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domingo, 21 de maio de 2023

O pior vizinho do mundo (A man called Otto, 2022)

O pior vizinho do mundo (A man called Otto, 2022). Dir: Mark Forster. HBO Max. Versão americana de um filme sueco que, infelizmente, não vi (mas provavelmente era melhor), "O pior vizinho do mundo" é simpático e previsível. Tom Hanks, quem diria, já tem idade para fazer o papel do "velho rabugento" que, em outras épocas, seria feito por Walter Matthau ou, talvez, Clint Eastwood. Ele é Otto, um viúvo que está desgostoso da vida, briga com todo mundo e implica com a vizinhança; mas, para surpresa de zero pessoas, no fundo ele tem bom coração.


O bom elenco de coadjuvantes é elevado pela mexicana Mariana Treviño, que interpreta a nova vizinha de Otto, Marisol. Ela é cheia de vida, tem um marido bobão, duas filhas lindas e mais um bebê a caminho. Otto já estava literalmente com a corda no pescoço quando a mexicana bateu à sua porta trazendo comida e se apresentando. Aos poucos, o coração gelado do velho acaba sendo derretido pela moça e pela família dela. Em uma subtrama, ficamos sabendo que uma imobiliária quer despejar os moradores da vizinhança e construir prédios no lugar. Por um momento achei que a casa de Hanks fosse sair voando, carregada por balões de festa.

Como disse, o filme é bem simpático, apesar de previsível. Hanks está bem como o velho Otto e o roteiro mistura comédia com boas pitadas de drama. Flashbacks mostram a vida de casado de Otto com o amor da sua vida, Sonya (Rachel Keller), uma professora. A boa trilha sonora é de Thomas Newman e a direção de Mark Forster, que teve uma carreira bem diversa, dirigindo 007 (Quantum of Solace), Guerra Mundial Z, Em busca da Terra do Nunca, etc. Disponível na HBO Max.

sexta-feira, 2 de abril de 2021

Meu Pai (The Father, 2020)


O terror está nos detalhes. Na cor e posição de móveis. No tamanho de quartos, salas. Nos quadros da parede. De quem é este apartamento? Quem é essa pessoa? Quem sou...eu? "Meu pai" é, ao mesmo tempo, lindo e assustador. Ao nos colocar no lugar de um homem que, pouco a pouco, está perdendo a memória, o filme mostra como as aparências enganam e como tudo, no fundo, depende da interpretação que fazemos das coisas.

Anthony (um estupendo Anthony Hopkins) é um senhor que mora sozinho em um apartamento enorme em Londres. Sua filha, Anne (Olivia Colman, sempre certeira) vem visitá-lo todos os dias; ela está brava com ele porque ele não consegue se dar bem com nenhuma cuidadora que ela contrata. Ela também lhe diz que está de mudança para Paris porque ela conheceu um homem, com quem vai se casar. Só que, na cena seguinte, Anthony está conversando com um homem que diz ser marido da filha dele. Paris? Não, eles não vão a Paris. A filha chega das compras e Anthony não a reconhece.

"Meu Pai" é escrito e dirigido por Florian Zeller, baseado em uma peça escrita por ele. Não sei como era no teatro, mas Zeller faz um trabalho brilhante e bastante cinematográfico ao puxar o tapete debaixo de nossos pés cena após cena. Pequenas mudanças na direção de arte trocam a posição dos móveis e a cor das paredes. Assim como Anthony, ficamos perdidos espacialmente e, através da edição, temporalmente. Algumas cenas se repetem, com pequenas mudanças; a montagem não é linear.Nada disso funcionaria, porém, sem a brilhante interpretação de Anthony Hopkins, que passa toda gama de emoções através do olhar e da linguagem corporal. O elenco ainda conta com Olivia Williams, Rufus Sewell, Imogen Poots e Mark Gatiss em papéis que se alternam, dependendo da cena.

Este não é, porém, um filme "truque" tipo "Memento", de Christopher Nolan, onde o que importa é a forma. "Meu Pai" usa da técnica para criar empatia. É de cortar o coração, e assustador, ver como toda uma vida, memórias e a própria noção de quem você é vão se perdendo no final da jornada. A última imagem é muito triste, e muito bela. Por todo filme, Anthony fica obsecado por encontrar seu relógio de pulso, é como se ele tentasse segurar o Tempo com as mãos. "Meu Pai" recebeu seis indicações ao Oscar; filme, ator (merecidíssimo, para Hopkins), atriz coadjuvante (Colman), roteiro adaptado, edição e direção de arte. Disponível na Apple TV e, para quem quiser se arriscar, em breve nos cinemas.

sexta-feira, 15 de março de 2013

O Quarteto

"O Quarteto" marca a estréia do ator Dustin Hoffman na direção. Aos 75 anos, Hoffman escolheu temas próximos a sua realidade: a arte e a velhice. O filme tem muitas semelhanças com o recente "O Exótico Hotel Marigold", inclusive dividindo uma atriz em comum, Maggie Smith, e trata do tema da terceira idade da mesma forma fantasiosa e edificante. Ou seja, a anos luz do soco no estômago que é "Amor", de Michael Haneke.

