segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Vencedores OSCAR 2015



A cerimônia do Oscar 2015 foi apresentada por Neil Patrick Harris, que começou o show com uma apresentação musical. "Precisamos voltar a amar os filmes", disse Harris. Jack Black interrompeu a música de abertura com uma intervenção bem humorada.

Segue abaixo os vendecores do Oscar, na ordem em que foram apresentados:

Melhor Ator Coadjuvante: JK Simmons (Whiplash)

Melhor Figurino: Milena Canonero (O Grande Hotel Budapeste)

Melhor Maquiagem: Frances Hannon e Mark Coulier (O Grande Hotel Budapeste)

Melhor Filme Estrangeiro: Ida

Melhor Curta-Metragem Live Action: "The phone call"

Melhor documentário curta-metragem: "Crisis Hotline: Veterans Press 1"

Melhor mixagem de som: Craig Mann, Ben Wilkins e Thomas Curley ("Whiplash")

Melhor edição de som: Alan Robert Murray e Bub Asman ("Sniper americano")

Melhor Atriz Coadjuvante: Patricia Arquette ("Boyhood")

Melhores efeitos visuais: Paul Franklin, Andrew Lockley, Ian Hunter e Scott Fisher ("Interestelar")

Melhor animação em curta-metragem: "Feast"

Melhor animação longa metragem: "Operação Big Hero"

Melhor design de produção: "O grande hotel Budapeste"

Melhor fotografia: Emmanuel Lubezki ("Birdman")

Melhor Edição: Tom Cross ("Whiplash")

Melhor documentário longa-metragem: "Citizen Four"

Melhor canção: "Glory", de John Stephens e Lonnie Lynn ("Selma")

Melhor Trilha Sonora: Alexandre Desplat ("O grande hotel Budapeste")

Melhor Roteiro Original: Alejandro G. Iñárritu, Nicolás Giacobone, Alexander Dinelaris Jr. e Armando Bo ("Birdman")

Melhor Roteiro Adaptado: Graham Moore ("O Jogo da Imitação")

Melhor Diretor: Alejandro Gonzáles Iñárritu ("Birdman")

Melhor Ator: Eddie Redmayne ("A Teoria de Tudo")

Melhor Atriz: Julianne Moore ("Para Sempre Alice")

Melhor Filme: Birdman


João Solimeo


segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Ida

Cada frame de "Ida", se ampliado e colocado em uma moldura, poderia vencer um concurso de fotografia. Dirigido por Pawel Pawlikowski, "Ida" é um dos indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro (pela Polônia) e, claro, ao Oscar de melhor fotografia, de Ryszard Lenczewski e Lukasz Zal (segundo o site da American Society of Cinematographers, Lukasz Zal fotografou a maior parte do filme). Captado em digital com uma Arri Alexa 4:3 em cores, o filme foi cuidadosamente tratado para resultar na belíssima imagem final em preto e branco e em uma proporção quadrada que remete aos filmes feitos antes da invenção do Cinemascope, nos anos 1950.

Pode parecer apenas preciosismo técnico, mas o formato ajuda a transportar o espectador para a Polônia do pós-guerra, no início dos anos 1960. Anna (Agata Trzebuchowska, em seu primeiro papel) é uma noviça órfã que passou a vida toda em um convento gelado e austero. Ela está para fazer seus votos de castidade e obediência quando a madre superiora lhe diz que ela deve visitar a única parente viva, uma tia. Anna parte para a cidade grande e conhece Wanda Cruz (Agata Kulesza), sua tia. "Você sabe quem eu sou? O que eu faço da vida?", pergunta Wanda. Com um cigarro na mão, um homem desconhecido no quarto e vestindo roupas de baixo, Wanda parece uma prostituta barata, mas neste filme as aparências enganam. Wanda é, na verdade, uma juíza e Anna também não é quem achava que fosse. A tia lhe informa que seu nome verdadeiro é Ida Lebenstein, ela é judia e os pais foram mortos na 2ª Guerra Mundial. (leia mais abaixo)


Relutantemente, Wanda resolve ajudar Ida a descobrir seu passado; as duas partem em direção ao interior e o filme se torna um road movie. Elas formam um par estranho. Wanda é carnal, alcoólatra e fuma um cigarro atrás do outro. Ida, criada como freira, fala apenas o necessário e reza antes de fazer qualquer coisa. No caminho elas dão carona para um jovem músico (Dawid Ogrodnik) que fica encantado com a beleza de Ida. A adição do saxofonista à trama também muda a trilha sonora, inicialmente composta por clássicos, para o jazz. Passo a passo, sempre seguida por Ida, Wanda vai descobrindo o paradeiro dos pais da garota, cujos corpos estariam enterrados em uma floresta no interior. Ela também, logo descobrimos, está atrás de respostas para seu passado.

