sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Inquietos

Não há nada romântico a respeito do câncer, e este é o maior problema com "Inquietos", de Gus van Sant. Com produção de Ron Howard e Brian Grazer (de blockbusters como "Apolo 13" e "Cowboys e Aliens" ) o filme de Van Sant tem "alma" de filme independente. Atores relativamente desconhecidos, trilha sonora "alternativa" e assuntos considerados tabu no cinema americano, como morte e suicídio. O filme é "bonitinho" demais, o que compromete.

Enoch Brae (Henry Hopper, filho de Dennis Hopper) é um rapaz depressivo que gosta de entrar de penetra em velórios. Ele perdeu os pais em um acidente de carro e esteve à beira da morte por meses. Ele mora com uma tia em uma casa que é o protótipo da casa mal assombrada, grande e escura, e tem um amigo imaginário chamado Hiroshi (Ryo Kase), que diz ser o fantasma de um piloto kamikaze japonês. Enoch conhece Annabel (Mia Wasikowska, pense na garota mais gracinha que se pode imaginar) em um destes velórios e os dois se tornam amigos. Tudo no casal lembra a morte; Enoch apresenta seus pais a Annabel no cemitério, claro, e ela é interessada em insetos que se acasalam na carcaça de animais mortos. Annabel está morrendo; ela é paciente teminal de câncer e os médicos lhe deram três meses de vida. Junta-se um rapaz apaixonado por morte com uma moça que está para morrer e o resultado é difícil de classificar (uma "comédia romântica mórbida"?).

O elenco deve ser elogiado. O filho de Dennis Hopper é bom e sua interpretação ao lado de Wasikowska funciona bem. A amizade entre os dois logo se transforma em amor e, com três meses de vida, não há tempo a perder e o casal passa a maior parte do tempo juntos, seja em transfusões de sangue ou visitando o necrotério do hospital de Annabel. Nem tudo funciona no filme, no entanto. Sim, o casal é uma gracinha e há muita "nobreza" por parte de Enoch em aceitar o amor de Annabel nessas condições, mas se a "mensagem" do filme é contra o preconceito, o rapaz tinha que ser um suicida que tem conversas com pilotos kamikaze? Fica aparente também a tentativa de Gus Van Sant (ou dos produtores) em deixar tudo sempre o mais leve possível. Não há problema algum em encarar a morte com bom humor, mas o filme sofre de um excesso de "gracinha" que chega a incomodar. A trilha sonora de Danny Elfman (que já viu dias melhores em sua parceria com Tim Burton) e as canções "alternativas" tocam alegremente em qualquer situação que poderia ser mais dramática, como se o espectador tivesse que ser pego pela mão e não enfrentar o que, repito, não tem graça alguma: Annabel está morrendo de câncer.

Mia Wasikowska carrega o filme nas costas, mas sua personagem, que deveria ser o centro de atenção, é colocada de lado em sequências em que Enoch está brigando com seu fantasma imaginário ou agindo como um garoto mimado. E por que um filme que fala tanto sobre morte evita encará-la de frente no final? "Inquietos" é cheio de boas intenções, tem bom elenco e várias cenas interessantes, mas acaba se afogando no próprio açúcar. Visto no Topázio Cinemas.



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