A trama se passa na Inglaterra, em uma casa de repouso exclusiva para músicos aposentados. O som de andadores, bengalas, tosse e juntas doloridas se mistura à música constante de quartetos de câmara, solistas, tenores e todo tipo de músicos praticando diariamente. Um diretor tirano (Michael Gambon, ótimo) está ensaiando vários números para um show de gala anual que a casa de repouso apresenta no aniversário de Giuseppe Verdi. A renda do show vai para a manutenção da casa, que corre o risco de fechar. A chegada da diva Jean Horton (Maggie Smith) causa rebuliço; ela havia sido casada com Reggie Paget (Tom Courtenay), que ainda guarda a mágoa de ter sido traído por ela décadas atrás. Já Wilf (Billy Connolly) e Cissy (Pauline Colins) vêm na chegada de Horton a chance deles reunirem o quarteto que fez muito sucesso apresentando o "Rigoletto" de Verdi.

O filme tem boas intenções e é gostoso de se ver, mas não passa de uma série de clichês envolvendo personagens da terceira idade e artistas em decadência. Há o personagem "safado" que ainda só pensa em sexo; há as inevitáveis piadas envolvendo a perda da memória ou outras enfermidades relacionadas à idade; há várias sequências musicais mostrando os diversos grupos se preparando para a apresentação final, e assim por diante. Tudo filmado sob o sol dourado da primavera, como se a Inglaterra fosse sempre um país ensolarado e agradável. Os créditos finais mostram como vários dos figurantes e personagens secundários são músicos e artistas de verdade, em uma montagem de fotos que os mostra no passado e agora. Divertido e inofensivo. Em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Amor

Georges não se recorda do nome do filme, mas lembra que ficou muito emocionado enquanto o assistia. Mais do que isso; ao encontrar um colega, na volta para casa, não pôde conter as lágrimas ao lhe narrar a história. "Por que você nunca me contou isso?", pergunta a esposa de Georges, Anne, que acabou de sofrer um derrame e está com o lado direito do corpo paralisado. Cenas como esta, de um casal ainda surpreendendo um ao outro mesmo depois de décadas de intimidade, é que fazem de "Amor", o novo filme do austríaco Michael Haneke, mais do que uma história sobre velhice e doença. Georges e Anne são interpretados por duas lendas do cinema francês, Jean-Louis Trintignant (de "Um homem e uma mulher") e Emmanuelle Riva (de "Hiroshima, moun amour") , e "Amor" venceu o último Festival de Cannes. É uma pequena obra-prima. É também, surpreendentemente, um filme muito sensível e mesmo "gentil" quando comparado à obras anteriores de Haneke, um mestre da frieza, como "Caché" e "A Fita Branca".

Não que "Amor" seja um filme fácil. A lenta desintegração física e mental pela qual passa Anne no desenrolar da trama é tão desoladora quanto inevitável. Haneke filma em planos longos, quase teatrais. Há uma conversa entre Georges e a filha Eva (a sempre competente Isabelle Huppert, de "Minha Terra, África" e "Copacabana") em que a câmera fica em um canto da sala, imóvel, por minutos a fio enquanto pai e filha falam sobre a família. Eva é casada com um músico inglês que tem casos com outras mulheres; os filhos estão em internatos ou não falam com os pais. É um contraste grande com o Amor (com letra maiúscula) que existe entre Georges e Anne. Haneke os filma com carinho lidando, a princípio com um choque disfarçado, com os primeiros sinais da doença. Anne, apesar de precisar de muitos cuidados, é uma mulher inteligente e muito consciente dos esforços do marido em tratar dela. Ela o faz prometer que nunca vai levá-la a um hospital ou casa de repouso e, no início, o casal parece ter a situação sob controle. É então que Anne sofre um segundo derrame e fica naquele estado semi vegetativo em que não se sabe se a pessoa está consciente ou não, e é um tormento tanto para Georges quanto para o espectador testemunhar a mudança na mulher. Há uma cena extremamente corajosa de Riva em que ela (que tem 85 anos) é vista nua enquanto uma enfermeira lhe dá banho, e a atriz se entrega totalmente ao papel; não por acaso, ela foi indicada ao Oscar de melhor atriz. Jean-Louis Trintignant também oferece uma interpretação sincera e emocionante como o marido devotado que sofre dia e noite para cuidar da esposa e lidar com as cobranças da filha.

