sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

A Vida Secreta de Walter Mitty

Walter Mitty (Ben Stiller) é um homem analógico. Logo na primeira cena nós o vemos enfrentando problemas para postar em um site de relacionamentos enquanto, atrás dele, podemos ver uma estante cheia de discos de vinil e um aparelho de som antigo. Ele trabalha para a revista "Life" no setor que lida com os poucos negativos de fotos que ainda são enviados por fotógrafos mundo afora. Walter e sua vida analógica enfrentam um grande desafio quando a "Life" é comprada e é anunciada a extinção da revista em papel. A "Life" vai se transformar em "Life Online", que é uma metáfora bastante direta para o que está acontecendo hoje não só com Walter, mas com todo mundo.

"A Vida de Walter Mitty" é estrelado e também dirigido por Stiller; a produção seria comandada por Gore Verbinski, mas Stiller assumiu o posto quando Verbinski foi dirigir o fracasso "O Cavaleiro Solitário". Ben Stiller é bom comediante e é um ator muito melhor do que o insuportável Adan Sandler, por exemplo, passando um ar de "gente comum" que cai bem em um personagem como Walter Mitty (por outro lado, Steve Carell teria sido perfeito). Mitty tem um herói, um fotógrafo aventureiro chamado Sean (ninguém menos que Sean Penn, de "Milk"), que lhe manda um rolo de filme com instruções específicas para usar a foto número 25 como capa da última edição impressa de "Life". O problema é que Walter não consegue encontrar o negativo e resolve, pela primeira vez em anos, sair da zona de conforto, partindo para uma aventura em busca de Sean e da misteriosa foto. Há algo de "Forest Gump" em Walter Mitty quando ele parte, geralmente correndo, mundo afora por países como a Groenlândia, Islândia e Afeganistão. Não foram usadas câmeras digitais nas filmagens, mas sim a película (analógica) Kodak. O que não impede, porém, que o filme tenha algumas sequências cheias de efeitos especiais (digitais) que mostram as fantasias de Walter. Algumas destas cenas são interessantes, mas há outras exageradamente longas e desnecessárias, como uma luta entre Mitty e seu "inimigo" Ted Hendricks (Adam Scott), o executivo responsável pela transição da "Life" (um personagem que lembra o de George Clooney em "Amor sem Escalas").


As cenas com as aventuras reais de Mitty funcionam muito melhor, filmadas em locações reais na Islândia (que também foi usada para se passar pela Groenlândia e o Himalaia). Há também um romance com altos e baixos entre Mitty e uma colega de trabalho, Cheryll (Kristen Wigg, de "Meu Malvado Favorito 2"). Incomoda um pouco o uso descarado de merchandising; além da revista "Life", claro, há uma propaganda constante do site de relacionamentos e-Harmony. A veterana Shirley MacLaine faz uma participação como a mãe super-protetora de Mitty. A "mensagem" do filme não é nenhuma novidade, mas um convite à aventura nunca é demais. "A Vida Secreta de Walter Mitty" não é nenhuma obra-prima, mas diverte.

PS: e quem percebeu a sutil referência a "Matrix"?

Câmera Escura

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

"Os Mercenários 3", veja o teaser

Sylvester Stallone e um impressionante grupo de atores do cinema "macho" voltam ano que vem no terceiro filme da franquia "Os Mercenários". O episódio vai trazer atores do calibre de Harrison Ford, Mel Gibson e Antonio Banderas, além de Wesley Snipes, Jet Li, Jason Statham, Arnold Swarzenegger, Dolph Lundgren e muitos outros. Haja testosterona.

O teaser, curto e simples, mostra o elenco ao som da trilha de "A Ponte do Rio Kwai", clássico de David Lean de 1957.

Câmera Escura

Confira.

Assista ao teaser trailer de "Como treinar seu dragão 2"

A "DreamWorks Animation" lançou um novo teaser trailer do filme "Como treinar seu dragão 2".

O filme é dirigido por Dean DeBlois e é a continuação do sucesso de 2010, "Como treinar seu dragão", que contava a história da amizade entre um garoto viking e um dragão que aterrorizava a vila do rapaz. A animação foi um grande sucesso e, naturalmente, ganhou uma continuação, que se passa cinco anos depois dos eventos da primeira parte.

Entre os atores que dublam as vozes dos personagens está Cate Blanchett (Blue Jasmine), Kit Harington (Game of Thrones) e Craig Fergusson, entre outros.

Segundo o site  IMDB, O filme está marcado para estrear no Brasil em 19 de junho de 2014.

Câmera Escura

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

42: A História de uma Lenda

Mesmo após lutar contra os nazistas na II Guerra Mundial ao lado dos brancos, os negros americanos, ao voltarem para casa, reencontraram os problemas de sempre; segregação, lugares separados em estádios, casas de espetáculo e até mesmo em banheiros. No baseball não era diferente e os negros podiam jogar apenas em uma liga própria. Até que, em 1947, o dono do Brooklyn Dodgers, Branch Hickey (um Harrison Ford bem diferente do comum) resolveu fazer uma aposta polêmica, trazendo para o time o jogador negro Jackie Robinson (Chadwick Boseman), que faria história usando a camisa "42".

Esta história é contada por Brian Helgeland, roteirista do ótimo "Sobre Meninos e Lobos", de Clint Eastwood e diretor do divertido "Coração de Cavaleiro", com Heath Ledger. "42" tem seus méritos, mas é bem comportado demais, parecendo um especial de TV. Harrison Ford surpreende ao deixar de ser "Harrison Ford" e assumir a idade, interpretando Branch Hickey como um velho idealista, obstinado e ranzinza (que lembra um pouco Carl Fredricksen, personagem do animado "Up - Altas Aventuras", da Pixar). No papel de Jackie Robinson, Chadwick Boseman faz o que pode com um roteiro um tanto simplista. O verdadeiro Robinson tem o status de lenda no baseball americano, a ponto da camisa número 42 ter sido aposentada no esporte, o que talvez justifique o modo "chapa branca" com que este filme foi feito. Mesmo mostrando episódios de racismo, "42" parece com medo de encarar os problemas que devem ter acontecido na época. A única cena mais forte se dá quando o técnico do time da Filadélfia, Ben Chapman (Alan Tudyk), resolve provocar Robinson gritando uma série de frases racistas durante um jogo. No resto do filme, porém, quase todo ato de racismo é acompanhado por uma cena em que um colega branco de Robinson lhe dá apoio imediato.


"42: A História de uma Lenda" ganharia muito se saísse do lugar comum. É tecnicamente competente, com boa fotografia do veterano Dom Burgess (de "Forest Gump", "O livro de Eli", "Homem-Aranha"), música de Mark Isham e interpretações sólidas. Mas falta ambição. Disponível em DVD (onde pode ser melhor apreciado).



domingo, 15 de dezembro de 2013

O Hobbit: A Desolação de Smaug

Um ano depois de "O Hobbit: Uma Jornada Inesperada", o diretor Peter Jackson (e legiões de produtores, artistas de efeitos especiais, atores, figurantes, etc) coloca nas telas "O Hobbit: A Desolação de Smaug", capítulo dois da trilogia re-imaginada por Jackson a partir do singelo livro escrito por J.R.R. Tolkien lá nos idos do século XX.

O filme ainda é muito longo, mas é fato de que o ritmo é mais rápido do que o anterior. Bilbo Baggins (Martin Freeman, divertido), o mago Gandalf (Ian McKellen) e 13 anões continuam a jornada pela Terra Média em direção da Montanha Solitária, antigo reino dos anões. O lugar foi tomado pelo cruel e gigantesco dragão Smaug (na voz GRAVE de Benedict Cumberbatch, de "Além da Escuridão: Star Trek"), e os anões querem retomar seu lugar de direito. Eles são liderados por Thorin Escudo de Carvalho (Richard Armitage), e a impressão que se tem é que Peter Jackson está tentando dar a Thorin semelhanças com Aragorn (Viggo Mortensen) que, na trilogia do "Senhor dos Anéis", também era o filho de um rei deposto, tentando retomar seu lugar. Só que não é tão fácil humanizar (ou enobrecer) personagens tão caricatos quanto os 13 anões criados por Tolkien (lembrando que o trabalho original era um livro infantil). Os aventureiros entram na Floresta Sombria, enfrentam um grupo de aranhas gigantes e acabam prisioneiros dos Elfos liderados pelo Rei Thranduil (Lee Pace), pai de Légolas (Orlando Bloom), que não aparece no livro original mas foi trazido de volta por Jackson para esta aventura. Bloom está doze anos mais velho do que nos filmes anteriores e, apesar da idade (e peso) maiores serem aparentes, seu personagem ainda faz a alegria dos fãs. Na sequência mais acelerada do filme, em que Bilbo e os anões fogem em uma corredeira dentro de barris,  Légolas mata dezenas de orcs enquanto salta de barril em barril, pulando por cima de galhos e realizando outras acrobacias de arco e flecha em punho. Os orcs, falando nisso, são os típicos vilões feios e descartáveis que podem ser mortos pelos heróis sem problemas de consciência.


