segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Confisco (2021)

Confisco (2021). Dir: Ricardo Martensen e Felipe Tomazelli. HBO Max. Documentário que tenta mostrar as consequências do Plano Collor (março de 1990), que confiscou o dinheiro das cadernetas de poupança e investimentos acima de 50 mil cruzados novos (dinheiro da época), jogando o país no caos. O objetivo era derrubar uma inflação galopante que fazia com que as lojas mudassem os preços diariamente, as maquininhas de etiquetar funcionando a todo vapor.

Para tentar humanizar a história, o documentário foca em duas famílias: a da ex-ministra Zélia Cardoso de Mello (uma das idealizadoras do plano) e de uma família "típica" brasileira. A ex-ministra mora em Nova York e é vista em atividades do dia a dia como caminhando no Central Park ou assistindo a um jogo da seleção brasileira com a família. Do outro lado, a família de Dorival Silva lembra o baque que o plano causou aos negócios e à vida em casa. Dorival havia trabalhado anos como caminhoneiro e, com muito suor, havia crescido, comprado outros caminhões e planejava uma aposentadoria tranquila. Às vésperas do plano econômico, Dorival havia vendido uma casa e um caminhão e colocado tudo no banco. Fernando Collor era visto como a salvação do Brasil contra a ameaça vermelha do PT (história familiar?) e estava sempre na TV com o apelido de "caçador de marajás".

A jornalista Lillian Witte Fibe, uma das entrevistadas, diz que ninguém conseguiu entender o plano, quando ele foi lançado. Segundo ela, a ministra Zélia Cardoso parecia muito tranquila quando foi dar entrevista na Globo e até teria feito piada sobre pegar o dinheiro de todo mundo; mas não soube explicar o plano na TV. Jornalistas como Joelmir Betting e Paulo Henrique Amorim são vistos tentando explicar as medidas econômicas.

O documentário peca em não mostrar melhor as consequências do confisco. Apesar da história da família de Dorival, seria interessante ver outros exemplos de como o dia a dia da população foi afetada. Há imagens de correria aos bancos e manchetes que falam até em suicídio, mas nada muito aprofundado. Quando a Zélia Cardoso de Melo, hoje ela diz que deveria ter recusado o cargo e "deixado um homem fazer este plano". Ela alega que foi perseguida por ser mulher e o documentário mostra reportagens da época que falavam desde sobre a falta de maquiagem da ministra até sua vida amorosa. O documentário termina com a eleição de Bolsonaro à presidência da república e uma cena da família Silva dançando no carnaval de 2020 (às portas da pandemia). Interessante. Disponível na HBO Max.

sábado, 29 de janeiro de 2022

A Lenda do Cavaleiro Verde (The Green Knight, 2021)

 

A Lenda do Cavaleiro Verde (The Green Knight, 2021). Dir: David Lowery. Amazon Prime. Um filme de fantasia medieval que, confesso, estava esperando o tempo todo o momento em que alguém fosse fazer alguma piadinha fácil ou piscar para a câmera, mas não. "A Lenda do Cavaleiro Verde" é bastante sério e te transporta centenas de anos para um passado iluminado à luz de tochas, habitado por reis, rainhas, cavaleiros, bruxas e espíritos. Tudo com um visual arrebatador, direção de arte (Louise Mathews e Christine McDonagh) e fotografia (Andrew Droz Palermo) construindo quadros belíssimos, acompanhados por ótima trilha sonora (Daniel Hart).

Dev Patel é Gawain, sobrinho do Rei Arthur e futuro cavaleiro da Távola Redonda. No dia de Natal estão todos reunidos na corte quando o assustador Cavaleiro Verde entra, com cavalo e tudo, para fazer um desafio: aquele que o derrotasse ganharia seu machado e teria glórias por um ano. Ao final deste tempo, porém, o vencedor teria que reencontrar o Cavaleiro Verde para um acerto de contas. O rei e os cavaleiros ficam paralisados, mas Gawain aceita a aposta e corta a cabeça do Cavaleiro Verde. Ele vai conseguir cumprir sua parte do trato, um ano depois?

Não espere uma aventura como recentes encarnações de "Rei Arthur" ou coisas do gênero. O filme é escrito e dirigido por David Lowery, que em "Sombras da Vida" (A Ghost Story, 2017) escalou Casey Affleck como um fantasma e o deixou plantado em longos planos estáticos. "A Lenda do Cavaleiro Verde" te coloca no ritmo da Idade Média. Tudo é lento e ritualizado. Há belas (e longas) cenas de Dev Patel cruzando paisagens verdejantes, atravessando rios, enfrentando espíritos, gigantes e toda sorte de personagens estranhos. É um filme que discute valores como heroísmo, valentia e, por tabela, a masculinidade. Há forte ligação com superstições e com o sobrenatural. Um personagem chega a questionar Gawain sobre o que ele busca: "Honra?", ele diz. "É uma pergunta?", o outro responde. O elenco traz também Alicia Vikander, Joel Edgerton e Sean Harris. Disponível na Amazon Prime.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

O Tempo com Você (Tenki no Ko, 2019)

O Tempo com Você (Tenki no Ko, 2019). Dir: Makoto Shinkai. HBO Max. Outra bela animação de Makoto Shinkai, que há um bom tempo é um dos "candidatos" a substituto de Hayao Miyazaki como mestre da animação japonesa (diria que ele é mais focado em amores adolescentes do que em temas universais como Miyazaki, mas há cenas nesta animação que parecem tiradas diretamente de "Castelo no Céu").

Assim como em "Your Name" ("Kimi no na wa", um dos maiores sucessos de todos os tempos), em "O Tempo com Você" Shinkai mistura romance adolescente com eventos que beiram o sobrenatural. Hodaka Morishima (voz de Kotaro Daigo) é um rapaz de 16 anos que foge de casa, no interior, e vai para Tokyo. Ele passa maus bocados nas ruas até que encontra um emprego em uma pequena editora que publica lendas urbanas. Chove constantemente em Tokyo há semanas, e então o rapaz encontra uma moça chamada Hina (voz de Nana Mori) que tem o poder de parar a chuva e trazer o Sol. Os dois começam a oferecer o serviço de "Garota do Sol" online, prometendo dias ensolarados para festas, casamentos, eventos corporativos, etc.

Parece bobinho mas, como toda boa animação japonesa, o "poder" da garota carrega um preço alto a ser pago. A trama também traz o tema sério de menores de idade que são abusados, ou moram sozinhos, ou que enfrentam trabalhos degradantes para sobreviver. Acho até que a parte "sobrenatural" da trama, que envolve o poder de mudar o clima, causar nevascas no verão, etc, pode ser encarada como uma "viagem" na cabeça dos personagens para enfrentar os problemas sérios do dia a dia. Talvez. Quando ao romance adolescente, Makoto Shinkai adora esticar um drama até os últimos minutos, e em "O Tempo com Você" não é diferente. Gosto. Disponível na HBO Max. PS: a Netflix tinha várias animações de Makoto Shinkai no acervo... vi agora que não estão mais disponíveis. 

