quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Também a Chuva

Sebastián (Gael Garcia Bernal) é um cineasta que quer filmar a chegada de Cristóvão Colombo à América. Idealista, quer mostrar a exploração feita pelos europeus aos povos indígenas. Seu produtor, Costa (Luis Tosar), levou toda a equipe para filmar em Cochabamba, Bolívia, pois a mão-de-obra é praticamente de graça. De fato, a primeira cena do filme mostra uma fila enorme de moradores locais tentando uma vaga como figurante no filme de Sebastián. Um deles, Daniel (Juan Carlos Aduviri), causa confusão quando os produtores dizem que não há mais vagas. Sebastián gosta do jeito do rapaz e o contrata, junto com a filha pequena, para o filme.

"Também a Chuva", dirigido por Icíar Bollaín, é metalinguístico, quando um filme fala sobre a feitura de outro. O recurso é interessante e serve para mostrar os bastidores do cinema, mas este traz uma particularidade: além do recurso do filme dentro do filme, "Também a Chuva" serve para mostrar sensível paralelo entre a exploração dos conquistadores espanhóis do século 16 e dos cineastas espanhóis do século XX. Os figurantes locais, por exemplo, são contratados por míseros dois dólares por dia, enquanto a equipe européia toma champanhe e se hospeda em hotéis caros. Há cenas muito inteligentes; quando o ator que interpreta Colombo (Karra Elejalde) está ensaiando uma cena no jardim do hotel, por exemplo, ele se aproxima de uma empregada local (com rosto indígena) e retira o brinco dela, dizendo "Ouro! Onde encontrou isso?". Por um momento, o espectador fica sem saber onde termina o filme histórico e começa o filme contemporâneo. A confusão, proposital, continua por toda a produção e é interessante como várias cenas do passado da América são ecoadas no presente.

Além disso, a trama se passa durante a chamada "guerra da água" ocorrida na Bolívia no ano 2000. O governo fez um acordo com a companhia americana Bechtel Corporation, privatizando toda a água da região. A empresa fez melhorias, mas a população local não tinha como pagar os serviços, que sofreram um aumento de 300%. Era considerado ilegal abrir um poço ou até mesmo coletar a água da chuva. Daniel é um dos líderes do movimento de resistência contra a privatização da água, o que causa preocupação aos produtores. Eles até tentam suborná-lo, oferecendo 10 mil dólares para ele deixar de participar das manifestações que estão pipocando pela cidade. Seu personagem, um índio chamado Hatuey, é muito importante para que ele coloque o filme em risco. Conforme o tempo passa, o idealista diretor Sebastián e o ganancioso produtor Costa vão trocando de papel. Costa começa a perceber os problemas locais enquanto Sebastián só está preocupado com seu filme.

"Também a Chuva" foi o filme escolhido pela Espanha para tentar uma vaga ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2011. É uma bela produção muito bem escrita por Paul Laverty, e mostra como quinhentos anos de colonização não mudaram muita coisa.


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Gainsbourg - O Homem que Amava as Mulheres

Você já escutou esta música. As notas graves da guitarra dão lugar a uma melodia suave, acompanhada por sussurros que parecem ter sido gravados durante o momento íntimo de um casal. "Je T ´aime...moi non plus", de Serge Gainsbourg, foi um escândalo ao ser lançada em 1969 e chegou a ser proibida em vários países. A não ser por esta canção, porém, Gainsbourg não é muito conhecido fora da França, seu país de origem. Pintor, desenhista, escritor, músico, cineasta e boêmio profissional, Gainsbourg teve uma vida cercada de sucessos e polêmicas. Seu talento multimídia foi transformado agora em filme pelo cartunista francês Joann Sfar, que tentou ser tão anárquico quanto o personagem.

O melhor elogio que se pode fazer a "Gainsbourg - O Homem que Amava as Mulheres" (no subtítulo infeliz escolhido no Brasil) é sobre o quanto os atores são parecidos com as pessoas que estão representando. A começar pelo próprio Gainsbourg, replicado à perfeição por Eric Elmosnino, que ganhou o prêmio "César" pelo papel. Muito bem representadas também estão figuras como a deusa francesa Brigitte Bardot (Laetitia Casta), a inglesa Jane Birkin (Lucy Gordon) ou mesmo a filha de Serge, Charlotte (Orphée Silard).