O ponto alto, claro, é o confronto com o enorme dragão Smaug, uma fera de tamanho descomunal, que "causa terremotos quando se move e tufões quando agita as asas". Mas é um dragão que fala com o inglês impecável de Benedict Cumberbatch e os diálogos irônicos de Tolkien, e é realmente divertido ver o pequeno Bilbo tentando salvar a própria vida através da lábia. O filme é visualmente espetacular e há sequências de ação suficientes para agradar qualquer fã. Paralelo à trama do livro original, Peter Jackson e seus roteiristas vão tentando criar pontes com a trilogia original do "Senhor dos Anéis", o que não deixa de ser ambicioso, apesar de soar forçado em diversos momentos. A trama termina no meio a uma cena de ação, deixando o público em suspense para a conclusão da saga, daqui um ano. Com altos e baixos, "A Desolação de Smaug" é melhor do que o anterior, embora poderia ser melhor ainda se Jackson não tivesse tanto apego com as horas e horas de material filmado. Mesmo comercialmente falando, um filme entre uma hora e meia e duas horas renderia muito mais. Faz falta alguém com poder para pegar o filme e cortar, tranquilamente, uns quarenta, cinquenta minutos (material que poderia se tornar "extra" no DVD) de cenas desnecessárias.

Câmera Escura

sábado, 14 de dezembro de 2013

Christopher Nolan lança teaser trailer de "Interstellar"

"Interstellar", o próximo filme de Christopher Nolan, tem teaser trailer lançado. O vídeo mostra imagens de arquivo do Programa Espacial americano enquanto se escuta uma narração de Matthew McConaughey sobre o desejo humano de explorar o desconhecido. O filme tem data para estrear, 7 de novembro de 2014. Assista.




 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Azul é a cor mais quente

Uma pena que este filme tenha sido mais comentado por causa das cenas de sexo do que pelas outras coisas que tem a oferecer. As cenas existem e são "fortes" sim mas, em plena segunda década do século 21, sexo não deveria ser considerado novidade no cinema. Filmes como "O Amante" (1992), de Jean-Jacques Annaud ou, mais recentemente, "Desejo e Perigo" (2009), de Ang Lee (sem falar em séries de TV como "Game of Thrones") levaram a representação do ato sexual ao limite. O diferencial das cenas em "Azul é a cor mais quente", talvez, seja a longa duração; considerando que o filme tem mais de três horas, porém, sexo é apenas um detalhe.

"Azul é a cor mais quente" é dirigido pelo tunisiano Abdellatif Kechiche (do perturbador "Vênus Negra"), que escreveu o roteiro baseado em uma série de quadrinhos. Adèle (Adèle Exarchopoulos) é uma adolescente que está em dúvida sobre sua sexualidade. Bonita, ela atrai a atenção dos rapazes (e garotas) da escola, e chega a transar com um colega, mas ela sente que falta alguma coisa. "Parece que estou sempre fingindo", diz ela a um amigo gay. A "alguma  coisa" de que ela sente falta aparece na forma de uma garota mais velha, Emma (Léa Seydoux, de "Missão: Impossível - Protocolo Fantasma"), que ela vê passando na rua. As duas acabam se conhecendo em um bar gay e começam a sair juntas. Ao contrário do que a publicidade em torno do filme dá a entender, elas não pulam direto na cama. Leva quase uma hora e meia para que as duas, finalmente, durmam juntas. Este é um filme europeu, e as personagens ficam conversando sobre arte e filosofia, citando trechos de Sartre em longos diálogos muito bem interpretados pelas atrizes e coreografados por Kechiche. É um filme plasticamente bonito de se ver, com fotografia primorosa de Sofian El Fani que, auxiliado pela direção de arte e figurino, compõe quadros em que a cor azul é predominante. Emma é estudante de Belas Artes e Adèle está estudando para ser professora. Emma é mais velha e segura de si, enquanto que Adèle parece estar sempre com "fome". A presença de comida, aliás, é constante por todo o filme; do lanche que Adèle faz com um rapaz, no início, passando pela macarronada preparada por seu pai aos frutos do mar feitos pelos pais de Emma, os personagens estão sempre comendo alguma coisa. Após um beijo em uma cena sensível passada no parque, as duas acabam finalmente na cama, e começa a longa cena de sexo sobre a qual estão todos falando. Curiosamente, o contato físico é tão grande e explícito que, a meu ver, o sexo esfria o filme. Há mais intimidade nos olhares trocados por Emma e Adèle no bar, falando sobre arte, do que nos malabarismos filmados detalhadamente por Kechiche. Estas cenas são necessárias? Talvez, mas não pelo tempo que consomem.


Falando em "tempo", o roteiro esconde sua passagem em frases dos diálogos, mudanças nos penteados e em outros pequenos detalhes. Emma leva Adèle para conhecer os pais, por exemplo, e eles comentam que queriam conhecê-la "há meses". Em uma festa, vemos uma mulher que está grávida e, em outra cena, descobrimos que sua filha já está com três anos. Adèle se torna professora do maternal e pré-primário e gosta do seu trabalho, mas Emma gostaria que ela fizesse algo mais criativo. Como em qualquer drama de romance (hétero ou gay), há cenas de ciúmes, traições e corações partidos, tudo apresentado no ritmo lento com que Kechiche leva a narrativa.

"Azul é a cor mais quente" ganhou a Palma de Ouro em Cannes e tanto o diretor quanto as duas atrizes foram premiados. A julgar por entrevistas dadas por elas, as filmagens foram tudo, menos harmoniosas. As atrizes descrevem Kechiche como um ditador no set, refazendo a mesma cena centenas de vezes. Talvez tudo não passe de marketing. O que fica das três horas acompanhando a "vida de Adèle" (do título original) é um cinema extremamente bem feito e, em grande parte, sensível e honesto. A interpretação das atrizes varia; a personagem de Emma (e a interpretação de Seydoux) crescem bastante durante a narrativa, enquanto que Adèle me pareceu melhor na primeira metade. Tirando a polêmica, o que sobra é bom cinema.



quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Eu, Anna

Saber "quem matou" é a coisa menos importante neste filme de suspense. "Eu, Anna" tem muito "clima" e boas interpretações da dupla principal de atores veteranos. Charlotte Rampling (também nas telas em "Trem Noturno para Lisboa") está com 67 anos e, ao contrário de muitas atrizes por aí, nunca fez questão de esconder a idade. Ela é Anna, uma mulher divorciada que, solitária, procura por um companheiro em reuniões de solteiros. Em uma destas reuniões entra Bernie (Gabriel Byrne, sempre sóbrio), um inspetor de polícia que está ali para...vamos por partes.

Bernie está investigando o assassinato de um homem, George Stone (Ralph Brown) que morreu com uma pancada na cabeça; Bernie chega à cena do crime às cinco da manhã e encontra, saindo do prédio, uma bela mulher (Rampling), com quem fica intrigado. Uma mistura de interesse pessoal e faro profissional o faz investigar Anna, a quem segue pelas ruas de Londres. Anna mora com a filha Emmy (Hayley Atwell, de "Capitão América: O Primeiro Vingador") e uma neta de dois anos, Chiara. Em flashbacks sangrentos, ficamos sabendo que Anna havia estado com o homem que foi assassinado, mas ela é culpada? Há outros suspeitos, como o filho do morto, Stevie (Max Deacon), que estava devendo dinheiro para traficantes; teria sido o crime motivado por um problema com drogas? Mas, como disse, saber quem foi o culpado ou culpada fica em segundo plano; o que importa ao filme é o estranho relacionamento entre o policial Bernie e Anna. Ele a segue até uma das reuniões de solteiros, se apresenta e os dois se sentem à vontade um com o outro, apesar de ser claro que ambos guardam segredos e mágoas do passado. Bernie está realmente interessado romanticamente ou quer desvendar um crime?