Encabeçado por grandes interpretações e maravilhosamente filmado por Pawlikowski, "Ida" é tão belo quanto profundo. A personagem principal é como uma tela em branco onde, aos poucos, formas e sombras são projetadas. A inocência dá lugar a questionamentos e descobertas. O plano em que Trzebuchowska solta os cabelos, olhando diretamente para a câmera, vai ficar na sua memória.

João Solimeo

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Sniper Americano

Independente de toda controvérsia gerada a respeito do protagonista deste filme, Chris Kyle, um sniper que teria matado oficialmente 160 pessoas (mais de 200 extra-oficialmente), a questão que fica é: "Sniper Americano" é um bom filme? A resposta é não. Clint Eastwood, que já fez o ótimos "Os Imperdoáveis" e "Sobre Meninos e Lobos", entrega um filme de guerra bastante convencional.

O inimigo iraquiano é sempre chamado de "selvagem" ou classificado como o "mal". Há um vilão caricato que é tão ruim que mata criancinhas com uma furadeira elétrica. Há incontáveis e repetitivas "DR" toda vez que o marido volta para a esposa chorona e solitária (Sienna Miller). Há balas voando em câmera lenta para o destino sangrento. Há aquela cena passada no cemitério, com salva de tiros, marcha fúnebre e bandeira americana sendo dobrada solenemente. Enfim, era de se esperar que Clint Eastwood pudesse fazer um filme de guerra sem seguir tantos clichês. "Guerra ao Terror", de Katherine Bigelow, fez muito melhor alguns anos atrás.

Chris Kyle é interpretado por Bradley Cooper, que apesar de estar muito bem dificilmente mereceria uma indicação ao Oscar (seu nome foi a surpresa entre os indicados a ator). Jake Gyllenhaal, não indicado, está muito melhor em "O Abutre". Kyle, personagem que realmente existiu e é considerado um herói nos Estados Unidos, é daqueles texanos típicos; machão, amante de armas e mulheres e que dizem em voz alta que os EUA são "o melhor país do mundo". Após os atentados de 11 de setembro de 2001 ele se vê na obrigação de defender seu país e se alista nos SEALS, o que gera outra onda de cenas clichês de recrutas sofrendo com um treinamento exaustivo. (leia mais abaixo)



No Iraque, o trabalho de Kyle era se posicionar no topo de prédios e matar friamente qualquer pessoa que ele julgasse uma ameaça aos comboios americanos. Ele é visto matando homens, mulheres e até crianças que, sempre, são mostrados por Eastwood como uma ameaça real, justificando, assim, as mortes. Kyle ganha o apelido de "Lenda" entre os companheiros pela impressionante quantidade de mortes inimigas. Chega a ser engraçado que um sniper iraquiano conhecido como "Mustafá" (Sammy Sheik) seja visto como um grande vilão por fazer exatamente a mesma coisa que Kyle faz, ou seja, matar covardemente, de longe, soldados inimigos.

É verdade que, na parte final, "Sniper Americano" chega a questionar a guerra e tenta mostrar os efeitos que ela tem nos soldados que voltam para casa. Bradley Cooper busca alguma humanidade em Kyle nas cenas em que ele não consegue lidar com o dia-a-dia "normal" e com as exigências da mulher. Em nenhum momento, porém, ele duvida de suas ações. Soa falsa a tentativa do filme de mostrar alguma ambiguidade em um personagem que foi mostrado o tempo todo como um matador frio e eficiente. E o final é tão abrupto que parece que Jason Hall, o roteirista, não sabia como finalizar a trama. O já citado "Guerra do Terror" e mesmo "A Hora mais Escura" são muito mais eficientes em retratar um conflito que se estende por anos e está longe de uma solução.

ps: e se o seu objetivo for ver uma boa briga entre snipers assista "Círculo de Fogo" (não o filme de robôs, mas "Enemy at the Gates", produzido em 2001), que mostra Ed Harris e Jude Law na 2ª Guerra Mundial.

