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terça-feira, 4 de novembro de 2014

O Senhor das Moscas (Netflix)

O começo de "O Senhor das Moscas" ("Lord of the Flies", 1990), disponível no Brasil pela Netflix, parece uma daquelas aventuras infanto-juvenis escritas por Júlio Verne, como "Dois Anos de Férias" (1888). Um grupo de uns 20 garotos sobrevive a um acidente de avião e naufraga em uma ilha deserta. Aparentando ter no máximo 13 anos, os garotos estão todos vestindo uniformes de um colégio militar e, a princípio, agem com maturidade diante da tragédia. O tempo, as adversidades e principalmente a natureza humana vai mudar este quadro.

O filme, dirigido por Harry Hook, é baseado no famoso livro escrito pelo britânico William Golding em 1954. Ao contrário do otimismo apresentado pelo colega francês Júlio Verne, Hook escreveu "Lord of the Flies" no período pós 2ª Guerra Mundial, com o mundo dividido entre Ocidente e Oriente, na Guerra Fria. Em uma alegoria não muito sutil, o livro de Golding não vê o ser humano com muita esperança. As crianças, sozinhas na ilha e tendo que lutar para sobreviver, acabam aos poucos abandonando a civilização e regredindo a estágios primitivos. (mais abaixo)


Filmado na Jamaica com bela fotografia de Martin Fuhrer, o que mais impressiona na versão cinematográfica de Hook é o ótimo elenco infantil. O grupo acaba se dividindo entre a liderança natural de dois garotos, o idealista Ralph (Balthazar Getty) e o rebelde Jack (Chris Furrh). Ralph acredita na ordem e na civilização. Ele convoca assembleias para discutir os rumos da colônia de garotos, criando grupos de pesca e coleta de frutas. Ralph também organiza a manutenção de uma fogueira para tentar atrair a atenção de um possível resgate. Já Jack valoriza a liberdade e organiza grupos de caça aos porcos selvagens que existem na ilha.

O filme, a princípio, pode parecer um bom programa de aventura para crianças, mas atenção; o desenrolar da história leva a alegoria de Golding a caminhos extremos e muito violentos. Há uma cena particularmente perturbadora, envolvendo a morte de uma criança, que surpreende pela forma gráfica com que é mostrada. Cuidado, portanto, pais que pretendem ver o filme com os filhos. Disponível na Netflix.

Obs: Fãs da série de TV "Lost" vão reconhecer e achar curiosas as referências apropriadas pelos criadores da série, como a queda do avião em uma ilha, a caça aos porcos selvagens, a divisão dos sobreviventes em grupos distintos e até mesmo a presença (ou não) de um "monstro" misterioso na floresta.

João Solimeo
Câmera Escura

domingo, 14 de agosto de 2011

Super 8

Nos anos 60, nos Estados Unidos, um garoto "nerd" chamado Stevie pegou a câmera de 8 milímetros do pai e começou a fazer imagens com ela. Umas das primeiras foi um acidente de trem feito com um modelo; Stevie faria uma série de filmes de guerra, terror e ficção-científica com os amigos da escola. Com estas obras debaixo do braço, mais um curta metragem em 35mm chamado "Amblin", Stevie (sobrenome Spielberg) visitou os estúdios da Universal, em Hollywood, e se tornou o diretor mais jovem contratado pelo estúdio. Ou assim conta a lenda. O fato é que o Super-8, a menor bitola da película cinematográfica (que tem geralmente 35mm no cinema profissional) foi a escola de muitos diretores, como Spielberg, George Lucas, Martin Scorsese, James Cameron e tantos outros. Em uma época pré "home video" e décadas antes das câmeras digitais, era com o Super-8 que as famílias registravam seus aniversários e viagens e os futuros cineastas aprendiam a disciplina de filmar com cartuchos que duravam no máximo três minutos.


