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domingo, 24 de dezembro de 2023

Maestro (2023)

Maestro (2023). Dir: Bradley Cooper. Netflix. "Maestro" não é um filme fácil de avaliar. Segundo longa metragem do ator e diretor Bradley Cooper, "Maestro" é tecnicamente lindo, mas falho em diversos outros pontos. Ficam claras a garra e dedicação de Cooper ao papel, se transformando fisicamente no compositor e condutor Leonard Bernstein, um dos músicos americanos mais renomados de todos os tempos.

Não é uma biografia convencional. Ao invés de contar a história como uma série de eventos interligados, "Maestro" foca em determinados momentos da vida de Bernstein e família. Há também algumas entrevistas do compositor em diversos pontos da vida, recriadas de cenas reais; escutamos da voz do próprio personagem seus pontos de vista sobre composição, regência e a vida em geral. O filme foi rodado em película Kodak em maravilhosa fotografia de Matthew Libatique, que vai do preto-e-branco dos anos 1940 às cores fortes do Technicolor dos anos 1960 e 1970. Há a recriação de uma apresentação de Bernstein e orquestra na Ely Cathedral que é maravilhosa.
O filme falha, no entanto, em nos mostrar quem foi, de fato, Leonard Bernstein. Se você espera ver cenas dos bastidores de "Amor, Sublime Amor" (West Side Story), por exemplo, vai ficar desapontado. Se quiser saber detalhes mais íntimo ou "picantes" da vida pessoal dele, também. Há várias cenas que deixam claro que Bernstein era gay (ou, talvez, bissexual), mas o tema é tratado com certa distância. Quem sofre, calada, é a personagem de Carey Mulligan (ótima), como a esposa de Bernstein, Felicia. Ela era uma atriz que passou décadas ao lado do marido, com quem teve três filhos. O filme mostra que ela sabia das indiscrições do marido, mas mantinha as aparências. Há quem diga que o filme é muito "chapa branca", até porque teve apoio e aprovação da família. Talvez.
De qualquer forma, há sequências muito belas por toda a produção. Cooper parece possuído por Bernstein nas cenas em que está regendo (dizem que ele estudou por anos para conseguir fazer a cena na catedral). Mas falta recheio, falta contexto. Para quem não conhece a vida e obra de Leonard Bernstein, não vai ser com este filme que vai ficar sabendo. Tá na Netflix.

quinta-feira, 27 de julho de 2023

Oppenheimer (2023)

Oppenheimer (2023). Dir: Christopher Nolan. Depois de meses de uma das campanhas publicitárias mais massivas (e estranhas) de todos os tempos, chega finalmente aos cinemas o mais novo filme de Christopher Nolan. Juro que tentei ver na estreia, mas fui afogado por um mar de pessoas usando rosa.

"Oppenheimer" é um filme de Christopher Nolan, o que já carrega algumas coisas: é longo (são três horas de duração), é pesado e teatral (as paredes literalmente tremem quando Oppenheimer está nervoso), os personagens não param de falar (até em uma cena de sexo Oppenheimer está lendo um livro em sânscrito), a trilha sonora é constante e opressora (surpresa, não é de Hans Zimmer, mas o compositor Ludwig Göransson está fazendo uma imitação perfeita), e o visual é incrível (o filme foi feito em película Kodak, em IMAX 70mm, pelo diretor de fotografia Hoyte Van Hoytema).

Isto posto, "Oppenheimer" é um grande filme. Cillian Murphy está excelente como um cientista brilhante com uma vida pessoal conturbada. J. Robert Oppenheimer foi um dos primeiros físicos a descrever um buraco negro, mas também sabia ler Karl Marx no original, aprendeu holandês em seis meses e lia em sânscrito. Também flertou com o Partido Comunista Americano (embora nunca tenha se filiado) e mandava dinheiro para os refugiados da Guerra Civil Espanhola; ao mesmo tempo, ajudou a criar uma arma de destruição em massa que matou perto de 200 mil pessoas.