João Solimeo


quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Tangerinas (Mandariinid)

Este pequeno filme da Estônia é passado no espaço entre as poucas casas de um vilarejo. É o início dos anos 1990 e há uma guerra acontecendo, mas é daquelas guerras europeias em que é difícil saber quem está lutando e porquê. Um letreiro no início informa que a região da Abecácia, ao norte da Geórgia, foi ocupada no século 19 por imigrantes da Estônia. Em 1992 a Geórgia quis retomar o território e quase todos os estonianos fugiram. Apenas alguns permaneceram para trás.

É o caso de Ivo (o ótimo Lembit Ulfsak), um senhor que tem uma pequena madeireira, e de Margus (Elmo Nüganen), que tem um pomar de tangerinas e quer fazer uma última colheita antes de também fugir para a Estônia.

A paz dos dois é perturbada quando um tiroteio acontece no vilarejo. Ivo e Margus conseguem resgatar dois sobreviventes, um mercenário checheno chamado Ahmed (Giorgi Nakhashidze) e um soldado da Geórgia chamado Nika (Michael Meskhi). Os dois, inimigos mortais, se recuperam em quartos separados da casa de Ivo, que tem que lidar não só com os ferimentos deles mas com a rivalidade entre os soldados. "Você perdeu seu tempo tentando salvá-lo, velho", diz Ahmed. "Eu vou matar o georgiano na primeira oportunidade". (leia mais abaixo)


Ivo os trata como um avô trataria dois moleques mal educados, com firmeza, e consegue que eles prometam que, ao menos dentro da casa, não se matariam. Há uma cena engraçada que Margus questiona esta promessa e Ivo lhe diz que ainda há quem cumpra com sua palavra. "E você tem os dois em sua casa?", pergunta Margus.

O filme, escrito e dirigido por Zaza Urushadze, é um dos candidatos ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2015. Com uma hora e vinte e três minutos de duração, "Tangerinas" é simples e direto, passando uma mensagem pacifista clara. Ahmed e Nika se odeiam por princípio, mas a convivência, aos poucos, vai quebrando seus preconceitos com relação ao outro. Todo o filme é passado no vilarejo, seja na casa de Ivo ou no pomar de Margus. Eles falam a mesma língua e têm um passado em comum, mas estão em guerra por um pedaço de terra.

A direção de Urushadze é elegante e econômica. A câmera está sempre fazendo movimentos lentos e precisos e os ótimos atores conduzem a narrativa. O final não chega a ser surpreendente, mas é melhor executado do que esperava. É um bom filme que mostra a estupidez da guerra sem precisar de grandes discursos.

João Solimeo
Câmera Escura

domingo, 8 de fevereiro de 2015

O Jogo da Imitação

É sempre complicado falar sobre um filme feito sobre uma pessoa real. Deve-se encará-lo como uma obra de ficção qualquer, analisando apenas sua lógica interna, execução técnica, direção e elenco? Ou se deve levar em conta a relação do produto final com a história real que o inspirou? Creio que um pouco das duas coisas.

"O Jogo da Imitação" se baseia em três momentos da vida do matemático britânico Alan Turing; no final dos anos 1920, quando era um estudante; nos anos 1940, durante a 2ª Guerra Mundial e nos anos 1950, quando ele foi condenado por "indecência" por ser homossexual. 

Cinematograficamente falando, a fase passada durante a guerra é a melhor. O mundo estava sob a ameaça nazista e os alemães ganhavam a guerra. Milhares de civis britânicos morriam com os constantes bombardeios e a inteligência britânica montou uma força tarefa para tentar quebrar um código alemão criado por uma máquina chamada de Enigma. Os melhores matemáticos e criptologistas do país foram chamados para trabalhar com a máquina e tentar quebrar o código.