Corte para o Século XXI. Um diretor "nerd" chamado J.J. Abrams (de "Lost" e "Star Trek") propôs ao diretor Steven Spielberg uma parceria. O resultado, "Super 8", é uma bem intencionada homenagem não só ao formato de filmes caseiros mas, antes de tudo, ao cinema de Steven Spielberg. Há várias citações ao "mestre da fantasia" (como já foi chamado Spielberg), como o roteiro passado em uma cidade pequena, garotos andando de bicicleta, raios de luz cruzando a tela e um mistério que pode, ou não, ter vindo do espaço. Vale dizer que, por mais bem intencionada que seja a produção, a obra fica um pouco aquém do esperado.


Em 1979, com a chegada das férias de verão, o garoto Joe Lamb (Joel Courtney) e um grupo de amigos resolvem fazer um filme de zumbis. Joe está animado com a perspectiva de trabalhar com a bela Alice Dainard (a precoce Elle Fanning, de 13 anos), que aceitou fazer um papel. Uma noite todos vão à estação de trem da cidade para filmar uma cena e então (em clara citação a Steven Spielberg) testemunham um espetacular acidente entre um trem e uma caminhonete. A cena, diga-se de passagem, é a melhor do filme, e os efeitos sonoros foram feitos por Ben Burtt (antigo colaborador de Lucas e Spielberg). Nos destroços do trem os garotos encontram centenas de estranhos cubos brancos, e Joe vê que "alguma coisa" foge de um dos vagões. Os garotos pegam a câmera de Super-8 (que havia filmado o acidente) e desaparecem do local logo antes da chegada de um grupo do exército. O acidente e a presença do exército mudam a rotina da pequena cidade de Lilian, Ohio. Coisas estranhas começam a acontecer; os cachorros fogem; motores e aparelhos elétricos desaparecem misteriosamente; a eletricidade falha. De tantos em tantos minutos, em cenas coreografadas para que o espectador não veja o que está acontecendo, pessoas são atacadas por "algo". O que está acontecendo?


J.J. Abrams é bom diretor ("Star Trek" é impecável) mas está longe de ser um Spielberg na hora de lidar com cenas de ação ou emoção. "Super 8" flui bem quando foca nos garotos fazendo seu filme de zumbis ou vagando pela cidade, mas certas nuances escapam às mãos do diretor. A relação entre Alice e Joe poderia render muito mais, até porque falta ao jovem ator o que sobra de talento em Fanning. Em uma cena em que os dois estão vendo imagens em Super-8 da mãe de Joe, por exemplo, Alice se emociona e chora de verdade enquanto o garoto não demonstra nada. E por que será que Abrams é obcecado por monstros escondidos? Assim como em "Lost" e em "Cloverfield" (produzidos por ele), a criatura em "Super 8" permanece invisível por quase todo o filme. Isso é interessante para criar suspense, sim, mas após certo tempo o recurso acaba cansando (e, assim como em "Cloverfield", quando é revelado, o monstro parece mais feio do que realista).


Com citações a "Tubarão", "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", "Os Goonies", "E.T. O Extraterrestre", entre outros, sobram homenagens mas falta um pouco de talento ao filme de Abrams. "Super-8" está pronto para uma boa "Sessão da Tarde", mas nada além. Imperdível: durante os créditos, o filme de zumbis que os garotos estavam fazendo é exibido na íntegra.


segunda-feira, 24 de maio de 2010

LOST - The End

Acabou. Após seis anos de mistérios, especulações, viagens reais e imaginárias, mortes, renascimentos, mudanças no tempo e no espaço, a história dos passageiros do Vôo 815 da Oceanic finalmente chegou ao fim. O final, a bem da verdade, não explica muito (ou não explica tudo) o que realmente aconteceu nestas seis temporadas. E não poderia ser diferente. "Lost" sempre foi muito mais sobre os mistérios do que sobre as explicações, sobre as perguntas deixadas no ar que faziam a delícia (e agonia) de milhões de fãs no mundo todo.

