Mostrando postagens com marcador josé padilha. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador josé padilha. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Robocop

"Robocop" foi lançado em 1987 com direção do holandês Paul Verhoeven. Era uma ficção-científica passada em um futuro próximo, satírica e extremamente violenta. O sucesso gerou duas continuações (bastante inferiores) e até uma série de desenhos animados. O policial meio homem, meio máquina volta agora repaginado pelas mãos do brasileiro José Padilha, "quente" nos Estados Unidos depois do enorme sucesso de "Tropa de Elite". Levando-se em conta a crueza e violência dos filmes de Padilha, até que não era uma má escolha. O problema é que estamos no século 21 e, para os padrões do cinema atual, não cabe fazer um filme sobre um "herói" como Robocop da mesma forma violenta de Verhoeven. O cyborg retorna em um filme tão clean quanto vazio, o que é uma pena.

Os erros começam pela escalação do elenco. Há vários bons atores jovens por aí, mas Padilha escolheu para o papel principal o inexpressivo sueco Joel Kinnaman. O rapaz tem uma voz grave, o que é apropriado para Robocop, mas em um papel em que toda a interpretação depende das expressões faciais, Kinnaman é muito frio. E o que dizer dos vilões? O Robocop de 1987 trazia os ótimos Ronny Cox e Kurtwood Smith como os bandidos que aterrorizavam a cidade de Detroit. Na versão atual, fica até difícil saber quem são realmente os vilões da história. O grande Michael Keaton está desperdiçado como Raymond Sellars, o chefe da empresa que faz fortuna mundo afora com robôs de combate.  Gary Oldman é o Dr. Norton, o responsável pela criação do Robocop. Oldman é bom ator, mas os roteiristas não sabem o que fazer com o personagem dele. Em um momento ele é uma figura paterna para Alex Murphy, o policial transformado em Robocop. Em outro, porém, mexe no cérebro do rapaz para que ele não possa mais sentir emoções. Depois muda de ideia novamente. Há ainda um vilão chamado Antoine Vallon (Patrick Garrow), que entra mudo e sai calado, sendo praticamente irrelevante para a trama (que diferença de Clarence Boddicker). Samuel L. Jackson interpreta um jornalista de direita que, estranhamente, lembra muito o personagem Fortunato, de "Tropa de Elite 2". (leia mais abaixo)



Sem falar que, ao mudar a origem do personagem do Robocop, o filme de Padilha lhe tirou toda a motivação. Enquanto no filme original Alex Murphy (na época interpretado por Peter Weller) era brutalmente mutilado por Boddicker e sua gangue, na versão atual Murphy vai parar no hospital quando seu carro explode, em um impessoal atentado a bomba. Esta versão de Robocop é tão clean que as balas disparadas pela arma do cyborg são elétricas, ou seja, não matam (a não ser quando ele quer). Tudo parte do esforço em fazer um filme  "inofensivo" para pré-adolescentes (que encontram muito mais violência nos games que jogam em casa).

A sátira social presente no filme de Verhoeven se transformou, nesta versão, em um discurso vazio sobre o uso de drones pelos Estados Unidos mundo afora. José Padilha conseguiu levar seus habituais colaboradores, o fotógrafo Lula Carvalho e o editor Daniel Rezende para trabalhar com ele. Pena que o roteiro (escrito por Joshua Zetumer) seja tão fraco e pouco ousado.

