domingo, 13 de agosto de 2023

Império da Dor (Painkiller, 2023)

Império da Dor (Painkiller, 2023). Dir: Peter Berg. Netflix. Minissérie em seis capítulos que mostra as origens da epidemia de opioides que atingem os EUA. "Opioide" é uma droga sintética baseada nos compostos da morfina e heroína. Nos anos 1990, a empresa Purdue Pharma lançou um analgésico chamado OxyContin que se tornou um fenômeno de vendas. Sua fórmula era basicamente a mesma da heroína, mas a droga era vendida como um remédio milagroso que era mais seguro do que os outros e prometia trazer vida nova a pacientes com dor. O problema é que não foram feitos estudos relacionados à dependência e abuso do remédio (ou melhor, os estudos foram escondidos das autoridades reguladoras e aprovados com propinas). O resultado foram milhares de pessoas viciadas no composto. Famílias foram destruídas e pessoas morriam de overdose diariamente.


A minissérie é contada a partir do ponto de vista de uma investigadora da promotoria chamada Edie Flowers (Uzo Aduba, muito bem). Investigando o que acreditava serem fraudes médicas, Edie descobriu que o OxyContin estava sendo prescrito pelos médicos aos milhares. Matthew Broderick, o eterno Ferris Bueller, interpreta aqui um sujeito asqueroso chamado Robert Sackler, o presidente da Purdue Pharma. Robert aprendeu com o tio, Arthur Sackler (Clark Gregg), a vender drogas com uma estratégia de marketing que envolvia contratar garotas jovens e bonitas que convenciam centenas de médicos a prescrever OxyContin. O modelo de negócio recompensava com bônus, carros de luxo e apartamentos os vendedores que conseguissem convencer os médicos a aumentar cada vez mais a dose do remédio. Quando pacientes começaram a se viciar ou morrer, a empresa alegava que viciados sempre existiram e não era culpa da Purdue se eles abusavam do remédio.

Cada episódio começa com a declaração de uma pessoa real dizendo que a série modificou alguns fatos por motivos dramáticos; então a pessoa mostra a foto de algum ente querido que morreu em decorrência do uso de OxyContin. Há vários momentos em que a série é superficial ou irônica demais por motivos dramáticos mas, no geral, ela pinta um retrato bem assustador do poder das empresas farmacêuticas, que basicamente são traficantes legais de drogas. Tá na Netflix. PS: a série foi baseada em um longo e ótimo artigo do "The New Yorker" chamado "The Family That Built an Empire of Pain", que vale muito a leitura.

Paraíso (Paradise, 2023)

Paraíso (Paradise, 2023). Dir: Boris Kunz. Netflix. Ficção-científica alemã que lembra bastante a premissa de "O Preço do Amanhã" (2011, Andrew Niccol). Em um futuro próximo, um procedimento médico permite que as pessoas vendam anos da vida delas para os super ricos que, assim, permanecem sempre jovens. A estrela da empresa é Max (Kostja Ullmann), que tem a vida perfeita com a esposa, Elena (Marlene Tanczik). Só que um incêndio destrói o apartamento deles e a companhia de seguros se recusa a pagar. A única saída é Elena vender 40 anos da vida dela para pagar a dívida, o que destrói o casal.

Há várias boas ideias aqui e a produção é bem feita. A criação de mundo é interessante e claro que há uma simbologia no fato dos ricos literalmente sugarem a vida dos pobres em troca da juventude eterna. Há um grupo terrorista chamado "Adão" que promete assassinar todos as pessoas que se beneficiarem do procedimento, que eles consideram blasfemo. Como disse, a ideia já foi explorada por Andrew Niccol (de "Gataca") em "O Preço do Amanhã", em que o Tempo era uma espécie de moeda corrente que era vendida ou trocada entre as pessoas, separadas em castas.

O filme dá uma derrapada no terceiro ato. Há uma cena de tiroteio muito mal filmada entre mercenários da empresa farmacêutica e os "terroristas" do grupo Adão. A motivação dos personagens também muda conforme o vento e o final deixa bastante a desejar. Talvez funcionasse melhor como um episódio de uma hora de "Black Mirror" mas, sendo uma produção da Netflix, até que o resultado é melhor do que o esperado.

domingo, 6 de agosto de 2023

A Vida Depois (The Fallout, 2021).

A Vida Depois (The Fallout, 2021). Dir: Megan Park. HBO Max. Filme bonito e muito sensível sobre um assunto bastante comum nos últimos anos (infelizmente). Duas adolescentes estão no banheiro de uma escola de ensino médios dos EUA quando escutam tiros vindos do corredor. As duas se escondem em um box e a câmera nunca sai delas; ouvimos os tiros continuando no corredor, os gritos de desespero e, minutos depois, a polícia, tudo do ponto de vista das garotas (e de um rapaz, que entra no meio do tiroteio).
É mais um dia nas escolas dos Estados Unidos, mas este filme foca nos sobreviventes e como eles enfrentam as semanas seguintes. Jenna Ortega (famosa por "Wandinha") está excelente como uma das garotas, Vada. Ela é esperta, natural e completamente a vontade na pele da adolescente (Ortega já tinha quase 20 anos quando fez o filme, mas a personagem dela tem 16 e, francamente, ela parece ter uns 13). A outra garota da cena inicial é completamente diferente de Vada; Mia (Maddie Ziegler) é alta, bonita e uma "influencer" com milhares de seguidores no Instagram. Enquanto Vada tem família, com pai, mãe e uma irmã mais nova para lhe darem suporte (embora eles não saibam exatamente como agir), Mia parece popular mas é solitária e mora em uma casa grande, cheia de objetos de arte, mas os pais estão sempre viajando pela Europa (e não voltam nem depois do tiroteio).