"Lost" já foi muito bom e muito ruim. Em seu melhor, a série levantava questões sobre a natureza humana, sobre o poder do destino, sobre a validade da ciência contra o poder da fé, o valor da amizade e do companheirismo. Em seu pior, era uma história "nerd" que misturava civilizações egípcias com seres imortais vindos não se sabe de onde e uma "luz da vida" convenientemente criada nos últimos episódios para ajudar a "explicar" tudo. Em suma, "Lost" era uma série ótima quando tratava dos personagens, mas derrapava quando tentava explicar seu lado "nerd". Uma das melhores sacadas dos roteiristas, sem dúvida, foi saber usar do recurso do flashback como nunca. Ao jogar um grupo de personagens em uma ilha, a saída genial de dar cor e vida à série foi mostrar a vida pregressa de cada um deles através de uma série de engenhosos flashbacks, que não só mostravam quem era cada uma daquelas pessoas, como também criava curiosas conexões entre elas. A primeira (e melhor) temporada explorou como nunca o recurso, que ganhou uma "virada" também genial algumas temporadas depois, ao inverter a linha do tempo para o futuro na forma de flashforwards que mostravam os personagens fora da ilha. E que personagens. Jack (Mathew Fox), Kate (Evangeline Lilly), Sawyer (Josh Holloway), Sayid (Naveen Andrews), Hugo (Jorge Garcia), Jin (Daniel Dae Kim), Sun (Yunjin Kim), Locke (Terry O´Quinn), Claire (Emilie de Ravin), Charlie (Dominic Monagham), Desmond (Henry Ian Cusick)... nomes que, ano após ano, se tornaram parte do imaginário dos fãs e parte da "família" de "Lost".

Fica claro também que, ao contrário do que alguns fãs defendem, os roteiristas iam decidindo o caminho da série conforme o trilhavam. E mais, o próprio feedback dos fãs, em um volume inédito nesta era da internet, moldou o futuro da série. Mais do que espectadores, os fãs se tornaram verdadeiros co-autores de "Lost" ao discutirem, semana após semana, o que estava acontecendo e o que viria a acontecer com os personagens. É possível notar alguns caminhos experimentados pelos roteiristas conforme a série se desenrolava. Fica claro que, nas primeiras temporadas, "Lost" tinha tudo a ver com a "Iniciativa Dharma" e sua tentativa de "salvar o mundo" através da exploração dos "números malditos" (4, 8, 15, 16, 23, 42). Havia um clima que lembrava algum projeto secreto estilo "Projeto Manhattan" ou os anos paranóicos da Guerra Fria, principalmente na figura de Benjamin Linus (Michael Emerson) e sua vila. Mais tarde o rumo da série mudou para a figura misteriosa de "Jacob", que ninguém sabia exatamente quem era, mas que definitivamente não era a mesma "pessoa" que mostrariam depois. A série abraçou seu lado "nerd" de forma mais forte ao apresentar não só Jacob mas um "irmão" misterioso e, depois, uma "mãe" inexpicada e inexplicável. Pode ter funcionado para tentar solucionar vários mistérios da série mas, infelizmente, Jacob e companhia acabaram tirando perigosamente o foco dos personagens principais e, o que é pior, dava a impressão que eles eram indiferentes ao passado, presente e futuro da ilha.

