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terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Se estas paredes cantassem (If these walls could sing, 2022)

Se estas paredes cantassem (If these walls could sing, 2022). Dir: Mary McCartney. Disney+. Há um misto de reverência e história neste documentário da filha de Paul McCartney, Mary, sobre o famoso estúdio "Abbey Road", em Londres. Talvez reverência demais e história de menos, mas não deixa de ser um bom retrato do lugar em que foram gravados alguns dos maiores discos de todos os tempos, de música clássica aos Beatles, de Pink Floyd a John Williams.

Com duração de 90 minutos, o filme conta rapidamente a história do estúdio (que começou como EMI) e parte para uma série de entrevistas com os músicos que lá gravaram. Há boas histórias; Elton John conta que comprava seus discos favoritos com o dinheiro que ganhava como pianista contratado. Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, também foi músico contratado do estúdio e estava presente na gravação do tema de "Goldfinger", de 007. Como não poderia deixar de ser, Paul McCartney (e os Beatles) acabam sendo os mais citados no documentário. O filho de George Martin, famoso produtor musical dos Beatles, fala como o pai gravou os álbuns da banda. O primeiro disco (com clássicos como "Love me do" e "Twist and Shout") foi gravado em apenas um dia. Já o famoso "Sgt. Peppers", de 1967, foi quando "os loucos tomaram conta do sanatório", nas palavras de McCartney. Ringo Starr diz que, se não fosse por Paul McCartney, os Beatles teriam gravado só três álbuns, ao invés de oito.

No mesmo ano, no estúdio ao lado, o Pink Floyd (na época liderado por Syd Barrett) gravava seu primeiro álbum, o revolucionário "The Piper at the Gates of Dawn". Em 1973, a banda gravou o clássico "The Dark Side of the Moon", o álbum que mais tempo esteve entre os mais vendidos dos EUA. Curioso que Roger Waters e David Gilmour, inimigos históricos que recentemente trocaram farpas pela internet, façam alguns elogios na gravação do documentário.

O filme mostra também como o estúdio entrou em crise no final dos anos 1970 e teve que vender grande parte do equipamento (McCartney teria ficado com bastante coisa). O estúdio tomou vida nova quando John Williams e George Lucas resolveram gravar as trilhas de "Caçadores da Arca Perdida" e vários capítulos de "Star Wars" em Abbey Road. Há várias outras histórias sobre outros músicos e bandas (sobra até espaço para o imbecil do Kanye West). Como disse, talvez o documentário seja reverente demais em alguns momentos; fala-se muito sobre a "mística" do lugar e sobre como as paredes supostamente estão "encharcadas" com a música gravada lá. A não ser por um senhor chamado Lester que faz a manutenção do equipamento, senti falta do depoimento de mais pessoas que trabalharam lá, como o grande Alan Parsons, por exemplo (que foi engenheiro de som dos Beatles e do Pink Floyd antes de criar a própria banda); mas é um bom documentário. Disponível na Disney+.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Doutor Estranho (2016)

O Dr. Stephen Strange surgiu nos quadrinhos em 1963, criado a quatro mãos pelo "mago" Stan Lee e pelo desenhista Steven Ditko (os mesmos que criaram o Homem Aranha). As tramas do Dr. Estranho eram passadas em "multiversos" e mundos paralelos que ecoavam o psicodelismo dos anos 1960. Foi tão influente que o Pink Floyd não só citou o doutor nas letras de uma canção (Cymbaline, do álbum "More", 1969) como os quadrinhos serviram de base para a capa do segundo álbum da banda, "A Saucerfull of Secrets" (1968). Em troca, podemos escutar "Interstellar Overdrive", do Floyd, em cena chave do filme atual.

Strange chega à tela grande na forma de Benedict Cumberbatch e baseado em efeitos especiais tão mirabolantes que deixariam Christopher Nolan zonzo. Há cenas impressionantes (que lembram algumas cenas de "A Origem", de Nolan) em que os magos da Industrial Light & Magic retorcem não só ruas, mas cidades inteiras. "O que você colocou no meu chá?", Cumberbatch pergunta a Tilda Swinton no primeiro encontro entre eles, no Nepal.

Cumberbatch interpreta Strange com a competência de sempre, misturando um pouco a genialidade  (e arrogância) de seu Sherlock Holmes com outros papéis que interpretou, como o matemático Alan Turing. No início do filme encontramos Strange como um cirurgião que é a estrela do hospital em que trabalha. Sua habilidade na mesa de cirurgia só não é maior que seu ego. Tudo parece perdido em uma noite em que Strange sofre um acidente de carro que deixa graves sequelas. Inconformado por não encontrar a cura na medicina tradicional, Strange parte para o Nepal onde vai se encontrar com a "Anciã" (Swinton, divertida, cuja escalação causou polêmica pelo fato de terem escolhido uma mulher branca para interpretar uma oriental). O filme pisa fundo na psicodelia e a Anciã mostra a um cético Strange os "multiversos" e suas ramificações.

