Nem tudo é o que parece (Layer Cake, 2004). Dir: Matthew Vaughn. Netflix. Eita que faz quase um mês que não escrevo por aqui (faltou inspiração). Pensar que este filme tem quase 20 anos. "Layer Cake" é daqueles filmes de crime britânicos que até são bons, mas que quase colocam tudo a perder com um estilo cheio de cenas "espertas" e cacoetes. Não é coincidência que Matthew Vaughn, o diretor, produziu alguns filmes de Guy Ritchie, o campeão de filmes estilosos, mas geralmente vazios.
Daniel Craig, às vésperas de se tornar James Bond, aqui é um traficante de cocaína que pretende se aposentar. Como geralmente acontece com personagens à beira da aposentadoria, as coisas não saem como ele espera. A trama é bem confusa e envolve a procura pela filha de um chefão do crime e a venda de 1 milhão de pílulas de ecstasy roubadas da máfia sérvia. No elenco encontramos um jovem Tom Hardy, além de Michael Gambon, Sally Hawkins, Colm Meany, Burn Gorman, entre outros. Sienna Miller, coitada, aparece em duas, talvez três cenas, como a "loira gostosa" do filme.
Como disse, tudo é cheio de estilo, com efeitos especiais colando planos sequência que acompanham a narração do personagem de Craig (que, curiosamente, não tem nome). É bem feito, violento às vezes e com aquele tipo de humor bem britânico. Está mais par Guy Ritchie, porém, do que para Scorsese. Tá na Netflix.
O herói dos aos 1980 está de volta nas mãos do diretor original, George Miller, com Tom Hardy no papel que foi de Mel Gibson. Charlize Theron também está no elenco e quase rouba o filme. Confira o vídeo!
Alfred Hitchcock tinha tal domínio sobre o que fazia que gostava de se desafiar com situações limitantes. Fez um filme inteiro passado em um bote em "Um Barco e Nove Destinos" (1943); em "Festim Diabólico" (1948), uma série de planos sequência simulavam um movimento contínuo de câmera, em tempo real; em "Janela Indiscreta" (1954), colocou James Stewart preso a uma cadeira de rodas e fez todo o filme do ponto de vista dele. Hitch, provavelmente, aprovaria "Locke", filme escrito e dirigido por Steven Knight, disponível na Netflix.
Ivan Locke (Tom Hardy, de "Os Infratores") é um empreiteiro responsável pela construção de um novo edifício em Birmingham, Inglaterra. Na véspera do dia crucial para o projeto, quando mais de 200 caminhões virão despejar toneladas de concreto nas fundações do prédio, Locke entra em sua BMW e parte para Londres, em uma viagem que vai mudar sua vida. Em uma proeza técnica considerável, os 85 minutos do filme se passam dentro do carro de Locke; Tom Hardy é o único ator que vemos durante toda a produção.
Ele não está sozinho, no entanto. As vozes de uma série de personagens podem ser ouvidas pelo viva voz do seu celular, e Locke tem que resolver problemas em três frentes distintas: o canteiro de obras que ele deixou para trás, com várias pessoas desesperadas precisando da orientação dele; sua família, composta pela esposa e dois filhos, entusiasmados pela transmissão de um jogo importante de futebol e o aguardando em casa; e Bethan (Olivia Colman), uma mulher que está em Londres em trabalho de parto de um filho ilegítimo de Locke. Os dois haviam dormido juntos por uma única vez no ano anterior, nas comemorações de uma obra bem sucedida. Locke tem consciência de que fez algo errado e decidiu, justo nesta noite, quebrar com uma vida regrada e íntegra para consertar este erro, nem que tenha que destruir sua carreira e casamento no processo. (leia mais abaixo)
Filmes vistos por um único ponto de vista não são novidade; em 2010, Ryan Reynolds passa o tempo inteiro dentro de um caixão em "Enterrado Vivo", angustiante filme de Rodrigo Cortés. Robert Redford também é o único ser humano visto pelos 144 minutos de "Até o Fim", dirigido por J.C. Chandor em 2013. E Colin Farrell fez um filme praticamente solo em "Por um Fio", em 2002, dirigido por Joel Schumacher.
Assim como nestes outros exemplos, o que marca "Locke", além do feito técnico, é o lado humano. Ivan Locke está longe de ser perfeito. Ele é sem dúvida um workaholic, embora tenha uma visão bastante filosófica sobre seu trabalho. "Concreto é delicado como sangue", diz ele a um subordinado desesperado. Tudo isto é apresentado ao espectador como em uma rádio novela, enquanto Locke viaja pela noite inglesa. Tom Hardy carrega o filme nas costas, mas também é digno de nota o ótimo trabalho vocal realizado pelos atores invisíveis com quem ele dialoga pelo telefone.
