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sexta-feira, 10 de novembro de 2023

O Assassino (The Killer, 2023)

O Assassino (The Killer, 2023). Dir: David Fincher. Netflix. Michael Fassbender é um assassino profissional. Pelos primeiros vinte minutos do filme, nós o vemos em um apartamento de Paris esperando por sua vítima. Em uma narração em off, o assassino descreve seu método, seu perfeccionismo. Fincher, sendo Fincher, filma tudo imaculadamente. Cada plano é uma pintura, cada corte preciso. O áudio é excelente. Criador e criatura parecem uma máquina precisa de matar/filmar. E aí dá tudo errado.
Acho que gostar de "O Assassino" depende do modo como você vê filmes. Esse não é daquele tipo de filme para se ver com a luz acesa, levantando para ir ao banheiro ou olhando o celular (na real, nenhum filme é). É um balé lindamente coreografado por Fincher e seu grupo habitual de colaboradores (Kirk Baxter na edição, Erik Messerschmidt na fotografia, Atticus Ross e Trent Reznor na trilha sonora). Há poucos diálogos e uma ação leva à outra. Fassbender está excelente. Há uma cena com Tilda Swinton que é tão boa que parece que o filme vai terminar. E aí acontece uma coisa estranha... o filme não termina e se estende por uma meia hora que me pareceu desnecessária. O final é meio irônico, meio anticlimático.
Assim como seu personagem, Fincher parece querer mostrar que, no fundo, também é humano. "O Assassino" não é ótimo como um "A Rede Social" ou "Garota Exemplar", mas é bonito pra caramba de se ver. Tá na Netflix.

sábado, 24 de junho de 2023

Era uma vez um gênio (3000 years of longing, 2022)

Era uma vez um gênio (3000 years of longing, 2022). Dir: George Miller. Amazon Prime Video. A classificação para este filme na Amazon está como "Infantil - Romance - Excitante - Estranho". Bom, a censura é 16 anos e, definitivamente, este não é um filme infantil. Estranho, sem dúvida. "Era uma vez um gênio" pode ser chamado de um conto de fadas adulto, feito por um dos diretores mais ecléticos de todos os tempos (George Miller dirigiu filmes tão diferentes quanto "Mad Max: Estrada da Fúria" e "Happy Feet").

Tilda Swinton é Alithea, uma acadêmica especializada em narrativas que vai participar de uma conferência em Istambul. Em um lojinha local ela encontra uma garrafa de vidro distorcida, que ela leva ao hotel. Ao limpar a garrafa na pia do banheiro, a tampa se solta e sai um gênio gigante interpretado por Idris Elba (com orelhas pontudas). Sim, pode até parecer o começo de uma história infantil, mas está longe disso.

O gênio, com de costume, oferece satisfazer três desejos da personagem de Swinton, mas a experiência dela diz que, geralmente, essas histórias não acabam bem. Ao invés de fazer os desejos, Alithea passa então a escutar a história de vida do gênio, que começa literalmente com a Rainha de Sabá. George Miller recria as histórias de Elba com atores e muitos efeitos especiais, que nem sempre funcionam direito. Grande parte do filme é passada dentro deste quarto de hotel, enquanto Alithea tenta decidir seus desejos e o gênio vai contando suas histórias. É bastante estranho, a bem da verdade.

Há muito simbolismo e mais de um toque de que a intelectual vivida por Swinton talvez não esteja bem da cabeça. Há ecos de uma tragédia no passado, envolvendo uma criança chamada Enzo. Na terceira parte, em Londres, quadros na parece e caixas no porão dão mais dicas sobre a vida de Alithea, mas nada fica muito claro. Se você embarcar no romance "infantil, excitante e estranho" da descrição, é um filme interessante, mas difícil, de encarar até o final. A direção de fotografia é do grande John Seale ("Estrada da Fúria", "O Paciente Inglês", "O ano em que vivemos em perigo") e a trilha sonora de Tom Holkenborg é bonita. Disponível na Amazon Prime. 

sábado, 17 de dezembro de 2022

Pinóquio (Guillermo del Toro's Pinocchio, 2022)

Pinóquio (Guillermo del Toro's Pinocchio, 2022). Dir: Guilllermo Del Toro e Mark Gustafson. Netflix. Belíssima animação em stop motion que é mais uma versão da história de Pinóquio (sendo a mais famosa a feita por Walt Disney em 1940). A versão de Del Toro é, à primeira vista, mais infantil do que eu esperava; quando se pensa sobre o filme, no entanto, você percebe que ele é bastante profundo. "É um filme sobre a Morte", teria dito Del Toro. De fato, uma história sobre um boneco de madeira que ganha vida acaba sendo, também, sobre o oposto (tanto que Tilda Swinton faz a voz tanto da Vida quanto da Morte no filme).

