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quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Elle (2016)

A violência parece cercar Michèle Leblanc (Isabelle Huppert, ótima como sempre). Logo na primeira cena do filme testemunhamos, aparentemente, Michèle sendo estuprada por um homem que invadiu sua casa. As atitudes dela após o fato, no entanto, não parecem condizentes com uma mulher que acabou de ser violentada. No trabalho dela, mais violência, agora virtual. Michèle é dona de uma empresa que cria viodeogames, e o mais novo produto da casa mostra, com detalhes, uma mulher sendo violentamente atacada por um monstro. "Precisa ser mais forte", ela diz para um grupo de jovens desenvolvedores. No campo familiar, a mãe de Michèle fica insistindo para que ela vá visitar o pai na cadeia, preso há muitos anos por um crime bárbaro.

"Elle" é dirigido pelo lendário cineasta holandês Paul Verhoeven (78 anos), que depois de alguns sucessos na Europa, no começo dos anos 1980, foi conquistar a América com filmes como "Robocop" (1987), "Total Recall" (1990) e "Instinto Selvagem" (1992). O fracasso veio com a bomba "Showgirls" (1995) e outros filmes pouco vistos que levaram o diretor de volta à Europa. Verhoeven mostra toda sua competência neste filme em que mistura drama familiar com cenas de suspense à Alfred Hitchcock.

O roteiro é bastante francês. Michèle convive com o ex-marido, faz questão de conhecer a jovem namorada dele e tem um caso com o marido da melhor amiga. No corpo de qualquer outra atriz a personagem provavelmente passaria por fria, mas Huppert a interpreta com tanto carisma que Michèle, ao invés de ser uma mulher traumatizada e esmagada pelo passado, parece até conformada e pragmática com a série de fatalidades que acontecem na sua vida. Há uma curiosa ligação entre violência e intimidade no filme de Verhoeven que também é bastante européia. Sobre a trama não se pode falar muito sem acabar revelando detalhes. Assim como Hitchcock, Verhoeven entende que o bom filme de suspense não é o que guarda segredo por muito tempo, mas sim o que o revela no meio da trama e deixa o espectador ainda mais interessado no que vai acontecer.

"Elle", marquem aí, é boa aposta para o Oscar de melhor filme estrangeiro ano que vem. (e pode até sobrar uma indicação para Huppert).

João Solimeo

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Robocop

"Robocop" foi lançado em 1987 com direção do holandês Paul Verhoeven. Era uma ficção-científica passada em um futuro próximo, satírica e extremamente violenta. O sucesso gerou duas continuações (bastante inferiores) e até uma série de desenhos animados. O policial meio homem, meio máquina volta agora repaginado pelas mãos do brasileiro José Padilha, "quente" nos Estados Unidos depois do enorme sucesso de "Tropa de Elite". Levando-se em conta a crueza e violência dos filmes de Padilha, até que não era uma má escolha. O problema é que estamos no século 21 e, para os padrões do cinema atual, não cabe fazer um filme sobre um "herói" como Robocop da mesma forma violenta de Verhoeven. O cyborg retorna em um filme tão clean quanto vazio, o que é uma pena.

Os erros começam pela escalação do elenco. Há vários bons atores jovens por aí, mas Padilha escolheu para o papel principal o inexpressivo sueco Joel Kinnaman. O rapaz tem uma voz grave, o que é apropriado para Robocop, mas em um papel em que toda a interpretação depende das expressões faciais, Kinnaman é muito frio. E o que dizer dos vilões? O Robocop de 1987 trazia os ótimos Ronny Cox e Kurtwood Smith como os bandidos que aterrorizavam a cidade de Detroit. Na versão atual, fica até difícil saber quem são realmente os vilões da história. O grande Michael Keaton está desperdiçado como Raymond Sellars, o chefe da empresa que faz fortuna mundo afora com robôs de combate.  Gary Oldman é o Dr. Norton, o responsável pela criação do Robocop. Oldman é bom ator, mas os roteiristas não sabem o que fazer com o personagem dele. Em um momento ele é uma figura paterna para Alex Murphy, o policial transformado em Robocop. Em outro, porém, mexe no cérebro do rapaz para que ele não possa mais sentir emoções. Depois muda de ideia novamente. Há ainda um vilão chamado Antoine Vallon (Patrick Garrow), que entra mudo e sai calado, sendo praticamente irrelevante para a trama (que diferença de Clarence Boddicker). Samuel L. Jackson interpreta um jornalista de direita que, estranhamente, lembra muito o personagem Fortunato, de "Tropa de Elite 2". (leia mais abaixo)