Apesar de seu deslize conjugal, Locke é um homem íntegro e responsável. Por que, então, ele arriscaria um trabalho de milhões de libras por causa do bebê de uma mulher que ele mal conhece? Por que abrir o jogo com a esposa esta noite? O que seu próprio nascimento tem a ver com isso?
É interessante notar o significado do seu nome; John Locke, um filósofo do século 17, desenvolveu uma teoria conhecida por "tabula rasa", ou "folha em branco". Ivan Locke, nesta longa viagem noturna, decidiu zerar sua vida e recomeçar do zero. Imperdível.
"Os Infratores" vale mais pelos aspectos técnicos e pelo elenco do que pelo filme. Passado nos anos 1930 durante a "lei seca", ele é extremamente violento e trata da família Bondurant, formada por três irmãos, Forrest (Tom Hardy, de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"), Howard (Jason Clarke) e Jack (Shia Labeouf, de "Wall Street"). A "lei seca" proibia a fabricação e comercialização de bebidas alcoólicas, o que causou o surgimento de milhares de produtores ilegais de bebida. No condado de Franklin, no estado da Virginia, havia tantos fabricantes que, à noite, as florestas ficavam iluminadas pelo fogo dos alambiques ilegais. A família Bondurant é uma das mais prósperas, e há uma lenda que diz que os irmãos são invencíveis, quase imortais.
Os negócios da família são ameaçados pela chegada do agente federal Charlie Hakes (Guy Pearce, de "Prometheus"), um homem elegante mas extremamente cruel. Vestido sempre com roupas sociais, gravata borboleta e luvas, Hakes tem os cabelos tingidos e a fala suave, mas é um homem corrupto que quer uma parte do negócio dos Bondurant. Forrest, o mais velho, se recusa a colaborar e começa uma guerra particular com o agente federal. O problema é que o roteiro (escrito pelo músico e ator Nick Cave), uma vez estabelecida a premissa da história, não consegue desenvolvê-la direito. Fica clara logo no início a situação de antagonismo entre os irmãos Bondurant e Charlie Hakes mas, estranhamente, nada acontece por boa parte do filme. Ou, quando acontece, não há as consequências esperadas. Há uma sequência, por exemplo, em que Hakes dá uma surra em Jack, o irmão mais novo, interpretado por Shia Labeouf. É de se esperar que os irmãos mais velhos de Jack, cabeça quente que são, ataquem Hakes, mas nada acontece. Não só isso, depois de ser surrado violentamente no rosto, Jack aparece com apenas alguns hematomas na cena seguinte. Para um filme tão cuidadoso na direção de arte e recriação de época, falhas como esta chamam a atenção. Em meio a tanta testosterona, há duas mulheres na trama. Uma é Maggie, interpretada por uma das atrizes mais belas hoje em Hollywood, Jessica Chastain (de "A Árvore da Vida", "Coriolano", "Histórias Cruzadas"). Ela é uma ex-dançarina de Chicago que deixa a cidade grande para, ironicamente, procurar por uma vida mais calma no interior. Ela arruma emprego no restaurante dos Bondurant e, aos poucos, ganha o coração duro do irmão mais velho, Forrest. A outra mulher é Bertha (Mia Wasikowska, de "Inquietos"), a filha do pastor da cidade. Ela atrai a atenção do personagem de LaBeouf, que faz de tudo para impressionar a moça, como comprar roupas novas e um carro caro.
"Os Infratores" é dirigido pelo australiano John Hillcoat e tinha tudo para ser muito bom, mas o espectador fica esperando o filme decolar. Há boas cenas de suspense e tiroteio entre os irmãos e a polícia, e cenas ternas de romance entre Shia Labeouf e Mia Wasikowska, mas é tudo muito longo e, o que é pior, inconsequente. O grande ator Gary Oldman, que faz o gângster Floyd Banner, é simplesmente esquecido pelo roteiro no meio do filme. A lenda sobre os Bondurant serem imortais, ao invés de ser contrariada pelo roteiro, acaba sendo confirmada por várias situações difíceis de acreditar. Jessica Chastain é atacada por dois gângsters violentos em uma cena e, pouco depois, aparece intocada. E o próprio caráter dos Bondurant é incongruente. Eles são vistos praticando atos de extrema violência em alguns momentos, mas são incapazes de fazer mal a Charlie Hakes, cada vez mais sanguinário. Assim, "Os Infratores" pode ter seus bons momentos, mas acaba sendo uma experiência decepcionante. Visto no Kinoplex, Campinas.