A animação é brilhante, feita com bonecos articulados e todo tipo de técnica, como substituição de rostos (as expressões de Pinóquio são todas "duras", apropriado para um boneco de madeira) ou bonecos articulados nos mínimos detalhes, como Gepeto. Há também cenários belíssimos e algumas cenas complementadas com elementos em computação gráfica, mas o "coração" do filme é todo feito à mão (com mostra um "making of" na mesma Netflix).

O roteiro mistura elementos infantis e até cenas musicais com temas mais pesados como o crescimento do fascismo na Itália e os efeitos das duas guerras mundiais no Século XX (Gepeto perde o filho Carlo, de 10 anos, em um bombardeio na I Guerra Mundial). O trabalho de vozes também é muito bom. Gepeto é interpretado por David Bradley e o vilão Volpe é feito por Christoph Waltz. Ewan McGregor faz um Grilo tão bom que Del Toro aumentou a importância do personagem durante a produção. O resto do elenco ainda conta com as vozes de John Turturro, Ron Perlman, Finn Wolfhard e até a grande Cate Blanchett fazendo um macaco. A trilha é de Alexandre Desplat.

Não é uma obra prima como "O Labirinto do Fauno" (2006), mas trata de vários dos mesmos temas e tem um visual de encher os olhos. Tá na Netflix.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Doutor Estranho (2016)

O Dr. Stephen Strange surgiu nos quadrinhos em 1963, criado a quatro mãos pelo "mago" Stan Lee e pelo desenhista Steven Ditko (os mesmos que criaram o Homem Aranha). As tramas do Dr. Estranho eram passadas em "multiversos" e mundos paralelos que ecoavam o psicodelismo dos anos 1960. Foi tão influente que o Pink Floyd não só citou o doutor nas letras de uma canção (Cymbaline, do álbum "More", 1969) como os quadrinhos serviram de base para a capa do segundo álbum da banda, "A Saucerfull of Secrets" (1968). Em troca, podemos escutar "Interstellar Overdrive", do Floyd, em cena chave do filme atual.

Strange chega à tela grande na forma de Benedict Cumberbatch e baseado em efeitos especiais tão mirabolantes que deixariam Christopher Nolan zonzo. Há cenas impressionantes (que lembram algumas cenas de "A Origem", de Nolan) em que os magos da Industrial Light & Magic retorcem não só ruas, mas cidades inteiras. "O que você colocou no meu chá?", Cumberbatch pergunta a Tilda Swinton no primeiro encontro entre eles, no Nepal.

Cumberbatch interpreta Strange com a competência de sempre, misturando um pouco a genialidade  (e arrogância) de seu Sherlock Holmes com outros papéis que interpretou, como o matemático Alan Turing. No início do filme encontramos Strange como um cirurgião que é a estrela do hospital em que trabalha. Sua habilidade na mesa de cirurgia só não é maior que seu ego. Tudo parece perdido em uma noite em que Strange sofre um acidente de carro que deixa graves sequelas. Inconformado por não encontrar a cura na medicina tradicional, Strange parte para o Nepal onde vai se encontrar com a "Anciã" (Swinton, divertida, cuja escalação causou polêmica pelo fato de terem escolhido uma mulher branca para interpretar uma oriental). O filme pisa fundo na psicodelia e a Anciã mostra a um cético Strange os "multiversos" e suas ramificações.

Mads Mikkelsen interpreta Kaecilius, um ex-pupilo da Anciã que mudou "para o lado negro da Força" e está tentando conjurar um feitiço para atrair um grande vilão que vive em um mundo além do Tempo. O elenco ainda conta com Chiwetel Ejiofor como um seguidor da Anciã e uma desperdiçada Rachel McAdams como uma médica que é o interesse amoroso de Strange.

A trama segue o mesmo padrão "vilão-maluco-que-quer-poder-eterno" de tantos outros filmes, misturado a muita filosofia de biscoito da sorte, viagens astrais, loops temporais e cenas visualmente interessantes. Nem tudo funciona, o filme poderia ser mais curto e mais focado, por exemplo. A trilha sonora de Michael Giacchino lembra muito os temas que ele criou para os últimos filmes de Star Trekm as ainda é inspirada.

