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domingo, 22 de outubro de 2023

Assassinos da Lua das Flores (Killers of the Flower Moon, 2023)

Assassinos da Lua das Flores (Killers of the Flower Moon, 2023). Dir: Martin Scorsese. Um filme novo de Scorsese nos cinemas é um evento que deve ser visto em uma sala de cinema. Não pude fazer isso com seu último trabalho, "O Irlandês", que saiu na Netflix, e a diferença é considerável. "Assassinos da Lua das Flores" mostra um Scorsese maduro, ainda tentando coisas diferentes aos 80 anos de idade. A diferença aqui é o ponto de vista feminino, na forma de uma índia da tribo Osage chamada Mollie (Lily Gladstone). Sim, Robert De Niro está lá (excelente). DiCaprio está lá. Assassinatos, violência, gângsters... ingredientes de um filme "normal" de Scorsese, mas talvez com um toque extra de crueldade e tristeza.

A trama se passa nos anos 1920 em Oklahoma, EUA. Leonardo DiCaprio é Ernest, um soldado voltando da Primeira Guerra Mundial para trabalhar para o tio, Willian Hale (De Niro). Os índios da nação Osage ficaram ricos quando petróleo foi descoberto em suas terras. Aparentemente, eles vivem bem, têm casas enormes, carros, joias; mas uma das qualidades deste filme de Scorsese é como ele mostra, bem lentamente, que as aparências enganam. Não é segredo que este é um filme (bem) longo, são quase três horas e meia de duração. A editora habitual de Scorsese, Thelma Schoonmaker, faz um belo trabalho em apresentar os personagens e manter as tramas compreensíveis ao longo de vários anos (e longos minutos de filme), mas é discutível se qualquer filme precisa ter três horas e meia de duração, mas essa é outra questão.
Como disse, creio que o que chama atenção nesta obra é o modo como Scorsese apresenta o "mal". Sem entrar no terreno de spoilers, o filme é excelente em apresentar eventos que, mais tarde, descobrimos serem terríveis, mas que aparentam ser inocentes no começo. O mais desconcertante é o caso de amor entre o personagem de DiCaprio e Millie, cheio de camadas e nuances. Ela, forte, decidida, dona do nariz, mas humana. Ele, fraco, indeciso, aparentemente apaixonado por ela mas incapaz de ir contra um sistema que a vê como algo descartável.
O roteiro, inicialmente, daria ênfase aos agentes federais que vêm para a cidade investigar a morte de vários índios Osage. DiCaprio interpretaria um deles, em um papel mais heroico. Ele e Scorsese acabaram mudando o foco para o ponto de vista das vítimas e o filme ganhou muito com isso. É um trabalho de fôlego que vai colocar lenha na fogueira das premiações do ano que vem, que pareciam estar definidas entre a "Barbie" de Greta Gerwig e o "Oppenheimer" de Nolan.
Com relação à duração do filme, temos que levar em conta que ele foi coproduzido pela Apple para seu canal de streaming. O mesmo aconteceu com "O Irlandês' e a Netflix. Coincidência ou não, são dois filmes com três horas e meia de duração, o que leva a crer que foram editados mais com os serviços de streaming na cabeça do que as salas de cinema. Ridley Scott vai lançar seu "Napoleão" com duas durações, uma mais curta nos cinemas e outra mais longa no streaming. Seria uma nova tendência? É esperar para ver.

terça-feira, 11 de janeiro de 2022

Não olhe para cima (Don´t look up, 2021)

Não olhe para cima (Don´t look up, 2021). Dir: Adam McKay. Netflix. Lançado na véspera do Natal, este filme ficou na minha lista de "a assistir" por alguns dias, devido a compromissos familiares, festas, etc. Só que era impossível abrir qualquer rede social sem ver algum comentário sobre "Não olhe para cima"; memes, spoilers, críticas positivas, negativas, gente me perguntando o que eu achei. Ufa, assisti. Tanto se falou do filme que, acho, não tenho muito a acrescentar. É melhor do que eu esperava (eu tenho medo quando a Netflix junta um monte de atores famosos e faz uma porcaria qualquer para movimentar o algoritmo).