Benedict Cumberbatch ("12 Anos de Escravidão") interpreta o matemático Alan Turing como um gênio arrogante e de poucos amigos. Como o Sr. Spock de Star Trek, Turing não tem senso de humor e entende tudo de forma literal e lógica. Ele fica fascinado com a máquina Enigma, capaz de gerar trilhões de combinações possíveis; os alemães trocavam o código todos os dias à meia-noite, tornando impossível que seres humanos conseguissem decifrá-lo em tão pouco tempo. A lógica de Turing é de que apenas uma máquina conseguiria combater outra máquina e ele começa a construir o protótipo dos primeiros computadores, que ele chama de "Christopher". A máquina de Turing realmente existiu, embora não tenha sido criação única dele nem tenha surgido do "nada", como o filme sugere, mas foi baseada em uma máquina polonesa chamada "Bombe". De qualquer forma, o filme reconstrói a máquina de forma impressionante e é fascinante vê-la funcionando, embora demorasse horas para chegar a algum resultado. É provável que qualquer calculadora de bolso hoje tenha mais poder de processamento que a máquina de Turing, mas ela foi responsável por quebrar o código alemão e sem dúvida ajudou a terminar a guerra. (leia mais abaixo)


As outras duas fases do filme, que lidam com a infância de Turing e sobre o período pós-guerra, são decepcionantes. Há um vai e vem destas cenas, montadas com a fase da guerra, que por vezes mais servem para confundir do que para explicar a trama. Turing quando garoto (Alex Lawther) é ainda mais tímido e fechado e é constantemente atacado pelos colegas de turma. Seu único amigo (e amor precoce) é um garoto chamado Christopher, com quem troca mensagens criptografadas. O fato de Turing chamar sua máquina de "Christopher", mais tarde, é uma licença poética bastante previsível dos roteiristas. Nos anos 1950, um policial começa a suspeitar que Turing seja um espião soviético depois de investigar um roubo na casa dele. O suspense se torna um anticlímax quando ele descobre o que o espectador já sabia faz tempo, que o segredo de Turing era ser homossexual e não um agente duplo.

Assim, "O Jogo da Imitação" acaba se tornando bastante irregular, mesclando bons momentos de suspense e paranoia durante a guerra com outros que não chegam a lugar algum. Interessante também notar que, assim como na outra biografia de um gênio matemático britânico que está nos cinemas, "A Teoria de Tudo", "O Jogo da Imitação" usa de vários elementos de "Uma Mente Brilhante", filme em que Russell Crowe interpretou outro gênio matemático que era bom em decifrar códigos.

João Solimeo


quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Grandes Olhos

"Grandes Olhos" começa com a fuga de Margaret (Amy Adams) de sua casa, localizada em uma rua que parece ter saído diretamente do cenário de "Edward Mãos de Tesoura". Ela arruma as malas rapidamente, coloca a filha única no banco de trás do carro e parte para São Francisco, fugindo de um casamento problemático. O que este começo nos diz? Que Margaret é uma mulher que luta pelo que quer; que, em plenos anos 1950, teve coragem de largar um casamento ruim e tentar a vida sozinha na cidade grande. Certo?

Pois é, este é só um dos grandes problemas do roteiro de "Grandes Olhos" (não, não é a biografia de Emma Stone), filme dirigido por um Tim Burton tentando ser diferente. "Grandes Olhos" conta a história de uma mulher que se submeteu a um homem por vários anos, que tomou crédito pelo trabalho dela e a escondeu do mundo. Por que, então, começar o filme desta maneira?

Margaret era uma artista de um trabalho só. Sua marca registrada era pintar quadros mostrando crianças tristes com olhos enormes, que ninguém queria comprar. Ela então conheceu Walter Keane (Christoph Waltz), outro suposto artista que, charmoso e vendedor nato, pintava quadros de Paris, onde dizia que havia morado e estudado Belas Artes. Ele convence o dono de um bar de jazz a expor seus trabalhos e os da esposa no corredor do banheiro da casa. Ninguém liga para suas paisagens parisienses, mas aos poucos os quadros da esposa começam a chamar a atenção e Walter, egocêntrico, diz que ele é o autor das obras. (leia mais abaixo)


Margaret, a mulher que foi apresentada como alguém independente e mãe solteira, inexplicavelmente aceita o papel de coadjuvante na farsa criada por Walter, que sequer era violento (ainda não, pelo menos) com ela ou a filha. O roteiro (escrito por Scott Alexander e Larry Karaszewski, de filmes muito melhores como "O Povo contra Larry Flynt", "O Mundo de Andy" e "Ed Wood") quer que o espectador acredite também que nem a filha de Margaret, que morava com ela e o pai adotivo em um apartamento pequeno, sabia que era a mãe que pintava os famosos quadros.