Com altos e baixos e em meio a tantos filmes de super heróis, "Doutor Estranho" é uma viagem e tanto. 

João Solimeo

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Moonrise Kingdom

Associar o adjetivo "estranho" ao diretor e roteirista americano Wes Anderson é uma redundância. "Genial" pode também ser usado, com mais parcimônia. O trabalho de Anderson sempre carrega uma preocupação com o ligeiramente bizarro, pela direção de arte precisa e por grandes atores em papéis normalmente não associados a eles (quem imaginaria George Clooney dublando uma raposa na animação "O Fantástico Sr. Raposo"?).

"Moonrise Kingdom" traz todas estas características em um filme que, na falta de uma melhor classificação, está sendo chamado de "infantil". Ele se passa em uma ilha habitada por poucas pessoas. O ano é 1965 e longos planos iniciais mostram crianças brincando antes da era da informática, escutando discos de música clássica, jogando pingue pongue, lendo ou acampando. É de um campo de escoteiros que foge o herói da trama, um órfão chamado Sam  (Jared Gilman) que parte em direção ao norte da ilha com uma canoa e grande quantidade de equipamento. Ele vai se encontrar com Suzy (Kara Hayward), uma menina igualmente precoce e inteligente que é filha dos advogados interpretados por Bill Murray e Frances MacDormand. Tanto Sam quanto Susy são infelizes, têm problemas em casa e querem escapar para um lugar melhor. Eles se apaixonaram à primeira vista durante uma apresentação de teatro infantil sobre a Arca de Noé, e haviam trocado cartas desde então, combinando a fuga. O roteiro (de Anderson e Roman Coppola, indicados ao Oscar) nunca os trata como crianças, pelo contrário, são os adultos que agem como tal. Bruce Willis é o Sr. Sharp, um policial solitário que tem um caso com a mãe de Susy. Edward Norton é o pobre líder do "Acampamento Ivanhoé" de escoteiros, de onde Sam foge; após se reunir com sua "tropa" e traçar os planos para tentar encontrar o garoto fujão, um garoto lhe pergunta se ele precisa de um "Phd" para fazer aquele trabalho. Há outros coadjuvantes famosos em pequenas pontas, como Harvey Keitel, Jason Schwartzman e Tilda Swinton (a "vilã" que quer enviar Sam para fazer um "tratamento" com choques elétricos).

Outro ponto notável é que não há nada de infantil no romance entre Sam e Susy. Os dois seguem uma antiga trilha indígena e vão parar em uma praia deserta onde montam acampamento e, em cenas que devem ter dado dor de cabeça aos censores americanos, começam a se aproximar de modo bastante físico (embora não vulgar). Anderson constrói planos extremamente precisos, auxiliado pela bela fotografia de Robert D. Yeoman e cenários de Adam Stockhausen. A duração enxuta (94 minutos) é bem-vinda, e "Moonrise Kingdom" nunca deixa de ser interessante.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Precisamos falar sobre o Kevin

Kevin (Ezra Miller) é um rapaz de quinze anos, bonito, culto, com fala mansa e grave. É apaixonado por arco e flecha desde que sua mãe, Eva (Tilda Swinton), leu Robin Hood para ele quando era criança. Mas Kevin tem um problema: ele é um monstro. "Precisamos falar sobre o Kevin" é um livro lançado pela escritora Lionel Shriver (nascida Margaret Ann Shriver) em 2003, que conta uma história bem americana que, infelizmente, se tornou lugar comum nos noticiários: o massacre em uma escola ginasial. A britânica BBC comprou os direitos do livro e lança agora o filme dirigido por Lynne Ramsay.

Assim como no livro, o filme é contado do ponto de vista da mãe de Kevin, Eva, após a tragédia ocorrida com a família. Tilda Swinton (de "Um Sonho de Amor") está excelente e foi injustamente esquecida pelo Oscar, para o qual não foi sequer indicada. Swinton, usando penteados diferentes conforme a época em que se passa a história, interpreta Eva como o retrato desesperado de uma mulher que, ao se tornar mãe, perdeu tudo. É um ponto de vista um tanto radical; é como se toda a vida dela, a partir do nascimento de Kevin, fosse uma interminável depressão pós-parto, e há algo de maniqueísta no filme. Que Kevin se torne um adolescente problemático e sádico é triste, mas possível. Mais improvável é a premissa de que o garoto fosse o retrato do demônio desde o seu nascimento. Será que Hitler era uma criança problemática? Exageros à parte, o filme é tão bem feito e Tilda Swinton tão convincete que o espectador acredita na existência deste garoto capaz dos atos mais terríveis. Mas o filme é tanto sobre os problemas de Kevin quanto sobre as falhas dos pais, Eva e Franklin (John C. Reilly).