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Bar Doce Lar (The Tender Bar, 2021)

 
Bar Doce Lar (The Tender Bar, 2021). Dir: George Clooney. Amazon Prime. Filme bonito, muito bem dirigido por Clooney e com um surpreendente Ben Affleck em um dos papéis principais, "The Tender Bar" não foi muito bem recebido pela crítica. Eu gostei. O roteiro (de William Monaham) é baseado nas memórias de J.R. Moehringer. O bar to título é onde se passa grande parte da história, que revolve ao redor de um garoto chamado JR (Daniel Ranieri, uma graça de menino). Ele e a mãe (Lily Rabe) voltam para a casa dos pais porque ela não consegue mais pagar o aluguel. O pai de JR é um canalha que é "só uma voz na rádio" (ele é um locutor que liga para o menino de tantos em tantos anos). O avô do garoto é interpretado pelo grande Christopher Lloyd, meio sumido das telas ultimamente. Há uma bela sequência em que o avô leva o neto para a escola em um evento de dia dos pais.

Quem rouba a maioria das cenas, no entanto, é Ben Affleck como o Tio Charlie. Ele se torna uma espécie de pai substituto para o garoto, lhe ensinando sobre os fatos da vida e descobrindo o talento dele como escritor. Tye Sheridan interpreta JR quando adolescente e o acompanhamos a Yale, onde se matricula em Direito (sonho da mãe). Lá ele desenvolve uma paixão não correspondida por uma mulher manipuladora chamada Sidney (Briana Middleton), que enrola o rapaz por vários anos.

O filme é bem dirigido por George Clooney, que mantém um ar nostálgico, com uma fotografia quente e a câmera em movimento. Há um plano sequência muito bom que mostra a ideia de "uma volta com o filho" que o pai de JR faz um dia, aparecendo do nada e dirigindo com o garoto em uma volta pelo quarteirão. O foco, no entanto, está sempre na interação entre os atores, nos olhares e reações. Bonito. Disponível na Amazon Prime Video.

domingo, 23 de janeiro de 2022

O Assassino de Clovehitch (The Clovehitch Killer, 2018)

O Assassino de Clovehitch (The Clovehitch Killer, 2018). Dir: Duncan Skiles. Netflix. Suspense razoável que funciona muito melhor na primeira metade, "O Assassino de Clovehitch" se passa em uma cidade pequena dos EUA. Um serial killer havia matado dez mulheres na região há uma década, mas a cidade ainda está em luto pelas vítimas. Os crimes pararam de repente, mas todos os anos a cidade faz uma homenagem aos mortos. Tyler (Charlie Plummer) um típico adolescente de 16 anos, vive com uma família religiosa comandada pelo seu pai, Don (Dylan McDermott); Don é sempre alto astral e é líder dos escoteiros da cidade, o que significa que ele é bom em fazer nós.

Ok, uma noite Tyler sai para namorar na van do pai e a garota encontra uma foto perturbadora de uma mulher nua, amarrada em pose sadomasoquista. Logo a cidade toda acha que Tyler é um "pervertido", mas o rapaz começa a desconfiar que o pai, religioso e "homem de bem", não é o que parece. Como agir quando se desconfia que o próprio pai seja um serial killer? Esta primeira metade do filme, como disse, é a melhor e cria um bom suspense. Mais para frente, no entanto, os acontecimentos se tornam meio forçados e difíceis de acreditar. Tyler é auxiliado na investigação pela garota "nerd" da cidade, Kassi (Madisen Beaty), que obviamente tem um motivo pessoal para procurar pelo assassino.

O filme não é ruim, mas não me envolveu muito. As crises de consciência do rapaz por desconfiar do próprio pai não me soaram honestas e a relação entre os dois me pareceu mais a de um tio e sobrinho do que entre pai e filho. Há uma reviravolta interessante no terceiro ato mas o final, se você pensar um pouco, não faz muito sentido. Tá na Netflix.

domingo, 16 de janeiro de 2022

Mãe X Androides (Mother/Android, 2022)

Mãe X Androides (Mother/Android, 2022). Dir: Mattson Tomlin. Ficção-científica genérica da Netflix, então você já sabe o que vai ver. Em um futuro distópico, a Humanidade é atacada pelos androides que faziam os serviços da casa. Chloë Grace Moretz é uma moça que engravida do namorado (ou ficante), Sam, interpretado por Algee Smith. Eles estão tendo uma DR quando o "apocalipse robô" acontece, e fogem para a floresta.

Você já viu isso tudo antes. O roteiro é bem "arroz com feijão", embora tenha alguns bons momentos. O excelente "Filhos da Esperança" (em que Clive Owen tenta levar uma moça grávida para um barco) é inspiração óbvia. Moretz ainda tem cara de adolescente e, mesmo fugindo pela floresta, tomando chuva e lutando com androides, a maquiagem dela permanece intacta. Há uma "virada" no roteiro, perto do final, que seria interessante em um filme melhor. O final é dramalhão puro. Tá na Netflix. 

sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Eternos (Eternals, 2021)

Eternos (Eternals, 2021). Dir: Chloé Zhao. Disney+. Acho que o título apropriado seria "EternoZZZzzzzz...". Tentativa da Marvel de fazer um filme de heróis mais "artístico", "Eternos" decepciona pelas oportunidades perdidas. É certamente ambicioso... o roteiro tenta abarcar uma história de 5 mil anos em que os tais "eternos" foram enviados à Terra para lutar com os "Deviantes" (
monstros CGI que me lembraram "Depois da Terra"). Há tramas envolvendo seres "celestiais", a influência que "deuses" teriam na evolução do ser humano, etc, tudo embalado em belíssimas paisagens filmadas em IMAX. A câmera de Chloé Zhao emula Terrence Malick e abusa de planos em grande angular, flutuando sobre dunas, florestas, cidades. Lindo.

O problema é que o roteiro tenta abarcar mais do que consegue. O tom varia muito; logo depois que uma personagem importante morre e o filme deveria ficar sério, vemos várias sequências "cômicas" envolvendo um "eterno" que virou um astro do cinema indiano em "Bollywood". Pouco depois estão todos fazendo piadas ao redor de uma mesa, citando "Os Vingadores". Discussões sobre a influência maléfica da tecnologia (e uma cena da destruição atômica em Hiroshima) fazem par com uma cena ridícula em que uma "eterna" mostra a outro um app que deixa o rosto dele mais velho.

E o filme é interminável. Não tenho problema nenhum com filme de super herói (me diverti muito com o último Homem-Aranha) ou com filmes com ambições artísticas ("Duna" é maravilhoso), mas "Eternos" não é direito nem uma coisa, nem outra. "Eternos" levou uma surra de crítica e público e eu achei que o crédito final, que diz que eles vão voltar, foi otimista demais. Disponível na Disney+.

