Duna: Parte 2 (Dune: Part 2, 2024). Dir: Denis Villeneuve. Três anos depois da primeira parte, chega aos cinemas a continuação do épico de Denis Villeneuve, Duna. O primeiro filme, apesar de muito bom, tinha o problema de parar no meio da trama. Este começa praticamente na cena seguinte do filme anterior e imagino o dia em que vai ser possível assistir tudo, de uma vez, em um filmão de mais de quatro horas.
O roteiro traz algumas adaptações e mudanças na trama do livro que são interessantes. Stilgar (Javier Bardem), é mostrado como um fanático religioso, diferentemente do livro. Chani (Zendaya), ao contrário, é vista como uma pessoa cética que acha que profecias servem apenas para prender seu povo. Esses temas, presentes nos livros de Frank Herbert, são colocados mais em evidência no roteiro de Villeneuve e Jon Spaihts. Paul Atreides (Timothée Chalamet) não acredita que ele seja o "Lisan al Gaib", o profeta que o povo Fremen acredita que veio para salvá-los. Já Lady Jessica (Rebeca Ferguson), sua mãe, acha que ele deve abraçar as profecias para ganhar mais poder.
Todos estes temas, fanatismo, misticismo, dependência química e expansão da mente convivem em um cenário de ficção-científica, com suas naves espaciais, lasers, explosões e batalhas épicas entre casas rivais do Império. O estilo grandioso de Villeneuve, acompanhado pela música de Hans Zimmer e incríveis efeitos especiais, por vezes, beiram o exagero. Uma vez que se "abrace" o estilo, no entanto, o resultado é impressionante. Eu, que já li o livro original várias vezes, fico impressionado como a visão de Villeneuve é parecida com o que eu havia imaginado. Já foi anunciado que um terceiro filme, baseado em "O Messias de Duna" (o segundo livro), será feito por Villeneuve e equipe (o que explica porque Anya Taylor-Joy aparece só por alguns segundos neste filme... sua personagem será explorado no próximo capítulo).
O resto do elenco conta com Josh Brolin, Austin Butler, Léa Seydoux, Charlote Rampling, Florence Pugh, entre outros. O grande Christopher Walken, que eu adoro, infelizmente foi uma escolha errada para encarnar o Imperador. Walken é ótimo, mas está fora de lugar aqui. Não sei como estes filmes são encarados por quem não leu os livros (estou curioso), mas achei um épico grandioso. Nos cinemas.
Duna (Dune, 2021). Dir: Denis Villeneuve. Não ia ao cinema desde janeiro de 2020. Em pandemia, havia prometido a mim mesmo que só "Duna" me faria arriscar uma sala de cinema, e isso no ano passado; o filme foi adiado em um ano e chegou finalmente às salas de todo mundo. Nos EUA, "Duna" estreou simultaneamente na HBO Max (o que causou protestos de Denis Villeneuve e de vários outros diretores). Mas é definitivamente para ser visto no cinema, e troquei a TV de casa por um IMAX maravilhoso.
Qualquer um que me conheceu desde os quatorze anos de idade já me viu com "Duna" debaixo do braço. A versão que David Lynch cometeu em 1984 é bem ruim e nunca vi inteira. Ai o grande diretor canadense Denis Villeneuve ("A Chegada", "Sicario", "Blade Runner 2049") assumiu o projeto e o filme que chega às telas agora é, com ressalvas, bastante bom. É daqueles filmes com visual impressionante (tudo em uma ESCALA gigantesca) ótimos figurinos, fotografia, trilha sonora, etc. Não faço ideia de como o filme é recebido por alguém que não leu o livro mas, do meu ponto de vista, o roteiro (de Villeneuve, Erik Roth e Jon Spaihts) fez um bom trabalho de adaptação do "tijolo" que é a obra original de Frank Herbert.
