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domingo, 25 de julho de 2021

A Testemunha Ocular (The Public Eye, 1992)

A Testemunha Ocular (The Public Eye, 1992). Dir: Howard Franklin. Netflix. Lembro vagamente de ter visto este filme em VHS há um tempão. Joe Pesci é um fotógrafo freelancer conhecido como "O grande Bernzini". São os anos 40, em Nova York, e Bernzini vira as noites tirando fotos de assassinatos, incêndios, brigas familiares... qualquer coisa que renda uns trocados ao vender para os jornais. Como todo bom filme "noir", há uma "mulher fatal" chamada Kay (Barbara Hershey), que pede um favor ao fotógrafo; ela herdou uma casa noturna do marido e tem recebido ameaças veladas de vários membros da Máfia. Ela quer que Bernzini descubra o que há por trás das ameaças e a trama se complica, envolvendo disputas entre as "famílias" italianas de Nova York, uma investigação do FBI e um esquema de corrupção envolvendo vales de combustível (estamos em plena 2ª Guerra Mundial).

O filme é escrito e dirigido por Howard Franklin (que tem o roteiro de "O Nome da Rosa" no currículo) e produzido por Robert Zemeckis ("De Volta para o Futuro", "Forrest Gump"). Joe Pesci está ótimo como "o grande Bernzini", um fotógrafo obcecado pelo seu trabalho; o personagem foi baseado em uma pessoa real chamada Arthur Fellig (conhecido como Weegee). É curioso encontrar, entre os coadjuvantes, atores como um jovem Jared Harris (das séries "Chernobyl", "The Crown" e "Mad Men"), interpretando o porteiro da casa noturna. Richard Schiff (de "The West Wing" e "The Good Doctor") tem uma aparição rápida como um fotógrafo concorrente. Stanley Tucci interpreta um mafioso, assim como Jerry Adler e Dominic Chianese (ambos da série "The Sopranos").

A recriação de época é bem feita e o filme tem boa direção de fotografia. Há várias cenas em preto e branco, filmadas do ponto de vista do fotógrafo, mostrando como ele enquadra as imagens conforme anda pelas ruas de Nova York. Mark Isham compôs a boa trilha sonora. Não é nenhum clássico do gênero mas é bem feito e vale uma olhada. Tá na Netflix.
 

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Side by Side

Quando estava filmando "Zodíaco" com David Fincher, Robert Downey Jr. resolveu fazer um protesto. O fato do filme estar sendo captado em digital significava que não havia mais as pausas comuns em sets de filmagem para recarregar as câmeras com os rolos de filme, e Fincher fazia os atores trabalhar por 14 horas seguidas. Downey Jr. começou a urinar em potes de vidro e espalhar pelo set, para mostrar que ele precisava parar de vez em quando.

Esta é uma das boas histórias ouvidas no ótimo documentário "Side by Side" ("Lado a Lado", não lançado no Brasil), uma investigação feita pelo ator Keany Reeves sobre uma mudança de paradigma na produção cinematográfica, de película para digital. Por um século, filmes foram feitos usando a película cinematográfica de 35mm (ou, em algumas ocasiões, de 16mm ou 65mm), o que tinha vantagens e desvantagens. A película funciona através de um processo fotoquímico; a luz passa pelas lentes da câmera e impressionam uma tira de filme coberta com material sensível. O filme, depois de exposto, tem que ser revelado (em negativo) e impresso em uma cópia positiva, que era assistida pelo diretor e equipe apenas no dia seguinte às filmagens. A qualidade é excelente, mas o processo é caro e só o Diretor de Fotografia era responsável pela captação das imagens.

No digital a imagem é capturada por um chip eletrônico que, no início, tinha qualidade muito inferior à película cinematográfica, mas havia algumas vantagens; as câmeras digitais são menores, mais leves e portáteis que as pesadas câmera de cinema. Também é possível gravar tomadas com até quarenta minutos de duração (ao contrário dos dez minutos, no máximo, de uma câmera de cinema). Diretores como David Lynch e Danny Boyle contam como isso lhes deu enorme liberdade para lidar com os atores, que podiam interpretar longas cenas sem ter que ficar esperando que as câmeras de cinema fossem recarregadas. Já Christopher Nolan diz que os atores e a equipe não conseguem ficar concentrados por tanto tempo e precisam de uma pausa técnica de vez em quando.


Keanu Reeves explora esta mudança de película para digital não só na captação das imagens, mas também na edição e pós-produção. Até a década de 1990 os filmes eram montados manualmente; os editores trabalhavam diretamente com a película em grandes máquinas chamadas "moviolas". Martin Scorsese conta como as pontas dos dedos chegavam até a sangrar de tanto se cortar e colar pedaços de película com as mãos. Tudo mudou com a chegada de programas de edição como o Avid ou o Final Cut, que trabalham com uma versão digitalizada da película, que era escaneada e transferida para dentro do computador. Também os efeitos especiais, antes feitos com processos físicos caros e demorados, passaram a ser feitos digitalmente no computador. Com a captação das imagens feita em digital, todo este processo de digitalização da película não existe mais.

