sexta-feira, 23 de abril de 2010

A Estrada

Há muitos ecos de "Filhos da Esperança" em "A Estrada", outro daqueles filmes pós-apocalípticos tão adorados pela ficção científica. Baseado em um livro de Cormac MacCarthy, "A Estrada" alterna momentos de extremo realismo e crueldade com outros ternos, beirando perigosamente a pieguice, principalmente por culpa do piano repetitivo da tilha sonora.

Viggo Mortensen é um ator corajoso, que poderia ter explorado sua boa figura e seu sucesso na trilogia "O Senhor dos Anéis" para fazer filmes mais fáceis e lucrativos. Mas ele preferiu um caminho mais desafiador e tem trabalhado frequentemente com David Cronenberg. Aqui ele é "O Pai", um personagem sem nome que, após perder a mulher e o mundo que conhecia em um evento que destruiu a Terra (não se explica o que aconteceu), vive para seu filho único. Os dois partem para uma viagem na "Estrada", a caminho do mar, este eterno símbolo de volta ao útero materno. A relação entre pai e filho é tocante, e subverte a noção de ligação da criança com a figura da mãe. Ela é vista em flashbacks na figura de Charlize Theron que, ao contrário do Pai, não vê sentido em continuar vivendo, nem mesmo por seu filho. As memórias da esposa assombram os pesadelos de Pai e Filho na estrada, indo em frente sem saber exatamente o porquê. Há várias referências bíblicas e até uma afirmação "pró vida" no modo como o Pai trata do Filho. Embora seja uma relação complicada. Há uma clara referência ao mito bíblico de Abraão, que teria sido ordenado por Deus a matar o próprio filho. O Pai anda com uma arma com duas balas na cintura, uma para ele e outra para o filho, no caso da situação ficar insuportável.

"A Estrada" tem direção de John Hillcoat, que é corajoso o suficiente para não transformar o filme em uma simples "mensagem" de esperança. O Pai diz ao filho que eles devem continuar vivendo, e que eles fazem parte do grupo dos "bons". Os "maus" são homens que desceram ao nível mais baixo que um ser humano pode chegar, que é o canibalismo. Há várias sequências em que eles são vistos, às vezes perto demais, e há uma arrepiante cena de suspense quando o Pai vai verificar o que há no porão de uma casa. É também em um subterrâneo que Pai e Filho encontram um paraíso na forma de produtos que nós, vivendo no mundo moderno, não imaginamos a importância. O filme conta com a participação especial de coadjuvantes de alto nível. Tente reconhecer Robert Duvall ou Guy Pierce entre as poucas figuras encontradas durante a jornada de Pai e Filho em direção do mar.

É um bom filme, na mesma linha de Mad Max, Eu sou a Lenda, Filhos da Esperança e tantos outros. Mas lhe falta uma amarração melhor, algum senso de propósito ao final da jornada. É episódico e muitas vezes repetitivo. As interpretações, sem dúvida, são seu ponto forte.


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