Mads Mikkelsen interpreta Kaecilius, um ex-pupilo da Anciã que mudou "para o lado negro da Força" e está tentando conjurar um feitiço para atrair um grande vilão que vive em um mundo além do Tempo. O elenco ainda conta com Chiwetel Ejiofor como um seguidor da Anciã e uma desperdiçada Rachel McAdams como uma médica que é o interesse amoroso de Strange.

A trama segue o mesmo padrão "vilão-maluco-que-quer-poder-eterno" de tantos outros filmes, misturado a muita filosofia de biscoito da sorte, viagens astrais, loops temporais e cenas visualmente interessantes. Nem tudo funciona, o filme poderia ser mais curto e mais focado, por exemplo. A trilha sonora de Michael Giacchino lembra muito os temas que ele criou para os últimos filmes de Star Trekm as ainda é inspirada.

Com altos e baixos e em meio a tantos filmes de super heróis, "Doutor Estranho" é uma viagem e tanto. 

João Solimeo

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Richard Wright (1943-2008)


Peço licença para abrir um parêntese musical e falar sobre a morte deste grande músico, Richard Wright, fundador e tecladista do Pink Floyd. Nascido em Londres em 25 de julho de 1943, Richard Wright, junto com Roger Waters (baixo), Nick Mason (bateria) e Syd Barrett (vocal e guitarra, substituído depois por David Gilmour), fundou o grupo Pink Floyd nos anos 1960, em plena psicodelia londrina. Wright não era nenhum virtuoso no teclado como Rick Wakeman (do Yes) ou Keith Emmerson (do Emmerson, Lake & Palmer), mas seus teclados foram fundamentais na criação de um tipo de som que, para fugir do rótulo genérico "progressivo", foi chamado de "floydiano". Este som consistia em longas escalas e improvisações de Wright que serviam de base para o resto da banda decolar. Seu teclado celestial foi fundamental em músicas como "A Saucerful of Secrets" (1968) ou "Careful with that Axe, Eugene" (1969). "Echoes", do disco "Meddle" (1971), é freqüentemente considerada pelos fãs a melhor música do quarteto Waters/Gilmour/Wright/Mason, e começa com uma simples nota do piano de Wright. Quase vinte e três minutos depois (nos tempos em que o lado do vinil forçava a música a acabar) era com os teclados de Wright que "Echoes" terminava. Para se ter uma idéia visual e sonora de como isso funcionava, recomendo o DVD "Pink Floyd Live at Pompeii", do diretor Adrian Maben, que documentou a banda tocando "ao vivo" para uma platéia de fantasmas na cidade destruída de Pompéia.



Em 1973, o Pink Floyd lançou sua obra prima, o disco "Dark Side of the Moon", um dos três discos mais vendidos na história. Muito se fala das letras (fantásticas) de Roger Waters, mas a presença de Wright, principalmente em conjunto vocal e musical com David Gilmour, é fundamental para o sucesso do disco, particularmente em "Time". Duas composições suas, "The Great Gig in the Sky" (com os vocais instrumentais de Clare Torry) e "Us and Them", fazem parte da alma do álbum. No disco seguinte, "Wish you were here" (1975), seus teclados são novamente fundamentais para a longa "Shine on you crazy diamond", homenagem a Syd Barrett.

Em 1979, após o disco "Animals" (de 1977, última vez que os quatro membros clássicos do grupo gravaram um disco juntos), vem o projeto pessoal de Roger Waters, "The Wall", sobre a separação que ele sentia entre a banda e a platéia. As gravações, por causa do perfeccionismo de Waters, foram difíceis para Wright, que não passava por um bom período e não concordava com a visão de Waters sobre a banda. Isso levou ao seu afastamento do Pink Floyd, embora ele tenha participado da turnê do "The Wall" como músico convidado.

Nos anos 1980, Waters deixou a banda e David Gilmour resolveu retomar os rumos musicais do grupo, chamando Wright de volta. Segue-se o disco "A Momentary Lapse of Reason" (1987) em que, a bem da verdade, Wright teve pouca participação nas gravações. Mas ele estava de volta ao grupo como tecladista na turnê que se seguiu ("The Delicate Sound of Thunder"), e sua presença foi fundamental para o som do grupo. O mesmo se deu no álbum seguinte (o último de estúdio do Pink Floyd), "The Division Bell" (1994), seguida da turnê "PULSE". Richard Wright lançou dois discos solo, o simpático "Wet Dream" (1978) e o pesado e conceitual "Broken China" (1996), que trata da depressão da sua esposa. Deste último destaco a faixa "Breakthrough", que conta com vocais de Sinead O´Connor.

