quinta-feira, 8 de maio de 2008

Vênus




O primeiro papel no cinema de Peter O´Toole foi no épico “Lawrence da Arábia” (1962), de David Lean. O´Toole deu a interpretação de sua carreira, que foi seguida de uma série de sucessos e de outras grandes atuações, mas nunca recebeu o Oscar de Melhor Ator. Alguns anos atrás ele recebeu um prêmio honorário da Academia, o que não é a mesma coisa. Em 2007, aos 75 anos, O´Toole foi novamente indicado (e novamente derrotado) ao prêmio por sua brilhante interpretação em “Vênus”, um bom filme dirigido em 2006 por Roger Michell. Não deixa de ser chocante ver o efeito dos anos nas feições do antigo Lawrence da Arábia. O´Toole exibe as marcas da idade em seu rosto, sua voz e no modo de andar. O “consolo” é que tudo isso é perfeitamente adequado ao papel que ele está interpretando, Maurice, um velho ator que passa seus dias indo ao teatro e na companhia de velhos amigos. Um deles é Ian (Leslie Phillips, ótimo), a própria definição do “velho rabugento”. Ian também foi um ator de sucesso modesto e que está ansioso com a notícia de que uma sobrinha de 19 anos virá morar com ele. Ian tem fantasias de que a sobrinha Jessie será uma espécie de enfermeira particular, cuidando dele e fazendo suas vontades, mas a realidade é bem diferente. Jessie (Jodie Whittaker) é a típica adolescente revoltada e insolente, que não liga para o tio e o trata mal.

Mas Maurice sente uma inesperada atração pela atitude da garota e começa a usar do seu velho charme para conquistá-la. Ian pergunta a Maurice, indignado: “o que você faz com ela, na sua idade?”. E Maurice responde simplesmente “algo muito difícil... eu a trato bem”. De fato, a relação entre Maurice e Jessie não é inteiramente platônica... há um subtexto sexual ocorrendo o tempo todo, mas é fato que a idade avançada de Maurice não permite que nada muito físico ocorra. Assim, Maurice passa as tardes levando Jessie ao teatro e a jantares, onde Jessie descobre que ele é razoavelmente famoso. Ele também lhe arruma um emprego como modelo (nua) em uma classe de desenho, mas ela não permite que ele a veja. Maurice começa a chamá-la de “Vênus” depois de levá-la ao museu de arte para ver o quadro de mesmo nome de Diego Velázquez. A garota não tem maturidade para entender os motivos do interesse de Maurice, mas claro que gosta da atenção e, em alguns momentos, permite certas liberdades da parte dele, como deixar que ele beije seu pescoço ou segure suas mãos. Estas cenas (um velho de 74 anos e uma garota de 19) podem soar “impróprias” mas são feitas com muita sensibilidade. Maurice claramente foi um ator belo e desejado na juventude (assim como Peter O´Toole), e a figura de Jessie lhe trás de volta velhos desejos. Jessie (que teve um filho abortado recentemente) não está acostumada a ser bem tratada por ninguém, muito menos por homens.

Vale notar também a presença de Vanessa Redgrave, maravilhosamente “real” e idosa, como a ex-esposa de Maurice. Eles ainda cultivam uma amizade antiga, mas ela guarda certo ressentimento pelas aventuras amorosas que Maurice teve nos tempos de juventude. Há uma bela cena entre os dois em que Maurice demonstra arrependimento pelo que fez. Peter O´Toole está magnífico nos pequenos detalhes de seu personagem e em seu claro declínio físico. O filme não tem ilusões com relação à velhice e também mostra o lado “ruim” (ainda que natural) da idade, como embaraçosas consultas a médicos, problemas físicos e a presença inevitável da morte. O filme está em DVD.

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