"Eu, Anna" foi escrito e dirigido pelo filho de Charlotte Rampling, Barnaby Southcombe (enteado do músico francês Jean-Michel Jarre), em sua estréia em longas metragens. Southcombe faz um filme com muita atmosfera, aproveitando muito a boa direção de fotografia de Ben Smithard e a trilha sonora (de alguém que assina "K.I.D."). O roteiro, baseado em um livro de Elsa Lewin, guarda surpresas para o final. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.

Câmera Escura

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Trem noturno para Lisboa

Raimond Gregorius (Jeremy Irons, de "Margin Call") é um professor suíço que salva a vida de uma garota em Berna, quando ela ia pular de uma ponte. A moça desaparece e deixa para trás um livro intitulado "Ourives das Palavras", de um médico português chamado Amadeu de Prado. Dentro do livro, Gregorius encontra uma passagem de trem para Lisboa e, em um impulso, vai para a estação e toma o trem; começa, assim, sua aventura em busca da moça que lhe deixou o livro e sobre o autor.

"Trem noturno para Lisboa" é dirigido por Bille August, que já havia trabalhado com Jeremy Irons em "A Casa dos Espíritos", de 1993. O roteiro (adaptado por Greg Latter e Ulrich Herrmann) é baseado no best seller do suíço Pascal Mercier (lançado em 2004). O filme tem um ritmo lento e segue a estrutura clássica de um thriller de mistério, ainda que Gregorius não saiba exatamente o que está procurando. Desconheço o tom do livro, mas o filme se aproxima perigosamente a cair em um daqueles textos de auto-ajuda, cheios de boas intenções mas um tanto superficiais. Gregorius fica fascinado com as palavras de Amadeu de Prado e, logo ao chegar em Lisboa, entra em contato com as pessoas que o conheceram em vida, como a misteriosa irmã Adriana (Charlotte Rampling) ou amigos como João Eça (Tom Courtenay), da época em que Prado havia lutado contra a ditadura de António de Oliveira Salazar. O filme, bem editado por Hansjörg Weißbrich, costura longos flashbacks dos anos 1970, durante a ditadura, com sequências no presente, seguindo Jeremy Irons enquanto ele tenta reconstruir a vida de Amadeu de Prado (Jack Huston).


Há uma licença poética que pode confundir um pouco o espectador, que não vai conseguir entender em que língua os personagens estão falando. Todos, independente da nacionalidade, conversam entre si em inglês fluente. O fato de Gregorius ser interpretado por Jeremy Irons, com seu inglês britânico impecável, nos faz pensar que ele é um professor inglês que trabalha na Suíça. A coisa fica mais complicada em Portugal, já que os portugueses também se comunicam em inglês, mesmo nos flashbacks dos anos 1970, o que não faz nenhum sentido. Isso só se explica pelo fato do filme ser uma co-produção internacional, feita para o mercado mundial. O elenco, além de Jeremy Irons, tem grandes nomes como Mélanie Laurent (Truque de Mestre), August Diehl, Lena Olin e até uma participação de Christopher Lee (com 91 anos). A direção de fotografia de Filip Zumbrunn valoriza a luz de Lisboa e, nesta época de blockbusters de super heróis sendo lançados semanalmente, não deixa de ser um alívio ver um filme habitado por pessoas de carne e osso, andando por ruas de verdade, e não em cenários criados em computação gráfica. Em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Jogos Vorazes: Em Chamas

A continuação do filme de 2012, "Jogos Vorazes", chega com todas as características de um "filme do meio" de uma trilogia (a terceira parte, na verdade, será dividida em dois filmes). É mais sério, mais pesado e termina sem uma resolução. Baseado na série de livros adolescentes escritos por Suzanne Collins, "Em Chamas" é, também, um daqueles filmes à prova de crítica. Ele foi criado para um público cativo (jovens garotas, em sua maioria) que vão ao cinema sabendo exatamente o que os espera, e acompanham cada cena com gritinhos de prazer; na fileira de trás, uma garota recitava todas as frases dos personagens.

Dirigido por Francis Lawrence ("Eu sou a Lenda", "Constantine"), "Jogos Vorazes: Em Chamas" traz um elenco composto por grandes atores, como Philip Seymour Hoffman (que faz Plutarco, o novo organizador dos Jogos), Stanley Tucci (se divertindo ao interpretar um alucinado apresentador de TV), Woody Harrelson (Haymitch) e Donald Sutherland (Presidente Snow), mas as adolescentes foram ao cinema suspirar pelo "irmão do Thor", Lian Hemsworth, que interpreta Gale, um dos vértices do triângulo amoroso completado por Jennifer Lawrence (Katniss Everdeen) e Josh Hutcherson (Peeta Mellark). Após vencerem os 74º Jogos Vorazes (uma mistura de Coliseu romano com reality show), Katniss e Peeta precisam continuar a farsa de que eles se amam, enquanto visitam os distritos que fazem parte de Panen. Só que a vitória, ao invés de acalmar os distritos, como originalmente planejado, está sendo vista como um sinal de esperança pelo povo que sofre sob o jugo da Capital. O Presidente Snow planeja matá-los convocando-os para uma nova edição dos Jogos, que agora terão como competidores os vencedores anteriores do evento.


Grande parte do filme é uma repetição do capítulo anterior. Há a apresentação dos competidores em um desfile de bigas romanas (Katniss e Peeta entram novamente com as roupas em chamas), há sequências que mostram os competidores treinando para os Jogos, há entrevistas na TV apresentadas por Stanley Tucci (e, novamente, Peeta faz uma "revelação" bombástica), há diálogos quase idênticos entre Lawrence e Lenny Kravitz (que interpreta Cinna, o estilista de Katniss) e cenas de ciúmes entre o triângulo amoroso. De novidade há o novo design do "cenário" em que se passam os Jogos e os novos competidores. O público, claro, adorou o filme. Em uma cena climática, perto do final, uma garota no cinema gritou "Chupa, Snow!", e toda sala aplaudiu. Ano que vem tem mais.

domingo, 17 de novembro de 2013

Blue Jasmine

O telefone toca e Jasmine (Cate Blanchett) corre desesperada para ele. Ela está cansada, desiludida e está se recuperando de um colapso nervoso. Há pouco tempo ela estava organizando recepções em apartamentos de cobertura de Manhattan para o marido rico e bonito, Hal (Alec Baldwin). Hoje ela está vivendo de favor na pequena casa da irmã Ginger (Sally Hawkins), em São Francisco, sem um tostão na carteira e simplesmente desesperada por uma chance de voltar à vida boa, nem que isto signifique depender de outro homem rico.

Jasmine é a personagem principal do novo filme de Woody Allen ("Vicky, Cristina, Barcelona", "Tudo pode dar certo", "Meia noite em Paris"), o gênio novaiorquino que lança um filme por ano há décadas, com resultados variáveis. "Blue Jasmine", felizmente, está entre os ótimos trabalhos do diretor. E grande parte desse sucesso se deve à escalação da atriz australiana como Jasmine. Blanchett está extraordinária. Jasmine é patética; passou anos ao lado de um homem que lhe dava tudo do bom e do melhor, mas ela nunca se questionava de onde o dinheiro vinha. Também fazia vista grossa aos vários casos que Hal tinha com secretárias, modelos, babás e todo tipo de mulher bonita. As atividades criminosas do marido são descobertas pelo FBI e ele acaba se matando na prisão, deixando Jasmine completamente desestruturada. Já a irmã dela, Ginger, é o retrato da mulher comum, trabalhadora (é caixa em um supermercado de São Francisco), tem dois filhos de um casamento fracassado com Augie (Andrew Dice Clay) e está namorando outro "perdedor" (na concepção de Jasmine), um cara chamado "Chili" (Bobby Canavale). Allen está inspirado e escreve cenas generosas para as duas atrizes, e Sally Hawkins faz um ótimo trabalho contracenando com Blanchett.