 

terça-feira, 11 de janeiro de 2022

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (Spider-Man: No Way Home, 2021)

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (Spider-Man: No Way Home, 2021). Dir: John Watts. SPOILERS MUITOS SPOILERS. Não tem como falar deste filme sem spoilers, então esteja avisado. Dos três atores que fizeram o Homem-Aranha nos últimos vinte anos (Tobey Maguire, Andrew Garfield e Tom Holland), o último é o que eu menos vi em filmes "solo". Vi Holland como o Aranha quando ele participou dos filmes dos Vingadores, mas creio que só tenha visto o primeiro dos filmes solo com ele. Achei que isso seria um grande problema ao ver este último, mas não foi. "Sem Volta para Casa", na verdade, me pareceu voltado exatamente para o fã por volta da minha idade ou, no mínimo, quem assistiu bastante os primeiros filmes com Tobey Maguire.

A Marvel, de forma esperta, conseguiu, no mínimo, um grande feito logístico com este filme, trazendo de volta não só os heróis como os vilões dos filmes anteriores. Claro que tem o fator "exploração da nostalgia" tão presente nos filme de hoje, ou o chamado "fan service". Mas ao contrário do (bom) filme dos "Ghostbusters" recente, em que os atores originais fazem uma ponta descartável no final, "Sem Volta para Casa" não usa Tobey Maguire, Andrew Garfield, Willem Dafoe, Jamie Foxx e Alfred Molina (entre outros) como simples "papel de parede". Os personagens têm função definida e fazem diferença na trama. Tobey Maguire talvez seja, ainda, em quem eu pense quando ouço falar em Homem-Aranha, mas sou dos poucos que gostou de Andrew Garfield no papel. Junta-se os dois com Tom Holland, que é muito carismático, e as cenas em que os três Peter Parker/Homem-Aranha dividem a tela são ótimas. Há até uma tentativa (bem sucedida, em minha opinião) de redimir os filmes do Andrew Garfield. Há uma química ótima entre os três e até um momento em que eles batem papo e comparam histórias sobre amores e vilões.

A única crítica que tenho é que o tom do filme varia bastante. A trama inicial, com Tom Holland, é bem leve e "bobinha". Chateado com o fato de que sua identidade secreta foi revelada, Parker se encontra com o Dr. Strange (Benedict Cumberbatch) para tentar fazer com que as pessoas se esqueçam dele. Strange, que deveria ser mais esperto, acaba se embananando e criando a situação que mistura o "multiverso" e trazendo vilões e heróis para uma mesma dimensão. A morte trágica da tia May (Marisa Tomei) me pareceu uma consequência muito forte para um deslize provocado por um capricho adolescente de Peter Parker. De qualquer forma, é um filme muito gostoso de se assistir; é sim bastante calcado em nostalgia, mas de forma inteligente, e é bom rever estes atores em papéis que os marcaram. Visto em enorme Imax, nos cinemas.

 

King Richard: Criando Campeãs (King Richard, 2021)

King Richard: Criando Campeãs (King Richard, 2021). Dir: Reinaldo Marcus Green. HBO Max. Cinebiografia do pai das campeões de tênis Venus e Serena Williams, Richard Williams (Will Smith). É melhor ver o filme sem pesquisar muito sobre o personagem principal, acho. Dei uma lida agora na vida dele e o seu retrato, no filme, é muito mais generoso. Como filme, "King Richard" é uma boa história de esportes e superação. Richard Williams alegava ter criado um plano de carreira para as filhas antes mesmo delas terem nascido. Usando bolinhas e raquetes de segunda mão (ou roubadas de um clube), Williams colocou Venus e Serena para treinar desde pequenas em quadras públicas da cidade de Compton (parte do condado de Los Angeles). Usando de muita determinação (e algumas atitudes questionáveis), Williams conseguiu levar as meninas a grandes treinadores profissionais de tênis, que concordaram em treiná-las de graça.

Como nós sabemos que o plano dele funcionou (Venus e Serena se tornaram as maiores vencedoras da história do tênis), o método de Richard Williams parece justificável. Mesmo sabendo "o final", o filme não deixa de manter o interesse, principalmente pela boa interpretação de todo elenco. Will Smith há anos tenta ser aceito como ator dramático; seu Richard Williams é, várias vezes, um cara egocêntrico, egoísta ou simplesmente um "mala", mas ele tem carisma de sobra. Deve-se notar as boas interpretações das meninas que fazem as filhas de Williams, com destaque para Saniyya Sidney (Venus) e Demi Singleton (Serena). Nomes como Tony Goldwyn e o incansável Jon Bernthal interpretam os técnicos das meninas. Aunjanue Ellis está muito bem como a mulher de Richard, Oracene, que é quem mantinha a casa funcionando e, muitas vezes, tinha que colocar o marido no lugar.

O resultado é um filme bem feito e "para cima", embora não brilhante. O Richard Williams real, segundo li, era ainda mais controverso, sendo acusado de abandonar os filhos do primeiro casamento, autopromoção, exploração do talento das meninas, entre outras coisas. O filme não deixa muito claro de onde veio seu talento para treinar as garotas ou mesmo como elas se sentiam tendo a vida toda planejada desde o nascimento (elas nunca quiseram ser outra coisa?). Disponível na HBO Max.

Encanto (2021)

Encanto (2021). Dir: Jared Bush, Byron Howard, Charise Castro Smith. Disney+. Animação bem fraquinha da Disney (o 60º longa metragem do estúdio). O filme ficou meio escondido do público e críticos até perto do lançamento (o que nunca é bom sinal), e mesmo colegas experts em Disney não faziam ideia sobre o quê era o animado. Bom, ele é sobre muita coisa... e sobre nada.

Na Colômbia vive a família Madrigal. Todos eles (menos uma pessoa) têm poderes especiais... uma mulher é super forte, outra pode curar doenças, um rapaz pode se transformar em qualquer outra pessoa, etc. De tempos em tempos há uma "cerimônia" em que um membro da família vai descobrir os poderes especiais que ele tem. Só que quando chega a vez de Mirabel (voz de Stephanie Beatriz), ela não recebe nenhum poder. Por que? Não se sabe direito; o caso é que os poderes dos outros também começam a falhar, a casa em que eles vivem apresenta rachaduras, um tio "desaparecido" reaparece misteriosamente, um pretendente à mão de uma irmã aparece na hora errada e... legal, mas porquê eu não estou nem um pouco interessado no que está acontecendo?

Há várias canções (do grande Lin-Manuel Miranda, que estava sem inspiração) bem chatinhas que surgem do nada e mais atrapalham do que ajudam. Não há um vilão nem muita razão para qualquer coisa acontecer, mas o roteiro tenta disfarçar com muitas cores, números musicais e um final com "mensagem". Bocejos. Disponível na Disney+.