Especulações, teorias, suposições, apostas... como explicar, afinal, "Lost"? A melhor saída, na verdade, é não explicar. Assim, me arrisco a dizer (e que caia a ira de vários fãs) que Damon Lindelof e Carlton Cuse, os produtores e roteiristas principais (apesar da publicidade concedida a J.J. Abrams) acertaram no capítulo final. Não, não há uma "explicação" definitiva. Entre o lado "nerd" e o lado humano, venceu este último, e o episódio final de mais de uma hora de duração é praticamente uma celebração aos personagens. Acabamos descobrindo que o tal "mundo paralelo", na verdade, não passava de um "não-lugar" que era fruto da imaginação dos personagens, todos mortos. Não significa, atenção, que eles estivessem mortos durante a série (uma das várias teorias sobre "Lost"). Como explica o pai de Jack, Christian, eles não morreram todos ao mesmo tempo, mas estão ali para "se lembrarem...e para deixarem para trás". É assim, na verdade, que deve ser encarado este último episódio da série. Ou mesmo, talvez, toda a sexta temporada. Foi uma temporada para que os fãs pudessem se lembrar dos personagens, de suas histórias, dos que morreram, renasceram, aprenderam a falar outra língua, voltaram a andar, se amaram ou se odiaram...e os deixar para trás.

Sim, é brega, é new age, é produto pop cultural disfarçado de filosofia barata. Mas assim foi "Lost" durante todos estes anos. Se não foi a melhor série de todos os tempos (para mim, o título pertence à "Jornada nas Estrelas" original dos anos 60), chegou bem perto. Com todas suas contradições e buracos do tamanho de crateras, "Lost" contou com histórias intrigantes e, muitas vezes, extremamente inteligentes. Misturou filosofia, antropologia e religião ("Christian Shephard?" pergunta Kate, irônica) com viagens no tempo, sexo, drogas e rock ´n roll, um bocado de violência e atores acima da média (marcados, provavelmente, para o resto de suas carreiras pelos personagens). Mas tudo chega ao fim.

É hora dos fãs deixarem "Lost" para trás.


terça-feira, 13 de abril de 2010

LOST e Cavalo-Marinho no Céu

por João Solimeo

Um grupo de passageiros de um avião se encontra, de repente, em um lugar isolado. Um deles acorda e não sabe direito onde está. Olha em volta e vê os outros passageiros do avião na mesma situação, desorientados. Alguns gritam, outros choram. Se, ao ler estas linhas, você pensou na abertura do seriado “Lost”, da ABC, não é o único. A surpresa, talvez, esteja em descobrir que se trata da abertura de um livro de ficção científica dos anos 60 escrito por Edmund Cooper (Inglaterra, 1926-1982), chamado “Cavalo-Marinho no Céu” (“Seahorse in the Sky”, 1969).

Li este livro nos final dos anos 80, e quando “Lost” foi lançado fiquei intrigado com as semelhanças. Nestes seis anos em que a série está no ar fiquei ainda mais intrigado pelo fato de que, a não ser por poucas referências na internet, a ligação entre livro e série não foi feita. Nem mesmo o site “Lostpedia”, um dos mais completos a respeito da série, cita o livro de Cooper. Sou fã da série, embora não possa ser considerado um "expert", mas as semelhanças listadas a seguir mostram como muitas das idéias presentes no seriado, sem dúvida, foram baseadas em “Cavalo-Marinho no Céu”.


Livro versus Série
No livro de Cooper, um avião saindo de Estocolmo, com direção a Londres, nunca chega a seu destino. Não há um acidente aéreo, mas os passageiros se lembram apenas de estarem em um avião em um momento e, no outro, estarem em um lugar completamente diferente. Dezesseis pessoas, oito homens e oito mulheres, acordam deitados no meio de uma rua, no meio do nada. Eles são de países diferentes, mas conseguem se entender. Estão isolados em uma rua que começa do nada e leva a lugar nenhum. Há um “Hotel” de um lado da rua e um “Supermercado” do outro. Em redor, há apenas mato.

Em “Lost”, um avião que ia da Austrália para os Estados Unidos nunca chega a seu destino. Há um acidente aéreo, mas os passageiros, a princípio, não conseguem se lembrar de nada. Jack, um médico, acorda em uma floresta, sem saber onde está ou o que aconteceu. Anda até uma praia onde encontra os destroços do avião e um grupo de pessoas desesperadas e confusas. Eles estão em uma ilha, sem possibilidade de fugir. Há 48 sobreviventes.