A trama acompanha a vida de Gainsbourg (nascido Lucien Ginsburg) desde a infância; o pai o forçava a tocar piano e o garoto já provocava polêmica por desenhar mulheres nuas nos cadernos dos colegas da escola. Quando os nazistas invadiram a França e os judeus foram obrigados a usar a Estrela de Davi no ombro, o pequeno Lucien foi o primeiro da fila. O fato de ser judeu e ter as feições exageradas fizeram com que o garoto criasse um companheiro imaginário na forma de uma enorme cabeça caricatural que o segue para todos os lados. A idéia pode dar certo em uma história em quadrinhos ou charge, mas a figura é muito entranha em um filme. Quando Gainsbourg se torna adulto, o companheiro imaginário ainda o segue, agora na forma de um homem alto, com orelhas e nariz compridos. Há cenas bizarras em que Gainsbourg conversa consigo mesmo (ou com a tal figura) e a seriedade do momento fica comprometida. A trilha sonora e as cenas musicais funcionam melhor em apresentar o talento de Serge e sua relação com as mulheres. "Je T´aime...", na verdade, foi composta com (e para) Brigitte Bardot, com quem Gainsbourg teve uma tórrida relação. Só que a atriz era casada e o romance terminou, fazendo com que Serge transferisse a música para sua próxima paixão, a atriz inglesa Jane Birkin. Gainsbourg também provocou a ira dos tradicionalistas ao fazer uma versão "jamaicana" da "Marselhesa", o hino da França.

Há boas cenas perdidas no filme de Joann Sfar que, no geral, é confuso. Mas o tom cartunesco é bem vindo por subverter a fórmula tradicional das cinebiografias de artistas, que sempre seguem a lógica do "desconhecido que alcança a fama, se entrega às drogas e mulheres e entra em decadência". Mas se o espectador fica conhecendo mais sobre a obra de Gainsbourg depois de ver o filme, o personagem ainda é um enigma. Tudo parece vir muito fácil para o homem pequeno e feio, mas talentoso, que se vê na tela. E o filme termina antes que outras polêmicas, principalmente envolvendo a filha Charlotte Gainsbourg, aconteçam na vida de Serge. Charlotte se tornou atriz e cantora de sucesso, interpretando em filmes como "Anticristo" e "Melancolia", de Lars von Trier, entre dezenas de outros. Gainsbourg, expert em criar polêmicas, gravou com a filha de 13 anos "Lemon Incest", em que os dois são vistos deitados na mesma cama, ele sem camisas, cantando um para o outro. Ao que parece, Serge Gainsbourg foi provocador até o fim. Morreu de ataque cardíaco em 1991.

sábado, 20 de agosto de 2011

A Árvore da Vida

Quem somos nós? De onde viemos? Para onde vamos? Deus existe? E se existe, como pode permitir que coisas ruins aconteçam? Estamos sós no Universo? O que é estar vivo, afinal? Estas são as perguntas básicas que os seres humanos fazem desde o início dos tempos, e campos de conhecimento como a filosofia, a psicologia ou as religiões tentam responder. São questionamentos fascinantes mas, também, extremamente básicos, e lidar com eles pode resultar em obras baratas de auto-ajuda ou em obras-primas. O diretor Terrence Mallick não se intimidou e fez um filme que é extremamente pretensioso, sim, e lembra os tempos em que diretores como Stanley Kubrick não tinham medo de desafiar o público. Curioso também que o filme de Mallick tenha sido produzido e lançado praticamente no mesmo período que Melancolia, de Lars von Trier, e é uma experiência singular vê-los com poucas semanas de diferença. Há várias ligações, tanto temáticas quanto visuais, entre as duas obras.