Franklin é o retrato do otimismo e da ingenuidade. Ele se recusa a acreditar que Kevin tenha problemas e sempre poe a culpa na esposa. Eva também não é uma mãe exemplar. Ela tenta ser amigável com o filho, mas frequentemente transforma suas frustrações em um comportamento violento. Interessante como as semelhanças físicas e psicológicas entre Eva e seu filho são mostradas através de detalhes como o corte de cabelo dos dois ou em cenas espelhadas. A cor vermelha está ligada a Kevin através de suas roupas quando criança e seus sanduíches de geléia. A cor é fortemente ligada a Eva em uma cena extraordinária que abre o filme, quando ela está na Espanha durante a "Tomatina", uma festividade em que centenas de pessoas se envolvem em uma guerra de tomates. Uma cena que é, ao mesmo tempo, alegre e assustadora.

Há também uma crítica à sociedade do espetáculo em que o mundo se tornou. Quando perguntado sobre o porquê dele ter feito o que fez, Kevin diz a um repórter que ele agiu como todos, no fundo, desejavam . Por que eles estavam assistindo àquela entrevista? Por que não mudaram de canal? Perturbador, mas fascinante, "Precisamos falar sobre o Kevin" é dos melhores filmes do ano. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.


domingo, 9 de outubro de 2011

Um Sonho de Amor

Em uma rica mansão em Milão, Itália, um grande número de empregados uniformizados, eficientes e discretos está preparando um jantar especial. É o aniversário do patriarca da família Recchi, um magnata dono de uma rica tecelagem que carrega seu nome; com a idade avançada do Sr. Recchi, ele decide passar a empresa para seu filho mais velho, Tancredi (Pippo Delbono) e para o neto Edoardo (Flavio Parenti). Nos bastidores e calmamente comandando o jantar está Emma (Tilda Swinton), esposa de Tancredi, uma russa de nascimento que aprendeu, com o tempo, a se tornar italiana (o que, no mundo refinado dos Recchi, significa ser eficiente e obediente).

"Um Sonho de Amor" (no original, "Eu sou o amor"), sem exageros, é uma jóia rara. O diretor Luca Guadagnino produz uma obra elegante, extremamente ambiciosa e muito bela de se ver. A direção de fotografia de Yorick Le Saux é deslumbrante. Esta sequência inicial do jantar é filmada à meia luz, em tons quentes que contrastam com o cenário frio de Milão durante uma tempestade de neve. A sofisticação da direção de arte revela, a cada plano, os anos de tradição (e muito dinheiro) que existem naquela família. Ao mesmo tempo, percebe-se que algo não vai bem. O roteiro mostra, aos poucos, os pequenos dramas familiares que vão surgindo, como quando o patriarca se decepciona com o presente dado pela neta Elizabetta (Alba Rohrwacher, de "Que mais posso querer")  que, mais tarde, se revela homossexual. Ou o ciúme não declarado do irmão mais novo por Edoardo, claramente o preferido pela mãe. Para culminar a sequência, ela termina com a chegada de Antonio (Edoardo Gabbriellini), um cozinheiro amigo de Edoardo, que lhe traz um bolo de presente e é apresentado à mãe dele.

Um filme comum seria sobre o adultério de Emma e sobre suas consequências, mas este é um filme mais inteligente. Ele gira em torno das mudanças trazidas pelo tempo e pela sociedade sobre os personagens. Tilda Swinton sempre foi uma atriz excelente e é fascinante o modo como ela encarna o papel de Emma, uma mulher aparentemente sem passado que largou tudo para se tornar membro desta família italiana. A chegada da primavera traz novas cores ao filme e leva os personagens para as ruas, com consequências inesperadas. A revelação da homossexualidade da filha leva Emma a San Remo, onde Antonio, o cozinheiro amigo de Edoardo, planeja abrir um restaurante. Os dois iniciam um caso tórrido e inesperado, filmado por Guadagnino com grande beleza, em cenas passadas em meio à natureza. O relacionamento parece mais uma traição ao filho Edoardo do que ao marido de Emma, constantemente envolvido com a tecelagem e fazendo negócios em Londres.