Vada e Mia acabam engatando uma amizade gerada pelo trauma e pela necessidade de apoio. Há cenas inocentes delas vendo TV e dançando juntas, mas há também álcool e drogas envolvidas (e confesso que é meio estranho ver Ortega, com o rosto de uma criança, fazendo essas coisas). A personagem dela tenta lidar com o trauma como pode, inclusive ficando confusa sobre seus sentimentos tanto por Mia quanto por Quinton (Niles Fitch), um garoto que também sobreviveu ao ataque. Shailene Woodley (da série "Divergente"), que até um tempo atrás fazia papéis de adolescente, faz uma participação aqui como uma psicóloga. Um bom filme, bem interpretado e dirigido com sensibilidade. Disponível na HBO Max. 

sábado, 5 de agosto de 2023

Sunshine: Alerta Solar (Sunshine, 2007)

Sunshine: Alerta Solar (Sunshine, 2007). Dir: Danny Boyle. Star+. Muito curioso rever este filme depois de ter assistido "Oppenheimer". Cillian Murphy, na época com 30 anos (mas parecendo ter 22), interpreta o físico de uma nave que está a caminho do Sol. A carga é uma bomba atômica "do tamanho de Manhattan", como diz uma narração. Cillian é o cientista responsável pela bomba e o único que sabe ativá-la, quando chegaram ao Sol. O objetivo é dar um "restart" na estrela, que está morrendo e ameaça matar a todos na Terra. Não sei se Christopher Nolan gosta deste filme, mas há várias cenas que me lembraram "Oppenheimer".
Eu vi "Sunshine" nos cinemas, há mais de 15 anos. Eu me lembro de ter achado o filme intrigante, mas pesado e exagerado. Ele melhorou muito nesta revisão. O elenco, além de Murphy, é ótimo e tem futuras estrelas da Marvel como Chris Evans e Benedict Wong, além de Michelle Yeoh, Mark Strong, Hiroyuki Sanada e Rose Byrne. O roteiro é de Alex Garland, que depois faria o ótimo "Ex-Machina". O filme tem um visual deslumbrante, cheio de vermelhos e laranjas, conforme a nave vai se aproximando do Sol. Há todo um lado filosófico e psicológico sobre os efeitos da luz na mente das pessoas. O psicólogo da nave (Cliff Curtis), passa horas no observatório observando a estrela.

O terço final fica cada vez mais inacreditável, mas me parece que Garland e Boyle estão mais interessados no lado poético/filosófico do que no verossímil. Há, claro, influências de "2001", de Kubrick, e "Solaris", de Tarkovski. Conforme a nave se aproxima do Sol, mais a luz aumenta e o filme toma ares de pesadelo ou delírio. Como disse, várias cenas do Sol e/ou atividade atômica que, somadas à imagem de Cillian Murphy, lembram muito "Oppenheimer", e "Sunshine" pode fazer uma interessante sessão dupla com ele. Disponível na Star+. 

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Rei dos Clones (King of Clones, 2023)

Rei dos Clones (King of Clones, 2023). Dir: Aditya Thayi. Netflix. Documentário interessante, mas um tanto superficial, sobre um cientista da Coréia do Sul chamado Hwang Woo-Suk. Especialista em células tronco, ele se tornou uma "celebridade" em seu país por causa de avanços do controverso campo da clonagem. Logo no começo descobrimos que, depois do sucesso, ele caiu em desgraça e foi preso por fraude e questões éticas. Hoje, no entanto, ele ainda é um dos principais expoentes no assunto e ganha fortunas clonando camelos de corrida nos Emirados Árabes ou animais de estimação para clientes ricos mundo afora. Um italiano fala sobre como se apegou ao seu buldogue francês e ficou devastado quando ele morreu de um tumor. O filme tem uma cena estranha que mostra o italiano enterrando o cachorro no jardim enquanto, ao seu lado, o clone do animal brinca e pula alegremente.

O que fica em aberto no documentário é até que ponto a clonagem humana (teoricamente) não foi para frente por questões éticas ou se foi algum impedimento científico mesmo. No começo dos anos 2000, Hwang Woo-Suk fazia promessas duvidosas a cadeirantes e outras pessoas com problemas físicos, dizendo que as faria andar novamente. Até o eterno Superman, Christopher Reeve, havia ouvido falar no médico "milagroso" coreano, que recebia milhões de dólares em investimento governamental e privado. É fato que os métodos do cientista eram questionáveis e ele gostava um pouco demais da fama que tinha; o caso é que ele não prometia clonar seres humanos, mas criar embriões que poderiam ser usados para gerar "órgãos de reposição" para seus doadores. Houve forte resistência internacional pelo medo da criação de "seres híbridos" e outras aberrações, mas qual o limite ético para a medicina? O documentário não explora muito as questões que levanta. Tá na Netflix.