domingo, 27 de novembro de 2011

O Céu sobre os Ombros

Mistura de ficção com documentário, "O Céu sobre os Ombros" não é um filme amigável. Não há  preocupação em apresentar os personagens ou situar o espectador. Não há trilha sonora, a não ser uma ou outra música que esteja tocando no rádio (como "Beautiful Girl", do INXS, ou "Eye in the Sky", de Alan Parsons). A câmera é geralmente parada, a fotografia naturalista. Quem são estas pessoas?

Misturar documentário com ficção não é novidade. O mestre Eduardo Coutinho já o fez bem em "Jogo de Cena" e "Moscou", por exemplo. Aqui, o diretor Sérgio Bórges usou sua experiência em curta-metragens e filmes experimentais para mostrar a vida de três pessoas incomuns de Belo Horizonte. Evelyn é uma transexual que faz mestrado na UFMG, dá aulas sobre sexualidade e, à noite, é prostituta (ou como ela mesmo se define, "puta"). Há longas cenas de nudez da personagem que é meio homem, meio mulher e que, na vida, também é dividida. Como conciliar o nível cultural de uma mestranda com alguém que faz programas baratos à noite? "Oral é dez, completo é trinta", diz ela a um cliente.

Há um escritor negro, Lwei (que também passa grande parte do filme andando nu pelo apartamento), que nunca conseguiu terminar um livro. Em longos monólogos para uma companheira que não diz uma palavra, ele explica que precisa de tempo para ficar satisfeito com seus textos. Compara-se a Leon Tolstoi, que teria escrito e reescrito "Guerra e Paz" várias vezes. Ele tem um filho com problemas mentais que lhe causa um "paradoxo"; não se sente bem quando está com ele, sente falta quando não está. Nunca trabalhou e é sustentado pela mãe e pela mulher.

O terceiro personagem, Murari, também é paradoxal. Ao mesmo tempo que é devoto de Hare Krishna e tenta seguir os ensinamentos de paz interior, é membro da torcida organizada do Atlético Mineiro. A cena mais movimentada do filme se passa dentro do "Mineirão", com a câmera focada apenas no rosto dos torcedores, que entoam gritos de guerra nada parecidos com os cânticos Hare Krishna.

Os personagens nunca se encontram, mas há alguns pontos em comum, como a solidão, a vontade de ser melhor e uma curiosa mistura da erudição com o mundano. As dificuldades financeiras existem, mas não são prioritárias. O amor é citado mas, na prática, é em buscar do prazer que os personagens parecem caminhar.  Não é um filme fácil e certamente vai desagradar às grandes plateias. Pesquisando na internet é possível encontrar um universo expandido do filme, principalmente na página no Facebook e no site oficial. Há diversos vídeos mostrando cenas que não estão no original. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.


Um comentário:

Thais disse...

Olá, João!
Gostaria de conversar com você sobre a Mostra Curta Audiovisual que acontecerá aqui em Campinas.
Na verdade, gostaria de saber se você se interessaria em cobrir diariamente o evento.
Você poderia me escrever no e-mail:
graciellathais@gmail.com ?
Obrigada, abs