O diretor/roteirista Adam McKay já havia feito uma grande sátira com "A Grande Aposta", também cheio de atores famosos e muito veneno, sobre a crise gerada pela bolha imobiliária. "Não olhe para cima" começou como uma sátira ao aquecimento global. Só que nosso "amigo" Covid apareceu em plena produção e o filme tomou outro rumo. O cometa descoberto por dois cientistas desconhecidos (Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence) acabou se tornando um símbolo para muito do que vimos nos últimos anos, como o negacionismo, os movimentos anti vacina e contra as máscaras, etc. É como se o vírus estivesse ali, brilhando no céu e vindo em nossa direção, mas muita gente fica dizendo que não devemos olhar para cima.

"Não olhe para cima", aliás, tem outro significado. Quando você olha para cima, você tira os olhos do celular. Um dos personagens do filme, interpretado com muita ironia por Mark Rylance, é um magnata das comunicações que é uma mistura de Jeff Bezos, Elon Musk, Steve Jobs, entre outros. Enquanto DiCaprio e Lawrence tentam convencer a todos de que o mundo vai acabar se nada for feito, Rylance vê no cometa uma oportunidade de "monetizar". A mídia, cheia dos sorrisos de Tyler Perry e Cate Blanchett, está mais preocupada com a "separação" de uma estrela teen (interpretada por Ariana Grande) do que em realmente escutar os cientistas. DiCaprio é classificado como um AILF (procure no google) enquanto que a personagem de Lawrence se torna um meme "engraçado".

Em meio a tudo isso, me surpreendi emocionado com os momentos finais. A Natureza é bela, mas pode ser letal. Há uma cena de jantar em família que vale o filme. E a Netflix segue surpreendendo... fazendo porcarias como "Alerta Vermelho" e "Imperdoável" mas lançando bons filmes como "Ataque de Cães", "A Mão de Deus" e "Não olhe para cima". Faz parte do jogo.

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

VENCEDORES OSCAR 2016



MELHOR FILME: "Spotlight - Segredos Revelados"

Melhor Diretor: Alejandro G. Iñarritu, por "O Regresso"

Melhor ator: Leonardo DiCaprio, por "O Regresso"

Melhor atriz: Brie Larson, por "O Quarto de Jack"

Melhor roteiro adaptado: "A Grande Aposta", de Charles Randolph e Adam McKay

Melhor roteiro original: "Spotlight", de Josh Singer e Tom McCarthy

Melhor Canção: "Writing´s on the Wall", Sam Smith, de "007 Contra Spectre"

Melhor Trilha Sonora: Ennio Morricone, por "Os Oito Odiados"

Melhor Filme Estrangeiro: "O Filho de Saul", de László Nemes

Melhor Curta Metragem: "Stutterer", de Benjamin Cleary e Serena Armitage

Melhor Documentário, Longa Metragem: "Amy", de Asif Kapadia e James Gay-Rees

Melhor Documentário, Curta Metragem: A Gir in the river: The Price of Forgiveness, de Sharmeen Obaid-Chinoy

Melhor Ator Coadjuvante: Mark Rylance, por "Ponte dos Espiões"

Melhor atriz coadjuvante: Alicia Vikander, em "A Garota Dinamarquesa"

Melhor Animação Longa Metragem: "Divertida Mente", de Pete Docter e Jonas Rivera

Melhor Curta Metragem de Animação: "Bear Story", de Gabriel Osorio e Pato Escala

Melhores Efeitos Especiais: Andrew Whitehurst, Paul Norris, Mark Ardington e Sara Bennett, por "Ex Machina"

Melhor Mixagem de Som: Chris Jenkins, Gregg Rudloff and Ben Osmo, por "Mad Max: Estrada da Fúria"

Melhor Edição de Som: Mark Mangini e David White, por "Mad Max: Estrada da Fúria"