A Árvore da Vida era um projeto antigo de Terrence Mallick que, como diretor, se dá ao luxo de só produzir quando está absolutamente pronto para um projeto. O enredo pode ser descrito em poucas palavras. Uma típica família americana do pós guerra perde um de seus três filhos quando ele tem 19 anos. A morte do rapaz provoca reações de dor, consusão, revolta e questionamentos. Mallick, auxiliado pela espetacular fotografia de Emmanuel Lubezki, filma quase tudo com lentes grande angular montadas em câmeras que se movimentam constantemente. Não é aquela movimentação epilética e desnecessária dos filmes de Michael Bay; a câmera de Mallick é como um "espírito" percorrendo os cenários ou circulando os personagens. É, talvez, a visão de "Deus". Cada plano é como um pequeno filme acompanhado pela bela trilha sonora de músicas clássicas ou original, composta por Alexandre Desplat.

Os questionamentos da mãe (Jessica Chastain, sublime) a Deus e ao próprio Universo levam a um flashback que literalmente transporta o espectador para a origem dos tempos. Uma sequência claramente baseada em 2001 enche a tela de galáxias e aglomerados estelares, com efeitos especiais produzidos, em parte, por Douglas Trumbull (lendário técnico de filmes como 2001, Contatos Imediatos do Terceiro Grau e Blade Runner, entre outros). Vale repetir, Mallick não tem medo de ser pretensioso. O resultado é uma obra que, para surpresa negativa de vários frequentadores dos cinemas de shoppings, está longe de ser "um filme do Brad Pitt". É mais apropriado classificar A Árvore da Vida como um filme experimental, uma obra audiovisual que lembra Koyaanisqatsi (de Godfrey Reggio) e Baraka (de Ron Fricke), compostos inteiramente por imagens e música. A diferença é que, ao contrário dos exemplos citados, há um lado humano bastante presente no filme de Mallick. A típica família americana dos anos 50 é representada pelo Sr. O´Brien (Brad Pitt), um self made man que trabalha duro, sustenta (e oprime) a esposa e tenta ensinar aos três filhos o que é "ser homem". Não é uma tarefa fácil. Jack (Hunter McCraken), o filho mais velho, tem que lidar com a rididez do pai e com as dificuldades de se tornar adulto. A Sra. O´Brien, a mãe, é quase uma irmã para os três filhos homens, mas carrega aquela sabedoria e amor que só a maternidade ensina.

Falar mais é desnecessário. "A Árvore da Vida" deve ser mais sentido do que explicado. Não é um filme fácil e Mallick se equilibra em uma linha tênue entre o sublime e o patético. Na comparação com Melancolia, o filme de Terrence Mallick é mais esperançoso, embora também mostre como o Universo, ou a Natureza, ou Deus, ou seja lá como se pode nomear o grande mistério da existência, é ao mesmo tempo generoso e implacável. Seja você humano ou um ser pré-histórico, recém saído do mar e dando os primeiros passos na areia.


domingo, 14 de agosto de 2011

Super 8

Nos anos 60, nos Estados Unidos, um garoto "nerd" chamado Stevie pegou a câmera de 8 milímetros do pai e começou a fazer imagens com ela. Umas das primeiras foi um acidente de trem feito com um modelo; Stevie faria uma série de filmes de guerra, terror e ficção-científica com os amigos da escola. Com estas obras debaixo do braço, mais um curta metragem em 35mm chamado "Amblin", Stevie (sobrenome Spielberg) visitou os estúdios da Universal, em Hollywood, e se tornou o diretor mais jovem contratado pelo estúdio. Ou assim conta a lenda. O fato é que o Super-8, a menor bitola da película cinematográfica (que tem geralmente 35mm no cinema profissional) foi a escola de muitos diretores, como Spielberg, George Lucas, Martin Scorsese, James Cameron e tantos outros. Em uma época pré "home video" e décadas antes das câmeras digitais, era com o Super-8 que as famílias registravam seus aniversários e viagens e os futuros cineastas aprendiam a disciplina de filmar com cartuchos que duravam no máximo três minutos.