Apesar de grande parte do filme se passar em São Francisco, os flashbacks que mostram a vida rica de Jasmine são na Nova York de Woody Allen, fotografada em tela larga e cores quentes por Javier Aguirresarobe (o mesmo de "Vicky, Cristina, Barcelona"). O roteiro de Allen usa cenas do presente e do passado para ilustrar a esquizofrenia de Jasmine, que pode ser levada a pensar na vida que levava por coisas simples como o cheiro de um perfume francês. Todo elenco está muito bem e o filme conta ainda com participações de Peter Sarsgaard (de "Lovelace"), do comediante Louis CK e de Michael Stuhlbarg (de "Um Homem Sério"). Allen, aos 77 anos, ainda está em plena forma. Visto no Topázio Cinemas.

Câmera Escura

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Uma Noite de Crime

Em 2022, os Estados Unidos estão vivendo dias com baixo desemprego e criminalidade graças a uma nova lei instituída pelos novos "Pais da Nação" (referência aos "Founding Fathers", os revolucionários do século 18 que libertaram o país do domínio britânico); a lei institui que, um dia por ano, todos os crimes são permitidos, incluindo assassinato. Na teoria, este dia de expurgo (tradução melhor para o título original, "The Purge") serviria para "limpar" o país da violência ao permitir que todo cidadão liberasse sua "besta interior", em um efeito catártico. Na prática, a lei permite uma limpeza social e racial uma vez por ano, uma vez que os mais atingidos são os pobres e indefesos.

Visto desta forma, a premissa de "Uma Noite de Crime" até promete um filme com alguma profundidade. Puro engano. Produzido por Jason Blum (da série "Atividade Paranormal") com baixíssimo orçamento (US$ 3 milhões de dólares), a trama é só uma justificativa para um "slasher" de terror B, daqueles em os personagens agem da forma menos inteligente possível para garantir os sustos da platéia. O elenco conta com Ethan Hawke, que adora fazer filmes de baixo orçamento e é amigo pessoal dos produtores, além de Lena Headey, a rainha Cercei Lannister de "Game of Thrones", no papel da esposa em perigo. Hawke interpreta James Sandin, o principal vendedor de uma empresa que instala equipamentos de segurança. Por causa da "noite do crime", ele enriquece rapidamente ao vender portas blindadas e sistemas de alarme avançados para toda a vizinhança onde mora. Para ele, tudo está correndo às mil maravilhas em sua família, composta por esposa dedicada e um casal de filhos adolescentes. Acontece que nesta "noite do crime" em especial algo dá errado; o filho de James, Charlie (Max Burkholder) fica com pena de um mendigo que vê pelas câmeras de segurança da casa e o deixa entrar para se proteger.


Alguns minutos depois a casa é cercada por um grupo de jovens vizinhos, todos ricos e educados, mas assassinos sanguinários que vieram reclamar seu direito de matar. Todos eles vem vestidos com seu "kit de filme de terror" particular, ou seja, com máscaras horrendas e facões pingando sangue. Eles conseguem cortar a luz da casa, a invadem, e então se desenrolam todos aqueles clichês que fazem a delícia dos fãs do gênero. Casa às escuras, a família resolve se separar (naquela lógica de filmes de terror) e ir cada um para um canto para enfrentar os invasores. Há várias cenas de corpos sendo atingidos por tiros de grosso calibre, machadadas, facadas, correrias no escuro e entes queridos salvos (ou não) no último instante. No fim das contas, um filme que tinha uma premissa interessante se desenrola como dúzias de outros filmes de suspense/terror que existem por aí. De qualquer forma, "The Purge" fez grande sucesso nas bilheterias americanas (e mais ainda mundo afora), recuperando várias vezes seu baixo orçamento, o que significa que continuações estão a caminho.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Capitão Phillips

Em abril de 2009 um navio cargueiro americano chamado Maersk Alabama foi abordado por quatro piratas da Somália que usavam um simples barco de pesca impulsionado por motores de popa. Apesar da região ser conhecida por este tipo de ataques, ninguém a bordo do Alabama estava armado, o que os fez presa fácil para os piratas. O capitão do navio se chamava Rich Phillips (Tom Hanks), que tentou negociar com Muse (Barkhad Abdi), o líder do grupo de somalianos, a liberação do navio e da tripulação. Hanks novamente interpreta o papel do "homem comum" (que ele faz tão bem) enfrentando uma situação extraordinária; ele será provavelmente indicado mais uma vez ao Oscar (já venceu dois) por causa de uma cena extraordinária no final do filme, da qual falaremos mais tarde.

"Capitão Phillips" é baseado em uma história real (embora aparentemente muito romanceada) e é dirigido por um mestre em filmes de ação, Paul Greengrass (de "A Supremacia Bourne", "O Ultimato Bourne", "Voo United 93", etc). Greengrass é famoso pela câmera nervosa e imagem granulada, em estilo documental, e ele novamente faz uso destas técnicas aqui, embora de forma mais comedida. Ele também tem grande domínio sobre o suspense, e as cenas iniciais de "Capitão Phillips", da partida do navio até o embarque dos piratas, são muito bem feitas, com um ritmo que começa lento e vai acelerando aos poucos. O fato de que praticamente todos os atores serem desconhecidos (ou mesmo amadores escolhidos especialmente para este filme) só aumenta o realismo (e a identificação com Tom Hanks).


Curiosamente, o filme perde um pouco do gás assim que os piratas chegam a bordo. Quase toda a tripulação do Alabama está escondida, e Phillips começa um jogo de paciência com Muse, tentando evitar que ele encontre o resto de seus homens. Há longas cenas mostrando os dois indo de um lado para o outro dentro do grande navio enquanto a tripulação tenta não ser encontrada. Após um confronto com os piratas, eles acabam fugindo do cargueiro em um pequeno barco baleeiro, levando o Capitão Phillips como refém, e o filme muda de rumo. Entra em cena a Marinha americana e Greengrass parece um pouco deslumbrado em mostrar o poderio bélico do gigante americano contra aqueles quatro piratas esqueléticos, desesperados e famintos dentro do barquinho de metal.

ATENÇÃO, AVISO DE (POSSÍVEIS) SPOILERS

E então chegamos à última cena, em que Tom Hanks dá um show que vai lhe garantir mais uma indicação ao Oscar. Esqueçam o suspense, as questões políticas, os erros e acertos do filme que, até aqui, havia sido bom, mas nada de excepcional. Resta apenas a belíssima interpretação de Tom Hanks, esgotado, surrado, coberto de sangue em em choque, em uma cena que vale o filme.

FIM DOS SPOILERS

Há controvérsias sobre se o verdadeiro Capitão Phillips teria sido realmente o herói retratado no filme. Na internet podem ser lidos artigos e entrevistas com outros tripulantes do navio refutando a versão presente no filme e no livro lançado pelo verdadeiro Rich Phillips há alguns anos. Como ficção, no entanto, "Capitão Phillips" é uma boa pedida.

Câmera Escura

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Thor - O Mundo Sombrio

Do grande cartel de super-heróis da Marvel, o deus nórdico Thor é, provavelmente, o mais fantasioso. O filho de Odin (Anthony Hopkins) tem uma enorme capa vermelha, veste uma armadura e tem como arma um martelo. Na pele de Chris Hemsworth ("Rush", "Thor", "Os Vingadores"), o herói é, além disso, um dos mais óbvios "homens objeto" da série produzida pela Marvel. Thor ganhou uma aventura solo em 2011 dirigido pelo shakespeareano Kenneth Branagh, que fez um filme apenas correto, preparando terreno para "Os vingadores" e apresentando, além de Thor, seu meio-irmão Loki (Tom Hiddleston) que sempre rouba a cena quando aparece.

