terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Django Livre

Quentin Tarantino continua fazendo seu tipo característico de cinema, parte paródia, parte homenagem. Desde "Cães de Aluguel" (1992), passando por "Pulp Fiction" (1994), "Jackie Brown" (1997), "Kill Bill" (2003 e 2004), "À prova de  morte" (2007) a "Bastardos Inglórios" (2009), Tarantino recriou e reciclou filmes de guerra, artes marciais, "blacksploitation", etc. Com "Django Livre", a coisa fica ainda mais complicada. É um "faroeste", mas não do tipo feito por mestres como John Ford. "Django Livre" é a paródia da paródia, um filme americano ao estilo dos "faroestes spaghetti" feitos pelos italianos nas décadas de 1960 e 1970. Tarantino inclusive "empresta" o título, os letreiros iniciais e até a trilha sonora de "Django" (1966), filme de Sergio Corbucci com Franco Nero (assista aqui). Nero, aliás, aparece em uma ponta rápida.

Django (Jamie Foxx) é um escravo que é liberto por um caçador de recompensas alemão chamado Dr. King Schultz (o ótimo Christoph Waltz, de "Bastardos Inglórios" e "Deus da Carnificina"). A princípio, Schultz precisa que Django reconheça um trio que ele está procurando, mas os dois acabam formando uma parceria. Schultz fica comovido com a história de Django, que quer encontrar a esposa e libertá-la. O alemão também fica impressionado pelo fato dela se chamar Broonhilda, assim como em um mito germânico. Schultz e Django matam uma série de criminosos na primeira parte do filme e então, após o inverno, partem para a fazenda de Calvin Candie (Leonardo DiCaprio), onde a esposa de Django supostamente está servindo como escrava. O filme tem ótimas cenas, como uma em que Schultz mata o xerife de uma cidadezinha e sai ileso após um discurso que faz ao delegado. Longos diálogos, aliás, são outra marca registrada de Tarantino, e podem ser tanto um deleite quanto um problema. Este é um filme com quase três horas de duração e parte se deve a cenas esticadas demais pelos diálogos. É de se estranhar, também, algumas repetições escritas por Tarantino; logo no início, quando é liberto por Schultz, Django monta em um cavalo e acompanha o alemão através de uma cidade, e a frase "nunca vi um negro montando a cavalo" é repetida diversas vezes. Outra frase usada por Django, quando se refere ao prazer de ganhar dinheiro por matar brancos, também é repetida algumas vezes. O filme também tem um sério problema de ritmo e montagem. Quando um grupo da Ku Klux Klan (a organização racista do sul dos Estados Unidos) ataca o acampamento em que o Dr. Schultz e Django estariam dormindo, por exemplo, a cena é cortada por um momento engraçado em que os homens encapuzados reclamam que não conseguem ver nada através das máscaras. Apesar de ser o momento mais cômico do filme, a cena não faz sentido como está montada. O final também sofre quando um banho de sangue, que deveria ser a conclusão da história, é interrompido desnecessariamente (para continuar uns 15 minutos depois). Vale citar que a editora de todos os filmes de Tarantino, Sally Menke, morreu em 2010 e foi substituída neste filme por Fred Raskin, que era assistente dela, o que pode explicar alguns dos problemas.

Fãs do diretor, no entanto, vão se deleitar. "Django Livre" é bastante violento, divertido, bem interpretado e tem ótimos momentos. O fato de Tarantino ter tratado de um tema delicado como a escravidão causou controvérsia; o diretor Spike Lee declarou que o filme é desrespeitoso com seus ancestrais e que a escravidão não era um faroeste italiano, mas um Holocausto. Deve-se levar em conta que o mundo retratado nos filmes de Tarantino não é o real, mas sim uma realidade alternativa criada por sua imaginação. Interessante também o fato de que nada menos que três grandes produções de Hollywood neste ano ("Django", "Lincoln" e "A Viagem") tenham usado o tema da escravidão. "Django Livre" está indicado aos Oscar de Melhor Filme, Melhor Fotografia (Robert Richardson), Melhor Ator Coadjuvante (Christoph Waltz), Melhor Roteiro Original (Quentin Tarantino) e Melhor Edição de Som (Wylie Stateman).

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