Melhor Edição/Montagem: Margaret Sixel, por "Mad Max: Estrada da Fúria"

Melhor Fotografia: Emmanuel Lubezki, por "O Regresso"

Melhor Maquiagem: Lesley Vanderwalt, Elka Wardega e Damian Martin, por "Mad Max: Estrada da Fúria"

Melhor Design de Produção: Colin Gibson e Lisa Thompson, por "Mad Max: Estrada da Fúria"

Melhor Figurino: Jenny Beavan, "Mad Max: Estrada da Fúria"

sábado, 11 de janeiro de 2014

O Lobo de Wall Street

Depois de flertar com a fantasia com o infantil "A Invenção de Hugo Cabret", Martin Scorsese está de volta ao estilo que o consagrou. "O Lobo de Wall Street" é seu melhor filme em muitos anos, feito com a garra e a ousadia de um diretor jovem. Scorsese, no entanto, já está com 71 anos, não tem mais nada a provar e realizou pelo menos três obras-primas, Taxi Driver (1976), Touro Indomável (1980) e Os Bons Companheiros (1990). Estão de volta os belos movimentos de câmera minuciosamente coreografados (fotografia de Rodrigo Pietro, de "Argo"), a edição nervosa e magistral da antiga colaboradora Thelma Schoonmacher, o uso constante de clássicos do rock na trilha sonora e um personagem que narra a própria história.

Há muito de Henry Hill (personagem de Ray Liotta em "Os Bons Companheiros") em Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio, em sua quinta colaboração com Scorsese). Os dois são jovens ambiciosos que não querem viver a vida de "otários" que as pessoas comuns vivem. Os dois se juntam a organizações cujo principal objetivo é ganhar dinheiro por qualquer meio possível, não se importando com a lei. Henry Hill se juntou aos mafiosos; Jordan Belfort se juntou à Wall Street. Em "O Lobo de Wall Street", Scorsese deixa um pouco de lado a violência física e investe pesado no triângulo sexo, dinheiro e drogas. DiCaprio está constantemente "chapado", seja com cocaína, bebida ou centenas de pílulas de remédios controlados. Há também uma grande dose de cenas de sexo e nudez. Há também uma surpreendente dose de humor. Hugo Cabret, pelo jeito, foi só uma brincadeira passageira de Scorsese com o cinema em 3D.

O roteiro, escrito por Terence Winter, é baseado na vida real de Jordan Belfort, um corretor de valores que tinha o dom de vender qualquer coisa. Depois da "Segunda-feira Negra" (19 de outubro de 1987, quando Wall Street teve a maior queda desde o "crash" de 1929), Belfort foi trabalhar em uma corretora de fundo de quintal. As ações valiam apenas centavos, mas a comissão dos corretores era de 50%. Há uma ótima cena em que Belfort, em sua primeira ligação, convence um comprador a adquirir 4 mil dólares em ações de uma empresa de garagem, e seus companheiros ficam todos assistindo seu desempenho. Em pouco tempo ele se junta a Donnie Azzof (um ótimo Jonah Hill, de "O Homem que Mudou o Jogo") e funda a empresa Stratton Oakmont, cujo logo e propagandas sugerem uma tradicional firma de Wall Street, quando na verdade funcionava em uma garagem improvisada; os corretores, todos antigos amigos de Belfort, se transformaram de vendedores de maconha a milionários em poucos meses. (mais abaixo)


O elenco conta com várias participações especiais. O diretor Rob Reiner faz o pai de Belfort, "Mad Max" Belfort. O também diretor Jon Favreu (da série "Homem de Ferro") interpreta um advogado. Kyle Chandler (de "Super 8" e "Argo") é um agente do FBI que quer colocar Belfort atrás das grades. Jean Dujardin (de "O Artista"), é um sofisticado banqueiro suíço a quem Jordan recorre para tentar esconder sua fortuna. A australiana Margot Robbie é Naomi, uma ex-modelo que faz com que Jordan Belfort largue da mulher para se casar com ela (a cena em que DiCaprio a pede em casamento lembra um pouco DeNiro pedindo Sharon Stone em casamento em "Cassino", aliás). A participação mais marcante, porém, é de Matthew McConaughey (de "Obsessão"), em um pequeno mas importante papel no início do filme. A cena em que ele e um jovem DiCaprio almoçam juntos dá o tom para toda a trama, e McConaughey está ótimo.