Claro que a trama não vai acabar bem, mas, novamente, com que elegância o roteiro mescla a decadência familiar dos Recchi com os fatores externos, como a globalização, que vão tirar a tecelagem das mãos da família. Curioso também o modo como a sexualidade é retratada no filme, da frieza entre Tancredi e Emma para o calor de seu relacionamento com Antonio; do homossexualismo de fato de Elizabetta à insinuação de que a amizade entre Antonio e Edoardo poderia se tornar algo mais. Tudo culminando em um final apropriadamente operático, com tragédia, drama e romance resultando em uma emocionante cena de libertação. Imperdível. Visto como cortesia no Topázio Cinemas.

Câmera Escura

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button

O filme tem uma premissa interessante, que já foi inclusive tema de um comercial do qual me lembro, anos atrás, em que Chico Anísio descrevia uma vida ao contrário; deveríamos nascer velhos e crescer cada vez mais jovens, até voltar ao útero materno. Não haveria a suposta decadência da velhice, pelo contrário, ficariamos cada vez mais em forma, menos enrugados, mais "bonitos". Também me lembro do comediante americano Jerry Seinfeld dizendo que o primeiro e o último aniversário das pessoas é bem parecido; não sabemos direito o que está acontecendo, a festa é preparada pelos outros e, provavelmente, estaremos usando fraldas.

O Curioso Caso de Benjamin Button parte desta premissa. Benjamin (Brad Pitt) é um homem que nasce um bebê "velho" e enrugado. Os ossos estão fracos, os olhos apresentam catarata, todos os sintomas de um idoso de 80 anos. A mãe morre no esforço de dar à luz esta estranha criança e o pai, atormentado, abandona o bebê em uma casa que cuida, justamente, de pessoas idosas. Ele é adotado por uma mulher negra chamada Queenie (a ótima Tarji P. Henson). Ela considera o bebê milagroso e resolve tomar conta dele da mesma forma com que ela trata dos outros habitantes da casa: todos idosos em processo de decadência física e mental. Só que o pequeno Benjamin está no caminho contrário, se tornando mais jovem a cada dia.

O filme é passado no sul dos Estados Unidos e tem vários bons momentos, além de um elenco composto por Pitt, Cate Blanchett, Tilda Swinton e Julia Ormond. O diretor é David Fincher, conhecido por filmes pesados e psicológicos como Se7en, Clube da Luta e Zodíaco. Fincher também é famoso como um técnico competente, que experimenta com novas tecnologias e efeitos especiais. "Benjamin Button" é recheado de efeitos digitais que recriam várias épocas da história americana e, de forma extraordinária, dão uma ajuda ao trabalho de maquiagem de envelhecer ou rejuvenescer os atores. Brad Pitt, especialmente, é mostrado desde os 80 anos até a juventude, e imagino que uma grande quantidade de "magia" digital foi empregada para transformá-lo diante dos olhos da platéia. O filme, visualmente, é plasticamente bonito e interessante de se ver.

O problema é que para cada virtude há uma quantidade considerável de problemas. O roteiro é o maior deles. Para começar, é muito, mas muito parecido com "Forrest Gump", que Robert Zemeckis realizou em 1994, escrito pelo mesmo roteirista, Eric Roth. Este video mostra claramente as incríveis semelhanças entre os dois projetos. Tanto Benjamin Button quanto Forrest Gump são crianças com um problema, criados por uma mãe solteira no sul dos Estados Unidos. Ambos conseguem superar as dificuldades (inclusive de locomoção) e se apaixonam por uma amiga, loira, de infância. Ambos crescem e vão para a guerra, e depois passam um tempo em um barco. Ambos têm um amigo negro e depois um amigo bêbado e revoltado. Ambos saem de casa e viajam pelo mundo... e assim por diante. E não só isso, os dois filmes foram feitos por diretores conhecidos pelos seus filmes de efeitos especiais (Zemeckis e Fincher) que resolveram apostar seu talento em um filme tocante e sensível sobre uma "pessoa especial". Forrest Gump ganhou 6 Oscars; Benjamin Button está com 13 indicações ao prêmio.

