Camaleões (Reptile, 2023). Dir: Grant Singer. Netflix. Filme policial que vale a pena quase que exclusivamente por causa de Benicio Del Toro. O porto-riquenho carrega o filme nas costas com uma interpretação e tanto, quieto, inteligente, observador. Ele é um policial chamado a investigar a morte brutal de uma corretora de imóveis. De cara ele desconfia do namorado dela, um sujeito interpretado por Justin Timberlake; mas há outros suspeitos promissores, como o ex-marido da moça e um vizinho estranho interpretado (pelo estranho) Michael Pitt.
É o tipo de filme policial que vai se desenrolando aos poucos. Del Toro tem uma esposa esperta interpretada por Alicia Silverstone, que estava sumida das telas há um tempo. Os dois fazem um grande casal e ela o ajuda a pensar sobre o caso e a manter sua sanidade. A direção é de Grant Singer, especialista em video clips que estreia no longa metragem. Ele é bem seguro e cria cenas com bastante clima e suspense.
Uma pena que o roteiro se perca bastante mais para o final. Há descobertas e reviravoltas interessantes que são mal aproveitadas e, acabado o filme, você fica tentando entender exatamente o que aconteceu, ou como. Diversas pistas ficam sem explicação e dá a impressão que tiveram que terminar o filme sem se importar muito com o que veio antes. Vale a pena? Como disse, no mínimo vale pela presença de Del Toro e suas cenas com Silverstone. Tá na Netflix.
Nem um Passo em Falso (No Sudden Move, 2021). Dir: Steven Soderbergh. HBO Max. Detroit, 1954. Dois capangas, interpretados por Don Cheadle e Benicio Del Toro, são contratados por um mafioso (Brendan Fraser) para um trabalho rápido. Ele precisam manter refém a família de um empregado da GM (David Harbour) enquanto este vai até a empresa pegar um documento secreto. As coisas dão bastante errado e Cheadle e Del Toro se descobrem no meio de uma trama complicada que envolve segredos corporativos, disputas entre mafiosos, a polícia, entre outras coisas.
Soderbergh está à vontade como diretor, editor e diretor de fotografia (sob pseudônimos) do filme. Para representar a desorientação dos personagens, Soderbergh uma uma lente grande angular que distorce os cantos da imagem, aumentando alguns personagens e diminuindo outros. A direção de arte recria muito bem os anos 1950 e o elenco é cheio de figuras conhecidas, como Jon Hamm, Ray Liotta e Bill Duke (além de uma surpresa não creditada).
Apesar de não ser exatamente um "filme de assalto" como a série "Onze Homens e um Segredo" (também de Soderbergh), a trama envolve uma série de golpes e traições envolvendo o tal "documento secreto". O roteiro fica bastante confuso conforme avança e o final poderia ser melhor, mas não importa. É bem dirigido, tem bom elenco e vale ser visto. Na HBO Max.
O diretor Oliver Stone volta à boa forma com este filme cínico e violento. Stone tem uma carreira com altos e baixos, quase sempre marcada pela polêmica. Fez um dos filmes mais realistas sobre a Guerra do Vietnã, "Platoon" (1986), expôs a cobiça do capitalismo em "Wall Street" (1987), apresentou sua versão sobre o assassinato do Presidente Kennedy em "JFK" (1991), contou a vida do poeta do rock, Jim Morrison, em "The Doors" (1991), narrou a vida dos presidentes "Nixon" (1995) e George W. Bush em "W." (2008), e assim por diante. Depois do fracasso retumbante com o épico "Alexandre" (2004), fez o comportado "As Torres Gêmeas" (2006) e uma continuação para "Wall Street" em 2010.
"Selvagens" é narrado do ponto de vista de O. (Blake Lively), abreviação de Ofélia, uma "patricinha" loira da Califórnia que é namorada de dois traficantes modernos. Chon (Taylor Kitsch) é um ex-combatente das guerras do Iraque e Afeganistão que trouxe do oriente as sementes para um tipo especial de maconha, cultivada e melhorada por Ben (Aaron Johnson), um "neo hippie" formado em botânica. Os dois são discretos, eficientes e produzem a melhor erva da Califórnia, ganhando milhões de dólares e dividindo o tempo entre surfar, transar com O. ou, no caso de Ben, fazer viagens humanitárias para a África ou Indonésia. Tudo vai bem até que um cartel mexicano resolve entrar no negócio de Ben e Chon e lhes envia vídeos mostrando como eles lidam com os inimigos, degolados por serras elétricas. Chon, o ex-soldado, é partidário de uma resposta à altura; Ben, o humanitário, acha que eles podem chegar a um acordo. Quando eles resolvem fugir para a Indonésia com O., ela é sequestrada pelo cartel, que começa a fazer uma série de exigências. Começa então uma guerra entre o cartel mexicano, liderado por Elena (Salma Hayek) e os dois americanos.
O roteiro, de Oliver Stone, Don Winslow e Shane Salerno, é por vezes atrapalhado pela narração redundante de O. Tirando este detalhe, ele tem boas sacadas. A personagem de Salma Hayek é uma das mais interessantes; ela tem uma filha na Califórnia que se recusa a falar com ela, e quando O. é sequestrada e mantida em cativeiro surge uma ligação afetiva entre a rainha do crime e a patricinha americana. John Travolta, em um papel diferente do habitual, faz um agente federal corrupto cuja lealdade varia entre Ben e Chon e o primeiro tenente de Elena, um capanga chamado Lado (Benicio Del Toro, apropriadamente asqueroso). Emile Hirsch interpreta um hacker responsável pela lavagem de dinheiro dos traficantes, e há um grande número de bons coadjuvantes. O filme é bastante violento e Oliver Stone usa a trama para cutucar o modo de vida americano. Stone inclusive brinca com os clichês do gênero em um final que, dependendo como se olha, pode significar algo completamente diferente. É discutível se uma dupla de traficantes como Ben e Chon seria tão "nobre" a ponto de arriscar tudo pela vida da namorada em comum, e o filme por vezes esbarra no melodrama. Como é típico de Oliver Stone, a dose de exagero é alta, mas é visível o talento do diretor. Visto no Kinoplex Campinas.