Sem falar que, ao mudar a origem do personagem do Robocop, o filme de Padilha lhe tirou toda a motivação. Enquanto no filme original Alex Murphy (na época interpretado por Peter Weller) era brutalmente mutilado por Boddicker e sua gangue, na versão atual Murphy vai parar no hospital quando seu carro explode, em um impessoal atentado a bomba. Esta versão de Robocop é tão clean que as balas disparadas pela arma do cyborg são elétricas, ou seja, não matam (a não ser quando ele quer). Tudo parte do esforço em fazer um filme  "inofensivo" para pré-adolescentes (que encontram muito mais violência nos games que jogam em casa).

A sátira social presente no filme de Verhoeven se transformou, nesta versão, em um discurso vazio sobre o uso de drones pelos Estados Unidos mundo afora. José Padilha conseguiu levar seus habituais colaboradores, o fotógrafo Lula Carvalho e o editor Daniel Rezende para trabalhar com ele. Pena que o roteiro (escrito por Joshua Zetumer) seja tão fraco e pouco ousado.

Câmera Escura

terça-feira, 28 de agosto de 2012

O Vingador do Futuro

A ideia é interessante. Na falta de dinheiro ou oportunidade para fazer uma viagem ao redor do mundo, que tal comprar um implante com as memórias desta viagem, como se você a tivesse feito de verdade? A empresa Rekall, no final do século 21, promete lhe fornecer a experiência. Esta é a premissa criada pelo escritor de ficção-científica Philip K. Dick em seu conto "We can remember it for you wholesale", escrito em 1966. A história deu origem a um espetacular filme de aventura dirigido pelo holandês Paul Verhoeven em 1990, estrelado por Arnold Swarzenegger. Hoje, 22 anos depois, uma nova versão é dirigida por Len Wiseman.

Douglas Quaid (Colin Farrell) é um homem que, todas as noites, sonha que é um agente secreto. Na vida real, porém, ele é um simples operário das indústrias Cohaagen, que fabrica soldados robóticos do outro lado do planeta. A Terra foi quase toda destruída em guerras biológicas e apenas dois lugares ainda são habitáveis: a "Federação Unida da Bretanha" (Inglaterra e arredores) e a "Colônia" (a Austrália). Os dois são ligados por um túnel/elevador que atravessa o núcleo do planeta, por onde Quaid e milhares de operários da "Colônia" se deslocam para trabalhar na sede do novo "Império Britânico". Quaid gostaria que a vida dele e da esposa Lori (Kate Beckinsale) fosse diferente, e um dia resolve comprar memórias na Rekall. O vendedor lhe oferece um pacote em que ele seria um agente secreto que trabalharia tanto para o Chanceler Cohaagen (Bryan Cranston) quanto para o líder da resistência, Matthias (Bill Nighy, desperdiçado). O problema é que quando o procedimento de implante está para começar, descobre-se que Quaid realmente é um agente secreto, e dezenas de policiais invadem a Rekall. Descobrindo habilidades que não sabia que tinha, Quaid consegue matar a todos e fugir. Quem ele seria realmente? E, o mais importante, seria aquilo tudo real ou ele estaria vivendo as memórias implantadas pela Rekall?