E os problemas não param por ai. Para poder contar a história de Benjamin em flashbacks o roteiro criou o estratagema de começar a história no passado recente, durante a passagem do furacão Katrina pelo sul dos Estados Unidos. Daisy (Cate Blanchett), está praticamente morrendo em uma cama de hospital assistida pela filha Caroline (a bela Julia Ormond, cujas rugas mostram, mais do que qualquer coisa no filme, o verdadeiro poder do tempo). Mesmo agonizando, a velha senhora consegue arrumar forças para contar o tal caso "curioso" de Benjamin Button, convenientemente auxiliada pelo diário do próprio mais uma série de fotos e documentos que aparecem, como mágica, da bagagem dela. Esta trama paralela é até mais difícil de acreditar do que o estranho "milagre" da vida de Button. Como, e por que, a mãe conseguiria guardar tantos segredos de sua vida para a própria filha? Como ela teria organizado toda aquela "apresentação" com as fotos, o diário, as anotações, agonizando em uma cama de hospital? Para quem o narrador, o próprio Benjamin Button, está contando a história? Para Caroline? Então porque ele muda a pessoa narrativa (de terceira pessoa para primeira pessoa) em determinado ponto do filme?

Assim, O Curioso Caso de Benjamin Button, apesar dos bons momentos e do belo visual, acaba resultando em um filme interessante, mas nada original.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Queime depois de ler

"Onde os fracos não têm vez", filme anterior dos irmãos Coen, foi muito elogiado pela crítica e até levou o Oscar de Melhor Filme mas, é fato, não foi nenhum sucesso de público. O estilo lento e principalmente o final em aberto deixou muita gente confusa (ou brava mesmo) com os dois irmãos mais criativos do cinema americano. Pois bem, eles agora retornam com um filme cheio de astros e um estilo bem mais leve e acessível. O que não significa que "Queime depois de ler" seja um filme "convencional". Joel e Etan Coen são famosos por seu estilo meticuloso, ritmo lento e diálogos bem escritos. Tudo está presente na nova produção da dupla, mas em doses menores. Adiciona-se uma boa dose de humor negro e temos esta comédia de erros que satiriza os filmes de espionagem e a paranóia americana.

John Malkovich é Osbourne Cox, um analista da CIA que, no início do filme, está sendo dispensado do trabalho. Um superior lhe diz que ele tem um problema com a bebida. "Vocè é mórmon! Para você todos têm problemas com a bebida!", retruca Cox. Ressentido e muito, muito bravo, Cox vai para casa e conta à eposa que se demitiu, e que pretende escrever um livro de "memórias". A esposa é Katie (Tilda Swinton... quem senão os irmãos Coen para imaginar um casal como John Malkovich e Tilda Swinton?), que está tendo um caso com Harry Pfarrer (George Clooney, se divertindo). Harry é supostamente um policial (nunca o vemos trabalhando) que, em 20 anos de serviço, nunca disparou uma arma. Ele é casado com uma escritora de livros infantis. Recapitulando: Cox (Malkovich) é casado com Katie (Swinton), que tem um caso com Harry (George Clooney), que é casado com uma escritora.

Em uma academia de ginástica, a instrutora Linda Litzke (Frances McDormand), está passando pela crise da meia idade. Ela quer se "reinventar" passando por uma série de cirurgia plásticas caras (que seu plano de saúde não cobre); ela tabém está tentando encontrar um companheiro em anúncios da internet. Ela trabalha com Chad (Brad Pitt), um personal trainer hiperativo que, um dia, está todo animado em frente ao computador: o faxineiro encontrou no vestiário um CD que, supostamente, contém informações sigilosas da CIA. Chad descobre que o dono do CD é um analista chamado Osbourne Cox (lembram-se?), e sugere a Linda que eles tentem trocar o CD por dinheiro.

Com esses personagens e ingredientes os Coen vão construindo um filme que, de início, nem é assim tão cômico mas que, aos poucos, vai se tornando cada vez mais absurdo e engraçado. Clooney e Tilda Swinton, vale notar, interpretaram juntos no drama "Conduta de Risco" (Michael Clayton, 2007), pelo qual Swinton ganhou o Oscar. Brad Pitt está muito engraçado, interpretando um rapaz não muito esperto e que acha que está dando um grande golpe ao chantagear um espião da CIA. E o que dizer de John Malkovich?

"Queime depois de ler" não é nenhuma obra prima, e está distante das tragicomédias anteriores dos Coen como "Barton Fink" e o estupendo "Fargo". Mas ainda é um filme acima da média.