Claro que a vida de excessos de Belfort não poderia acabar bem. "Não há nobreza em ser pobre", diz DiCaprio em um de seus vários discursos para seus corretores. "O Lobo de Wall Street" mostra que ser rico a qualquer custo também tem seu preço.

terça-feira, 11 de junho de 2013

O Grande Gatsby

É difícil sair do lugar comum ao se escrever sobre esta versão para cinema (a quarta) do livro de F. Scott Fitzgerald. O diretor Baz Luhrmann filma como se o estúdio estivesse pegando fogo; tudo é exagerado, carnavalesco e, no final das contas, falso. "Que grande cenário!", pensa o espectador. "Quantos figurantes!". É um filme em que grande quantidade de dinheiro foi gasta para contar a história de uma época em que se "torrava" muito dinheiro. É ultra colorido e fotografado como um conto de fadas regado a LSD. Quando termina, resta apenas levantar da poltrona e sair da sala.

sábado, 28 de janeiro de 2012

J. Edgar

John Edgar Hoover foi diretor do FBI por quase 50 anos. Transformou as técnicas policiais, criou as bases para a criminalística e foi dos primeiros a acreditar na importância das impressões digitais para se descobrir criminosos. Passou por vários momentos importantes da história americana e mundial do século XX; a depressão dos anos 30, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria, a "caça às bruxas" da perseguição comunista, o assassinato de John F. Kennedy, o pouso na Lua, o início da Guerra do Vietnã. Uma cinebiografia estrelada por Leonardo DiCaprio e dirigida por Clint Eastwood tinha tudo para ser épica, não? Então por que é que "J. Edgar" não consegue decolar?

Há vários problemas. O mais sério é o ponto de vista adotado por Eastwood e seu roteirista, Dustin Lance Black (do bom "Milk - A Voz da Igualdade"). O filme acompanhar Hoover o tempo todo; quando ele não está falando sem parar, sua voz em off narra seus pensamentos e desacreve acontecimentos da época, em um discurso lento e com sotaque carregado feito por DiCaprio. Não há momentos de respiro, de reflexão. J. Edgar era um rapaz metódico, perfeccionista e muito ligado à mãe (Judi Dench). Acreditava piamente que o Comunismo era uma doença, principalmente quando, logo depois da Revolução Russa de 1917, os Estados Unidos sofreram uma série de atentados a bomba cometidos por grupos radicais. Retraído e homossexual enrustido, Hoover não tinha namoradas, amigos nem família (além da forte presença materna). Leonardo DiCaprio não é mau ator, mas nos últimos anos adotou um estilo de interpretação que se resume a fazer uma cara fechada, com as sobrancelhas franzidas, e falar pausadamente. O roteiro usa de um artifício comum às cinebiografias, que consiste em colocar o personagem principal narrando a própria vida para um jornalista ou biógrafo. Neste caso, uma série de agentes (com nomes genéricos como "Agente Smith") anotam a narração de um velho Hoover (DiCaprio com maquiagem pesada) falando sobre como assumiu a direção do FBI com apenas 24 anos. Figuras históricas como Martin Luther King são mencionadas, mas nunca vistas. O foco está sempre em Hoover. Há destaque para o episódio do sequestro do filho do aviador Charles Lindbergh nos anos 30, que comoveu os Estados Unidos, e Hoover é visto expulsando as pessoas da sala dos fumantes para criar o primeiro laboratório de criminalística do FBI. Mas não fica claro se as técnicas empregadas pelo Bureau eram corretas ou pura adivinhação.