Dos anos 1990 para cá, sua ligação com David Gilmour se estreitou cada vez mais. Os dois compuseram juntos a maioria das faixas do álbum "The Division Bell" e, já neste século, Wright foi colaborador freqüente nos projetos de Gilmour, como no disco solo "On an Island" (2006). Wright saiu em turnê com Gilmour e, segundo este diz em seu site, Wright sempre se surpreendia com a reação calorosa dos fãs. Os dois podem ser vistos juntos nos DVDs "David Gilmour in Concert" (2002) e "Remember that Night" (2007).

O site oficial do Pink Floyd publicou uma nota simples dizendo que a família de Wright lamenta informar que ele faleceu após uma “breve luta contra o câncer”. David Gilmour, em seu site oficial, diz que Wright era insubstituível, que o amava e vai sentir muito sua falta. Assim como, certamente, todos os fãs do Pink Floyd e de Richard Wright.


quinta-feira, 10 de abril de 2008

Pink Floyd - The Wall

Em 1977, o grupo inglês Pink Floyd estava em plena turnê mundial do disco "Animals", lançado recentemente. O letrista e baixista Roger Waters não estava gostando do show. A banda havia ficado famosa demais, as demandas técnicas muito específicas, o público cada vez mais barulhento e fanático. Um desses fãs estava na primeira fila gritando histericamente quando, de repente, Waters perdeu a paciência e cuspiu no rosto do rapaz. Ao sair do show, espantado com a própria atitude, Waters imaginou um conceito tão ousado quanto inédito: para representar a sensação de separação entre a banda e o público, Waters imaginou um grande muro em frente ao palco, encobrindo toda a visão da platéia. Alguns anos depois, em 1979, era lançado o disco duplo "The Wall", uma das maiores conquistas artísticas do grupo, e também um dos responsáveis pela extinção da banda em sua formação mais tradicional (este é um assunto para mais tarde). Os shows ao vivo do disco eram dos mais teatrais já imaginados no rock. Conforme as músicas iam sendo tocadas, assistentes de palco iam montando um gigantesco muro branco que ia crescendo, tijolo a tijolo, escondendo a banda do público. No meio do show o último tijolo era inserido e o isolamento da banda (e do personagem principal do disco) estava completo. O muro branco então era usado como uma tela de cinema onde eram projetadas animações produzidas pelo chargista Gerald Scarfe. O muro literalmente vinha abaixo ao final de cada show enquanto a banda, protegida por uma grade, continuava tocando sob a chuva de tijolos que caia.
O diretor Alan Parker foi convidado a dirigir a versão cinematográfica do roteiro criado por Waters enquanto Gerald Scarfe produziria seqüências animadas para completar o filme. Lançado em 1982, "Pink Floyd - The Wall" era um filme à frente do seu tempo. Antes da MTV e da era dos videoclipes, Parker e Scarfe criaram um espetáculo audiovisual para ilustrar a música perfeccionista do Pink Floyd e os conceitos fortes de Waters. Já vi o filme diversas vezes e tive a oportunidade de revê-lo no "Cine Paradiso", um tradicional cineclube que fica no centro de Campinas e que tem resistido às ameaças de fechamento há anos.