O elenco é de primeira; Timothée Chalamet, Oscar Isaac, Rebeca Ferguson, Josh Brolin, Stellan Skarsgård, Jason Momoa, Zendaya, Javier Bardem, Charlote Rampling, entre outros. Chalamet está bastante bem como Paul Atreides, o herdeiro da Casa Atreides que descobre que também foi criado para ser uma espécie de "messias" pelas Bene Gesserit, uma ordem de mulheres da qual a mãe de Paul, Jessica (Rebeca Ferguson) faz parte. Tudo isso está ligado à uma trama complicada envolvendo política imperial, maquinações da corte, traições, golpes de estado, etc. Apesar de algumas mudanças, Villeneuve conduz algumas sequências de forma bem próxima ao livro original, e foi emocionante ver como as imagens dele eram parecidas com as que imaginei na cabeça durante todos esses anos.
Uma crítica que se pode fazer é que, por questão de tempo, o filme simplesmente termina lá pelo meio do livro. Toda a promessa épica do começo do filme termina com um final que, apesar de fiel a um trecho do livro, me pareceu meio apressado. Nessa época de séries épicas de TV como "Game of Thrones", "Fundação", etc, é de se perguntar se um livro longo e complicado como este não funcionaria melhor como uma minissérie, mas (grande) parte de mim está feliz que não tenham ido por este caminho. O futuro de Duna no cinema, porém, é incerto. Ao contrário de "O Senhor dos Anéis", que foi produzido como uma trilogia desde o início, Villeneuve não filmou a segunda parte do livro ainda. "Duna" foi bem recebido pelos críticos, mas ainda não se sabe se a bilheteria justificaria o investimento de uma continuação. Ironicamente, talvez a continuação seja "salva" justamente pela HBO Max, que provavelmente gostaria de tê-lo no catálogo. Enquanto isso não acontece, eu pretendo rever este aqui.
Shakespeare diz em uma de suas peças (Macbeth) que a vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, e que não significa nada". É assim que Woody Allen começa seu mais novo filme. Escrever sobre Allen, assim como ver um filme dele, é um prazer. O diretor veterano se mantém tão ativo que muitos o acusam de estar decadente. Na verdade seus filmes ainda estão bem acima da média da bobagem que tem povoado as telas recentemente. Sim, há uma espécie de "fórmula" para um filme de Woody Allen. Homens e mulheres com problemas conjugais, diálogos irônicos, jazz na trilha sonora e a sensação de que o mundo é feito de peças de teatro, óperas, galerias de arte e conversas sobre o ato de escrever. Só que em meio a este mundo aparentemente fora da realidade há espaço para pequenos e grandes dramas humanos, cheios de som e fúria, significando a vida e a morte para seus protagonistas, mas nada no esquema geral do mundo.
Helena (Gemma Jones) é uma senhora que perdeu o "chão" quando o casamento de 40 anos terminou. O ex-marido, Alfie (Anthony Hopkins), se assustou com a idade e caiu naquele padrão patético do idoso que deixa a esposa e passa a frequentar academias de ginástica e sair com garotas de programa. Helena vai buscar consolo em uma vidente chamada Cristal (Pauline Collins), que logo na primeira sessão vê "ondas coloridas positivas" indo na direção de Helena. Claro que ela é uma charlatã, mas ao menos é mais pessoal que os psiquiatras que tratavam de Helena antes, com frieza e remédios.
Helena é mãe de Sally (Naomi Watts), que trabalha em uma galeria de arte chefiada pelo atraente Greg (Antonio Banderas). Sally é casada com um americano, Roy (Josh Brolin), que já foi um escritor de sucesso. Incapaz de escrever um livro bom novamente, Roy passa o dia espiando e "buscando inspiração" na vizinha do outro lado da rua, a indiana Dia (Freida Pinto). A garota é violonista clássica e está noiva de um rapaz que está sempre viajando.
Allen, com seu talento habitual, cruza e descruza o caminho destas pessoas pelas ruas de Londres. Sally se apaixona pelo chefe espanhol, que aparentemente está interessado nela. Alfie se casa com uma prostituta chamada Charmaine (Lucy Punch, a personagem mais caricata do filme), que obviamente só está interessada no dinheiro dele. O novo livro de Roy é rejeitado pela editora e um de seus amigos, também escritor, sofre um grave acidente e fica em coma. Só que, antes do acidente, ele havia deixado o manuscrito de um ótimo livro para Roy ler, e Roy começa a imaginar se o amigo vai acordar um dia ou não. Todos estes personagens tem que lidar com a fascinação de Helena pela vidente e por sua recém descoberta "espiritualidade". Helena consulta Cristal regularmente e acredita piamente em todas as visões da charlatã.