A Filha Perdida (The Lost Daughter, 2021)

A Filha Perdida (The Lost Daughter, 2021). Dir: Maggie Gyllenhaal. Netflix. Filme de estreia na direção da atriz Maggie Gyllenhaal, "A Filha Perdida" é um drama ambíguo e bastante feminino. O roteiro, adaptado por Gyllenhaal de um livro de Elena Ferrante, trata de uma professora divorciada chamada Leda (a grande Olivia Colman), que vai passar as férias sozinha na Grécia. Leda se instala em um apartamento alugado e está tranquila na praia quando é interrompida pela chegada de uma barulhenta família ítalo-americana. Leda fica interessada na complicada dinâmica entre uma jovem mãe, Nina (Dakota Johnson) e a filha pequena, Elena. Nina não tem um momento de paz e sua relação com a filha desperta memórias dolorosas em Leda, que é especialista em literatura comparada e, quando jovem, também tinha uma relação complicada com duas filhas pequenas, Bianca e Martha.

O filme mistura cenas do presente com flashbacks em que Leda é interpretada por Jessie Buckley, que está ótima. A princípio você não imaginaria que Colman e Buckley pudessem interpretar a mesma pessoa em idades diferentes, mas a sensível direção de Gyllenhaal as faz bastante parecidas. Leda não é uma personagem fácil e o roteiro não tenta deixá-la mais agradável ao espectador.

Noções tradicionais de maternidade são atropeladas pela vontade de crescer na carreira e ser "livre", mas como fazer isso com marido e duas filhas pequenas? Leda acaba tomando decisões que, repito, não a tornam muito agradável. "Eu sou muito egoísta", ela acaba confessando a Nina em uma cena. Há também uma trama envolvendo uma boneca que até começa engraçada mas, com o tempo, fica perigosa. O que quer Leda? O filme é mais longo do que o necessário (eu dei uma pausa em um momento e ainda havia uma hora de duração). A fotografia de Hélène Louvart abusa dos closes. A edição do brasileiro Affonso Gonçalves é muito boa; grande parte do filme é contada com olhares e reações e tudo é resultado da boa montagem dos planos. Olivia Colman e Jessie Buckley estão excelentes e, provavelmente, estarão entre as indicadas ao Oscar. Tá na Netflix. 

Não olhe para cima (Don´t look up, 2021)

Não olhe para cima (Don´t look up, 2021). Dir: Adam McKay. Netflix. Lançado na véspera do Natal, este filme ficou na minha lista de "a assistir" por alguns dias, devido a compromissos familiares, festas, etc. Só que era impossível abrir qualquer rede social sem ver algum comentário sobre "Não olhe para cima"; memes, spoilers, críticas positivas, negativas, gente me perguntando o que eu achei. Ufa, assisti. Tanto se falou do filme que, acho, não tenho muito a acrescentar. É melhor do que eu esperava (eu tenho medo quando a Netflix junta um monte de atores famosos e faz uma porcaria qualquer para movimentar o algoritmo).

O diretor/roteirista Adam McKay já havia feito uma grande sátira com "A Grande Aposta", também cheio de atores famosos e muito veneno, sobre a crise gerada pela bolha imobiliária. "Não olhe para cima" começou como uma sátira ao aquecimento global. Só que nosso "amigo" Covid apareceu em plena produção e o filme tomou outro rumo. O cometa descoberto por dois cientistas desconhecidos (Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence) acabou se tornando um símbolo para muito do que vimos nos últimos anos, como o negacionismo, os movimentos anti vacina e contra as máscaras, etc. É como se o vírus estivesse ali, brilhando no céu e vindo em nossa direção, mas muita gente fica dizendo que não devemos olhar para cima.

"Não olhe para cima", aliás, tem outro significado. Quando você olha para cima, você tira os olhos do celular. Um dos personagens do filme, interpretado com muita ironia por Mark Rylance, é um magnata das comunicações que é uma mistura de Jeff Bezos, Elon Musk, Steve Jobs, entre outros. Enquanto DiCaprio e Lawrence tentam convencer a todos de que o mundo vai acabar se nada for feito, Rylance vê no cometa uma oportunidade de "monetizar". A mídia, cheia dos sorrisos de Tyler Perry e Cate Blanchett, está mais preocupada com a "separação" de uma estrela teen (interpretada por Ariana Grande) do que em realmente escutar os cientistas. DiCaprio é classificado como um AILF (procure no google) enquanto que a personagem de Lawrence se torna um meme "engraçado".

Em meio a tudo isso, me surpreendi emocionado com os momentos finais. A Natureza é bela, mas pode ser letal. Há uma cena de jantar em família que vale o filme. E a Netflix segue surpreendendo... fazendo porcarias como "Alerta Vermelho" e "Imperdoável" mas lançando bons filmes como "Ataque de Cães", "A Mão de Deus" e "Não olhe para cima". Faz parte do jogo.

Matrix Resurrections (The Matrix Resurrections, 2021)

Matrix Resurrections (The Matrix Resurrections, 2021). Dir: Lana Wachowski. ATENÇÃO POSSÍVEIS SPOILERS Uma coisa que sempre usei quando tinha que criar alguma coisa e estava sem ideias é "quando faltar imaginação, apele para a metalinguagem". Este Matrix é pura metalinguagem. Como fazer uma continuação para uma das trilogias mais bem sucedidas e influentes de todos os tempos? Acho que a resposta da diretora Lana Wachowski foi: "não levando muito a sério".

E se Thomas Anderson (Keanu Reeves) não fosse "Neo", o "escolhido" pela profecia para salvar a Humanidade do jugo das Máquinas? E se, na verdade, ele fosse o bem sucedido criador de uma trilogia de jogos chamada "The Matrix"? É assim que o encontramos no início de "Resurrections". O CEO da empresa de jogos, interpretado por Jonathan Groff (de "Mindhunter"), chama Anderson para uma reunião e explica que a Warner Bros. pretende fazer uma quarta parte para "Matrix", com a participação dos criadores ou não. Por que não participar? É genial e, provavelmente, nada do que os "fanboys" da série estavam esperando. Anderson é um cara deprimido e paranoico. Ele come sempre na mesma lanchonete porque lá ele pode ver Tiffany (Carrie-Anne Moss), uma mulher por quem ele é secretamente apaixonado e, surpresa, se parece muito com uma personagem chamada "Trinity", que ele criou. Todos os dias ele toma uma pílula (azul, claro) receitada por seu psiquiatra (Neil Patrick Harris), para enfrentar as reuniões criativas do grupo que está desenvolvendo "Matrix 4".