"Thor - O Mundo Sombrio" é dirigido por Alan Taylor, roteirista e diretor de vários episódios da série "Game of Thrones", o que lhe confere autoridade para lidar com um roteiro que mistura fantasia medieval com deuses nórdicos e elfos. É difícil se manter sério ao narrar a sinopse de um filme como este, mas vamos lá. Um prólogo narrado por Sir Anthony Hopkins conta a história dos "Elfos Negros", que viviam nas trevas e criaram uma arma mortal chamada de "éter". O pai de Odin derrotou o líder dos elfos, Malekith (Christopher Eccleston, irreconhecível debaixo da maquiagem) e enterrou o "éter" em um abrigo subterrâneo. Corte para Londres, milênios depois, onde Jane Foster (Natalie Portman) ainda espera pela volta do "rolo" dela, Thor, que sumiu há dois anos e não deu mais notícias (a não ser ao aparecer em Nova York para salvar o mundo em "Os Vingadores"). Foster ainda estuda fenômenos estranhos da Física e sua atenção é atraída para um lugar em Londres em que as leis da gravidade parecem ter ficado malucas. Ela acaba caindo em uma espécie de "portal" e vai parar justamente onde o "éter" estava escondido. Ela é possuída pelo "éter", que ameaça sua vida e faz com que Thor a leve para Asgard para tentar salvá-la. Só que a presença do "éter" em Asgard também atrai Malekith e seus Elfos Negros, que causam tanta destruição que fazem com que Thor peça ajuda a Loki, que está trancado nas masmorras.


O filme é melhor quando embarca de cabeça na fantasia de Asgard e dos outros "reinos" do que na Londres moderna. Londres, aliás, recentemente foi protagonista de outro filme de fantasia, "Além da Escuridão - Star Trek", e a cidade milenar leva uma sova no final deste filme, mesmo que em uma proporção bem menor do que Nova York em "Os Vingadores". Mas Nova York é Nova York, afinal de contas. É curioso ver vencedores do Oscar como Sir Anthony Hopkins sendo ligeiramente canastrões neste filme, ou então ver Stellan Skarsgard pagar mico como Eric Selvig, cientista que parece ter perdido alguns parafusos desde "Os Vingadores". De qualquer forma, "Thor - O Mundo Sombrio" é, no mínimo, superior ao primeiro filme e vale como passatempo.

Câmera Escura

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Lançado o primeiro trailer de "X-Men: Dias de um futuro esquecido"



O diretor Bryan Singer volta à franquia "X-Men" em um filme que vai juntar os mesmos personagens em duas épocas diferentes. Veteranos como Patrick Stewart (Xavier) e Ian McKellen (Magneto) vão dividir a tela com suas versões mais novas vistas em "X-Men: Primeira Classe", James McAvoy e Michael Fassbender. A ponte de ligação será o "imortal" Wolverine, vivido novamente por Hugh Jackman.

O filme tem estréia programada para Maio de 2014 e promete ser épico.

domingo, 27 de outubro de 2013

Exposição STANLEY KUBRICK

Excepcional a exposição sobre o diretor Stanley Kubrick no MIS São Paulo. A mostra toma quase todo o museu e os organizadores criaram ambientes para todos os filmes do genial diretor. Fotos, scripts, câmeras, lentes e objetos reais dos filmes são apresentados de forma muito original em salas que recriam cenas das produções. Na ala dedicada a "O Iluminado", por exemplo, o visitante percorre corredores estreitos que simulam o "Overlook Hotel". Atrás de portas corrediças encontram-se objetos do filme, como os vestidos vestidos pelas garotas gêmeas, ou a máquina de escrever usada por Jack Nicholson. A sala dedicada a "Barry Lyndon" exibe a câmera Mitchell BNC modificada por Kubrick para poder usar uma lente especial, com abertura 0.7, capaz de filmar à luz de velas.

Mas a ala mais impressionante é a dedicada a "2001 - Uma Odisséia no Espaço". Uma grande sala simula o quarto de hotel em que David Bowman vai parar no final do filme, e um monolito negro, no meio da sala, exibe imagens da produção. Há uma maquete da "centrífuga", cenário fantástico idealizado por Kubrick para rodar as cenas no interior da espaçonave Discovery. Também podem ser vistas a roupa dos astronautas e até a "fantasia" de macaco usada por atores para simular os habitantes da Terra pré-histórica vista no começo de "2001". A exposição fica no MIS até janeiro de 2014, mas ainda assim a fila para entrar estava bem longa. Um dos motivos é que a organização deixa entrar só algumas pessoas de cada vez. Por um lado é bom, pois o visitante pode percorrer praticamente sozinho todo o local. Por outro lado, a espera fora do museu é longa. Programa obrigatório para fãs de Kubrick e cinema em geral.

MIS São Paulo
Av. Europa, 158 - Jardim Europa, São Paulo - SP, 01449-000
Telefone(11) 2117-4777

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Os Belos Dias

Caroline acabou de entrar na "terceira idade" (ou "melhor idade", ou "velhice", depende de como se queira chamar esta fase), mas ainda carrega um "fogo" que a impede de sossegar. Interpretada por uma lenda do cinema francês, Fanny Ardant (ainda bela aos 64 anos), Caroline é uma dentista aposentada que ganha de presente das filhas um "vale" para uma clínica de repouso. Ela vai visitar o lugar e não aguenta passar uma tarde por lá. "Fui humilhada por uma moça de 30 anos", diz ela ao marido, o também dentista Philippe (Patrick Chesnais). Apesar disso, na casa ela conhece um jovem professor de informática, Julien (Laurent Lafitte), que é um conquistador nato. Eles saem para almoçar, ela bebe uma garrafa de vinho e, quando menos se espera, os dois estão se agarrando dentro do carro dele.

Este poderia ser o começo de um drama pesado, mas "Os Belos Dias" não é este tipo de filme. Não chega a ser uma comédia como "Copacabana", com Isabelle Ruppert, sendo um pouco mais sofisticado. Fanny Ardant, com 64 anos, está à vontade no papel e seu personagem é melhor que o próprio filme. Com relação ao tema da terceira idade, "Os Belos Dias" está muito longe da realidade cruel de "Amor", de Michel Haneke. O roteiro e direção de Marion Vernoux é bastante leve, sem muita profundidade, como em "O Quarteto" ou "O Exótico Hotel Marigold". O relacionamento entre Julien e Caroline é aquela mistura de atração carnal com amor materno que existe entre casais com grande diferença de idade. Mesmo quando a traição é exposta, os personagens são muito civilizados (talvez até demais) para fazer muito drama. O filme está em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.


terça-feira, 15 de outubro de 2013

Feliz Dia dos Professores

Ao mestre com carinho (1967)
Direção: James Clavell (que se tornaria um escritor de bestsellers como "Shogun")
Com Sidney Poitier

  


The Wall (1982)
Direção: Alan Parker
Com Bob Geldolf



Sociedade dos Poetas Mortos (1989)
Direção: Peter Weir
Com Robin Williams, Ethan Hawke, Josh Charles, Robert-Sean Leonard

   


Mentes Perigosas (1995)
Direção: John N. Smith
Com Michelle Pfeiffer




Meu Adorável Professor (1995)
Direção: Stephen Herek
Com Richard Dreyfuss




Escola de Rock (2003)
Direção: Richard Linklater
Com Jack Black

 


A Onda (2008)
Direção: Dennis Gansel
Com Jürgen Vogel

domingo, 13 de outubro de 2013

Gravidade

O diretor mexicano Alfonso Cuarón, que não laçava um filme no cinema desde o excepcional "Filhos da Esperança" (2006), volta à tela grande com um espetáculo audiovisual de tirar o fôlego. "Gravidade" segue a linha de bons filmes realizados sobre astronautas, de "2001 - Uma Odisséia no Espaço" (1968), obra-prima de Stanley Kubrick, passando por filmes como "Os Eleitos" (1983), de Philip Kaufmann, ou "Apollo 13", de Ron Howard. Cuarón é um mestre em reger planos sequência que duram por vários minutos (quem não se lembra daquela sequência incrível passada dentro de um carro em "Filhos da Esperança") e, em "Gravidade", usa e abusa do cinema digital, criando sequências intermináveis que mesclam com perfeição efeitos especiais com interpretações de atores de carne e osso (Sandra Bullock e George Clooney).

O filme transcorre como uma longa sequência que se passa quase que em tempo real, mostrando desde o momento em que Bullock e Clooney ficam "náufragos" no espaço após o ônibus especial deles ser destruído por uma chuva de detritos espaciais, até um final apoteótico (e bastante metafórico), que não vamos revelar.

Assista à crítica em vídeo, abaixo, e deixe seus comentários.



Câmera Escura

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Aposta Máxima

A crítica deste filme foi feita em forma de vídeo. Não pretendo abandonar as críticas escritas, até porque nem sempre terei as condições para gravar e editar um vídeo, mas fica este como teste.