O filme de Nolan conta a vida e "obra" de Oppenheimer partindo de dois julgamentos (ou melhor, "audiências"); em uma, o próprio Oppenheimer tem sua credibilidade posta em cheque em uma audiência que pretende revogar suas credenciais. Em outra, no Senado americano, o personagem de Robert Downey Jr., Lewis Strauss, tenta confirmar sua indicação a um alto posto no governo. Nolan, como de costume, não conta as histórias de forma linear e alterna várias linhas de tempo misturando preto e branco e colorido. Em uma decisão ousada, Nolan não coloca datas na tela e cabe ao espectador usar sua bagagem cultural para entender em que fase da História (com H maiúsculo) estamos. Às vezes fica bem confuso.

Até a explosão da primeira bomba atômica no teste de Trinity, no Novo México, diria que o filme é brilhante. Nolan consegue mostrar o processo de recrutamento dos cientistas para o Projeto Manhattan, a construção da base secreta em Los Alamos, a vida pessoal complicada de Oppenheimer, entre vários outros assuntos, de forma muito bem montada. A cena do primeiro teste nuclear, a propósito, é ótima (e você tem que ver este filme em uma tela IMAX gigante, com o som fazendo a cadeira tremer). O filme perde bastante o ritmo em sua hora final. Nolan exagera em seus maneirismos e fica difícil entender o que seu personagem está pensando quando o cenário está literalmente tremendo, a música está estridente e uma luz brilhante cega tudo por vários segundos (e não estou falando do teste nuclear, mas um simples interrogatório na tal audiência). É aposta certa que o filme vai render várias indicações ao Oscar. Resta saber se a bomba atômica, para Nolan, não vai se chamar Barbie. 

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Os Fabelmans (The Fabelmans, 2022)

 
Os Fabelmans (The Fabelmans, 2022). Dir: Steven Spielberg. Por muitos anos, o diretor Steven Spielberg foi considerado um cineasta puramente técnico, alguém focado só em efeitos especiais e em grandes bilheterias. Com o tempo, porém, percebeu-se que por trás de filmes como "E.T. - O Extraterrestre", "Contatos Imediatos do Terceiro Grau" se escondia alguém contando a própria história. A história de um garoto judeu em uma família dividida pela traição e pelo divórcio.


Após anos "se escondendo" atrás de metáforas, Spielberg resolveu contar sua vida de forma mais direta; o estopim foi a pandemia, quando o diretor se viu preso em casa. Ele e o co-roteirista Tony Kushner escreveram o filme em uma série de sessões de conversas pelo "Zoom". O resultado é extremamente pessoal, claro, e mais franco do que eu imaginava. Como alguém que não só assistiu aos seus filmes como leu todas as entrevistas e biografias que conseguiu encontrar, o filme também foi estranhamente familiar para mim.

A versão de Spielberg em "Os Fabelmans" é um rapaz chamado Sam (Mateo Zoryan, quando criança, e Gabriel LaBelle quando adolescente). Sam foi levado pelos pais para assistir ao filme "O Maior Espetáculo da Terra" (1952), de Cecil B. de Mille, quando pequeno, e ficou obcecado por uma cena em que um trem atropela um carro. O garoto tentou reproduzir a cena diversas vezes, em casa, com um trem de brinquedo, para desespero do pai (Paul Dano). A mãe (Michelle Williams, ótima) então deu ao garoto uma câmera amadora de 8mm, com a qual ele recriou a cena vista no cinema. Este foi o início de uma vida dedicada a criar e reproduzir (e manipular) imagens. Com o passar dos anos, o jovem Sammy estaria sempre com uma câmera na mão, fazendo filmes amadores de guerra, westerns e ficção científica com as irmãs ou com colegas da escola e escoteiros.

O filme, porém, não é somente sobre o surgimento de um cineasta, mas o modo como ele interpretava a vida por detrás das lentes. O pai era um homem extremamente técnico, um dos primeiros especialistas em computadores; o trabalho o obrigava a mudar frequentemente de cidade em cidade com a família. A mãe era pianista clássica, uma pessoa sensível e volúvel. Havia outra pessoa nessa dinâmica, um amigo pessoal do pai chamado Bennie (Seth Rogen, surpreendente), que se tornou um "amigo" especial da mãe. Esse triângulo amoroso era visto, mas inicialmente não percebido, por Sammy e pelas irmãs.

Spielberg lentamente introduz o conceito da traição através de imagens que acontecem às margens da ação principal. De forma genial, ele também mostra como Sammy só se dá conta do que está acontecendo ao editar um filme caseiro de uma viagem em família (mais o "amigo" Bennie). É bem típico de Spielberg que a cena não tenha diálogos, só imagens do jovem olhando, assustado, para os trechos de filme Super8 que ele está editando.