Christoph Waltz ("Django Livre"), que é ótimo ator, está completamente errado como Walter Keane, um americano do Nebraska que Waltz interpreta com seu sotaque europeu. Amy Adams ("Trapaça") está um pouco melhor, embora passe quase todo o filme com a mesma expressão desesperada. O roteiro perde ótimas oportunidades de discutir o que é "Arte" no século XX, ou "na era da reprodutibilidade técnica", como diz o famoso ensaio de Walter Benjamin. O tema é apenas sugerido de forma superficial na abertura, que mostra uma gravura de Keane sendo produzida em série e em algumas referências a Andy Warhol. Há apenas um crítico de arte (interpretado por Terence Stamp) que chega a discutir o valor dos quadros, mas tudo termina com uma cena de briga com Keane que beira o ridículo (com direito até a um close de Stamp segurando um garfo perto do rosto).

Lá pelas tantas Margaret foge novamente com a filha, que pergunta à mãe como é que elas vão sobreviver, já que não têm sequer roupas. Margaret responde "vamos ao Havaí, lá é um paraíso e não precisaremos de roupas". Se Margaret era tão submissa e controlada pelo marido, como ela tinha acesso ao dinheiro? Como conseguiu se mudar com a filha para uma casa enorme no Havaí e se manter lá escondida do marido? Tudo termina em uma sequência passada no tribunal, onde (finalmente) o óbvio é feito; quem conseguir provar que sabe pintar um quadro com os "grandes olhos" é o autor original.

É bom saber que Tim Burton tenha tentado fazer algo diferente do seu estilo convencional (nem Johnny Depp está neste filme, o que me deixou curioso em saber como ele faria Walter Keane). Pena que Burton tenha escolhido um roteiro tão fraco. Sua outra biografia, "Ed Wood" (1994), era muito melhor e mais adequada ao seu estilo. Para terminar, você fica se perguntando qual a importância de tudo aquilo. E se descobrissem que Romero Britto não pintou seus quadros? Pois é.

João Solimeo
Câmera Escura

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Um Santo Vizinho

Bill Murray. Precisa dizer mais? Com 64 anos, poucos atores são tão desencanados com a própria imagem quanto Murray, que pode ser tão ranzinza e engraçado quanto seus personagens. 

Ele é Vincent, um cara que é o que os americanos gostam de chamar de "loser" (um fracassado). Tem mais que cinquenta anos, está desempregado, devendo para todo mundo e ainda age como um adolescente. Bate ponto em um bar todas as noites, gasta o que não tem nas corridas de cavalos e, uma vez por semana, transa com Daka, uma prostituta russa que está grávida; Daka é interpretada por uma irreconhecível Naomi Watts ("Birdman"), "feia", boca suja e com um sotaque carregado.

Um dia Vincent  ganha vizinhos novos, a mãe solteira Maggie (Melissa McCarthy) e o filho dela, Oliver (Jaeden Lieberher). Maggie trabalha até tarde em um hospital e não tem com quem deixar Oliver depois da escola. Precisando de dinheiro, Vincent se oferece para ser "babá" do garoto. É bastante duvidoso que uma mãe deixaria o filho nas mãos dele, mas a relação entre Vincent e o menino, principalmente por mérito de Bill Murray, é engraçada e frequentemente tocante. Escrito e dirigido por Theodore Melfi (em seu primeiro longa metragem), "St. Vincent" é um filme pequeno e despretensioso, o que é bem vindo.


Se ele pode ser acusado de alguma coisa (e realmente pode) é de sentimentalismo. Há uma subtrama envolvendo a esposa de Vincent (que tem Alzheimer) que poderia estar em outro filme. Vincent visita a mulher em uma casa de repouso e só consegue conversar com ela se fazendo passar por médico, já que ela não o reconhece. O homem mal humorado desaparece e surge um marido com o coração partido e completamente devotado à esposa. Ponto para Bill Murray por conseguir fazer com que as contradições do personagem pareçam plausíveis. O modo como ele olha para a mulher conta histórias inteiras.

Há várias semelhanças com "Gran Torino", em que Clint Eastwood também interpreta um velho turrão que não quer contato com ninguém. O final, bastante açucarado, também é bastante previsível, o que não é ruim, mas o filme funciona melhor quando mostra o mundo de forma irônica.

João Solimeo
Câmera Escura