Divirta-se!



Câmera Escura

domingo, 6 de outubro de 2013

Obsessão

"Obsessão" é trash. Digo, quando o espectador imaginaria ver Nicole Kidman urinando em Zack Efron? Pois é, é neste nível de trash que estamos falando. Em 1969, um jornalista chamado Ward Jansen (Matthew McConaughey) volta para sua pequena cidade natal, na Flórida, para investigar um caso de assassinato. O suspeito é interpretado por John Cusack, que só poderia ser descrito como "nojento". Ele foi condenado à cadeira elétrica pela morte de um policial mas, sabe-se lá o porquê, o jornalista acredita na inocência dele.

O filme é escrito e dirigido por Lee Daniels (de "Preciosa"), com roteiro baseado em um livro de Pete Dexter. É passado no Sul dos Estados Unidos no final dos anos 1960, em uma época de luta pelos direitos humanos e contra o racismo, mas não fica muito claro o que isto tem a ver com a trama. Quando, no início, vemos McConaughey chegando à cidade de Lately, acompanhado de um repórter negro (David Oyelowo), lembramos de filmes como "Mississipi em Chamas" (1988), de Alan Parker, ou "Tempo de Matar" (1996), outro filme de McConaughey, em que ele interpretava um advogado responsável por defender Samuel L. Jackson. Mas "Obsessão" não é este tipo de filme. O racismo é visto o tempo todo, mas ninguém é inocente nesta história (muito menos o repórter negro). "Obsessão" não é um filme de mensagem (a não ser, talvez, a de que todo ser humano é podre). Nicole Kidman interpreta uma ninfomaníaca a quem o termo "vulgar" seria, talvez, um elogio. É daquelas mulheres que se apaixonam por presidiários (no caso, o personagem de John Cusack), com quem ela se corresponde sem nunca tê-lo conhecido. A cena em que os dois se encontram pela primeira vez, a propósito, faz a cruzada de pernas de Sharon Stone em "Instinto Selvagem" parecer uma história para crianças.


Tudo isto é filmado por Daniels com cores quentes e imagem granulada, e o filme cheira a suor, pântanos e jacarés. O propósito de chocar ou mesmo enojar a platéia é evidente e é uma pena que "Obsessão" sequer tente sair da linha trash. É de se imaginar como é que Lee Daniels conseguiu reunir um elenco destes para este filme (talvez o prestígio conseguido com "Preciosa"). Os atores, é verdade, devem ser elogiados pela ousadia. "Obsessão" não deixa de ser uma experiência curiosa mas, no final das contas, é apenas desagradável. Em cartaz no Topázio Cinemas, Campinas.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Renoir

Ambientado nas belas paisagens da Riviera Francesa, em 1915, "Renoir" mostra o ocaso de um grande artista e o nascimento de outro. O pintor impressionista Pierre-Auguste Renoir (Michel Bouquet, muito bem no papel) estava com 74 anos e sofria com uma artrite aguda que quase o impedia de usar as mãos para pintar. O pintor é visto sendo carregado alegremente de um lado a outro de sua grande propriedade por um grupo de mulheres que, ao instalá-lo em uma paisagem, acabavam também posando para ele. Eram todas, na verdade, ex-modelos que foram ficando e terminaram como suas empregadas (há também a sugestão de que muitas tenham sido suas amantes). Na mesma época, chega da guerra (a I Guerra Mundial) o filho de Pierre-Auguste, Jean, que viria a se tornar o grande cineasta Jean Renoir (Vincent Rottiers). No momento, porém, ele só está interessado em se curar das feridas sofridas no campo de batalha e voltar para o front.

A vida de pai e filho é sacudida com a chegada de uma nova modelo chamada Andrée (Christa Theret). A garota diz que veio posar para o grande pintor, que fica impressionado com ela e volta a pintar todos os dias, apesar das dores provocadas pela artrite. A beleza da moça acaba também mexendo com o jovem Jean Renoir, mas o roteiro não se desenrola da maneira como se espera. Esta sinopse (e o trailer do filme) podem dar a entender que "Renoir" se trata da disputa entre pai e filho pelo amor de uma mesma mulher, mas não. Dirigido por Gilles Bourdos, o filme está mais interessado em mostrar como a beleza influencia a arte, e vice-versa. A ótima direção de fotografia de Mark Ping Bing Lee enche a tela de cores fortes e quentes, como os vermelhos dos pimentões sobre a mesa da cozinha, ou os cabelos ruivos de Andrée ou o amarelo das flores dos campos. Tudo regado pela trilha sonora de Alexandre Desplat.


Filmes sobre artistas costumam seguir algumas convenções, e "Renoir" não é exceção. A obsessão do pintor é retratada em diversas cenas que mostram a dor do artista ao querer pintar debilitado pela artrite, ou então nos problemas familiares causados por seu amor à arte. Por diversas vezes os personagens citam uma esposa que teria morrido recentemente, mas por vezes fica difícil entender quando (ou se) ela morreu. Quando a garota chega à casa de Renoir, por exemplo, ela diz que foi enviada pela esposa dele. "Uma desconhecida enviada por uma morta", diz o velho, filosoficamente. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.

domingo, 22 de setembro de 2013

Elysium

"Elysim" está longe de ser perfeito. É cheio de "lições de moral", tem problemas de roteiro e quase todos os (bons) atores estão exagerados. Mas, assim como fez no excepcional "Distrito 9", o diretor/roteirista Neill Blomkamp é ousado e tem uma marca pessoal distinta, que é a extrapolação de problemas sociais reais da Terra dos dias de hoje para um cenário futurista. "Elysium" se passa no século 22. As cidades da Terra se parecem com as paisagens vistas na animação "Wall-e", com milhões de pessoas vivendo em cidades esgotadas e superpopulosas. A camada mais rica da população resolveu se separar ainda mais das classes baixas deixando o planeta e se mudando para uma gigantesca estação espacial chamada "Elysium", um paraíso artificial que parece um grande condomínio particular, com mansões brancas instaladas em meio a grandes gramados e lagos artificiais. Além da riqueza, da segurança e do ar puro, os ricos têm ainda outro privilégio: todas as mansões são equipadas com máquinas milagrosas que podem curar todas as doenças.

Enquanto isso, na superfície pobre e poluída do planeta, centenas de pessoas tentam chegar à "Elysium" em naves clandestinas comandadas por um rebelde chamado Spider (o brasileiro Wagner Moura, um tanto exagerado). A cena em que as naves rebeldes tentam chegar à estação espacial lembram imagens das barcas clandestinas cubanas, cheias de refugiados, tentando chegar à Flórida, ou mexicanos tentando atravessar para a Califórnia. Jodie Foster interpreta uma cruel chefe de segurança de "Elysium" que não vê problemas em ordenar que tais naves sejam destruídas, matando todos a bordo, para "proteger" a estação espacial dos "invasores". Matt Damon, cheio de tatuagens e de cabeça raspada, é Max, um operário que tenta levar uma vida honesta depois de uma infância e adolescência cometendo pequenos crimes. Ele recebe uma dose letal de radiação em um acidente de trabalho e só uma viagem a "Elysium" salvaria sua vida, e ele se vê obrigado a prestar um serviço a Spider, o único capaz de levá-lo até lá.


O roteiro é tão cheio de ideias que Blomkamp tem problemas em lidar com todas elas. A mais problemática envolve um programa de computador que seria a "chave" para "Elysium". Wagner Moura bate o olho em algumas linhas de código passando na tela e já consegue entender todo o "enredo". Há também um romance mal resolvido entre o personagem de Matt Damon e uma enfermeira chamada Frey (interpretada por outra brasileira, Alice Braga), que, ainda por cima, tem uma filha com leucemia que também precisa ser curada em "Elysium". E assim por diante. Com tudo isso, sente-se falta de um olhar mais detalhado sobre a população de "Elysium" em si. Será que eles só passam a vida à beira da piscina, passeando pelos gramados e ouvindo música clássica? Ninguém lá questiona a situação em que vive, e como ela pode ser frágil? Há problemas com drogas ou medicamentos? Com tédio?