Corte para o Século XXI. Um diretor "nerd" chamado J.J. Abrams (de "Lost" e "Star Trek") propôs ao diretor Steven Spielberg uma parceria. O resultado, "Super 8", é uma bem intencionada homenagem não só ao formato de filmes caseiros mas, antes de tudo, ao cinema de Steven Spielberg. Há várias citações ao "mestre da fantasia" (como já foi chamado Spielberg), como o roteiro passado em uma cidade pequena, garotos andando de bicicleta, raios de luz cruzando a tela e um mistério que pode, ou não, ter vindo do espaço. Vale dizer que, por mais bem intencionada que seja a produção, a obra fica um pouco aquém do esperado.


Em 1979, com a chegada das férias de verão, o garoto Joe Lamb (Joel Courtney) e um grupo de amigos resolvem fazer um filme de zumbis. Joe está animado com a perspectiva de trabalhar com a bela Alice Dainard (a precoce Elle Fanning, de 13 anos), que aceitou fazer um papel. Uma noite todos vão à estação de trem da cidade para filmar uma cena e então (em clara citação a Steven Spielberg) testemunham um espetacular acidente entre um trem e uma caminhonete. A cena, diga-se de passagem, é a melhor do filme, e os efeitos sonoros foram feitos por Ben Burtt (antigo colaborador de Lucas e Spielberg). Nos destroços do trem os garotos encontram centenas de estranhos cubos brancos, e Joe vê que "alguma coisa" foge de um dos vagões. Os garotos pegam a câmera de Super-8 (que havia filmado o acidente) e desaparecem do local logo antes da chegada de um grupo do exército. O acidente e a presença do exército mudam a rotina da pequena cidade de Lilian, Ohio. Coisas estranhas começam a acontecer; os cachorros fogem; motores e aparelhos elétricos desaparecem misteriosamente; a eletricidade falha. De tantos em tantos minutos, em cenas coreografadas para que o espectador não veja o que está acontecendo, pessoas são atacadas por "algo". O que está acontecendo?


J.J. Abrams é bom diretor ("Star Trek" é impecável) mas está longe de ser um Spielberg na hora de lidar com cenas de ação ou emoção. "Super 8" flui bem quando foca nos garotos fazendo seu filme de zumbis ou vagando pela cidade, mas certas nuances escapam às mãos do diretor. A relação entre Alice e Joe poderia render muito mais, até porque falta ao jovem ator o que sobra de talento em Fanning. Em uma cena em que os dois estão vendo imagens em Super-8 da mãe de Joe, por exemplo, Alice se emociona e chora de verdade enquanto o garoto não demonstra nada. E por que será que Abrams é obcecado por monstros escondidos? Assim como em "Lost" e em "Cloverfield" (produzidos por ele), a criatura em "Super 8" permanece invisível por quase todo o filme. Isso é interessante para criar suspense, sim, mas após certo tempo o recurso acaba cansando (e, assim como em "Cloverfield", quando é revelado, o monstro parece mais feio do que realista).


Com citações a "Tubarão", "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", "Os Goonies", "E.T. O Extraterrestre", entre outros, sobram homenagens mas falta um pouco de talento ao filme de Abrams. "Super-8" está pronto para uma boa "Sessão da Tarde", mas nada além. Imperdível: durante os créditos, o filme de zumbis que os garotos estavam fazendo é exibido na íntegra.


sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Melancolia

"Melancolia" é uma criação estranha e bela do dinamarquês Lars von Trier. Ele tem uma legião de seguidores (e detratores) do seu cinema provocador e irregular, e gosta de ousar brincando com gêneros (o musical "Dançando no Escuro", o terror de "Anticristo") ou linguagens (o teatro filmado de "Dogville" e "Manderlay"). Com "Melancolia" ele cria uma obra inusitada, um "disaster movie psicológico". Algo como uma mistura entre o drama "Interiores", de Woody Allen e "Impacto Profundo", de Mimi Leder.