Essa primeira parte, confesso, é minha favorita. É uma pena que "Resurrections" acabe se lembrando que tem que ser um filme da série "Matrix" e volte à trama de mundos paralelos, realidades virtuais, lutas de kung fu e muita, muita pancadaria. Essa parte, aliás, faz muito pouco sentido (embora seja legal rever Neo e Trinity dando porrada em um monte de gente). É certamente um filme para dividir opiniões. Como continuação de "Matrix", é bem mediano e bobo. Como autoparódia ele é quase genial. "O que as pessoas pensam quando escutam falar em Matrix?" pergunta um "criativo" em uma reunião. "Bullet time! Precisamos criar algo que supere o bullet time!". Haha. 

O Último Duelo (The Last Duel, 2021)

 
O Último Duelo (The Last Duel, 2021). Dir: Ridley Scott. Superprodução de época que naufragou nas bilheterias, "O Último Duelo" é bastante bom. O roteiro, escrito a seis mãos por Nicole Holofcener, Ben Affleck e Matt Damon, conta uma mesma história por três pontos de vista (estilo "Rashomon"). Na França do século 14, dois homens duelam até a morte pela honra de uma mulher. Pela lógica da época, quem vencesse o duelo estaria manifestando a própria vontade de Deus.


Os homens são Jean de Carrouges (Matt Damon) e Jacques Le Gris (Adam Driver). Carrouges está acusando Le Gris de ter estuprado sua esposa, Marguerite (Jodie Comer). Le Gris não nega ter tido relações com ela, mas alega que não foi estupro. A trama é contada três vezes, primeiro do ponto de vista do personagem de Matt Damon, depois de Adam Driver e finalmente pela visão de Jodie Comer. Nem sempre este "truque" do roteiro funciona. Há uma cena particularmente forte que é vista duas vezes e, apesar dos detalhes serem diferentes, não deixa de parecer exploração.

É um filme de Ridley Scott, o que significa produção classe A, bela direção de fotografia de Dariusz Wolski e trilha sonora de Harry Gregson-Williams. É bastante violento, tanto nas cenas de batalha como na cena do suposto estupro. O que fica é que as mulheres, na época, tinham nenhum controle sobre suas vidas. A decisão do duelo poderia significar não só a morte de um dos combatentes, mas da mulher também, caso "Deus" decidisse pela culpa dela. Jodie Comer (da série "Killing Eve") está excelente. "O Último Duelo" foi mal lançado nos cinemas (e só nos cinemas) e amargou um fracasso enorme. Em época ainda de pandemia, Scott deveria ter fechado um acordo com alguma plataforma de streaming e lançado o filme também na TV.

A Mão de Deus (È stata la mano di Dio, 2021)

A Mão de Deus (È stata la mano di Dio, 2021). Dir: Paolo Sorrentino. Netflix. Belo filme italiano de Sorrentino lançado pela Netflix. É um filme sobre a vida, então nem dá para fazer uma sinopse, mas o roteiro gira ao redor de um rapaz chamado Fabio (Filippo Scotti), que vive em Nápoles nos anos 80. Ele é apaixonado por futebol, especificamente pelo jogador argentino Maradona, que está de mudança para Nápoles. Fabio tem pais amorosos, um irmão mais velho que quer ser ator e uma irmã que está sempre no banheiro (é uma das piadas recorrentes do filme). Sorrentino mostra um monte de personagens de várias famílias e posições sociais. Todos são bem italianos, com as paixões à flor da pele.

O roteiro é formado por uma série de episódios interessantes, como quando a família conhece o noivo de uma tia "encalhada". Falando em tias, Fabio tem uma "musa", a tia Patrizia (Luisa Ranieri), uma mulher corpulenta que gosta de tomar banhos de Sol nua e deixar o marido emputecido. Tenho a impressão que um filme poderia ser feito sobre cada um dos personagens que aparecem na tela. Há momentos tristes, bizarros, felizes, sublimes. A direção de fotografia de Daria D'Antonio é maravilhosa. Há citações a Fellini, Franco Zeffirelli e Sergio Leone, entre outros. O ritmo é bem europeu, ou seja, lento, então não é um filme para ser visto correndo. Tá na Netflix.

Apresentando os Ricardos (Being the Ricardos, 2021)

Apresentando os Ricardos (Being the Ricardos, 2021). Dir: Aaron Sorkin. Amazon Prime. O roteirista e diretor Aaron Sorkin conta uma semana na história de um dos maiores sucessos da TV americana de todos os tempos, a série "I Love Lucy" (1951-1957). Estrelada por Lucille Ball (Nicole Kidman) e o marido cubano, Desi Arnaz (Javier Bardem), "I Love Lucy" tinha 60 milhões de espectadores por semana (um sucesso tem hoje, no máximo, 15 milhões). Sorkin fez muito sucesso como roteirista de TV (Newsroom, The West Wing) e cinema (A Rede Social, Steve Jobs) e recentemente se tornou diretor também (Os 7 de Chicago).

"Apresentando os Ricardos", de forma proposital ou não, tem um visual bastante televisivo. Nicole Kidman, que geralmente é boa atriz, tenta aqui passar alguns dos maneirismos de Lucille Ball, mas seu rosto parece uma máscara. Javier Barden, ótimo ator, não se parece em nada com Desi Arnaz, embora consiga passar o carisma e o lado mulherengo. O roteiro lida com várias tramas: Lucy é acusada por um jornalista de ser comunista; na época, isso era o equivalente a ser "cancelado". Em uma trama paralela, uma revista de fofocas publica uma matéria sobre a suposta infidelidade de Desi Arnaz, o que deixa Lucy ainda mais nervosa. Para completar, Lucy revela que está grávida, o que também pode complicar o futuro da série.

Todas estas tramas são interpretadas com os diálogos rápidos de Sorkin e ilustradas com vários flashbacks. O lado de "making off" é bem interessante; vemos como cada dia da semana era dedicado a uma atividade (leitura do roteiro, marcação de atores, ensaio técnico, etc) que finalizava com a filmagem do episódio na sexta feira. Kidman interpreta Lucille Ball como uma mulher extremamente detalhista e que lutava por cada palavra e ação do roteiro. Não sei como ela era na vida real mas, para o retrato de uma das mulheres mais engraçadas da TV americana, achei a interpretação pesada. Vale para quem é fã dos bastidores de uma produção, pela recriação de época e outros detalhes técnicos. O elenco ainda conta com J.K. Simmons, no segundo filme com ele que assisto em seguida. Disponível na Amazon Prime.

O Favorito (The Front Runner, 2018)

 
O Favorito (The Front Runner, 2018). Dir: Jason Reitman. Netflix. Filme político baseado na história real de um senador americano chamado Gary Hart (Hugh Jackman). Em 1988, Hart era o favorito para se tornar o próximo presidente dos Estados Unidos. Ele tinha 46 anos, era trabalhador, íntegro, carismático. Então, o desastre: um jornal de Miami publica uma matéria sobre um suposto caso extra-conjugal de Hart com uma bela modelo. Repórteres acamparam em frente à casa dele e tiraram fotos da suposta amante, que estampou a capa dos jornais e mudou o foco da campanha.

A tese do filme é que este foi o primeiro (ou, no mínimo, um dos primeiros) casos em que os jornais ditos sérios americanos (como o The Washington Post) se tornaram meros tabloides de fofocas. O roteiro (co escrito por Jason Reiman e o autor de um livro sobre o caso, Matt Bai) levanta uma série de questões interessantes sobre ética jornalística, curiosidade do público e os limites entre ambos. O problema é que, apesar de boas interpretações do elenco e uma execução competente, o filme parece não chegar a nenhuma conclusão a respeito. Uma figura pública tem direito à privacidade? Em um mundo em que todos expõem suas vidas o tempo todo, como o nosso, esse tipo de pergunta ainda tem razão de ser?

Reitman filma com franca influência de cineastas como Robert Altman, com takes longos em que a câmera passeia pelo rosto de um grande número de personagens; os diálogos se misturam e se entrelaçam de forma natural, mas confusa, por grande parte do tempo. O bom elenco conta com Vera Farmiga, J.K. Simmons, Kevin Pollack, Bill Burr, Kaitlyn Dever, Alfred Molina e mais um monte de gente boa. Para quem gosta de dramas políticos e boas interpretações. Tá na Netflix.

Encontros (Encounter, 2021)

 
Encontros (Encounter, 2021). Dir: Michael Pearce. Amazon Prime. Hmmm, este é meio difícil de definir. Há várias coisas que podem ser vistas como "spoiler", talvez pelo fato de que o roteiro do próprio filme não sabe direito o que quer. Riz Ahmed, sempre bom, recém saído de uma indicação ao Oscar por "O Som do Silêncio", também da Amazon, interpreta aqui um pai ausente que foi Fuzileiro dos Estados Unidos. Ele entra na casa da ex-esposa uma noite e diz aos dois filhos que eles vão sair em uma aventura. Os três partem madrugada afora pelas estradas dos EUA. Ahmed diz aos filhos que a Terra foi invadida por seres extraterrestres que infectam os humanos através dos insetos. As primeiras imagens do filme, aliás, mostram "algo" entrando na atmosfera terrestre a partir do espaço e, em seguida, várias imagens de insetos devorando outros ou picando seres humanos.


O melhor do filme é a interação entre Riz Ahmed e os garotos (Lucian-River Chauhan e Aditya Geddada). Os meninos parecem mesmo filhos dele e li que as cenas entre eles foram bastante improvisadas. A direção de fotografia é boa e as belas paisagens americanas são acompanhadas por uma trilha "viajante" de Jed Kurzel. O clima de mistério e ficção-científica vai dando lugar a algo mais "pé no chão", mas o filme nunca mergulha de vez em uma coisa ou outra. Talvez o filme nunca deveria sair do foco em Ahmed e os garotos (a personagem de Octavia Spencer, por exemplo, poderia nem existir). Eu queria ter gostado mais. Riz Ahmed é bom mas, sozinho, não consegue segurar o filme. Disponível na Amazon Prime.

Imperdoável (The Unforgivable, 2021)

Imperdoável (The Unforgivable, 2021). Dir: Nora Fingscheidt. Netflix. Dramalhão de Supercine que dá para assistir pelo bom elenco. Sandra Bullock estava já com 56 anos nas filmagens e, pelo que entendi, interpreta uma mulher de uns 45. Ela está bem, apesar do rosto bem plastificado. Ela é Ruth Slater, uma mulher que é solta da prisão após cumprir 20 anos pelo assassinato de um policial. A cena do crime é vista em fragmentos durante o filme e é propositalmente confusa. Ruth estava defendendo a própria casa de uma reintegração de posse e não queria se separar da irmã mais nova, Kate.

Vinte anos depois, livre da prisão, Ruth tem como missão reencontrar a irmã, que foi adotada por outra família e tem apenas vagas lembranças do passado. O elenco, como disse, é bom. Vincent D´Onofrio interpreta um advogado que aceita ajudar Ruth. A esposa dele é a grande Viola Davis, totalmente desperdiçada e que faz só umas três cenas. Jon Bernthal é um companheiro de trabalho. Richard Thomas (caramba.... o John Boy?? rs) é o pai adotivo de Kate (Aisling Franciosi).

As filmagens foram interrompidas pela pandemia e retomadas depois, o que talvez explique o sumiço do personagem de D'Onofrio na parte final. Um cara que interpreta o chefe de Sandra Bullock também some sem explicações. É filme de Supercine, mas tem seus momentos. Tá na Netflix.
 

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Viagem ao Topo da Terra (Le sommet des dieux, 2021)

Viagem ao Topo da Terra (Le sommet des dieux, 2021). Dir: Patrick Imbert. Netflix. Belíssima animação para adultos baseada em um mangá de Jirô Taniguchi e Baku Yumemakura, "Viagem ao Topo da Terra" é como uma pintura em movimento. A produção é internacional (a maioria francesa), embora a trama trate de personagens japoneses. O visual é bastante realista, apesar das cores fortes, e há belas sequências de escalada em diversas montanhas pela Europa e pela Ásia.

A trama acompanha um fotógrafo de aventuras chamado Fukamachi (voz de Damien Boisseau), que é especialista em fotografar escaladas. Ele começa a pesquisar a vida de um alpinista japonês chamado Habu Joji (Eric Herson-Macarel), que havia partido para o Himalaia e desaparecido. Diversos flashbacks mostram a vida de Habu e sua obsessão com as montanhas. Fechado e de poucas palavras, ele não era muito querido pelos outros alpinistas porque gostava de escalar sozinho. O fotógrafo consegue encontrá-lo e tenta convencê-lo a tentar subir o Everest com ele, documentando a viagem.

Há belas sequências de paisagens geladas e noites estreladas. O design sonoro também é muito bom, repare como o som muda conforme eles vão subindo para altitudes acima dos 8 mil metros. Depois de um tempo você até se esquece que está vendo uma animação e parece que está vendo um belo filme de viagem. Tá na Netflix. 

Four hours at the Capitol (2021)

Four hours at the Capitol (2021). Dir: Jamie Roberts. HBO Max. Bom documentário sobre a invasão ao Capitólio americano em 6 de janeiro de 2021. O filme é montado com entrevistas e muitas imagens reais do evento, tiradas de câmeras e celulares dos envolvidos, câmeras de segurança, câmeras de policiais, etc. É um passo a passo de um dos eventos mais bizarros (e potencialmente perigosos) da história americana. No dia 6 de janeiro de 2021, os congressistas americanos deveriam fazer a contagem oficial dos votos dos colégios eleitorais e chancelar a eleição, declarando a vitória de Joe Biden sobre Donald Trump. Só que Trump já estava falando sobre fraude meses antes das eleições em si, então milhares de apoiadores, naquele dia, achavam que o congresso americano estava roubando as eleições. Para piorar, o próprio Trump fez um discurso naquela manhã incitando os apoiadores, pedindo que eles marchassem até o Capitólio e impedissem o "roubo".