Oito anos se passaram desde os eventos relatados em "Batman: O Cavaleiro das Trevas" (2008). Gothan City está livre da ameaça dos bandidos graças a uma lei de "tolerância zero" idealizada por Harvey Dent (Aaron Eckhart) e Batman está desaparecido. Ele foi declarado culpado pela morte de Dent e, com a cidade em paz, está aposentado. Bruce Wayne vive recluso em sua mansão e as pessoas pensam nele como uma espécie de Howard Hughes. A paz, claro, está para terminar. Um Vilão (com "V" maiúsculo) está chegando à cidade; ele é Bane (Tom Hardy), um gigante musculoso e assustador que fala com a voz distorcida por uma máscara. Retomando a trama de "Batman Begins" (2000), Bane é um membro da "Liga das Sombras", organização liderada por Lian Neeson que planejava reduzir Gothan City a cinzas.
"O Cavaleiro das Trevas Ressurge" é o capítulo final da franquia regida por Christopher Nolan, diretor que, apesar de extremamente competente, não é conhecido nem pela modéstia ou pela humildade; Nolan gosta de espetáculos grandiosos e um pouco auto-importantes demais. Há quem o ache um gênio, enquanto outros o consideram um charlatão competente. O fato é que, com apenas 42 anos, o britânico Nolan conquistou um lugar entre os grandes diretores hoje no cinemão americano. O espectador que conseguir passar por cima da mão pesada do diretor vai gostar bastante deste episódio final do Homem Morcego. O filme tem 164 minutos de duração e muito pouco humor, e seria mais fácil de digerir se não se levasse tanto a sério. É o tipo de filme de super-herói que não faz auto-paródia, como "Os Vingadores", por exemplo.
Nolan trabalha com um elenco que o acompanha não só desde o primeiro "Batman", mas muitos deles também trabalharam com ele em "A Origem" (2010), como Michael Caine (o mordomo Alfred), Tom Hardy (irreconhecível como Bane), Joseph Gordon-Levitt (o policial Blake) e a francesa Marion Cotillard (Miranda Tate). Morgan Freeman volta como o "professor pardal" Lucius Fox e Gary Oldman reassume o papel do Comissário Gordon. Anne Hathaway estréia como a Mulher Gato, que não é necessariamente uma vilã. Christian Bale interpreta novamente Wayne e Batman. A trama é, como todo roteiro de Nolan, complicada. Bane se apodera de um reator desenvolvido pelas empresas Wayne que geraria energia limpa para a cidade de Gothan, mas que nunca havia sido usado porque Bruce Wayne temia, com razão, que ele pudesse ser transformado em uma arma. É exatamente o que faz Bane, com a ajuda de um cientista russo que ele captura em uma sequência espetacular que abre o filme. De posse da bomba nuclear, Bane faz toda cidade de Gothan de refém, cortando as ligações com o resto do mundo. Gothan, neste filme, foi filmada em Nova York, e não em Chicago, como nos outros filmes, para reforçar o isolamento da ilha de Manhattan.
(AVISO DE SPOILERS) Bane destrói a Bolsa de Valores, implode um estádio de futebol americano (em uma cena espetacular já revelada nos trailers) e faz um discurso aos cidadãos da cidade que é uma mistura de anarquismo com um socialismo deturpado. Muito pesado para um filme de super-heróis? Talvez, mas este é o cinema de Christopher Nolan. E onde está Batman, em meio a tudo isso? Ele, ou Bruce Wayne, está no fundo de um poço/prisão daqueles que só existem em filmes, pois dão ao herói a chance de escapar (um vilão de verdade simplesmente mataria Bruce Wayne, mas aí não teríamos o filme, certo?). Pena que, depois de tanta pompa e circunstância, o final de "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge" caia no clichê de uma luta corpo a corpo e em uma bomba daquelas que tem um contador grande e vermelho mostrando quantos segundos faltam para ela explodir. Apesar disso tudo, para quem gosta de um filme lento e bem feito, "Batman" é bom de se ver. Nolan, indo na contra-mão do cinema digital, é dos diretores que ainda usam película para filmar e, mais louvável ainda, se recusou a fazer o filme em três dimensões, como dita a "moda" corrente. Assim como nos outros capítulos, partes do filme foram filmadas em sistema IMAX, com película de bitola de maior resolução, o que dá ao filme um visual espetacular. E apesar de estar sendo divulgado como o último filme do super-herói, o final deixa aberta a porta para possíveis continuações.