A trama lembra o extraordinário "Interiores", filme extremamente sério que Allen escreveu e dirigiu em 1978. Aquele filme também lidava com uma mulher cujo marido a havia abandonado e sua filha com problemas no casamento com um escritor. Talvez o tempo tenha mostrado a Allen que tudo isso, no final, não "significa nada" e ele resolveu fazer uma comédia sobre o mesmo assunto. Para os cinéfilos, um filme de Woody Allen sempre significa alguma coisa, e este não é exceção.
Há um pouco de Gordon Gekko, o ambicioso jogador da bolsa de valores interpretado por Michael Douglas, no diretor Oliver Stone. Roteirista de sucesso nos anos 80, Stone se lançou para a fama cinematográfica dirigindo filmes polêmicos que trataram de biografias de presidentes americanos (como Nixon, JFK ou George W. Bush), a Guerra do Vietnã (Platoon, Nascido em Quatro de Julho, Entre o Céu e a Terra), violência e a mídia (Assassinos por Natureza) ou a ganância da bolsa de valores (Wall Street). Exagerado, ambicioso, manipulador, Stone passou por maus bocados nos últimos anos, investindo em grandes fracassos como "Alexandre" ou filmes por encomenda como "As Torres Gêmeas". Polêmico, também se tornou documentarista e se aproximou de figuras como Fidel Castro, em Cuba, e Hugo Chávez, na Venezuela.
Na cena que abre "Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme", continuação de seu filme de 1987, Gordon Gekko está sendo libertado da prisão depois de cumprir pena por diversos crimes financeiros. Ele tem pouco dinheiro, um celular que pesa quase um quilo e, fora das grades, ninguém para buscá-lo. Um pouco do Stone polêmico dos anos 80 também volta com Gekko. Paradoxalmente, o estilo um dia inovador de Stone, aos olhos do espectador do século XXI, parece extremamente "clássico", com belas tomadas de Nova York, capital do mundo, créditos no início do filme, música de David Byrne e Brian Eno e um elenco impressionante. De sólidos novos astros como Shia LaBeouf, a carismática Carey Mulligan e Josh Brolin a veteranos como Eli Wallach (no alto de seus incríveis 95 anos), Frank Langella, Austin Pendleton, Susan Sarandon e, claro, Michael Douglas, é um grupo de dar inveja.
Stone explora os atrativos e fraquezas do sistema capitalista em seu palco principal, o mercado de Wall Street. LaBeouf é Jake Moore, um garoto prodígio que, na casa dos vinte e poucos anos, mora em um apartamento caro em Manhatan e acaba de receber um bônus de US$ 1,4 milhões. Apesar da aparente prosperidade, no entanto, o mercado está para estourar em uma das maiores crises financeiras desde a queda da Bolsa de Nova York em 1929. Stone é meticuloso em mostrar como os "tubarões" do mercado exploram o sistema para derrubar competidores e sair lucrando no processo. É o caso de Bretton James (Josh Brolin), que liquida a empresa pertencente a Louis Zabel (Langella), mentor e segundo pai do personagem de LaBeouf. Desolado, Zabel se suicida no metrô de Nova York assim que perde sua empresa. LaBeouf promete se vingar de Bretton, mas ele o faz da maneira capitalista de ser, sendo contratado pelo próprio Bretton. Já Carey Mulligan (de "Educação" e "Em busca de uma nova chance") é Winnie Gekko, filha de Gordon, uma jornalista que mantém um pequeno site independente de notícias. Ela se recusa a perdoar o pai e não quer nada do seu dinheiro, apesar de estar noiva de Moore (LaBeouf), membro de Wall Street, e morar em um apartamento rico em Nova York.