Quase todo o filme é passado aqui na Terra mesmo, a não ser na parte final, em um embate barulhento entre Matt Damon e um mercenário chamado Kruger (Sharlto Copley, também de "Distrito 9"). Para um diretor ousado como Blomkamp, o final de "Elysium" é "bonitinho" demais (e Wagner Moura arrancou uma gargalhada de todo o cinema com uma frase). Bom filme, apesar de não ter o mesmo impacto de "Distrito 9".

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Lovelace

Hoje em dia, em que a pornografia está a um click do mouse de todo mundo, é difícil imaginar que as pessoas iam ao cinema para ver filmes desse gênero. E há quarenta anos, nos Estados Unidos, filmes adultos eram exibidos em grandes cinemas, com um público que não era formado apenas por rapazes cheios de hormônios. Em 1972, um filme pornô chamado "Garganta Profunda" causou furor não só pela premissa absurda (uma mulher com o órgão sexual em lugar inusitado), mas pelo carisma da estrela principal, a estreante Linda Lovelace. Ela não tinha o tipo físico comum às estrelas do cinema pornô; era apenas uma garota bonita (com uma "habilidade" especial). "Garganta Profunda" se tornaria um fenômeno, arrecadando meio bilhão de dólares. A estrela principal receberia pouco mais de mil dólares pelo trabalho que a marcaria pelo resto da vida.

"Lovelace" é dirigido por dois renomados documentaristas, Jeffrey Friedman e Rob Epstein. Eles usaram da experiência com a não-ficção para recriar a vida de Linda Boreman (Amanda Seyfried, de "Os Miseráveis" e "O Preço da Traição"), uma garota de Nova York que se mudou para a Flórida com a família  rígida e religiosa (interpretados por Robert Patrick e uma irreconhecível Sharon Stone). Linda se envolve com o típico "cafajeste profissional", Chuck (o competente Peter Sarsgaard, de "Educação"), um salafrário que explora garotas e drogas e apresenta Linda a produtores de filmes pornográficos. Eles ficam impressionados com a habilidade da garota em praticar sexo oral e, rapidamente, escrevem e produzem "Garganta Profunda". Friedman e Epstein montam o filme de forma não linear e, a partir do meio da trama, voltam no tempo e contam a mesma história sobre outro ponto de vista. É um recurso interessante. O que antes parecia "fácil", como a aparente tranquilidade de Linda em aceitar fazer um filme pornográfico, por exemplo, toma nova interpretação quando o espectador passa a vê-la como vítima de um homem violento e manipulador. Chuck a estuprava, batia e explorava como garota de programa. O espectador se pergunta porque uma garota como Linda aceitaria passar por tudo isso, mas ela estava "presa" naquela estranha relação que existe entre um cafetão e uma prostituta.

O final é curiosamente meloso. Ele mostra como Linda abandonou a pornografia (ela fez apenas "Garganta Profunda", na verdade) e se transformou em esposa e mãe, além de escrever um livro contra a pornografia e a violência doméstica. Tudo muito louvável mas, como filme, a forma como isso é apresentado é fraca. Os realizadores até apelam para uma trilha triste, com violino, para apresentar esta nova fase da vida de Lovelace. Impossível não comparar com o superior "Boogie Nights", fantástico retrato do mundo do cinema pornográfico feito por Paul Thomas Anderson em 1997. Friedman e Epstein não sabem se homenageiam a indústria pornográfica dos anos 1970 (com a qual parecem deslumbrados) ou fazem uma denúncia sobre este meio. Amanda Seyfried está muito bem como Linda Lovelace. Em compensação, James Franco não convence um segundo como Hugh Hefner, o fundador do império "Playboy".



segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Rush: No Limite da Emoção

Quarenta e dois dias depois de ter grande parte do corpo queimada em um violento acidente de Fórmula 1 e de ter passado por procedimentos médicos pesados (como enxerto de pele e limpeza do pulmão), o piloto austríaco Niki Lauda voltou às corridas. Seu objetivo: evitar que seu principal rival, o inglês James Hunt, vencesse o campeonato mundial de Fórmula 1 de 1976. Segundo Lauda, foram as imagens na TV de Hunt vencendo diversas corridas que o mantiveram vivo e com vontade de voltar a pilotar.

A história desta rivalidade é mostrada no filme "Rush", de Ron Howard ("Frost/Nixon", 2008). O filme transporta o espectador para a época em que as corridas de carros ainda eram tão "românticas" quanto perigosas, com a média de três pilotos mortos por temporada. Os carros não eram os computadores sobre rodas que existem hoje; eram tanques de combustível guiados de forma "analógica" por pilotos que tinham um tipo especial de loucura, uma paixão pelo perigo e pela velocidade que, muitas vezes, era fatal. A rivalidade entre pilotos sempre vendeu bem na Fórmula 1. Os brasileiros com mais de trinta anos se lembram dos duelos entre Nelson Piquet e Nigel Mansell pelo campeonato mundial de 1987 (vencido por Piquet) ou pela disputa acirrada entre Ayrton Senna e Alain Proust (mostrada no documentário "Senna"). Roward recria muito bem o clima da época, com direção de arte minuciosa e uma direção de fotografia (de Antonhy Dod Mantle, de "Quer quer ser um Milionário" e "127 Horas") que lembra a cor dos filmes em Super 8 dos anos 1970. Mas o principal acerto foi no elenco. Chris Hemsworth (de "Thor" e "Os Vingadores") está muito bem como James Hunt, um piloto tipo "playboy" que flertava com garotas, bebidas e drogas com a mesma intensidade com que gostava de pilotar automóveis. O espanhol Daniel Brühl está perfeito como o frio e metódico Niki Lauda; a semelhança com o piloto verdadeiro é impressionante, mesmo antes do acidente que distorceu seu rosto. O roteiro de Peter Morgan ("A Rainha", "360") repete a parceria com Ron Roward de "Frost/Nixon".



E há, claro, as corridas de Fórmula 1. A cena do desastre de Lauda em Nurburgring (vista no vídeo acima) foi recriada de forma idêntica pelos ótimos efeitos especiais do filme. "Rush" segue a tradição de grandes filmes de automobilismo como "Grand Prix" (1966) e "24 Horas de Le Mans" (1971), mas as câmeras (reais e virtuais) de Ron Howard e Anthony Dod Mantle não só nos colocam no cockpit do piloto como recriam toda uma época.

Câmera Escura

sábado, 7 de setembro de 2013

Jobs

Filmes sobre figuras históricas costumam tratar de líderes religiosos ou políticos, pacifistas ou estrelas de rock. Filmes sobre empresários já foram feitos antes (como "Tucker, Um Homem e seu Sonho", 1988, de Francis Ford Coppola), mas poucos apresentaram seu protagonista de forma tão religiosa quanto "Jobs". Em se tratando da marca "Apple", no entanto, não é de se estranhar, já que a fábrica de computadores, desde seu início, não tinha apenas "clientes", mas "seguidores", e Steve Jobs era seu profeta. Jobs morreu de câncer em 2011, deixando um legado impressionante de inovações tecnológicas como o iPod, o iPad, o iPhone e tantos outros que mudaram o modo como as pessoas interagem com os aparelhos eletrônicos.

Diante disso, é uma pena que a primeira cinebiografia a respeito do californiano seja tão "quadrada" e sem brilho. A melhor surpresa é a interpretação de Ashton Kutcher, que praticamente carrega o filme sozinho, com um bom trabalho ao emular Jobs. Financiado de forma independente, o filme foi feito às pressas para chegar às telas antes da produção da Sony Pictures que será baseada na biografia oficial de Steve Jobs, escrita por Walter Issacson. O filme da Sony, além de ter um orçamento muito superior, está sendo escrito pelo premiado roteirista Aaron Sorkin, que ganhou o Oscar em 2011 por "A Rede Social". Foram os diálogos rápidos e inteligentes de Sorkin que tornaram o filme sobre o Facebook interessante. Enquanto isso, em "Jobs" (dirigido por Joshua Michael Stern e escrito por Matt Whiteley), o roteiro se arrasta e o espectador assiste a longas sequências em que "nerds" em uma garagem ficam soldando circuitos em uma placa de computador, ou executivos tramam vinganças ao redor de mesas de reunião.