No livro de Cooper, aos poucos os passageiros do avião descobrem que estão em uma “ilha” no meio do nada, cercados por uma barreira feita por uma névoa fria e estranha. Também descobrem que dois outros grupos de 16 pessoas, em estágios evolutivos diferentes, estão na “ilha”. São, assim, três grupos de 16 pessoas, em um total de 48.

Na ilha de Lost, também há três grupos de pessoas. Há os sobreviventes do avião, há o grupo da vila e há os “outros” do templo.

No livro, comida aparece misteriosamente no “supermercado” do outro lado do Hotel. Na série, em uma das temporadas, comida da Iniciativa Dharma também aparece para os sobreviventes.

Na série, várias tentativas para sair da ilha são feitas, até que um grupo consegue finalmente sair. Três anos depois, eles retornam à ilha e, na sexta e última temporada, uma “realidade paralela” é criada.

No livro, após algumas tentativas de atravessar a “névoa”, um barco é construído e um grupo foge da “ilha” através do rio. Eles retornam três anos depois.

O final (leia sob sua conta e risco)

No livro, quando um grupo sai da “ilha” de névoa, encontram uma espécie de monumento abandonado. Lá eles descobrem que não passam de “cópias” de seus corpos originais, feitos por uma raça alienígena que morreu há muitos séculos. Este povo existe apenas como “fantasmas” que lembram a forma de cavalos-marinhos (por isso o nome do livro original) e que atravessaram o Universo para fazer cópias dos humanos e recriar sua espécie. Os extraterrestres fizeram uma cópia do avião, em pleno vôo, retiraram seus ocupantes e deixaram o avião original continuar sua viagem. O que significa que, assim como em Lost, duas realidades paralelas passam a existir. O livro termina com esta revelação e não mostra o que aconteceu aos passageiros originais, mas as “cópias” acabam se desenvolvendo e criando uma nova civilização.

O final da série está guardado a sete chaves na cabeça do atual responsável pela série, Damon Lindelof. Não me surpreenderia se descobríssemos que Jacob é um extraterrestre que veio à Terra para criar uma nova civilização usando “cópias” dos passageiros de um avião. Em maio, quando a série terminar, vamos descobrir, e atualizaremos este texto.

sábado, 9 de maio de 2009

Star Trek

"Space, the final frontier"... por qual outra frase começar um texto sobre "Jornada nas Estrelas" que não esta? Star Trek não é apenas uma série de ficção científica. Surgida nos anos 60, em plena corrida espacial, a série intergaláctica criada pelo ex-piloto militar e civil Gene Roddenberry se tornou um ícone. Roddenberry quebrou vários tabus, não só colocando uma mulher (uma mulher negra, ainda por cima) como membro de uma tripulação espacial, mas também um russo. Sua criação mais famosa, o vulcano Sr. Spock, com suas orelhas pontudas e sobrancelhas demoníacas, foi perseguido por várias instituições tradicionais, como a Igreja. Enquanto americanos e soviéticos brigavam em terra e no espaço durante a Guerra Fria, a tripulação mista da USS Enterprise semanalmente enfrentava dilemas morais (nos melhores episódios) ou, no mínimo, era uma boa e velha série de aventura espaço afora, a "última fronteira". A série original durou apenas três temporadas (entre 1966 e 1969), quando foi cancelada pela rede NBC. Mas com o sucesso de "Guerra nas Estrelas", de George Lucas, em 77, o elenco original da série partiu para a telona dos cinemas, rendendo lucros fabulosos para o estúdio Paramount e gerando vários outros produtos e novas séries de televisão. Os "trekkers", como são chamados os fãs do universo Star Trek, a tratam quase como uma religião e realizam convenções no mundo inteiro, muitas delas com a presença dos atores da série e dos filmes originais.