Curioso como, apesar da infidelidade ter partido da mãe, Spielberg tenha culpado o pai em seus filmes. Em "ET", é o pai que "está no México com a Sally"; em "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", é o pai que abandona a família e parte para o espaço com os aliens. Separações apareceriam também em trechos de "Império do Sol", "Inteligência Artificial", "Guerra dos Mundos", "Prenda-me se for capaz", entre vários outros filmes da carreira do diretor. Em "Os Fabelmans", o jovem Sammy resolve esconder a traição da mãe tirando fora os trechos comprometedores do filme caseiro que mostra à família (assim como ele faria, depois, em sua carreira).

É um filme e tanto, um prato cheio para cinéfilos (há uma ótima cena que mostra o diretor John Ford) e fãs de Spielberg. O último plano é genial. Nos cinemas.

sábado, 7 de setembro de 2013

Jobs

Filmes sobre figuras históricas costumam tratar de líderes religiosos ou políticos, pacifistas ou estrelas de rock. Filmes sobre empresários já foram feitos antes (como "Tucker, Um Homem e seu Sonho", 1988, de Francis Ford Coppola), mas poucos apresentaram seu protagonista de forma tão religiosa quanto "Jobs". Em se tratando da marca "Apple", no entanto, não é de se estranhar, já que a fábrica de computadores, desde seu início, não tinha apenas "clientes", mas "seguidores", e Steve Jobs era seu profeta. Jobs morreu de câncer em 2011, deixando um legado impressionante de inovações tecnológicas como o iPod, o iPad, o iPhone e tantos outros que mudaram o modo como as pessoas interagem com os aparelhos eletrônicos.

Diante disso, é uma pena que a primeira cinebiografia a respeito do californiano seja tão "quadrada" e sem brilho. A melhor surpresa é a interpretação de Ashton Kutcher, que praticamente carrega o filme sozinho, com um bom trabalho ao emular Jobs. Financiado de forma independente, o filme foi feito às pressas para chegar às telas antes da produção da Sony Pictures que será baseada na biografia oficial de Steve Jobs, escrita por Walter Issacson. O filme da Sony, além de ter um orçamento muito superior, está sendo escrito pelo premiado roteirista Aaron Sorkin, que ganhou o Oscar em 2011 por "A Rede Social". Foram os diálogos rápidos e inteligentes de Sorkin que tornaram o filme sobre o Facebook interessante. Enquanto isso, em "Jobs" (dirigido por Joshua Michael Stern e escrito por Matt Whiteley), o roteiro se arrasta e o espectador assiste a longas sequências em que "nerds" em uma garagem ficam soldando circuitos em uma placa de computador, ou executivos tramam vinganças ao redor de mesas de reunião.

É verdade que não só o lado bom de Jobs é mostrado. De temperamento difícil, o futuro criador do iPod é visto humilhando técnicos que não se comprometiam 100% com sua "visão" da empresa. No lado pessoal, ele negou a paternidade de uma menina que teria tido com a namorada. Era frequente também que ele tomasse para si o crédito por criações e inovações que não eram dele; o primeiro computador Apple, por exemplo, teria sido criado por Steve Wosniak (Josh Gad), seu amigo e sócio. A Apple Computer começou na garagem dos pais de Jobs e, nos primeiros meses, era tocada por Jobs, Wosniak e um grupo de técnicos que trabalhavam praticamente de graça. Quando a empresa cresceu, no entanto, Jobs se recusou a ceder ações para os antigos companheiros. Há uma cena em que Jobs é visto provando do próprio veneno, quando Bill Gates teria copiado o sistema operacional do Macintosh e criado o Windows, passando a perna na Apple. A rivalidade duraria décadas, mas o filme apenas mostra um telefonema de Jobs ameaçando processar Gates. Steve Jobs foi afastado da própria empresa em 1985 e criou a Next. (O filme não mostra como, em um golpe de "sorte", ele comprou de George Lucas uma pequena produtora de animações chamada Pixar, em 1986, e a transformou em uma empresa bilionária). Com altos e baixos, "Jobs" se apoia muito na interpretação de Kutcher para se manter em pé, e apesar de ser um bom trabalho do ator, não é o suficiente.