No documentário, vemos tudo isso do ponto de vista de vários desses apoiadores, como imagens de um grupo de manifestantes de uma organização de direita chamada "Proud Boys" (só homens são permitidos). Eles marcharam até o Capitólio e encontraram bem pouca resistência na entrada (havia bloqueios e meia dúzia de seguranças). Aos poucos, porém, milhares de outros apoiadores foram chegando e tomando a frente do lugar, derrubando uma a uma as barreiras e chegando próximo ao prédio. Tudo culminou com um grupo que conseguiu entrar no prédio depois de quebrar janelas e portas, interrompendo a contagem dos votos e quase jogando os EUA em uma situação de "lei marcial".

A força (e fraqueza) do documentário está em não tomar partido. Escutamos depoimentos tanto do lado dos insurgentes quanto dos policiais e políticos. A falta de contexto, às vezes, prejudica o entendimento da situação. O que fala mais alto são as imagens impressionantes, principalmente de um embate entre uns 30 policiais e milhares de manifestantes que tentavam conquistar um túnel que dava acesso ao prédio. Os policiais fizeram uma barricada humana e tentaram segurar, com a força dos próprios corpos, milhares de manifestantes que empurravam do outro lado. É surpreendente que, diante de tudo isso, só uma pessoa foi baleada (uma manifestante) e um policial morreu por falta de ar. Fica meio sem explicação a morte de quatro policiais que teriam se matado dias depois do conflito, além de manifestantes que teriam morrido por questões "não relacionadas à invasão". O pior, no final, é a sensação de que essa situação não terminou. Milhares (talvez milhões) de americanos acham que a eleição foi roubada e estão dispostos a retomar o poder à força. Disponível na HBO Max.

Ataque dos Cães (The Power of the Dog, 2021)

Ataque dos Cães (The Power of the Dog, 2021). Dir: Jane Campion. Netflix. Este é para ficar pensando um tempo. "Ataque dos Cães" se passa no estado de Montada, EUA, nos anos 1920 (embora tenha sido filmado na Nova Zelândia). É um curioso estudo sobre masculinidade tóxica, alcoolismo e maternidade/paternidade. A australiana Jane Campion (de "O Piano") filma sem pressa, em belíssimas imagens capturadas pela fotografia de Ari Wegner. A trilha de Jonny Greenwood (de vários filmes de Paul Thomas Anderson) é bastante presente e ajuda na composição de um cenário ao mesmo tempo lindo e opressor.

A trama envolve primeiramente dois irmãos, George (Jesse Plemmons) e Phil (Benedict Cumberbatch), dois "cowboys" que estão completando 25 anos tocando gado juntos. Enquanto que George é elegante e suave, Phil é bruto, orgulhoso e "macho". Cumberbatch está soberbo no papel de um homem asqueroso e ciumento da companhia do irmão; ele fica ainda mais furioso quando George conhece Rose (Kirsten Dunst), uma viúva que trabalha em um restaurante de uma pequena cidade. George e Rose se casam e se mudam para o rancho da família. Phil não esconde seu desprezo pela cunhada e faz de tudo para fazer a vida dela um inferno.

Rose não é a única vítima de Phil. Ela tem um filho chamado Peter (Kodi Smit-McPhee), que está estudando para ser médico e é o oposto do que Phil espera de um "homem"; Peter é sensível, quieto, tímido e protegido pela mãe. O roteiro, baseado em um livro de Thomas Savage, consegue surpreender de forma sutil, subvertendo algumas expectativas (pense no que acontece com aquele coelho, por exemplo). Não é um filme muito fácil, é lento e os personagens não são muito simpáticos. É, porém, fascinante. Tá na Netflix.

Ghostbusters: Mais Além (Ghostbusters: Afterlife, 2021)

 

Ghostbusters: Mais Além (Ghostbusters: Afterlife, 2021). Dir: Jason Reitman. Claro que este filme está calcado na nostalgia. Isso pode ser encarado de forma cínica ("estamos aqui só para ganhar o dinheiro dos fãs") ou não. Jason Reitman, o diretor e co-roteirista, é filho do diretor do original, Ivan Reitman, e declarou que o filme era uma homenagem ao trabalho do pai. Acho que há um pouco dos dois. O fato é que eu me diverti mais do que estava esperando, o que é ótimo.


Primeira surpresa... Carrie Coon? Ok, se o filme original tinha Sigourney Weaver, este também tem uma atriz e tanto no elenco; Coon faz o papel de Callie, uma mãe divorciada com dois filhos adolescentes que tem que se mudar para uma fazenda no meio do nada porque ela está falida. O pai dela, aos poucos ficamos sabendo, era Egon Spengler (Harold Ramis), um dos "caça-fantasmas" originais. Um dos acertos desta versão foi mudar o cenário urbano de Nova York dos outros filmes para uma paisagem rural. Finn Wolfhard (de Stranger Things) e Mckenna Grace são os adolescentes. Grace interpreta Phoebe, uma precoce garota de 12 anos que é nerd e acha ciência o máximo. O elenco ainda tem o garotão (de 52 anos) Paul Rudd como um sismólogo que está estudando estranhos terremotos que acontecem por ali.

Acho que a nostalgia de Reitman tem mais a ver com os filmes de Spielberg do que com "Ghostbusters", na verdade. Os garotos investigando fenômenos paranormais pela cidadezinha me lembraram filmes como "Os Goonies" ou mesmo "E.T." (recentemente, "Stranger Things" surfou na mesma onda). De vez em quando a gente é lembrado que esta é uma continuação de "Ghostbusters" e alguma referência é jogada na tela... armadilhas para fantasmas, o carro original, "mochilas de protons", etc. Apesar de gostar bastante do filme original de 1984, é fato que o roteiro era uma bagunça e a parte final, que envolvia cães "demoníacos" enviados por um deus sumério e referências "bíblicas" ao fim do mundo, cá entre nós, era uma grande bobagem; isso acontece exatamente igual aqui.

O ato final é praticamente uma recriação do final de "Ghostbusters" e, estranhamente, é o mais fraco. O filme é melhor quando foca nas relações familiares. É até uma surpresa quando os atores originais finalmente dão as caras e até me pergunto se eles eram necessários (há, porém, uma boa homenagem a Harold Ramis, que morreu em 2014). Há duas cenas pós créditos que prometem continuações desnecessárias, mas que você sabe que vão acontecer. Nos cinemas.

domingo, 2 de janeiro de 2022

tick, tick...BOOM! (2021)

tick, tick...BOOM! (2021). Dir: Lin-Manuel Miranda. Netflix. Vibrante musical que marca a estreia na direção de Lin-Manuel Miranda, que agitou a Broadway com seu "Hamilton" alguns anos atrás (hoje disponível na Disney+). O roteiro de "tick, tick...BOOM!" é baseado no musical (e na vida) de Jonathan Larson (um ótimo Andrew Garfield), um compositor e dramaturgo que, assim como Miranda faria depois, deixou sua marca nos palcos da Nova York dos anos 1990.

Larson era um compositor desconhecido que trabalhava em uma lanchonete de dia enquanto passava todos os outros momentos da sua vida trabalhando em um musical. A namorada, Susan (Alexandra Shipp), uma dançarina, se sentia deixada de lado. Michael (Robin de Jesus), um ator fracassado que havia trocado os palcos por um emprego bem pago como publicitário, também ficava em segundo plano. Tudo, na verdade, ficava em segundo plano para a "futura obra prima" de Larson, que iria apresentar uma leitura do musical para críticos no final da semana.

Andrew Garfield canta, dança, toca piano e carrega o filme nas costas. As músicas (compostas pelo Jonathan Larson real) não são nenhuma obra-prima, mas são animadas e ficam na cabeça. O roteiro é estruturado a partir de uma apresentação de Garfield e banda (Vanessa Hudgens é uma das cantoras). Diversas "lendas" da Broadway fazem participações especiais, como Bernardette Peters e Bebe Neuwirth, além de membros de "Hamilton", como a cantora Phillipa Soo. O ator Bradley Whitford interpreta outra lenda dos musicais, o compositor Stephen Sondheim. Lin-Manuel Miranda faz um "cameo" como um cozinheiro da lanchonete em que Larson trabalha. A trama leve e "para cima" tem alguns momentos dramáticos, como quando retratam as vítimas da AIDS da época. Divertido. Tá na Netflix.

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (Shang-Chi and the Legend of the Ten Rings, 2021)

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (Shang-Chi and the Legend of the Ten Rings, 2021). Dir: Destin Daniel Cretton. Estreia na Disney+ do mais recente filme da Marvel. Nunca fui leitor de quadrinhos de heróis, então o personagem, para mim, era desconhecido. Como filme genérico de artes marciais/filosofia de biscoito da sorte, porém, ele até que funciona. Minha maior surpresa foi ver o grande, gigante Tony Leung (Amor à Flor da Pele, Desejo e Perigo, O Amante, etc) como uma espécie de guerreiro imortal que possui os tais "dez anéis" do título. Ele é tamanho ator que você genuinamente sente por ele quando ele sofre pela esposa perdida, ou alguma cena mais sentimental do filme.

O roteiro é bem mirabolante e trata de um rapaz de São Francisco, Shang-Chi (Simu Liu, simpático), que trabalha como manobrista de um hotel. Ele tem uma amiga interpretada por Awkwafina, que é a obrigatória personagem cômica da Marvel (embora ela seja realmente engraçada). Uns capangas aparecem do nada para roubar um pingente que a mãe de Shang-Chi deu a ele quando ele era criança; o incidente faz com que ele revele para a amiga que, na verdade, ele foi criado pelo pai desde os sete anos para ser um assassino profissional. Eles vão até Macau para encontrar uma irmã de Shang-Chi, interpretada por Meng'er Zhang. Tudo culmina em uma longa sequência passada em uma terra mítica, no meio de uma floresta mágica (onde vive a grande Michelle Yeoh).

Como quase sempre acontece com estes filmes, este poderia ter uns 20 minutos a menos. Há boas cenas de artes marciais e de ação, embora a computação gráfica seja óbvia e o clímax parece mais com um filme de animação. Como disse, há bastante "filosofia de biscoito da sorte" e clichês de artes marciais, mas o bom elenco segura a onda. Há um personagem (que talvez seja spoiler), visto antes no terceiro filme do "Homem de Ferro", que está totalmente fora de lugar e irrita bastante. Há as obrigatórias cenas no meio e pós créditos. Eu sinceramente já me perdi na cronologia da Marvel. Disponível na Disney+.

The Morning Show (primeira temporada, 2019)

The Morning Show (primeira temporada, 2019). Apple TV+. Série em 10 capítulos que retrata a queda de um jornalista "estrela" de um programa matinal. O roteiro vem na esteira das acusações trazidas à tona pelo movimento "Me too", que revelou vários comportamentos inapropriados (para dizer o mínimo) de homens em posição de poder. É uma superprodução da Apple, com grande elenco e alto nível de produção. O roteiro, no entanto, ganharia com alguma sutileza, pois o assunto é delicado de lidar. O resultado é uma série às vezes mais engraçada do que deveria, apesar de um episódio bem pesado e um final meio perdido.

Mitch Kessler (Steve Carrell, que é tão bom interpretando canalhas quanto em comédias) está há 15 anos à frente do "The Morning Show", um programa matinal líder de audiência. Sua companheira de bancada, Alex (Jennifer Aniston, bem melhor do que eu esperava), acorda toda noite às 3h30 da manhã para se preparar para o programa; no dia que abre a série, todos na emissora são acordados com uma "bomba": Mitch havia sido demitido após ter sido acusado de assédio sexual por várias mulheres. A situação é claramente inspirada no caso de Matt Lauer, que foi "âncora" do Today Show, da NBC, por vários anos, até ser demitido pela mesma razão.

A série faz um bom trabalho em apresentar um monte de personagens diferentes e identificá-los na hierarquia de uma grande emissora de TV. Os cenários são muito bem feitos e a sala de controle do estúdio parece pronta para colocar um programa de verdade no ar. O ótimo elenco conta com Reese Witherspoon, Mark Duplass, Billy Crudup, Gugu Mbatha-Raw, Nestor Carbonell e dezenas de outros. O "problema" com o apresentador força a emissora a procurar por um substituto; eis que surge Bradley Jackson (Witherspoon, ótima), uma repórter do interior que teve um vídeo que viralizou e, em uma reviravolta (resumindo bastante) acaba parando na bancada do programa, ao lado de Jennifer Aniston.

Billy Crudup, como um executivo de entretenimento que assume o setor de jornalismo, está excelente. Seu personagem acredita que "o caos é a nova cocaína" e ele vê uma oportunidade de mudança (e ascensão na carreira) no escândalo. Isso justifica várias situações da série que, no mundo real, dificilmente aconteceriam.

O "coração" da série está no oitavo episódio, que mostra como um cara aparentemente gente boa como o personagem de Steve Carrell pode agir como um monstro. A cena em que ele leva uma produtora junior para o quarto do hotel é bastante desconfortável. O último capítulo, no entanto, achei uma confusão danada. As várias tramas, desenvolvidas por dez capítulos, parecem tentar ser resolvidas nos quinze minutos finais. É uma série com altos e baixos, mas que nunca perde o interesse. A segunda temporada está para terminar na Apple TV+