“The Wall” fala sobre um rock star chamado “Pink” (interpretado pelo músico Bob Geldof), que já está cheio. Ele não agüenta mais os shows, a vida em hotéis, as orgias nos bastidores, as drogas, as mulheres, tudo. O filme o mostra trancado dentro de um quarto de hotel em Los Angeles gradualmente perdendo a razão enquanto acompanhamos sua trajetória em flash backs. O personagem “Pink” é baseado em duas pessoas. Uma, obviamente, é o próprio Roger Waters, que não conheceu o pai morto na II Guerra Mundial. O outro é o fundador do Pink Floyd, Syd Barrett, que não agüentou a pressão do sucesso inicial da banda e, afundado em drogas, se retirou da cena artística no final dos anos 60. Barrett acabaria morrendo aos 60 anos na casa da família, onde se manteve recluso e se tornou uma figura “cult” no mundo do rock. Os flash backs de Alan Parker recriam a morte do pai de Pink na II Guerra em uma seqüência no início do filme que é revisitada várias vezes. Acompanhamos também a infância dele na Inglaterra, crescendo com uma mãe castradora e sofrendo abusos na escola. A seqüência do professor em “Another Brick in the Wall part 2” é a mais conhecida da produção, e a música chegou ao número um tanto na Inglaterra quando nos Estados Unidos na virada dos anos 70 para os 80. O refrão “we don´t need no education” se tornou um slogan em várias partes do mundo, e é freqüentemente mal compreendido. Antes que um protesto contra a educação, era um protesto contra o rigoroso método educacional inglês, que ainda permitia que os professores batessem nos alunos quando “necessário” e era contra qualquer tipo de criatividade. A música se transforma em uma seqüência fantástica em que o pequeno Pink imagina a escola como um labirinto de ratos, em que todos os alunos têm o mesmo rosto e marcham como soldados para um moedor de carne. O solo final do guitarrista David Gilmour é dos mais simples e perfeitos da história do rock.
“The Wall” deixaria Freud orgulhoso. Vemos como as experiências sofridas pelo jovem Pink acabam afetando sua vida como adulto bem sucedido financeiramente, mas um desastre pessoalmente. Há uma seqüência em que vemos o garoto interessado na vizinha que troca de roupa na casa ao lado, enquanto em uma montagem paralela vemos Pink adulto ignorando a bela esposa que tenta chamar sua atenção. Cada experiência destas é representada por mais um tijolo em um muro psicológico que o personagem vai construindo ao redor de si mesmo. É curioso também, para quem conhece a história da banda, ver como o personagem de “Pink” vai se tornando cada vez mais parecido com a personalidade difícil e autoritária de Roger Waters, conhecido por querer tudo absolutamente à sua maneira e por maltratar os parceiros de banda David Gilmour (guitarra e vocais), Richard Wright (teclado) e Nick Mason (bateria). Wright foi uma das vítimas do abuso e saiu da banda ainda durante as gravações do disco. Anos depois ele diria que não conseguia entender o conceito de distância dos fãs (é fato também que ele sofria de abuso de cocaína na mesma época). Mason se tornou um músico de estúdio e apenas David Gilmour (que mais tarde reformaria o Pink Floyd à sua maneira) oferecia algum tipo de resistência ao domínio de Waters e deu contribuições artísticas inegáveis. Gilmour foi o diretor musical do álbum e o produtor da gravação para o filme. Também compôs as faixas “Young Lust”, “Run like Hell” e “Comfortably Numb”, um ponto chave do filme: os empresários de Pink invadem o quarto destruído e o encontram desacordado, ferido e com as sobrancelhas raspadas. Um médico dá uma injeção em Pink que, com um grito de dor, acorda e é levado dopado para apresentar seu show.
É então que Pink se imagina como um ditador, e seu show vira uma espécie de comício fascista. Ele vê os fãs apenas como um bando de seguidores fanáticos e começa a fazer uma seleção racista em que judeus, negros e homossexuais são retirados à força por seus capangas e levados para o “muro”. Há quem diga que Waters levou seus medos e paranóias um pouco longe demais e que a analogia entre um concerto de rock e um comício nazista seria, no mínimo, imprópria. De qualquer forma, a cena é assustadora e fascinante, e o diretor Alan Parker diria depois que ele teve problemas em controlar a multidão de figurantes ensandecidos, muitos deles “skinheads” de verdade que não sabiam a diferença entre fantasia e realidade.
O final é composto pela animação sarcástica de Scarfe e é passado em um tribunal imaginário dentro da mente perturbada de Pink. Lá ele é julgado diante de um juiz concebido por Scarfe como um grande traseiro que literalmente fala pelo ânus. Pink escuta depoimentos dados por seu antigo professor do colégio, por sua mãe superprotetora e pela ex-esposa. Pink é considerado culpado e sentenciado ao pior dos pesadelos: ser exposto diante do mundo sem a proteção do muro que foi construindo durante a vida. No show ao vivo era o momento em que o muro vinha abaixo diante da platéia. No filme, Parker mostra o muro explodindo violentamente, tijolos voando em câmera lenta, enquanto se escuta o grito de dor de Pink.
Vinte e seis anos depois, o filme ainda resiste ao tempo e é freqüentemente estudado em escolas. A mensagem anti bélica está mais atual do que nunca e, apesar dos avanços visuais no cinema, The Wall permanece uma grande obra artística. Quanto à mensagem de Waters contra a desumanização dos concertos de rock e de ter repetido continuamente ser contra os shows em grandes estádios, ele continuou contraditório como sempre. Enquanto seus desafetos David Gilmour e Richard Wright vêm se apresentando em lugares menores e apresentando shows cada vez mais intimistas, Waters tem feito grandes turnês mundiais em que se apresenta para platéias em estádios lotados (como no Morumbi em São Paulo, ano passado). Não importa. Sua contribuição para o rock está garantida.