terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O Preço do Amanhã

O diretor e roteirista Andrew Niccol tem apenas quatro filmes como diretor, e seu roteiro para "O Show de Truman" (1998, dirigido por Peter Weir) foi indicado ao Oscar. Niccol tem uma visão de mundo pastante crítica e interessante. Em "Gattaca" (1997), o destino dos homens era ditado pelo código genético, sendo que um mero fio de cabelo poderia  denunciá-lo caso você não tivesse os genes "certos".  "O Show de Truman" (1998) trazia Jim Carrey como um rapaz comum que, sem o saber e contra sua vontade, é a estrela de um programa de televisão que o acompanha 24 horas por dia. Em "S1m0ne" (2002), a computação gráfica cria uma atriz perfeita (mas virtual) para o diretor vivido por Al Pacino. Nicolas Cage é um frio vendedor de armas no pesado "O Senhor das Armas" (2005). Niccol também escreveu a história que Spielberg levou às telas com Tom Hanks em "O Terminal" (2004), sobre um homem obrigado a viver em um aeroporto após seu país entrar em guerra civil. Como se vê, Niccol é obcecado por histórias sobre pessoas comuns esmagadas por algum poder superior , criado pelo próprio homem através do mau uso da tecnologia.

Em "O Preço do Amanhã" não é diferente, e a visão cínica de Niccol é tão inteligente quanto absurda. Em um futuro indeterminado, as pessoas são criadas geneticamente para viver até os 25 anos, quando param de envelhecer; mas há um porém. A partir dos 25 anos, um relógio digital/biológico começa uma contagem regressiva de um ano de vida. Este tempo passa a ser a moeda de troca das pessoas, que podem comprar mais "créditos" (minutos, horas, anos, décadas) através do trabalho ou em trocas com outras pessoas. A premissa é absurda, mas a metáfora do mundo moderno e a interpretação literal do ditado "tempo é dinheiro" feitas por Niccol são tão interessantes que não devem ser descartadas facilmente. No mundo habitado por Will Salas (Justin Timberlake), uma frase como "Ei, tem um minuto?" ganha outro significado. Ele vive nos "guetos", a região pobre da cidade, em que todo mundo tem pressa. Will faz trabalhos em troca de minutos extras e já conseguiu viver três anos além da marca dos 25 regulares. A sociedade está dividida em "fusos horários", regiões separadas por barreiras e guardas armados em que cada nível representa uma casta diferente. No topo está a elite, que literalmente pode viver para sempre, com milhares de anos estocados em bancos ou negociados na bolsa de valores. Após ganhar um século de crédito por salvar a vida de um homem rico, Will resolve ir até o nível mais alto para vingar a morte de sua mãe, que literalmente ficou sem tempo.

A metáfora do sistema econômico moderno é tão interessante que é uma pena que ele tenha que usá-la de forma tão banal, em um filme que mistura ficção-científica, aventura e policial. O personagem de Timberlake se junta à uma garota rica, Sylvia (Samanta Seyfried) e os dois se tornam uma espécie de "Bonnie e Clyde" misturados com "Robin Hood", roubando "bancos de horas" e os distribuindo aos pobres. Eles são perseguidos por um "Protetor do Tempo" chamado Raymond (Cillian Murphy). O roteiro faz observações muito inteligentes sobre a sociedade moderna, em que os ricos se julgam imortais e cada vez mais todos parecem ter a mesma idade. Em "O Preço do Amanhã" todos estão "congelados" com a aparência de jovens de 25 anos, o que faz com que um personagem diga uma das melhores frases do filme. Ao perceber que Timberlake está interessado em uma garota, o homem diz que são tempos complicados, pois não se sabe se a garota é filha, mulher ou mãe dele. É só folhear uma revista de "celebridades" para ver como o mundo real não é muito diferente disso. Quando se trabalha, alguém está literalmente trocando seu tempo de vida por dinheiro, e é visto como "natural" que uma pessoa com recursos financeiros viva mais e melhor do que uma pessoa pobre.

Todas estas boas idéias estão misturadas em um roteiro que alterna bons momentos com cenas sofríveis, e o resultado é um filme interessante que, infelizmente, não atinge tudo o que poderia ser.


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