Câmera Escura

domingo, 10 de outubro de 2010

Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro

"Tropa de Elite" (2007) foi um fenômeno do cinema brasileiro. Uma cópia com uma montagem temporária vazou, foi parar nas bancas dos camelôs e vendeu milhares de DVDs piratas. Antes mesmo do lançamento oficial, o filme já estava na boca do povo, que incorporou bordões como "pede pra sair!". O fenômeno não parou por ai. Os temas incendiários tratados pelo roteiro do diretor José Padilha se tornaram motivo de debates acirrados, teses acadêmicas e assunto para programas de televisão. A figura de um homem vestindo o uniforme preto do BOPE se tornou um herói inesperado, o "Capitão Nascimento", um policial incorruptível com métodos questionáveis de abordar os "vagabundos" da favela. Nascimento, incorporado por Wagner Moura, era honesto e matava com a mesma frieza policiais corruptos, traficantes de drogas e, a bem da verdade, qualquer um que ele julgasse estar do lado errado da lei. Em um país carente de justiça como o Brasil, a figura de Nascimento se tornou um modelo de conduta que podia ser torto e discutível, mas era considerado eficiente.
O agora Coronel Nascimento está de volta. "Tropa de Elite 2" tem todos os ingredientes que fizeram do primeiro filme um sucesso. Qualidade técnica inquestionável, elenco empenhado e grande dose de polêmica. José Padilha poderia, se quisesse, ter ido pelo caminho fácil e explorado a imagem do BOPE como em uma série de televisão americana, com seus membros participando de aventuras e passando por perigos nas favelas do Rio de Janeiro. Mas Padilha volta disposto a mostrar para todos os desavisados que o problema criminal na cidade carioca (e em todo o Brasil) é maior e mais perverso do que se imagina.
Dez anos depois dos acontecimentos do primeiro filme, Nascimento e sua "cria" no BOPE, o Capitão Matias (André Ramiro), estão se preparando para invadir o presídio Bangu I, que está em chamas. Nascimento é novamente o narrador do filme, soltando frases polêmicas como "o homem dos Direitos Humanos é quem vagabundo chama quando fez merda". De fato, em Bangu I os detentos estão se matando e fizeram dois policiais reféns. Nascimento está com o governador do Rio no celular, pedindo a chance de matar as lideranças do tráfico que estão trancafiadas ali. O governador responde que "não quer outro Carandiru". É então que chega a pedra no sapado de Nascimento, o professor de História, esquerdista e membro da organização "Human Rights Aid", Fraga (Irandhir Santos). Assim como no primeiro filme, um tiro se mostra fundamental para a trama. Em "Tropa de Elite", Neto (Caio Junqueira) dava o tiro certeiro que matava um traficante em um ponto chave do filme. Em "Tropa 2" é André Matias que, contrário às ordens de Nascimento, executa o líder da rebelião durante uma situação de refém.
O fato faz com que Nascimento seja demitido "para cima". Ele é exonerado do BOPE para ser assistente da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro. É de lá que ele planeja sua "luta contra o Sistema". "Tropa de Elite 2" não faz rodeios ao tratar dos problemas sérios que envolvem as polícias civil e militar do Rio de Janeiro, o BOPE, os políticos, traficantes e as milícias armadas. O roteiro é um labirinto denso e complicado envolvendo todas estas frentes. Há um ar de "filme de tese" ainda maior nesta continuação de "Tropa de Elite". É como se Padilha não quisesse mais que os espectadores, críticos e intelectuais confundissem seus personagens com heróis. É uma tarefa complicada. Padilha se utiliza dos mesmos recursos técnicos e da linguagem cinematográfica desenvolvidos por Hollywood para originalmente gramourizar seus temas. Às vezes fica difícil ver crítica nas cenas em que o BOPE, altamente técnico e especializado, invade uma favela com dezenas de homens, helicópteros e o "Caveirão", o carro blindado que é símbolo da corporação, para matar a maior quantidade de "vagabundos", os traficantes, possível.
Mas Padilha vai mais fundo. Ele mostra como a favela é um organismo vivo, que precisa de suprimentos para se alimentar. O massacre produzido pelo BOPE deixa a favela aberta para que policiais corruptos tomem o lugar dos traficantes e criem milícias armadas. O papel da mídia sensacionalista também é explorado. Fortunato (André Mattos) é um apresentador de televisão claramente baseado em Datena, com sua atuação teatral diante das câmeras, clamando por "justiça" e pela morte dos bandidos. Na verdade Fortunato está ligado às milícias que exploram as favelas. Há também citação aos bons jornalistas como no trágico caso de Tim Lopes, morto por traficantes durante uma reportagem. Nascimento tem que lidar com a ex-mulher e com o distanciamento do próprio filho, que o vê como um assassino. Fraga, um adversário constante, pode se tornar um aliado na cruzada por justiça de Nascimento.
Padilha termina seu filme com uma daquelas cenas que, novamente, se apropriam do cinema comercial americano, quando o herói vai a público contar a "verdade". O discurso do Coronel Nascimento ao final de "Tropa 2" provavelmente enojaria o Capitão Nascimento do primeiro filme. José Padilha e Wagner Moura, assim, deixam clara sua tese, da qual não escapa quase ninguém. A câmera voa então até Brasília, e a implicação é clara.
É, parceiro, quem disse que a vida é fácil? (visto no Topázio Cinemas).