quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Muito Barulho por Nada

O que fazer depois de dirigir um filme que custou 250 milhões de dólares e arrecadou quase um bilhão? Se você é Joss Whedon, você reúne os amigos, arruma uma casa grande, algumas câmeras e brinca de filmar Shakespeare. Depois do mega-sucesso de "Os Vingadores", Whedon quis baixar a poeira fazendo praticamente um vídeo caseiro de "Muito Barulho por Nada", uma comédia de William Shakespeare passada em Messina (Sicília), no século 16.

A versão de Whedon é ambientada nos dias de hoje em um local indeterminado (os personagens falam que estão em Messina, mas está tudo escrito em inglês). Filmado em preto e branco e com um visual bem caseiro, tem-se a sensação de que se está assistindo a um ensaio, e não a um filme "de verdade". Os atores são velhos conhecidos de Whedon e trabalharam com ele em séries de TV como "Buffy - A Caça Vampiros" ou "Angel". Fãs dos filmes da Marvel vão reconhecer Clark Gregg, mundialmente conhecido como o Agente Coulson, da organização SHIELD, interpretando o Sr. Leonato. A comédia de Shakespeare fala sobre os encontros e desencontros de alguns casais na propriedade de Leonato, que recebe a visita do príncipe Dom Pedro (Reed Diamond) e sua comitiva. O duque Cláudio (Fran Kranz) se apaixona à primeira vista pela filha de Leonato, Hero (Jilian Morgese) e os dois marcam o casamento para a semana seguinte. Só que o irmão invejoso do príncipe, Dom João (Sean Maher), trama para manchar a reputação de Hero, fazendo com que se acredite que ela está traindo Cláudio e não é mais "pura". Paralelamente, todos conspiram para tentar aproximar um casal "inimigo" por natureza, o irônico Benedick (Alexis Denisof) e a solteirona Beatrice (Amy Acker), fazendo-os acreditar que estão apaixonados um pelo outro.

Os diálogos são todos tirados da peça original e as interpretações são pouco convincentes. Amy Acker é quem se sai melhor como Beatrice; já Denisof é risível (no mau sentido) como Benedick. Não ajuda muito se você assistiu à versão tremendamente superior produzida, dirigida e interpretada por Kenneth Branagh há vinte anos. O filme de Branagh era banhado pela luz quente do mediterrâneo, belamente fotografado e interpretado por quem entende de Shakespeare (com exceção de Keanu Reeves e Robert Sean Leonard). A versão de Whedon soa como uma peça do colégio. E apesar de já terem sido feitas versões modernas bem sucedidas de Shakespeare, como "Coriolano" (dirigido e interpretado por Ralph Fiennes), ou mesmo o "Romeu + Julieta" de Baz Luhrmann, os temas tratados em "Muito Barulho por Nada" não combinam com a ambientação moderna. A questão de Hero ser ou não virgem, a submissão das mulheres e a glorificação do casamento podiam fazer sentido no século 16, mas não hoje. Assim, "Muito Barulho por Nada" pode servir como uma curiosidade, e talvez até funcione melhor na telinha da TV, mas é dispensável como cinema.

sábado, 17 de agosto de 2013

Bling Ring: A Gangue de Hollywood

Quando a adolescente Rebecca (Katie Chang) foi presa pela polícia por ter praticado uma série de roubos em Los Angeles, tudo que ela queria saber é o que "Lindsay" havia dito a respeito. Ela se referia à atriz Lindsay Lohan, que assim como Paris Hilton, Orlando Bloom e uma série de outras celebridades de Hollywood, havia sido roubada por um grupo que ficou conhecido como "Bling Ring". Filhos de famílias de classe média alta, mimados, desocupados e fascinados pela cultura das celebridades, o grupo de adolescentes usava a internet para descobrir se algum famoso estava fora de Los Angeles, depois procurava pelo endereço deles em sites como Google Maps ou celebrityaddressaerial.com e, de forma surpreendentemente fácil, invadia a casa deles em busca de bolsas e sapados de marca, além de dinheiro e jóias. Seria uma história difícil de acreditar se não fosse baseada em fatos reais, narrados nesta reportagem da revista Vanity Fair.