É verdade que não só o lado bom de Jobs é mostrado. De temperamento difícil, o futuro criador do iPod é visto humilhando técnicos que não se comprometiam 100% com sua "visão" da empresa. No lado pessoal, ele negou a paternidade de uma menina que teria tido com a namorada. Era frequente também que ele tomasse para si o crédito por criações e inovações que não eram dele; o primeiro computador Apple, por exemplo, teria sido criado por Steve Wosniak (Josh Gad), seu amigo e sócio. A Apple Computer começou na garagem dos pais de Jobs e, nos primeiros meses, era tocada por Jobs, Wosniak e um grupo de técnicos que trabalhavam praticamente de graça. Quando a empresa cresceu, no entanto, Jobs se recusou a ceder ações para os antigos companheiros. Há uma cena em que Jobs é visto provando do próprio veneno, quando Bill Gates teria copiado o sistema operacional do Macintosh e criado o Windows, passando a perna na Apple. A rivalidade duraria décadas, mas o filme apenas mostra um telefonema de Jobs ameaçando processar Gates. Steve Jobs foi afastado da própria empresa em 1985 e criou a Next. (O filme não mostra como, em um golpe de "sorte", ele comprou de George Lucas uma pequena produtora de animações chamada Pixar, em 1986, e a transformou em uma empresa bilionária). Com altos e baixos, "Jobs" se apoia muito na interpretação de Kutcher para se manter em pé, e apesar de ser um bom trabalho do ator, não é o suficiente.

domingo, 1 de setembro de 2013

Frances Ha

Frances (Greta Gerwig) é uma mulher de 27 anos que divide um apartamento em Nova York com a melhor amiga, Sophie (Mickey Summer). As duas se conhecem desde a época da faculdade e, segundo Frances, são "a mesma pessoa com cabelos diferentes". Fumam e bebem juntas, frequentam os mesmos lugares, brincam na rua como duas crianças. Um dia o namorado de Frances pede para ela vir morar com ele. Ela diz que não pode, pois mora com Sophie. O caso é que, ao contrário dos desejos de Frances, o tempo passa, as pessoas crescem e assumem responsabilidades, e talvez os planos de Sophie não sejam exatamente como Frances gostaria que eles fossem.

"Frances Ha" é escrito e dirigido por Noah Baumbach e por Greta Gerwig, e parece um filme francês dos anos 1960 que alguém achou enterrado em uma cápsula do tempo. Filmado digitalmente (com uma Canon 5D, uma câmera fotográfica) em maravilhoso preto-e-branco (direção de fotografia de Sam Levy) e contento várias trilhas sonoras de Georges Deleure (que colaborou frequentemente com François Truffaut), o filme só faltava ser falado em francês para a ilusão de se tratar de um exemplar perdido da nouvelle vague se completar. É tão francês que a personagem principal, claro, se chama "Frances". Greta Gerwig está soberba; não há um momento sequer em que ela não seja natural como uma aspirante a bailarina que perdeu o bonde da própria vida (mas não se deu conta disso ainda). É um filme sobre uma amizade que se mistura com amor (mais sobre isso em breve), sobre ilusões, sobre arte e sobre a realidade, que teima em aparecer de vez em quando para jogar um banho de água fria nos sonhos de Frances.

Noah Baumbach é colaborador frequente de Wes Anderson (diretor de "Moonrise Kingdom", "Os Excêntricos Tenenbauns", "O Fantástico Sr. Raposo", etc) e diretor de um filme que admiro muito, "A Lula e Baleia", com Jeff Daniels e Jesse Einsenberg. A colaboração com Greta Gerwig trouxe a "Frances Ha" um ponto de vista extremamente feminino. A influência francesa está presente em cada plano. Quando Sophie muda de apartamento, deixando Frances sem ter como pagar o aluguel, ela vai morar com dois artistas, o mulherengo Lev (Adam Driver) e Benji (Michael Zegen), em uma situação que lembra muito, claro, "Uma Mulher para Dois" (1962), de Truffaut. Há também uma sequência em que Frances, em um impulso, usa um cartão de crédito para passar um final de semana em Paris, e uma amiga lhe diz que conhece um rapaz muito parecido com Jean-Pierre Léaud, ator símbolo da nouvelle vague. O ar francês continua firme mesmo quando o ritmo contagiante de "Modern Love", de David Bowie, se torna a trilha sonora principal do filme.

E há a "amizade" entre Frances e Sophie. Apesar de uma frase no início dizer que elas são como "um velho casal de lésbicas que não faz sexo", e elas serem chamadas de heterossexuais por todo o filme, a atração de Frances por Sophie beira a obsessão. Ela fala sobre a amiga o tempo todo, com quem estiver próximo e disposto (ou não) a ouvir. As duas são vistas na mesma cama em diversas cenas (em uma delas, Frances tira a calcinha antes de se deitar). Sophie tem um namorado, que depois se torna seu noivo, mas Frances está sempre sozinha (a não ser pelo "namorado" com quem ela briga, no início do filme, por causa de Sophie) mesmo quando está morando em um apartamento com dois homens ativos sexualmente. Por mais "gracinha" que o filme seja, em sua exaltação à amizade, fica a sensação incômoda de que se está assistindo a um casal homossexual que não quer assumir o relacionamento e ser feliz. Mas é um filme gostoso de se ver, com interpretações sinceras e ótimo nível técnico. Em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.

Câmera Escura


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Muito Barulho por Nada

O que fazer depois de dirigir um filme que custou 250 milhões de dólares e arrecadou quase um bilhão? Se você é Joss Whedon, você reúne os amigos, arruma uma casa grande, algumas câmeras e brinca de filmar Shakespeare. Depois do mega-sucesso de "Os Vingadores", Whedon quis baixar a poeira fazendo praticamente um vídeo caseiro de "Muito Barulho por Nada", uma comédia de William Shakespeare passada em Messina (Sicília), no século 16.

A versão de Whedon é ambientada nos dias de hoje em um local indeterminado (os personagens falam que estão em Messina, mas está tudo escrito em inglês). Filmado em preto e branco e com um visual bem caseiro, tem-se a sensação de que se está assistindo a um ensaio, e não a um filme "de verdade". Os atores são velhos conhecidos de Whedon e trabalharam com ele em séries de TV como "Buffy - A Caça Vampiros" ou "Angel". Fãs dos filmes da Marvel vão reconhecer Clark Gregg, mundialmente conhecido como o Agente Coulson, da organização SHIELD, interpretando o Sr. Leonato. A comédia de Shakespeare fala sobre os encontros e desencontros de alguns casais na propriedade de Leonato, que recebe a visita do príncipe Dom Pedro (Reed Diamond) e sua comitiva. O duque Cláudio (Fran Kranz) se apaixona à primeira vista pela filha de Leonato, Hero (Jilian Morgese) e os dois marcam o casamento para a semana seguinte. Só que o irmão invejoso do príncipe, Dom João (Sean Maher), trama para manchar a reputação de Hero, fazendo com que se acredite que ela está traindo Cláudio e não é mais "pura". Paralelamente, todos conspiram para tentar aproximar um casal "inimigo" por natureza, o irônico Benedick (Alexis Denisof) e a solteirona Beatrice (Amy Acker), fazendo-os acreditar que estão apaixonados um pelo outro.

Os diálogos são todos tirados da peça original e as interpretações são pouco convincentes. Amy Acker é quem se sai melhor como Beatrice; já Denisof é risível (no mau sentido) como Benedick. Não ajuda muito se você assistiu à versão tremendamente superior produzida, dirigida e interpretada por Kenneth Branagh há vinte anos. O filme de Branagh era banhado pela luz quente do mediterrâneo, belamente fotografado e interpretado por quem entende de Shakespeare (com exceção de Keanu Reeves e Robert Sean Leonard). A versão de Whedon soa como uma peça do colégio. E apesar de já terem sido feitas versões modernas bem sucedidas de Shakespeare, como "Coriolano" (dirigido e interpretado por Ralph Fiennes), ou mesmo o "Romeu + Julieta" de Baz Luhrmann, os temas tratados em "Muito Barulho por Nada" não combinam com a ambientação moderna. A questão de Hero ser ou não virgem, a submissão das mulheres e a glorificação do casamento podiam fazer sentido no século 16, mas não hoje. Assim, "Muito Barulho por Nada" pode servir como uma curiosidade, e talvez até funcione melhor na telinha da TV, mas é dispensável como cinema.