Em uma época de relacionamentos rasos e com os índices de divórcio atingindo novos recordes, a relação mostrada em "Amor" pode parecer tanto uma benção quanto um tormento. O filme fala sobre o que todo mundo já sabe, ninguém consegue fugir da morte. O difícil é saber lidar com isto de forma digna e corajosa.

ps: falando em Oscar, "Amor" surpreendeu ao ser indicado em cinco categorias: Melhor Filme Estrangeiro (o virtual vencedor), Melhor Diretor (Michael Haneke, que pode tirar de Steven Spielberg seu terceiro prêmio), Melhor Roteiro (também de Haneke), Melhor Atriz (a já citada Emmanuelle Riva) e Melhor Filme de 2012.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Vênus




O primeiro papel no cinema de Peter O´Toole foi no épico “Lawrence da Arábia” (1962), de David Lean. O´Toole deu a interpretação de sua carreira, que foi seguida de uma série de sucessos e de outras grandes atuações, mas nunca recebeu o Oscar de Melhor Ator. Alguns anos atrás ele recebeu um prêmio honorário da Academia, o que não é a mesma coisa. Em 2007, aos 75 anos, O´Toole foi novamente indicado (e novamente derrotado) ao prêmio por sua brilhante interpretação em “Vênus”, um bom filme dirigido em 2006 por Roger Michell. Não deixa de ser chocante ver o efeito dos anos nas feições do antigo Lawrence da Arábia. O´Toole exibe as marcas da idade em seu rosto, sua voz e no modo de andar. O “consolo” é que tudo isso é perfeitamente adequado ao papel que ele está interpretando, Maurice, um velho ator que passa seus dias indo ao teatro e na companhia de velhos amigos. Um deles é Ian (Leslie Phillips, ótimo), a própria definição do “velho rabugento”. Ian também foi um ator de sucesso modesto e que está ansioso com a notícia de que uma sobrinha de 19 anos virá morar com ele. Ian tem fantasias de que a sobrinha Jessie será uma espécie de enfermeira particular, cuidando dele e fazendo suas vontades, mas a realidade é bem diferente. Jessie (Jodie Whittaker) é a típica adolescente revoltada e insolente, que não liga para o tio e o trata mal.

Mas Maurice sente uma inesperada atração pela atitude da garota e começa a usar do seu velho charme para conquistá-la. Ian pergunta a Maurice, indignado: “o que você faz com ela, na sua idade?”. E Maurice responde simplesmente “algo muito difícil... eu a trato bem”. De fato, a relação entre Maurice e Jessie não é inteiramente platônica... há um subtexto sexual ocorrendo o tempo todo, mas é fato que a idade avançada de Maurice não permite que nada muito físico ocorra. Assim, Maurice passa as tardes levando Jessie ao teatro e a jantares, onde Jessie descobre que ele é razoavelmente famoso. Ele também lhe arruma um emprego como modelo (nua) em uma classe de desenho, mas ela não permite que ele a veja. Maurice começa a chamá-la de “Vênus” depois de levá-la ao museu de arte para ver o quadro de mesmo nome de Diego Velázquez. A garota não tem maturidade para entender os motivos do interesse de Maurice, mas claro que gosta da atenção e, em alguns momentos, permite certas liberdades da parte dele, como deixar que ele beije seu pescoço ou segure suas mãos. Estas cenas (um velho de 74 anos e uma garota de 19) podem soar “impróprias” mas são feitas com muita sensibilidade. Maurice claramente foi um ator belo e desejado na juventude (assim como Peter O´Toole), e a figura de Jessie lhe trás de volta velhos desejos. Jessie (que teve um filho abortado recentemente) não está acostumada a ser bem tratada por ninguém, muito menos por homens.

Vale notar também a presença de Vanessa Redgrave, maravilhosamente “real” e idosa, como a ex-esposa de Maurice. Eles ainda cultivam uma amizade antiga, mas ela guarda certo ressentimento pelas aventuras amorosas que Maurice teve nos tempos de juventude. Há uma bela cena entre os dois em que Maurice demonstra arrependimento pelo que fez. Peter O´Toole está magnífico nos pequenos detalhes de seu personagem e em seu claro declínio físico. O filme não tem ilusões com relação à velhice e também mostra o lado “ruim” (ainda que natural) da idade, como embaraçosas consultas a médicos, problemas físicos e a presença inevitável da morte. O filme está em DVD.