em destaque no pôster de "O que os homens falam" (e eu ter escolhido uma foto com ele para ilustrar este texto), esteja avisado que Darín aparece apenas em uma das várias histórias contadas por este filme episódico.

Dirigido por Cesc Gay e passado em Barcelona (embora longe dos pontos turísticos), o filme é composto por uma série de histórias independentes, todas tratando da condição masculina no século 21. Como todo filme episódico, há histórias que gostaríamos de ver melhor desenvolvidas e outras que poderiam ser mais curtas. O filme é de 2012 e chegou a passar na 37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, mas está estreando apenas agora. Nos episódios, homens quarentões tentam resolver seus problemas, geralmente envolvendo mulheres. Javier Cámara leva o filho de volta ao apartamento da ex-mulher e, aos poucos, tenta dizer a ela que se arrependeu da separação (ele a havia traído com uma enfermeira) e quer voltar. No episódio com Darín, um amigo o encontra sentado em um banco de praça, olhando para um prédio; ele havia seguido a mulher, Laura, que o está traindo. Ele sabe que o casamento está perdido mas ainda tem esperanças de reconquistar a mulher. Apresenta vários problemas físicos, como náuseas e dores de cabeça. "São os cornos", diz ele, filosófico. Em outro episódio, Eduardo Noriega, um homem casado, tenta conquistar uma companheira de trabalho e, a princípio, parece que ele está se dando bem. Até que ela o manda esperar no banheiro da firma. No episódio com Leonor Watling (que fez "Fale com Ela", de Pedro Almodóvar), duas esposas conversam com o melhor amigo do marido delas, fazendo revelações chocantes. A cena em que os dois finalmente se encontram é sutilmente engraçada. (leia mais abaixo)


É bem feito e bem interpretado, com toques corretos de humor e drama. Ser apenas "correto", no entanto, não é dos melhores elogios que se pode fazer a um filme. É muito superior ao horrendo e machista "Os Infiéis", outro filme episódico sobre o universo masculino estrelado por Jean Dujardin. "O que os homens falam" tem momentos bem observados tanto sobre homens quanto mulheres. Todos parecem viver à base de antidepressivos ou algum outro tipo de droga (cigarro, bebida). Fidelidade é um conceito bastante flutuante, e a carência é grande. Curiosamente, os homens não têm sequer nomes (o site do imdb os lista apenas com letras), enquanto que as mulheres, sim. A fila, como se diz, anda, e todos(as) estão assustados com isso. Em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.

Câmera Escura

domingo, 18 de maio de 2014

Godzilla

O primeiro filme do monstro Godzilla foi lançado há 60 anos. O Japão havia sido devastado pela 2ª Guerra Mundial, tendo sofrido dois ataques nucleares, em 1945. Menos de dez anos depois o diretor Ishiro Honda lançou "Godzilla", que contava a história de um monstro acordado por um explosão nuclear. Ele fez tanto sucesso que gerou uma série de quase 30 filmes, inclusive uma versão americana (universalmente detestada) dirigida por Roland Emmerich ("Independence Day", "2012", "O Dia depois do Amanhã") em 1998.

Apesar do lagartão ter protagonizado alguns filmes japoneses neste novo milênio, era inevitável que Hollywood acabasse tentando novamente, o que aconteceu agora no aniversário de 60 anos do monstro. O responsável pelo filme é o diretor britânico Gareth Edwards, um garoto prodígio dos efeitos especiais que fez um longa metragem (chamado "Monstros"...claro) em 2010 em que foi diretor, produtor, roteirista e responsável pelos efeitos visuais. O novo "Godzilla", sem mais delongas, é uma decepção. Uma brilhante campanha publicitária criou trailers cheios de suspense em que pouca coisa era revelada; alguns usaram até a música do romeno Gyorgy Ligeti (usada em "2001 - Uma Odisseia no Espaço") e a narração de J. Robert Oppenheimer (o criador da Bomba Atômica) para da um ar mais "sério" ao filme. Pouco se via do próprio Godzilla ou detalhes do roteiro.