Scorsese levanta a questão de que, hoje, o espectador não sabe mais o que é "real" na tela. James Cameron, diretor de Avatar (que tem 3/4 das imagens criadas totalmente em computador) rebate dizendo que, no cinema, nunca se filmou a realidade. "O que é real?", pergunta ele a Keanu Reeves. "Há dezenas de pessoas em um set de filmagem, há um cara segurando o boom do microfone, há um técnico em cima da escada mostrando o traseiro. Nada disso é real". O surgimento de câmeras digitais especializadas em cinema, como a RED e a ARRI Alexa, aparentemente, enterraram de vez a película cinematográfica. "Eu tenho vontade de ligar para a película e dizer que conheci outra pessoa", diz Steven Soderbergh, que é um dos defensores do cinema digital. Há diretores como Steven Spielberg, Christopher Nolan, Zach Syder e Martin Scorsese, porém, que ainda trabalham com película, e vários filmes ainda são feitos em filme em Hollywood. Mas o fim da película é inevitável.

Tudo isso pode parecer técnico ou nerd demais para o espectador comum, mas o documentário levanta questões que interessam a todos. Esta mudança do analógico para digital não engloba só o cinema, mas praticamente tudo à nossa volta. Transações bancárias, divulgação de notícias, compartilhamento de música e várias outras coisas passaram por esta transformação e ainda não sabemos qual impacto isso terá no futuro. Um dos maiores problemas levantados por "Side by Side" é com relação à preservação desta enorme quantidade de material digital. Os filmes em película podem durar mais de um século. Qual a validade de um disco rígido de computador? O que vai acontecer com todos estes filmes digitais feitos nos últimos anos? Ou será que nada disso importa, e estamos vivendo em uma cultura descartável, que vai desaparecer em poucos anos? São questões importantes para entendermos o mundo de hoje.

Site oficial (o filme está disponível "on demand" apenas para os Estados Unidos, mas pode ser encontrado na internet)


domingo, 19 de julho de 2009

Antes que o mundo acabe

"Antes que o mundo acabe" foi o último filme exibido na competição oficial do II Festival Paulínia de Cinema, no dia 15 de julho e, em minha opinião, foi o filme mais gostoso de ver do festival. Dirigido por Ana Luiza Azevedo, "Antes que o Mundo Acabe" é uma produção da prolífica "Casa de Cinema de Porto Alegre", responsável por alguns dos melhores filmes nacionais dos últimos anos, como "Tolerância" (Carlos Gerbase), "O Homem que Copiava", "Meu Tio Matou um Cara" ou "Saneamento Básico" (todos de Jorge Furtado). Azevedo foi assistente de direção de Furtado e autora de vários curtas da casa, e faz sua estréia na direção de longas metragens. Baseado no livro de Marcelo Carneiro da Cunha, o roteiro foi escrito por Azevedo, Jorge Furtado, Paulo Halm e Giba Assis Brasil (que também é o editor do longa).

O filme conta a história do adolescente Daniel (Pedro Tergolina). Com 15 anos de idade, ele se encontra naquela fase em que os hormônios levam a melhor e tudo parece mudar muito depressa. Sua namorada, Mim (Bianca Menti) está em dúvidas sobre o namoro e pede "um tempo" a Daniel. "Quanto tempo é um tempo?", pergunta ele. Para complicar, ela está interessada no melhor amigo dele, Lucas (Eduardo Cardoso), que é o responsável pelo laboratório de Química no colégio onde os três estudam. Um dia Lucas sai mais cedo e deixa o laboratório sob a responsabilidade de Daniel. Ao descobrir que o melhor amigo está saindo com sua namorada, Daniel destrói o laboratório em um acesso de fúria e a culpa recai sobre Lucas. Além de estar com problemas com a namorada e o melhor amigo, Daniel começa a receber cartas da Tailândia de um fotógrafo que diz ser seu pai verdadeiro.

Tudo isso é contado de forma leve e divertida, sem cair no lugar comum. Daniel tem uma irmã menor chamada Maria Clara (Caroline Guedes) que tem um modo todo particular de ver o mundo. Parte da história é narrada por ela de uma forma que me lembrou muito o tipo de cinema feito por Jorge Furtado desde sua obra prima, o curta metragem "Ilha das Flores" (que consiste em criar "hyperlinks" entre os fatos do filme e informações extra filme). O fato do pai verdadeiro de Daniel ser fotógrafo também se presta para que o visual da obra seja muito interessante. Há várias referências à linguagem fotográfica e cinematográfica, como no brinquedo que Maria Clara tem no quarto (um zootropo, um dos primeiros aparelhos de imagens em movimento da história), ou nas colagens de figuras que ela faz. A narração também fala sobre as sociedades "poliândricas", em que as mulheres podem ter vários maridos, e o pai de Daniel pergunta a ele como isso seria visto aqui no Brasil. Claro que isso faz referência ao comportamento não só da namorada de Daniel como também do de sua mãe. Daniel é um garoto com "dois pais", um biológico e distante e um padrasto presente e gentil.