Eastwood parece distante da história que está contando. A trilha sonora, composta pelo próprio diretor, toca nos poucos momentos em que Hoover demonstra algum sentimento por outra pessoa, seja pela secretária particular vivida por Naomi Watts ou pelo companheiro Clyde Tolson (Armie Hammer). O relacionamento com Tolson é guiado com mão pesada por Eastwood, talvez pela falta de familiaridade com o assunto. A única cena de "amor" entre Hoover e Tolson acontece durante uma briga em que os dois partem para a violência. Pouco se fica sabendo sobre quem realmente foi J. Edgar Hoover, além de um egocêntrico que se considerava acima de todos. O roteiro deixa de lado a perseguição pessoal que Hoover praticou contra várias figuras que ele considerava "perigosas", como o ator e diretor Charlie Chaplin, deportado dos Estados Unidos nos anos 50. Fica difícil para o público ter qualquer empatia por um homem que, aparentemente, não passava de um "chato" que fala sem parar pelos 137 minutos do filme.


sexta-feira, 6 de agosto de 2010

A Origem

É um sonho. Você não sabe como foi parar lá. Enquanto ele acontece, parece tão real que você sente as mesmas dores, medos, alegrias, frustrações e desejos de quando está acordado. Ao mesmo tempo, há "algo" que lhe diz que não é verdadeiro. A cronologia é bagunçada. Você é capaz de feitos incríveis, como voar ou conquistar aquela pessoa que deseja. E quem nunca acordou assustado ao sonhar que estava caindo?

Todas estas situações, e muito mais, são usadas pelo diretor Christopher Nolan na criação de "A Origem". Nolan sempre gostou de desafios. Em "Memento" (2000) ele contou uma história ao contrário, com o filme partindo do final e indo para o começo. Em "Insônia" (2002) ele explorou a estranha investigação de um crime em um lugar em que nunca anoitecia. Em "O Grande Truque" (2006), a rivalidade entre dois mágicos é levada às últimas consequências. Nolan também foi o responsável pela volta do Homem Morcego nas versões sombrias de "Batman Begins" (2005) e "O Cavaleiro das Trevas" (2008). Seu enorme sucesso lhe permitiu produzir este roteiro ambicioso, de própria autoria, que lida com o mundo dos sonhos e do subconsciente.

Leonardo DiCaprio é Cobb, um especialista pago para invadir o sonho de pessoas para, através de manipulação ou intimidação, roubar informações. Seu próprio subconsciente carrega um problema, um trauma causado pela morte de sua esposa, Mal (Marion Cotillard), que invariavelmente acaba invadindo seus sonhos e atrapalhando a missão. Cobb não realiza as operações sozinho. Ele precisa da ajuda de outros especialistas, como uma "Arquiteta" (Ellen Page, a eterna "Juno"), responsável por criar o ambiente em que o sonho se passa. Há também o "Químico" (Dileep Rao), responsável por fazer a equipe dormir através de drogas de potências variadas. Há especialistas em se passar por outras no subconsciente da pessoa "invadida", e assim por diante. Há várias influências de "Matrix" (que já era um pastiche de várias fontes pop, como o livro "Neuromancer", de William Gibson) no roteiro. Mas "Matrix" influenciou mais na composição da equipe de DiCaprio do que propriamente no conceito de viver em uma realidade alternativa. Nolan poderia ter feito um filme voltado somente para o lado psicológico do ser humano, mas deve-se levar em conta seu lugar como diretor de filmes de massa, com a necessidade de entreter a parte da platéia que, lá pelo meio do filme, já não está entendendo mais nada.

Assim, pondo um pouco de lado e aceitando esse lado comercial do filme (que envolve perseguições e tiroteios, esperados em um filme de ação), o roteiro de Nolan é inteligente. Não contente em escrever uma história que se passa dentro do sonho de uma pessoa, "A Origem" mergulha em diversos níveis de sonho dentro de sonhos, cada um influenciado pelos acontecimentos do nível superior. Assim, como acontece na vida real, estímulos externos como movimentos bruscos ou ruídos afetam o que acontece no sonho, o que rende situações incríveis. Como se isso não bastasse, Nolan ainda usa o princípio de que, no sonho, o tempo parece passar mais devagar do que na vida real. Quem nunca cochilou por apenas cinco minutos e passou por um sonho que parece ter durado horas? Assim, o roteiro envia Cobb e sua equipe para dentro de diversos níveis de sonhos na mente de Robert Fischer (Cillian Murphy), herdeiro de um império empresarial que um rival (Ken Watanabe) quer destruir. Dentro de cada nível do subconsciente o tempo demora mais para passar, e todos devem ser sincronizados em um momento chave em que um acontecimento brusco pré-programado vai acordar os participantes e trazê-los de volta à realidade.

Há alguns detalhes que parecem ter sido criados para provocar o subconsciente do espectador. A música usada para acordar os "viajantes" é "Non, je ne regret rien" (Eu não me arrependo de nada), música de Edith Piaf que foi interpretada pela mesma Marion Cotillard que faz a esposa problemática de DiCaprio. O próprio DiCaprio interpretou um homem traumatizado pela morte da esposa em "Ilha do Medo", de Martin Scorsese. Coincidência? (Falando em música, deve-se lamentar a trilha sonora de Hans Zimmer, que toca sem parar por quase todo filme, que ganharia com um pouco mais de silêncio).

Crítica e público debatem a suposta genialidade de Christopher Nolan desde "Memento" e a balança, por enquanto, ainda pende para o lado do diretor. Seu maior problema é a tendência de querer explicar cada detalhe do que coloca na tela, em diálogos expositivos que soam artificiais demais. Nolan pode não ser um Kubrick (que também não era perfeito), mas na baixa criatividade e originalidade do cinema atual, sem dúvida ele está acima da média.


domingo, 14 de março de 2010

Ilha do Medo

"Nenhum homem é uma ilha", diz o ditado. Mas quem estuda um pouco de psicologia sabe que, na verdade, somos todos ilhas. Não há nada mais individual do que o modo como cada um vê e interpreta o mundo ao seu redor. O que é a realidade se não o modo como percebemos e interpretamos as coisas?

O novo filme de Martin Scorsese se passa integralmente em uma ilha, Shutter Island, no leste dos Estados Unidos. É uma ilha sanatório, para onde são enviados os pacientes mais perigosos e violentos. A trama também se passa em outra "ilha", nas memórias do personagem principal, Teddy Daniels (Leonardo DiCaprio, em mais uma parceria com Scorsese), traumatizado pela morte de sua esposa em um incêndio e pelas lembranças terríveis de quando libertou um campo de concentração nazista, na II Guerra Mundial. Teddy é um agente federal que é enviado à Shutter Island com seu parceiro Chuck (o sempre competente Mark Ruffalo) investigar o misterioso desaparecimento de uma paciente. Eles são recebidos pelo doutor Cawley (Ben Kingsley), que tem teorias próprias quanto ao modo de tratar os pacientes.

"Ilha do Medo" é um filme de suspense com toques de terror, e vai se tornando cada vez mais sinistro conforme a trama avança. Nem sempre o roteiro funciona, mas a competência impecável de Scorsese na direção e a boa interpretação do sólido elenco (que conta ainda com nomes como Max von Sidow e Emily Mortimer) contornam eventuais problemas. Scorsese é genial em mostrar que nem tudo é o que parece com pequenos detalhes, como a rápida cena em que um personagem "toma água" com um copo inexistente, ou um farol de navegação que não parece estar duas vezes no mesmo lugar. DiCaprio pode não ser um substituto à altura de Robert DeNiro (o antigo colaborador habitual de Scorsese), mas é bom ator e, aos poucos, vai passando ao espectador a sensação de que há algo errado com seu personagem. Ou será que o problema não é com ele? Será que Teddy é apenas paranóico ou há realmente um plano sombrio por trás do Dr. Cawley e os médicos da ilha? Ou, como diz uma piada de humor negro, "meus remédios para a paranóia estão tramando contra mim". Há, claro, ecos de Hitchcock em vários momentos do filme, de "Um Corpo que Cai" à "Psicose". E alguns toques de "O Iluminado", de Stanley Kubrick.

Dependendo de como se encara a trama (e o que é real ou não), o final pode ser tanto absurdo quanto aceitável. Não é um filme perfeito, e Scorsese já teve dias melhores. Mas, enquanto se desenrola, "Ilha do Medo" cumpre seu papel de intrigar e assustar o espectador.




PS: A trilha de "Ilha do Medo" foi organizada por Robbie Robertson. O tema principal do filme é a Sinfonia número 3 de Penderecki, que pode ser ouvida aqui:

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Foi apenas um sonho

Frank Wheeler (Leonardo DiCaprio) trabalha como um executivo em uma empresa em Nova York. É 1955 e os americanos vivem o pós-guerra. Frank não gosta do emprego, mas é o que mantém a ele, sua esposa April (Kate Winslet) e um casal de filhos em uma bela casa no subúrbio. No dia do seu aniversário de 30 anos, ele leva uma secretária para almoçar, desabafa seus problemas e, depois de beberem muito, transam no apartamento dela. Ao chegar em casa, a esposa e os filhos o aguardam para uma festa surpresa de aniversário. A cena do parabéns, aliás, é uma das poucas em que as crianças são vistas. Pelo resto do filme, muito se fala mas pouco se vê dos filhos.

"Foi apenas um Sonho" é o título brasileiro bobo e óbvio para "Revolutionary Road", o mais recente filme de Sam Mendes. Ele fecha o que podemos chamar de "trilogia do desespero" da classe média americana, formada pelos filmes "Beleza Americana" (do próprio Sam Mendes, de 1999) e "Pecados Íntimos" (de Todd Field, 2006), também estrelado por Kate Winslet. Mas não fecha com chave de ouro. Há algo de muito frio e calculado no filme de Mendes que transforma mais em um exercício de observação do que de empatia.

Após a festa de aniversário, April surpreende o marido com uma proposta: por que eles não vendem a casa, empacotam tudo e vão morar em Paris? Ela sabe que ele não é feliz no emprego e gostaria que ele tivesse tempo livre para poder "descobrir sua vocação". Como eles iriam sobreviver? O salário dela como secretária em uma agência do governo seria suficiente para sustentar a família, visto que o custo de vida de Paris (em 1955) era barato. A princípio Frank acha que ela não está sendo prática, mas acaba aceitando a idéia. De repente, a idéia de Paris e de largar tudo dá nova vida ao casal. Eles ficam mais próximos e surpreendem os vizinhos e colegas de trabalho com o anúncio de mudança de vida. No trabalho, quase que sem querer, Frank faz uma sugestão à matriz que é considerada revolucionária e, ironicamente, recebe uma proposta de promoção e aumento de salário. "Imagino a cara que eles fizeram quando você disse que está abandonando a empresa", brinca April.

Claro que a idéia de Paris funciona mais como uma fantasia do que como algo concreto. E o filme funciona ao expor os preconceitos da época, principalmente quando se comenta que seria a esposa a sustentar a família. Há também um personagem interessante interpretado por Michael Shannon, que faz um antigo interno de um hospital psiquiátrico. Ele visita os Wheelers acompanhado da mãe (Kathy Bates), que foi a corretora que lhes vendeu a casa, e do pai. Ao saber dos planos de se mudar para Paris, o rapaz parece ser o único a entender o casal. Só que Frank não está mais tão certo de sua decisão. A proposta de promoção e aumento de salário é tentadora. Eles não poderiam ser felizes nos Estados Unidos mesmo? Para complicar, April descobre que está grávida de 10 semanas e começa a imaginar se não seria melhor abortar.