A reportagem foi transformada em filme escrito e dirigido por Sofia Coppola, a talentosa filha de Francis Ford Coppola. Ela já tratou do mundo da fama antes em "Encontros e Desencontros" ("Lost in Translation", 2003) e "Um Lugar Qualquer" ("Somewhere", 2010) e, fazendo parte da "realeza" de Hollywood, conhece como ninguém este mundo de aparências. É interessante como ela intercala sequências protagonizadas pelos personagens com imagens reais de programas de celebridades e notícias que mostram a futilidade de Paris Hilton (que aparece como ela mesma em uma festa) ou os vários escândalos envolvendo Lindsay Lohan, presa por dirigir embriagada ou roubando jóias. A mistura do real com o inventado é constante durante todo o filme. Emma Watson, marcada para sempre como a Hermione dos filmes de Harry Potter, quer mostrar que cresceu e interpreta Nicki como uma "piriguete" que só usa saias dois palmos acima do joelho. As primeiras imagens da antiga atriz infantil, dançando de forma provocante em uma cena do filme, causaram sensação na internet. Coppola é muito irônica no modo como pinta a família de Nicki, composta só por garotas e guiadas por uma mãe que as educa com a filosofia das "Leis da Atração" e do "Segredo". Ela mostra fotos de Angelina Jolie e pede que as filhas descrevam o que admiram nela. "O marido", diz uma garota. "O corpão dela", diz outra.

O único homem da gangue, Marc (Israel Broussard), é um homossexual que é apaixonado por Rebecca ("Ela é como uma irmã") e passa o filme dando sugestões de moda para as outras garotas do grupo (uma delas é interpretada por Taissa Farmiga, irmã mais nova da atriz Vera Farmiga, de "Amor sem Escalas"). Cenas de Marc se confessando aparentemente para uma psicóloga acabam se revelando partes de uma entrevista que deu à Vanity Fair. Ou seja, tudo pela fama.

"Bling Ring" foi o último trabalho do grande diretor de fotografia Harris Savides (que morreu em 2012), que já havia trabalhado com Coppola em "Um Lugar Qualquer". Ele também havia trabalhado com diretores como David Fincher em "Zodíaco" e "Vidas em Jogo" e em vários filmes de Gus Van Sant, como "Milk" e "Elefante". Rodado em digital, "Bling Ring" é essencialmente noturno, mostrando as invasões da gangue às mansões de Hollywood, ou então dançando sob as luzes fortes dos clubes. Um dos roubos é visto em uma única tomada contínua que começa mostrando uma casa de longe e vai se aproximando aos poucos, em um zoom lento. O plano mostra como algumas celebridades, que tanto reclamam de terem sua privacidade invadida, moram em uma casa toda de vidro, visível para todo mundo. Interessante também ver como é baixa a segurança de lugares como a mansão de Paris Hilton, invadida diversas vezes pela gangue, que roubam apenas o suficiente para não serem notados (na vida real, a gangue roubou mais de 3 milhões de dólares em jóias e roupas). O ritmo lento pode desagradar alguns espectadores, mas "Bling Ring" é um bom trabalho de Sofia Coppola, frio e cínico.

Câmera Escura

domingo, 11 de agosto de 2013

Círculo de Fogo (Pacific Rim)

"Círculo de Fogo" (mais conhecido pelo título original "Pacific Rim") é um filme americano dirigido por um mexicano (Guillermo del Toro, da série "Hellboy" e de "O Labirinto do Fauno"...bons tempos), mas que tem alma de filme de monstros japoneses. "Hoje nós cancelaremos o Apocalipse!", grita o Marechal Pentecost (Idris Elba, de "Prometheus") em um daqueles discursos pré batalha repetidos desde o Henrique V de Shakespeare (e em "Coração Valente", "Independence Day", "O Retorno do Rei" e outra dezena de cenas semelhantes em outros filmes). "Pacific Rim" é a versão cinematográfica  de todos aquelas séries e filmes de monstros japoneses já produzidos, de "Spectroman" e "Godzilla" a "Neon Genesis Evangelion", agora transformados em "realidade" pela computação gráfica.