Tudo se passa na pequena cidade de Pedra Grande (RS), com uma passagem por Porto Alegre. Apesar da maioria da população ainda se locomover em bicicletas e o filme ter um ar que remete a uma vida mais pacata, é interessante notar que a tecnologia moderna não é deixada de fora; ela é representada pelo computador e aplicações da internet que já se tornaram lugar comum, como chats, Google Earth, sites de fotos e de busca (todos abrasileirados e adaptados de forma divertida). Quando Daniel ganha uma câmera fotográfica, é sua vez de registrar o que vê à sua volta e tentar tirar algum sentido disso. Será que tudo é o que parece? Será que o Brasil é tão diferente de um lugar distante como a Tailândia? Ou a globalização está nos deixando todos iguais?

"Antes que o mundo acabe" ganhou o prêmio da crítica no Festival de Paulínia e Ana Luíza Azevedo o de Melhor Direção. O filme ainda levou os prêmios de Melhor Fotografia (Jacob Solitrenick), Trilha Sonora (Leo Henkin), Figurino (Rosangela Cortinhas) e Direção de Arte (Fiapo Barth).

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Câmera Escura!

Nada mais apropriado do que postar aqui este projeto. A PUC-Campinas foi palco esta semana de uma série de exposições e palestras envolvendo a fotografia, além de prestar homenagem a Hércules Florence, francês radicado no Brasil que, no século XIX, foi o inventor brasileiro da fotografia. Uma das atrações da semana é o projeto "O Brasil pelo Buraco da Agulha". A idéia é simples mas extremamente elegante e sofisticada. Nesta era de megapixels e vida digital, o projeto conta com um caminhão/casa ambulante que tem um furo na lateral do baú. Por este furo a luz entra no caminhão, que se transforma em uma gigantesca Câmera Escura. O fotógrafo e aventureiro português Mica Costa Grande, de forma totalmente artesanal, coloca um papel fotográfico de aproximadamente 3 metros de comprimento na parede oposta ao furo e, em exposições que podem durar até oito horas, capta fotografias panorâmicas com definição impressionante. O caminhão esteve parado no Campus I da PUC esta semana e hoje fomos visitá-lo. Costa Grande fecha todo o caminhão e faz uma demonstração de como o processo da Câmera Escura funciona. Na parede oposta ao furo pode-se enxergar uma imagem (invertida e de ponta cabeça) da paisagem lá fora. É algo extremamente simples e lúdico ver o mundo desta forma. As pessoas geralmente não conseguem entender a simplicidade de uma câmera fotográfica. Costa Grande diz que ver a paisagem assim requer um modo diferente de ver o mundo e de interpretar os códigos. "Um bebê não consegue entender o que ele está vendo porque ainda não sabe o que as imagens significam", disse ele. Nosso cérebro consegue enxergar uma casa quando vê uma, mas é uma questão de experiências anteriores.


O cinema também funciona desta maneira. A tela é uma representação do mundo lá fora e o espectador tem que saber interpretar o que está vendo. Quando vemos um filme passado nos dias de hoje é mais fácil interpretar as imagens de cidades, carros, pessoas. Mas quando vemos uma sequência como o final de "2001 - Uma Odisséia no Espaço", por exemplo, nosso cérebro tem dificuldade em saber o que aquelas luzes e cores significam. Spielberg, quando fez a "conversa" entre os extraterrestres e os humanos em "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", se utilizou de luzes e sons para transmitir uma mensagem que não entendemos a língua, mas sabemos o que significa. Algumas coisas são difíceis demais de se captar à primeira vista. Conta a lenda que quando os irmãos Lumiere, na França, em 1895, fizeram a primeira exibição de cinema, os espectadores ficaram assustados com a imagem de um trêm que vinha em direção da tela. Mesmo sendo uma imagem de "baixa resolução", em preto e branco e sem som, o cérebro das pessoas sentiram medo ao ver o trem e algumas pessoas sairam correndo.




Em 1878, Edward Muybridge conseguiu provar que um cavalo tira as quatro patas do chão quando galopa. Ele colocou 16 câmeras fotográficas em percurso e amarrou linhas no disparador. Quando o cavalo passava trotando, as câmeras iam disparando e capturando o momento. Colocadas em sequências, as fotos do cavalo trotando se tornaram um dos primeiros "filmes" do mundo. Hoje, quando se assiste a uma grande produção de hollywood, não dá mais para saber o que é real e o que é inventado com computadores. Mas, ao menos por enquanto, o velho princípio da câmera escura, do pequeno furo por onde a luz passa para ser capturada seja por um rolo de filme ou por um feixe de eléctrons, ainda existe.
O site do projeto "O Brasil pelo buraco da Agulha" pode ser acessado abaixo: