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domingo, 25 de janeiro de 2015

A Teoria de Tudo

Albert Einstein, em seu tempo, era uma das pessoas mais famosas do planeta. Seu fascínio superava barreiras linguísticas, geográficas, religiosas, filosóficas e científicas. No entanto, quantas pessoas, de verdade, seriam capazes de dizer que entenderam a Teoria da Relatividade?

O mesmo pode se dizer de Stephen Hawking, décadas depois. O astrofísico inglês tem a fama de um astro do rock. Seu livro "Uma Breve História do Tempo" foi um bestseller avassalador, mesmo que poucos dos seus leitores faziam ideia do que ele estava falando. O que faz figuras como Einstein, Hawking, Carl Sagan ou Neil deGrasse Tyson fascinantes? Talvez seja exatamente seu mistério. Talvez seja nossa fascinação com o desconhecido, com a "mágica" que parece existir atrás de números e fórmulas que não sabemos como funcionam.

O cinema, ávido por figuras heroicas e mágicas, de tempos em tempos lança filmes sobre estes seres sobre-humanos e seu domínio sobre os números. Assim, olhamos com espanto para Matt Damon desenhando fórmulas na lousa em "Gênio Indomável" (1997) ou Russell Crowe imaginando números em pleno ar em "Uma Mente Brilhante" (1991) e esquecemos nossas dificuldades em fazer aquele cálculo simples de porcentagem.

Em "A Teoria de Tudo" é a vez de vermos Eddie Redmayne visualizando o início do Universo em uma xícara de café com leite. Ele interpreta Stephen Hawking desde os tempos em que apostava corrida de bicicletas com os colegas em Cambridge. Redmayne está muito bem como Hawking, com seus famosos óculos de aro grosso e expressão curiosa. O arco do seu personagem, aliás, é bastante parecido com o vivido por Russell Crowe em "Uma Mente Brilhante"; um matemático que conquista o amor de uma garota especial e se torna um gênio da ciência, tendo que superar um problema de saúde grave. (leia mais abaixo)


Enquanto John Forbes Nash, o matemático vivido por Crowe, sofria de esquizofrenia (fato desconhecido de grande parte do público), a atrofia nervosa apresentada por Hawking já faz parte do imaginário dos espectadores, que sempre o "conheceram" sentado naquela cadeira de rodas e "falando" com aquele sintetizador de voz robótico. Assim, não deixa de ser interessante vê-lo, através da interpretação de Redmayne, andando e correndo pelos corredores da universidade antes que os primeiros sintomas da doença se manifestem.

O roteiro, escrito por Anthony McCarten, é baseado no livro de Jane Hawking (vivida por Felicity Jones), a garota religiosa por quem Hawking se apaixonou. As cenas do primeiro encontro entre eles, em uma festa de Cambridge, são filmadas como em um conto de fadas, com bela fotografia de Benoît Delhomme. Com o perdão da palavra, o casal Hawking mostrado no filme é um dos mais "fofos" do cinema, mas há bons diálogos trocados por Redmayne e Jones a respeito do Universo e da existência (ou não) de Deus, etc. Poderia ser piegas, mas a interpretação dos dois é honesta, muito bem dirigidos por James Marsh (que fez o ótimo documentário "O Equilibrista").

O resto do filme trata da decadência física de Hawking, a quem o médico deu apenas dois anos de vida depois do primeiro ataque, e seus triunfos científicos. Não é por menos que o físico decidiu se dedicar ao estudo do Tempo, que ele conseguiu superar até os atuais 72 anos de idade. O roteiro trata de desconstruir também (embora de forma leve), o casamento de conto de fadas e Stephen e Jane. Há um professor de canto (interpretado por Charlie Cox) que se torna algo mais na vida de Jane, assim como uma enfermeira no caso de Hawking.

Não é um filme brilhante nem inovador, mas é extremamente bem feito, e a vida de Stephen Hawking é, sem dúvida, fascinante. "A Teoria de Tudo" conquistou cinco indicações ao Oscar: Filme, Ator (Eddie Redmayne), Atriz (Felicity Jones), Roteiro Adaptado (Anthony McCarten) e Trilha Sonora (Jóhann Jóhannsson).

Observação: Benedict Cumberbatch, que está concorrendo com Redmayne a melhor ator por "O Jogo da Imitação", interpretou Stephen Hawking em um especial para a BBC em 2004. O filme pode ser visto clicando aqui.

João Solimeo

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Man on wire

No final dos anos 60, um jovem francês chamado Philippe Petit estava na recepção do dentista, quando viu o desenho de duas torres no jornal: era a concepção artística do que viriam a ser as Torres Gêmeas do World Trade Center. Um idéia "maluca" surgiu na cabeça do francês, que desenhou uma linha entre as torres. Seis anos depois, ele atravessaria o vão de 450 metros de altura entre as torres a pé, equilibrando-se sobre um cabo de aço. Preso pela polícia de Nova York, ele foi levado para uma avaliação psiquiátrica e questionado sobre porquê ele havia feito aquilo. Em seu boletim de ocorrência, havia simplesmente as palavras: MAN ON WIRE. Esta é a extraordinária história do documentário de James March, vencedor do Oscar de Melhor Documentário de Longa Metragem no último domingo.

March usa de filmagens, fotos e documentos da época que, misturados a cenas reconstituídas por atores, constroem um filme de muito suspense, drama e comédia. O próprio Philippe Petit é um dos narradores, e o fato de sabermos que ele sobreviveu não tira o suspense do filme. Philippe, a namorada e um pequeno grupo de amigos organizou o ato como se fosse um assalto a banco. Ou, nos tempos de hoje, como um ataque terrorista. E é notável o fato de que o ataque de 11 de setembro de 2001 não seja citado nenhuma vez durante o filme. Pelo contrário, vemos as Torres Gêmeas serem construídas diante de nossos olhos, ao mesmo tempo em que Petit se prepara para seu "assalto". É um crime, claro, mas é em nome da arte, do espetáculo. Ou, talvez, da obsessão de um homem que nasceu para "subir em coisas". O documentário o mostra atravessando o vão entre as torres da Catedral de Notre Dame, em Paris, e em uma ponte na Austrália. A preparação para o World Trade Center, obviamente, era muito mais complicada. Eles construiram modelos em escala do topo dos prédios e Petit foi pessoalmente várias vezes para Nova York estudar a movimentação dos operários e dos poucos inquilinos do prédio ainda em construção. Sua equipe acabou contando com ajuda interna de um advogado que tinha um escritório no prédio, e providenciou identidades falsas para eles. Em outro momento, Petit e seus colegas fingiram ser jornalistas franceses que precisavam tirar fotos e entrevistar os operários no teto do prédio. Após anos de planejamento, identidades falsas e quase uma tonelada de equipamento preparado, a equipe foi para o prédio no dia 6 de agosto de 1974. Uma dupla subiu a Torre Norte enquanto a outra tomou a Torre Sul. É muito engraçada a descrição deles da noite passada no topo de Nova York, escondendo-se de guardas de segurança e passando finalmente o cabo entre as torres.

Em 7 de agosto de 1974, às sete e meia da manhã, Petit começou a travessia. Ele não só atravessou as duas torres uma vez, mas oito vezes, enquanto a polícia o aguardava dos dois lados para prendê-lo. Petit dançou, pulou e até deitou-se sobre o fio, a 400 metros de altitude sobre a cidade de Nova York. Isso depois de passar a noite em claro, escondido sob uma lona, e de puxar um cabo que pesava mais de duzentos quilos. Ele estava com 25 anos.
Além de fotos e filmes, o documentário conta com o depoimento dos cúmplices de Petit. Particularmente emocionantes são os depoimentos de sua ex-namorada, contando como ele a conquistou e como a vida dela foi dedicada a ele a partir de então, e de Jean-Louis Blondeau, o amigo que tentava manter as idéias malucas de Petit na parte prática. Interessante também ver como a vida de todos mudou depois do acontecido. A travessia (ou as travessias) entre as Torres Gêmeas mudou a vida de Petit e mesmo seu relacionamento com os amigos, que se separaram depois. O documentário é uma co-produção da BBC com a Discovery e tem previsão de lançamento no Brasil. Quanto ao "porquê" da travessia, Philippe Petit simplesmente disse à polícia de Nova York: "Não há um porquê". Condenado pelo juíz, sua sentença foi se apresentar para as crianças de Nova York.

ps: Quando o documentário ganhou o Oscar dia 22 de fevereiro último, Petit, no palco, equilibrou a estátua no queixo.