"Foi apenas um sonho" funciona melhor em sua primeira metade. O filme decai mais para o final. O roteiro é por demais teatral e direto, principalmente nas constantes brigas do casal, com muitos diálogos didáticos e expositivos. As crianças aparecem e desaparecem conforme a necessidade do roteiro, e "babás" são citadas a todo momento, mas nunca são vistas. Mas é um filme bem feito e bem interpretado, principalmente por Kate Winslet. Ela e DiCaprio repetem o par romântico de "Titanic", pouco mais de dez anos depois. Com o perdão do trocadilho, "Foi apenas um sonho" é bom, mas frio como um iceberg.


terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Rede de Mentiras

O que leva um diretor como Ridley Scott a fazer um filme como “Rede de mentiras”? Scott é um diretor eclético, tendo dirigido desde ficções científica cultuadas como o primeiro “Aliens” e o clássico “Blade Runner” até épicos como “Gladiador” e “1492”. Mas, de vez em quando, ele embarca em bobagens militares como “Falcão Negro em Perigo” ou este “Rede de Mentiras”. Não que o filme seja um desastre completo. Scott tem bom olho para enquadramentos e um grande senso estético, sendo sem dúvida competente no visual e na técnica cinematográficas. Mas “Rede de Mentiras”, além de ser um amontoado de clichês comuns a vários filmes de guerra e espionagem, tem também paralelos curiosos com outro filme de espionagem chamado “Jogos de Espiões”, dirigido pelo irmão mais novo (e menos talentoso) de Ridley, chamado Tony Scott (de “Top Gun, Ases Indomáveis”).

Em “Jogos de Espiões”, tínhamos um veterano da CIA (interpretado por Robert Redford) que era comandante e “mentor” de um jovem agente (interpretado por Brad Pitt), que era quem ia a campo realizar suas missões. Em “Rede de Mentiras”, também temos um veterano chamado Ed Hoffman (Russell Crowe, sempre camaleão, gordo e envelhecido para o papel) que, de seu posto nos Estados Unidos, supervisiona as operações de um jovem agente chamado Ferris (Leonardo DiCaprio) em missão no Iraque. Em “Jogos de Espiões” o personagem de Brad Pitt se envolvia com uma enfermeira que trabalhava com refugiados de guerra. Em “Rede de Mentiras”, DiCaprio se envolve com a enfermeira de um hospital em Amã, Jordânia, que lhe trata dos ferimentos após ter sido atacado por cães raivosos. A única diferença é que enquanto em “Jogos de Espiões” havia uma camaradagem e amizade entre o velho e o novo espião, em “Rede de Mentiras” há uma estranha relação de amor e ódio entre Ed Hoffman e Ferris. Os dois mantém contato telefônico (que maravilha de conexão têm seus celulares) entre os EUA e o Oriente Médio. Russell Crowe é geralmente visto como um “homem de família”, sempre levando os filhos à escola ou os acompanhando em atividades esportivas enquanto, pelo celular, comanda assassinatos e estratégias do outro lado do Globo. DiCaprio é o “herói” do filme mas, nesses tempos em que a popularidade dos EUA no mundo está em baixa, seu personagem é também um frio assassino e explorador de possíveis fontes de informação.

O filme, no entanto, não se sustenta. O espectador fica sentado por mais de duas horas vendo seqüência após seqüência espetacular de perseguições, explosões de bombas e imagens de satélite enquanto é jogado de um canto a outro do Oriente Médio. “Rede de Mentiras” fica melhor quando acalma um pouco em suas passagens na Jordânia. DiCaprio se aproxima de um líder chamado Hani (Mark Strong) que é possivelmente o melhor personagem do filme. Hani aceita fornecer ajuda da Jordânia à CIA, com uma condição: DiCaprio jamais pode mentir para ele. Claro que isso não vai acontecer. E há uma seqüência passada na casa da enfermeira Aisha (Golshifteh Farahani) que, por um momento, até traz alguma humanidade ao filme. Mas é tudo muito rápido. Logo estamos de volta às mesmas explosões e imagens tecnológicas de sempre. “Rede de Mentiras”, infelizmente, acaba se revelando um desperdício para os talentos de Crowe, DiCaprio e Ridley Scott.