Com o envelhecimento e morte de vários destes atores e uma queda na popularidade dos filmes feitos para o cinema, decidiu-se por uma reformulação da franquia e por uma manobra ousada; Star Trek voltaria à origem dos personagens da série clássica, agora interpretados por atores jovens, repaginados e prontos para o século XXI. A idéia, a bem da verdade, não é nova. Em seu livro "Memórias dos Filmes", William Shatner (o capitão James T. Kirk original) revela que após "Jornada nas Estrelas V: A Última Fronteira" (1989), o produtor Harve Bennet começou a desenvolver um filme em que atores jovens viveriam os personagens antes de se tornarem membros da Enterprise. Mas a idéia foi abandonada e a tripulação original voltou em "Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida" (1991). Depois disso os membros da série "A Nova Geração" passaram a habitar a telona e a idéia de Bennet foi posta de lado pelos produtores.

Coube ao criador da série "Lost", J.J. Abrams, a missão de retomar a franquia do zero. O resultado é um filme ótimo, que consegue não só mostrar a origem dos personagens como, através de um "truque" da ficção-científica, dar ao roteiro uma trama surpreendente. Ao contrário do caráter previsível que atrapalhou séries como "Star Wars" ou o novo "Wolverine", no "Star Trek" de Abrams tudo pode acontecer, graças a uma "mudança temporal" que ocorre no início. Esse recurso cria uma espécie de universo paralelo em que o destino dos personagens clássicos Kirk, Spock, McCoy, Sulu, Chekov, Uhura e Scott pode ser reinventado ao gosto dos roteiristas. James T. Kirk (Chris Pine, substituindo William Shatner) é mostrado como um rapaz revoltado de Iowa, órfão do pai que morreu heróicamente durante uma batalha com os Romulanos. Spock (Zachary Quinto, incrivelmente parecido com Leonard Nimoy) sofre com sua genética mista, humana (emocional) e vulcana (lógica). Os dois vão parar na Academia da Federação dos Planetas Unidos, onde vemos como Kirk consegue passar no teste do "Kobayashi Maru", uma simulação teoricamente impossível de vencer criada pelo jovem Spock. Ao longo da trama vemos também Leonard McCoy (Karl Urban) e uma bela e sexy Uhura (Zoe Saldana), que vai mexer com o coração mulherengo de James Kirk. E é surpreendente ver como o novo elenco consegue recriar uma das chaves do sucesso da série clássica, a "química" existente entre William Shatner, Leonard Nimoy, DeForest Kelley e os outros membros da Enterprise.

"Star Trek" é suficientemente bom para interessar a quem não tem conhecimento anterior da série. O próprio J.J. Abrams não era profundo conhecedor do universo trekker. O que não significa que os fãs não irão reconhecer dezenas de ótimas referências, desde o design dos uniformes, naves e armas aos efeitos sonoros inconfundíveis como o teletransporte, o comunicador, o sinal de alerta e outros. A produção tem um curioso design que mistura modernidade com o ar "retrô" dos episódios dos anos 60. Mas a cereja do bolo realmente é participação especial de Leonard Nimoy, o Spock original. Nimoy se tornou mundialmente conhecido por causa do personagem, o que inclusive lhe causou problemas profissionais e psicológicos no início da carreira. Ele chegou a escrever um livro chamado "Eu não sou Spock" e foi o último ator a aceitar voltar ao elenco quando a série passou para o cinema, nos anos 70. Com o passar dos anos, no entanto, Nimoy se tornou o "portador da chama" de Star Trek, tendo inclusive dirigido dois dos melhores filmes para o cinema, "Jornada nas Estrelas III: À Procura por Spock" (1984) e "Jornada nas Estrelas IV: A Viagem para Casa" (1986). Sua presença no novo "Star Trek" é como o "selo de qualidade" que faltava para dar autenticidade ao filme e desejar sorte ao novo elenco.

Assim, "Star Trek" ressurge como um dos melhores filmes de ficção-científica dos últimos anos, homenageando o passado com respeito e pavimentando o caminho para uma nova série de filmes. Vida longa e próspera.

Câmera Escura