O filme é dividido em duas partes, "Justine" e "Claire", que são duas irmãs; a primeira parte se passa na festa de casamento de Justine (Kirsten Dunst) e Michael (Alexander Skarsgård). A recepção ocorre em um casarão afastado da civilização, em meio a uma floresta e um campo de golfe. Justine é um poço de contradições. Em um momento aparenta estar feliz com seu casamento e no momento seguinte entra em um estado de profunda depressão. A mãe (Charlotte Rampling) não acredita em casamentos e destila seu veneno sobre a filha. O pai (John Hurt) é um piadista que está permanentemente bêbado e alienado aos humores da filha. A irmã Claire (Charlotte Gainsbourg) mantém uma distância estudada do caos à sua volta, que ela tenta administrar organizando a festa de casamento, a irmã instável e o marido controlador, John (Kiefer Sutherland), que não cansa de dizer a fortuna que tudo aquilo está lhe custando. Nesta primeira parte, "Melancolia" se refere ao estado depressivo de Justine. É um "disaster movie" familiar, já que o casamento está em rota de colisão desde o primeiro minuto de projeção.

A segunda parte trata de Claire, que parece ser o lado mais centrado da família, mas as aparências enganam. Charlotte Gainsbourg, que já trabalhou com Trier em "Anticristo", é uma atriz fascinante; seu corpo pequeno e rosto quase infantil passam uma sensação de fragilidade que contrasta com a beleza sensual de Kirsten Dunst. A trama se passa na mesma casa da festa, talvez meses depois; Justine está no fundo do poço, tendo que ser cuidada como uma inválida pela irmã Claire e pelo cunhado John. Há uma quarta figura neste grupo fechado, Leo (Cameron Spurr), o filho pequeno de John e Claire. Chega a ser surpreendente o modo terno com que Trier apresenta o garoto, que é o próprio retrato na inocência. Na casa isolada estão todos pensando na mesma coisa: a aproximação de um planeta chamado Melancolia, que surgiu no Sistema Solar e, dizem os cientistas, vai passar muito próximo da Terra, sem causar danos. O que não impede de aterrorizar Claire, que acredita nos sensacionalistas da internet que dizem que Melancolia vai colidir com a Terra.

Trier se utiliza desta trama com moldes de ficção-científica para fazer um filme psicológico sobre as relações humanas e discutir nosso lugar no Universo. John (em boa interpretação de Sutherland) é o típico "homem renascentista", que tem fé na ciência e um entusiasmo quase infantil (que divide com o filho pequeno) com relação à Astronomia. Ele está constantemente acalmando Claire e agindo como se algo tão bonito e fascinante como Melancolia fosse incapaz de causar mal. Prático, ele compra mantimentos extras e iluminadores à gás para o casarão e passa horas com o filho observando o planeta por um telescópio no jardim. Há uma cena incrivelmente bela quando Melancolia surge no horizonte, como uma Lua gigantesca e azul, iluminando a noite com uma falsa alvorada. Mas será que o lindo planeta é mesmo inofensivo? Quanto mais ele se aproxima da Terra e dá sinais de que vai realmente colidir com o planeta, os personagens reagem de forma diferente. Justine, paradoxalmente, é a que enfrenta o destino de modo mais calmo, embora fatalista. "A Terra é má", diz ela. "Ninguém vai sentir nossa falta". Já Claire entra em desespero, preocupada com o destino do filho pequeno. John, o calmo homem da ciência, reage da forma mais egoísta de todos.

Tudo isso é filmado de forma extremamente bela. O início do filme é formado por vários planos em câmera lenta que mostram, de forma metafórica, tudo o que vai se seguir. Há uma cena de nudez de Kirsten Dunst, deitada na relva, observando Melancolia, que é como uma pintura. Todas estas cenas são acompanhadas do melancólico (com o perdão da palavra) tema de Tristão e Isolda composto por Richard Wagner. Pena que Lars von Trier, em uma atitude que lembra certas ações da personagem Justine, se boicotou durante o último Festival de Cannes, onde "Melancolia" foi exibido. Durante uma entrevista coletiva, Trier começou a divagar e, surpreendendo a todos, disse ser nazista e que "entendia Hitler". Ele foi expulso do festival (que premiou "A Árvore da Vida") e causou mal estar geral; há quem acredite que tenha sido um golpe de marketing. Independente disso, "Melancolia" é um filme bastante singular, de beleza ímpar.