(Atenção, o texto abaixo contém SPOILERS sobre o filme. Caso não queira saber detalhes, leia somente depois de vê-lo)


O filme que chega aos cinemas, no entanto, está longe das boas sacadas da campanha publicitária. A começar pelo fato de que Bryan Cranston (famoso pela série "Breaking Bad", mas que também esteve em bons filmes como "Drive" e "Argo") não só não é o protagonista como "desaparece" rapidamente, deixando o filme nas costas de Aaron Taylor-Johnson (de "Anna Karenina"). O vazio deixado pela morte precoce de Cranston é enorme e o filme cai nos clichês de sempre. Johnson é um soldado americano que precisa "voltar para a família" e, convenientemente, é um especialista em bombas, o que já deixa implícito como é que o filme vai terminar. Dois monstros chamados  de "Muto" causam destruição por onde passam e o exército quer tentar matá-los usando bombas nucleares, mesmo tendo sido alertados pelo personagem interpretado pelo japonês Ken Watanabe de que eles se alimentam de radiação. Ele tenta também convencer os americanos de que o melhor é deixar a "Natureza encontrar seu equilíbrio" na forma de Godzilla, um lagarto de centenas de metros de altura que, neste filme, não é o vilão que fomos levados a acreditar. Além disso, o diretor fica brincando de esconde-esconde com Godzilla e os monstros e, estranhamente, deixa de mostrar quase todos os confrontos entre eles, preferindo cortar para os personagens humanos, ainda mais superficiais que os bichões digitais, ou para reportagens na TV. Se a proposta ao menos fosse como a do (tremendamente superior) "Cloverfield", produzido por J.J. Abrams, em que o monstro era visto propositalmente apenas de relance, ainda daria para entender. Do modo como foi feito por Edwards, a opção não faz sentido. E como explicar que a explosão de uma bomba nuclear na baía de São Francisco não cause a morte de toda a cidade?

Bons atores como David Strathairn, Ken Watanabe, Sally Hawkins (de "Blue Jasmine") e Juliette Binoche estão desperdiçados em personagens patéticos ou clichês, e Aaron Taylor-Johnson (que mantém a mesma expressão facial o filme todo) simplesmente não tem carisma para segurar a trama sozinho. O filme (ruim) de 1998, ao menos, sabia se divertir com as próprias falhas.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Praia do Futuro

"Praia do Futuro" é composto por uma série de belíssimas imagens e boas interpretações, mas resultando em um todo muito menor do que as partes. É um filme de momentos. De cenas estilizadamente masculinas mostrando um grupo de bombeiros treinando na praia. Ou de cenas tocantes de dois amigos/amantes enfrentando, como dois garotos, a arrebentação do mar em uma costa rochosa. Do contraste entre paisagens escaldantes, sob o Sol nordestino, e gélidas cidades alemãs.

Dirigido por Karin Aïnouz (de "O Céu de Suely", "Viajo porque preciso, volto porque te amo"), "Praia do Futuro" é melancólico e bem intencionado, embora caminhe bela e lentamente para...lugar nenhum. Vai ficar conhecido como o "filme gay do Wagner Moura" e, de fato, há várias cenas de sexo e nudez entre Moura e o ator alemão Clemens Schick ("Cassino Royale"), mas não se deve reduzir o filme só a este aspecto. Dividido em três capítulos, é uma co-produção entre Brasil e Alemanha. Na primeira parte, chamada "O Abraço do Afogado", Wagner Moura ("Elysium", "Tropa de Elite") é Donato, um salva-vidas que trabalha na "Praia do Futuro", no litoral cearense. Durante uma tentativa de resgate, ele não consegue salvar um estrangeiro de morrer afogado. O companheiro do morto, Conrad (Schick), não perde tempo e começa um tórrido relacionamento com Donato na mesma noite em que é comunicado do afogamento. (leia mais abaixo)



A segunda parte, chamada "Um herói partido ao meio", mostra Donato e Conrad sob o frio céu de Berlim, Alemanha. É a parte mais melancólica e, francamente, parada do filme. Há vários planos bem longos que mostram Wagner Moura sofrendo, quieto e olhando para o nada, em diversas paisagens da capital alemã. Conrad quer que ele largue tudo para trás e permaneça na Alemanha, mas Donato não sabe o que fazer. Isso é mostrado em meia dúzia de diálogos (o filme é bem silencioso) e muitas imagens contemplativas, em que Moura é visto pensando na vida, ou naquele tipo de cena bem clichê em que o protagonista é visto dançando loucamente em alguma casa noturna. É necessária paciência para passar por esta segunda parte.