A versão de 1990 levava Swarzenegger em uma aventura até o planeta Marte, onde ele lutava ao lado da resistência contra Cohaagen, um empresário que explorava os colonos. O roteiro era cheio de reviravoltas e Paul Verhoeven, como de hábito, criou um filme bastante violento, mas empolgante. A versão de Wiseman é muito mais "clean"; o visual é claramente baseado em "Blade Runner" (1982, de Ridley Scott, também tirado de um conto de Philip K. Dick) e Colin Farrell, sem dúvida, é melhor ator que Arnold Swarzenegger. O que não significa que este filme seja melhor; pelo contrário, falta a habilidade de um diretor como Verhoeven. Kate Beckinsale, apesar de bonita, está muito mal como a "esposa" de Quaid e passa o filme fazendo uma expressão forçada de vilã. Jessica Biel, como a comparsa de Quaid na resistência, se sai um pouco melhor, mas tanto seu visual quanto os figurinos são tão parecidos com os de Beckinsale que, por diversas vezes, elas se confundem. Os poucos momentos de calma são seguidos por sequências absurdas, como a passada dentro de elevadores que podem se movimentar em qualquer direção. A trama se passa toda no planeta Terra, mas o roteiro até referencia o primeiro filme em uma fala de Colin Farrell, que diz que ele sempre quis ir à Marte. O final é uma confusão de cenas de ação com as  esperadas explosões e fugas impossíveis. Prefira o original. Visto no Kinoplex Campinas.



sábado, 5 de abril de 2008

A Espiã


O holandês Paul Verhoeven é famoso por suas cenas de violência e sexo. Em alguns casos, cenas de ambos. É dele o já "clássico" Instinto Selvagem ("Basic Instinct), que em 1992 mostrou ao mundo a mais famosa cruzada de pernas do cinema, protagonizada por Sharon Stone. O filme não fazia o menor sentido em termos de roteiro, mas as cenas de Stone mais o suspense influenciado por Hitchcock fizeram muito sucesso. Verhoeven estreou no cinema americano com o estilizado "Conquista Sangrenta" (Flash and Blood, 1985), com Rutger Hauer e fez muito sucesso em seguida com "Robocop" (1987). Este último contém algumas das cenas mais violentas do cinema, mas era um primor em técnica (as cenas filmadas pelo ponto de vista de Robocop são brilhantes) e tinha bela trilha sonora de Basil Poledouris. Em seguida veio "O Vingador do Futuro" (Totall Recall, 1990), sobre um operário que se transforma em agente secreto e é enviado à Marte; ou será que é tudo um sonho? A história foi baseada em um conto de Philip K. Dick (de Blade Runner e Minority Report). Com essa série de sucessos no currículo, Verhoeven perdeu o rumo em uma série de fracassos, como "Showgirls" (1995, tão ruim que chega a ser cômico); "Tropas Estelares" (1997, pornograficamente violento) e "O Homem sem Sombra" (2000). Sua estrela parecia ter se apagado e ele desapareceu da cena cinematográfica americana.

Ele retorna agora com "A espiã", seu primeiro filme feito na Holanda em mais de vinte anos. O resultado é um filme bastante interessante e muito bem feito, mas com vários problemas. A atriz Carice van Houten está muito bem no papel de uma cantora judia que perde toda a família quando tenta fugir da Holanda. Ela consegue escapar milagrosamente de um massacre e começa a trabalhar para a resistência holandesa, espionando um alto oficial alemão chamado Ludwig Müntze. Bela e sensual, a garota adota o nome de Ellis de Vries e se envolve fisicamente com Müntze na tentativa de auxiliar os membros da resistência. O filme é passado na Holanda no final da Segunda Guerra Mundial e é muito bem feito, com estilo de cinema clássico e sem os efeitos especiais que fizeram Verhoeven famoso nos EUA. Carice van Houten está muito bem como Ellis e ela lembra as antigas divas da era de ouro de Hollywood. Mas este é um filme de Paul Verhoeven, o que significa que ela é vista nua em várias cenas. A direção, por vezes, é confusa. Quando a família de Ellis é massacrada em frente a seus olhos, por exemplo, ela permanece estranhamente fria e tranquila, mesmo tendo levado um tiro de raspão na cabeça. O roteiro é maniqueísta ao criar personagens "do bem" e "do mal" com quem o espectador pode se identificar (ou odiar). Falta também  uma explicação melhor sobre o passado da moça. Sabe-se que ela foi uma cantora, mas de que tipo? Ela foi famosa o suficiente para ser reconhecida durante a guerra? De onde ela veio? O roteiro mostra os pais e irmãos em uma cena apenas para matá-los em seguida, o que é uma saída simples demais. Mesmo com esses problemas (e com a duração longa), "A Espiã" é um filme interessante de se ver. E, quem sabe, o filme traga Verhoeven de volta às telas com mais frequência.