quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Gainsbourg - O Homem que Amava as Mulheres

Você já escutou esta música. As notas graves da guitarra dão lugar a uma melodia suave, acompanhada por sussurros que parecem ter sido gravados durante o momento íntimo de um casal. "Je T ´aime...moi non plus", de Serge Gainsbourg, foi um escândalo ao ser lançada em 1969 e chegou a ser proibida em vários países. A não ser por esta canção, porém, Gainsbourg não é muito conhecido fora da França, seu país de origem. Pintor, desenhista, escritor, músico, cineasta e boêmio profissional, Gainsbourg teve uma vida cercada de sucessos e polêmicas. Seu talento multimídia foi transformado agora em filme pelo cartunista francês Joann Sfar, que tentou ser tão anárquico quanto o personagem.

O melhor elogio que se pode fazer a "Gainsbourg - O Homem que Amava as Mulheres" (no subtítulo infeliz escolhido no Brasil) é sobre o quanto os atores são parecidos com as pessoas que estão representando. A começar pelo próprio Gainsbourg, replicado à perfeição por Eric Elmosnino, que ganhou o prêmio "César" pelo papel. Muito bem representadas também estão figuras como a deusa francesa Brigitte Bardot (Laetitia Casta), a inglesa Jane Birkin (Lucy Gordon) ou mesmo a filha de Serge, Charlotte (Orphée Silard).

A trama acompanha a vida de Gainsbourg (nascido Lucien Ginsburg) desde a infância; o pai o forçava a tocar piano e o garoto já provocava polêmica por desenhar mulheres nuas nos cadernos dos colegas da escola. Quando os nazistas invadiram a França e os judeus foram obrigados a usar a Estrela de Davi no ombro, o pequeno Lucien foi o primeiro da fila. O fato de ser judeu e ter as feições exageradas fizeram com que o garoto criasse um companheiro imaginário na forma de uma enorme cabeça caricatural que o segue para todos os lados. A idéia pode dar certo em uma história em quadrinhos ou charge, mas a figura é muito entranha em um filme. Quando Gainsbourg se torna adulto, o companheiro imaginário ainda o segue, agora na forma de um homem alto, com orelhas e nariz compridos. Há cenas bizarras em que Gainsbourg conversa consigo mesmo (ou com a tal figura) e a seriedade do momento fica comprometida. A trilha sonora e as cenas musicais funcionam melhor em apresentar o talento de Serge e sua relação com as mulheres. "Je T´aime...", na verdade, foi composta com (e para) Brigitte Bardot, com quem Gainsbourg teve uma tórrida relação. Só que a atriz era casada e o romance terminou, fazendo com que Serge transferisse a música para sua próxima paixão, a atriz inglesa Jane Birkin. Gainsbourg também provocou a ira dos tradicionalistas ao fazer uma versão "jamaicana" da "Marselhesa", o hino da França.

Há boas cenas perdidas no filme de Joann Sfar que, no geral, é confuso. Mas o tom cartunesco é bem vindo por subverter a fórmula tradicional das cinebiografias de artistas, que sempre seguem a lógica do "desconhecido que alcança a fama, se entrega às drogas e mulheres e entra em decadência". Mas se o espectador fica conhecendo mais sobre a obra de Gainsbourg depois de ver o filme, o personagem ainda é um enigma. Tudo parece vir muito fácil para o homem pequeno e feio, mas talentoso, que se vê na tela. E o filme termina antes que outras polêmicas, principalmente envolvendo a filha Charlotte Gainsbourg, aconteçam na vida de Serge. Charlotte se tornou atriz e cantora de sucesso, interpretando em filmes como "Anticristo" e "Melancolia", de Lars von Trier, entre dezenas de outros. Gainsbourg, expert em criar polêmicas, gravou com a filha de 13 anos "Lemon Incest", em que os dois são vistos deitados na mesma cama, ele sem camisas, cantando um para o outro. Ao que parece, Serge Gainsbourg foi provocador até o fim. Morreu de ataque cardíaco em 1991.

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