O que nos leva à terceira, "Um fantasma que fala alemão", que, sob muitos aspectos, se parece mais com o começo real do filme. Por volta de dez anos depois dos acontecimentos da segunda parte, o irmão de Donato, Ayrton (Jesuíta Barbosa), chega à Berlim à procura dele. Há outra bela cena, visualmente falando, em que Ayrton vê Donato trabalhando dentro de um gigantesco aquário marítimo, e os dois têm um encontro explosivo no elevador. O conflito entre os dois irmãos é o momento mais realista e honesto do filme, e talvez até explique um pouco toda a letargia anterior. O que não significa que o filme consiga se resolver até o final. O que quer Donato? O que quer "Praia do Futuro"? Não sabemos. Enquanto isso, podemos desfrutar da bela fotografia de Ali Olay Gözkaya enquanto os personagens pilotam motos, na neblina, em direção do horizonte. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.

Câmera Escura

sábado, 10 de maio de 2014

O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro

O que a Marvel tem feito nos últimos anos, com esta longa série de filmes baseados em seus super-heróis, é aplicar uma mentalidade de quadrinhos em um meio cinematográfico. É bem comum no mundo das HQs que personagens vivam múltiplas linhas do tempo, com trajetórias diferentes, mortes, novos começos, realidades paralelas, etc. Os filmes de Sam Raimi sobre o Homem-Aranha nem haviam esfriado e o estúdio lançou um reboot há dois anos, substituindo o "chorão" Tobey Maguire por Andrew Garfield ("A Rede Social") e iniciando uma nova franquia. O filme não era ruim, mas era redundante, contando novamente a já batida história da origem do Homem-Aranha.

A continuação lançada agora, livre de ter que estabelecer novamente a origem do herói, começa com a ação em pleno vapor. Os efeitos especiais transformaram o aracnídeo em um verdadeiro acrobata, que voa por entre os prédios de Nova York fazendo piruetas, contando piadinhas para os pedestres e batendo papo com o vilão (um desperdiçado Paul Giamatti), ocupado em roubar uma carga de plutônio de um caminhão em movimento. Peter Parker chega atrasado à própria formatura (apesar de Garfield já ter 31 anos e aparentar a idade), onde é aguardado pela bela namorada Gwen Stacy (Emma Stone). Garfield e Stone são a melhor coisa nestes novos filmes dirigidos por Marc Webb ("500 Dias com Ela"). O casal é bem melhor do que a indecisa dupla Parker/MJ de Tobey Maguire e Kirsten Dunst dos filmes de Raimi. O problema é que os altos e baixos da relação entre os dois são muito abruptos e os problemas deles parecem mais uma invenção dos roteiristas do que algo a ser levado a sério. De qualquer forma, há cenas genuinamente tocantes entre Parker e Stacey, principalmente em um final surpreendente (para quem, como eu, não conhece a mitologia dos quadrinhos) e tocante. (leia mais abaixo)


E, claro, há os vilões. Jamie Foxx ("Django Live") é "Electro", um homem-elétrico criado (assim como o Aranha) acidentalmente pela maligna empresa "Oscorp". Foxx passa metade do filme com um penteado ridículo e a outra metade como um efeito especial, mas consegue fazer um bom trabalho. Quem está melhor é Dane DeHaan, que interpreta Harry Osborn, um rapaz de 20 anos que herdou do pai (uma aparição rápida de Chris Cooper) tanto as empresas "Oscorp" quanto uma doença degenerativa que pode ser fatal. Osborn acredita que sua cura pode ser encontrada no sangue do Homem-Aranha, que não está muito interessado em doá-lo. O filme tem pelo menos 30 minutos a mais que o necessário (o que aconteceu com os filmes de 90 a 120 minutos de antigamente?), tempo dedicado a vilões aleatórios e cenas criadas apenas para fazerem sentido nos próximos capítulos da "saga".

Confesso que esperava um filme muito pior e, talvez por isso, o tenha apreciado mais do que ele mereça. O fato é que há um filme muito melhor dentro deste, esperando a chance de aparecer mas enterrado em cenas descartáveis de ação e efeitos especiais.