sábado, 28 de janeiro de 2012

J. Edgar

John Edgar Hoover foi diretor do FBI por quase 50 anos. Transformou as técnicas policiais, criou as bases para a criminalística e foi dos primeiros a acreditar na importância das impressões digitais para se descobrir criminosos. Passou por vários momentos importantes da história americana e mundial do século XX; a depressão dos anos 30, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria, a "caça às bruxas" da perseguição comunista, o assassinato de John F. Kennedy, o pouso na Lua, o início da Guerra do Vietnã. Uma cinebiografia estrelada por Leonardo DiCaprio e dirigida por Clint Eastwood tinha tudo para ser épica, não? Então por que é que "J. Edgar" não consegue decolar?

Há vários problemas. O mais sério é o ponto de vista adotado por Eastwood e seu roteirista, Dustin Lance Black (do bom "Milk - A Voz da Igualdade"). O filme acompanhar Hoover o tempo todo; quando ele não está falando sem parar, sua voz em off narra seus pensamentos e desacreve acontecimentos da época, em um discurso lento e com sotaque carregado feito por DiCaprio. Não há momentos de respiro, de reflexão. J. Edgar era um rapaz metódico, perfeccionista e muito ligado à mãe (Judi Dench). Acreditava piamente que o Comunismo era uma doença, principalmente quando, logo depois da Revolução Russa de 1917, os Estados Unidos sofreram uma série de atentados a bomba cometidos por grupos radicais. Retraído e homossexual enrustido, Hoover não tinha namoradas, amigos nem família (além da forte presença materna). Leonardo DiCaprio não é mau ator, mas nos últimos anos adotou um estilo de interpretação que se resume a fazer uma cara fechada, com as sobrancelhas franzidas, e falar pausadamente. O roteiro usa de um artifício comum às cinebiografias, que consiste em colocar o personagem principal narrando a própria vida para um jornalista ou biógrafo. Neste caso, uma série de agentes (com nomes genéricos como "Agente Smith") anotam a narração de um velho Hoover (DiCaprio com maquiagem pesada) falando sobre como assumiu a direção do FBI com apenas 24 anos. Figuras históricas como Martin Luther King são mencionadas, mas nunca vistas. O foco está sempre em Hoover. Há destaque para o episódio do sequestro do filho do aviador Charles Lindbergh nos anos 30, que comoveu os Estados Unidos, e Hoover é visto expulsando as pessoas da sala dos fumantes para criar o primeiro laboratório de criminalística do FBI. Mas não fica claro se as técnicas empregadas pelo Bureau eram corretas ou pura adivinhação.

Eastwood parece distante da história que está contando. A trilha sonora, composta pelo próprio diretor, toca nos poucos momentos em que Hoover demonstra algum sentimento por outra pessoa, seja pela secretária particular vivida por Naomi Watts ou pelo companheiro Clyde Tolson (Armie Hammer). O relacionamento com Tolson é guiado com mão pesada por Eastwood, talvez pela falta de familiaridade com o assunto. A única cena de "amor" entre Hoover e Tolson acontece durante uma briga em que os dois partem para a violência. Pouco se fica sabendo sobre quem realmente foi J. Edgar Hoover, além de um egocêntrico que se considerava acima de todos. O roteiro deixa de lado a perseguição pessoal que Hoover praticou contra várias figuras que ele considerava "perigosas", como o ator e diretor Charlie Chaplin, deportado dos Estados Unidos nos anos 50. Fica difícil para o público ter qualquer empatia por um homem que, aparentemente, não passava de um "chato" que fala sem parar pelos 137 minutos do filme.


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