Douglas e LaBeouf repetem, de certa forma, a dupla veterano/novato representada no Wall Street original, em 1987, por Douglas e Charlie Sheen (que faz uma ponta no novo filme). Escondidos de Winnie, os dois começam a trocar informações do mercado (que interessam Moore) por oportunidades de reconciliar pai e filha (que interessam Gekko). Michael Douglas ganhou um Oscar por sua performance no filme original e, paradoxalmente, acabou se tornando uma espécie de modelo para a geração dos anos 80. "Greed is good" (a ganância é boa), dizia Gordon Gekko. Neste filme suas motivações são mais cinzas e difíceis de decifrar. Teria ele se tornado um "homem bom" que só quer voltar a ver a filha? Teriam seus anos de prisão lhe ensinado alguma coisa? O filme é um pouco indeciso quanto a estas questões. O personagem de LaBeouf, principalmente, precisaria de um desenvolvimento melhor. Ele é claramente esperto e conhecedor do mercado o suficiente para estar na posição em que se encontra. Em outros momentos, no entanto, é ingênuo demais. Há também uma mensagem ecológica colocada na trama que, perigosamente, parece justificar os esquemas e lavagens de dinheiro realizados por Gekko e Moore.
Mesmo com estes problemas, é um filme extemamente interessante de assistir e muito bem realizado. Stone mostra como o governo americano foi em socorro das empresas que estavam para falir com um "auxílio" de 700 bilhões de dólares. Chega a ser engraçado o modo como todos, ao redor da mesa do Federal Reserve, discutem cifras de bilhões de dólares como se não fossem nada.
Fato extra filme, é digno de nota que o ator Michael Douglas, logo no início da campanha de promoção para "Wall Street", tenha sido diagnosticado com um câncer na laringe. Em aparição no programa David Letterman, Douglas revelou a doença e, calmo mas bastante preocupado, disse que é grave e que entraria em tratamento. Saber disso nos faz ver sua interpretação de forma diferente (talvez uma despedida?) e, talvez, tornem Gekko mais humano.
O vencedor do Oscar de Melhor Filme deste ano foi “Onde os Fracos não Têm Vez” (“No country for old men”), escrito e dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. O filme, de fato, é magnífico, mas não tem o “formato” de costume dos vencedores da Academia. Ele é lento e implacável, assim como seu vilão, vivido por um Javier Barden inspirado. Fica a mesma sensação desconfortável que se sente ao final de “Fargo” (1996), outra obra prima dos irmãos Coen, e há elementos parecidos (o dinheiro do crime, o policial comum confuso com a situação, etc). Todo o elenco está brilhante. Tommy Lee Jones faz um xerife velho, cansado e confuso com o tipo de crimes que vê à sua volta. São crimes sem sentido, gratuitos e violentos, frutos da sociedade moderna. O filme trata da inevitabilidade da morte. E a morte, aqui, tem a forma de um assassino com um cabelo esquisito, voz grossa e frases de efeito, que por vezes joga com a sorte para decidir o destino de suas vítimas. Javier Barden foi premiado como Melhor Ator pela Academia por sua brilhante interpretação.
Um filme acima de tudo silencioso, quase sem trilha sonora, composto por grandes paisagens e pequenos homens andando por elas. É a desconstrução do antigo “western” americano. É brilhante o modo como os Coen vão introduzindo os personagens e contando sua história através das imagens. A seqüência em que Llwelyn Moss (Josh Brolin, de “O Gângster”) descobre as vans dos traficantes abandonadas no deserto, cercadas de mortos, é perfeita. Vemos passo a passo o resultado do que deve ter sido um tremendo tiroteio e tentamos adivinhar o que o personagem vai fazer. Nem ele sabe, na verdade, e vamos descobrindo junto com ele.O final, em aberto, deixou muita gente confusa nas salas de cinema do mundo todo. Não é um final "comum". As coisas não se "resolvem" como normalmente. Como na vida, só há uma coisa que "resolve" tudo, que é a morte. Mas há lugar para a esperança em um sonho do policial vivido por Tommy Lee Jones; ele sonha com o pai, cavalgando enrolado em um cobertor, em meio à neve, carregando brasas para uma fogueira. Ele vai chegar lá um dia, naquele lugar quente e aconchegante, o pai esperando por ele. “Onde os fracos não têm fez” foi baseado no livro de Cormac McCarthy, e também venceu o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado.