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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Mães Paralelas (Madres Paralelas, 2021)

Mães Paralelas (Madres Paralelas, 2021). Dir: Pedro Almodóvar. Netflix. Belo filme do espanhol Almodóvar, um delicado conto que mistura maternidade, guerra civil, memórias, escavações, segredos, vida e morte. Parece muito, mas o espanhol sabe equilibrar como poucos tantos temas em um melodrama que beira o exagero, mas é dirigido e interpretado com tanto talento que tudo parece honesto.

Penélope Cruz, excelente, é Janis Martínez, uma fotógrafa de Madrid que está para dar à luz; no mesmo quarto está Ana (Milena Smit), uma adolescente também muito grávida. As duas têm bebês praticamente ao mesmo tempo, gerando duas meninas. Elas trocam telefones e prometem manter contato. Em uma trama paralela, Penélope Cruz procura por um arqueólogo forense para escavar uma vala comum em sua vila natal; lá estariam enterradas dez pessoas mortas durante a Guerra Civil Espanhola, entre elas seu bisavô. O responsável pela escavação é Arturo (Israel Elejalde), que é o pai da filha de Penélope Cruz.

Falar mais sobre a trama provavelmente revelará segredos que devem ser descobertos vendo o filme. Evite saber detalhes. O que vale, repito, é a maestria com que o veterano diretor espanhol desenrola seu melodrama, auxiliado por colaboradores tradicionais como Alberto Iglesias (indicado ao Oscar pela trilha sonora) e colorida fotografia de José Luis Alcaine. Penélope Cruz (indicada ao Oscar), que fez vários filmes com Almodóvar, está ótima. O roteiro faz paralelos interessantes entre as mães que perderam seus filhos na Guerra Civil com os problemas enfrentados pelas mães solteiras modernas. Repare como exames de DNA são usados para situações tão diversas. Belo filme. Tá na Netflix (assim como várias outras obras de Almodóvar, aproveite).

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Relatos Selvagens

"Relatos Selvagens" é composto por seis episódios cheios de ironia e humor negro. O filme é escrito e dirigido por Damián Szifrón e é uma co-produção entre a Argentina e a Espanha (representada por ninguém menos que Pedro e Agustín Almodóvar). O humor de Szifrón é afiado mesmo nas situações mais absurdas.

A primeira história se passa em um avião em que, misteriosamente, todos os ocupantes parecem ter alguma relação com um homem chamado Pasternak. O final é engraçadíssimo.

No segundo episódio, um homem pára em um pequeno restaurante de beira de estrada durante um temporal. A garçonete (Julieta Zylberberg) o reconhece; foi ele quem causou a morte do pai dela e assediou a mãe. Por anos ela sempre quis estar de frente com ele para lhe dizer poucas e boas. Mas a cozinheira (Rita Corteze) tem uma sugestão mais assustadora (e tentadora).

O terceiro episódio é, talvez, o melhor do filme. Ele mostra o que acontece quando dois homens estão atrás do volante de um carro. Leonardo Sbaraglia está dirigindo um carro de luxo em uma estrada e tenta passar outro carro, velho e sujo, dirigido por Walter Donado. Os dois se "estranham", Leonardo baixa o vidro e ofende o dono do outro carro. Alguns quilômetros à frente, porém, o carro de luxo é obrigado a parar na beira da estrada por causa de um pneu furado e o outro carro estaciona para tirar satisfações. Segue-se uma escalada da violência conforme cada um tenta mostrar ao outro quem é o mais forte.


No quarto episódio, o grande Ricardo Darín (que já foi visto nos cinemas por aqui em outro filme episódio este ano, "O que os homens falam") é um engenheiro de demolições que se vê enredado em um mar de corrupção e burocracia kafkanianas quando tenta recuperar seu carro, que havia sido guinchado injustamente pelo departamento de trânsito. Darín é o grande astro do cinema argentino e tem posição de destaque no pôster do filme. É sobretudo um ótimo ator e neste episódio não é diferente. O final é deliciosamente irônico.

O quinto episódio trata do tema da impunidade. Um rapaz de família rica, voltando de um bar na BMW do pai, atropela uma mulher grávida e foge da cena do acidente. O pai (Oscar Martinez) chama o advogado (Osmar Núñez) para tratar do assunto e eles planejam colocar um "laranja" para assumir a culpa pelo atropelamento. Os diálogos entre o pai e o advogado são ótimos. Qual o preço da liberdade de um filho?

O último episódio trata de infidelidade e problemas conjugais em plena cerimônia de um casamento. A noiva (Erica Rivas) descobre que a amante do marido está na festa e resolve se vingar dele. As consequências são desastrosas.

"Relatos Selvagens" foi um grande sucesso na Argentina e concorreu à Palma de Ouro no Festival de Cannes. Também foi o filme escolhido para tentar uma vaga ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro pela Argentina. A alta qualidade de todos os episódios faz com que o filme não caia no problema de outros exemplares do gênero, que geralmente alternam curtas bons com outros ruins. Há uma continuidade visual e temática entre os episódios muito interessante. Os problemas do casamento de Darín parecem explodir no episódio da noiva. O carro visto como arma no episódio dos dois motoristas causa a morte de uma mulher grávida em outro episódio. A opressão da vida urbana moderna, violência, estresse e burocracia caberiam perfeitamente no Brasil. Para não perder. Visto no Topázio Cinemas, em Campinas.

Câmera Escura

sábado, 24 de março de 2012

As Mulheres do 6º Andar

O Senhor Joubert (Fabrice Luchini, de "Potiche" e "Moliére") nasceu e passou a vida toda no mesmo prédio em Paris. É herança de família e lá ele mora com a esposa Suzanne (Sandrine Kiberlain, de "Mademoiselle Chambom" e "O Pequeno Nicolau"), a mãe e Germaine, empregada por trinta anos. Com a morte da mãe de Joubert, a velha doméstica é demitida e em seu lugar entra a jovem e bela Maria (Natalia Verbeke, de "O Filho da Noiva"). São os anos 60 e a França está recebendo uma grande leva de mão-de-obra espanhola por causa da ditadura de Francisco Franco. Segundo amigas de Suzanne, as espanholas são limpas e trabalham de domingo a domingo, com uma condição: querem ir à missa todas as manhãs. A chegada de Maria à casa do Senhor Joubert, um metódico e entediado corretor de valores, causa uma reviravolta na vida dele; interessado a princípio na beleza da moça, aos poucos ele fica atraído também pelo modo alegre e corajoso com que todas as empregadas espanholas do prédio, que moram do 6º andar, levam a vida.

O filme de Philippe Le Guay é uma deliciosa comédia que observa de modo otimista as relações sociais entre os franceses e as imigrantes espanholas. O elenco conta com duas atrizes que já trabalharam com Almodóvar, Carmen Maura (que interpreta Concepción) e Lola Dueñas (que interpreta Carmen, a empregada socialista que está sempre exigindo melhorias); as duas, aliás, interpretaram mãe e filha no ótimo "Volver". O roteiro é bem humorado e inteligente. As francesas amigas de Suzanne falam das espanholas como se fossem meras serviçais ignorantes, e quando o Senhor Joubert começa a se interessar por Maria parece que ele quer apenas dormir com ela. Aos poucos, porém, ele começa a perceber o modo de vida das outras espanholas, pessoas com quem convive todos os dias mas que, até então, lhes eram desconhecidas. Uma visita ao sexto andar revela que o único banheiro usado por elas está entupido e imundo, não há água corrente nos quartos e a higiene pessoal deve ser feita usando-se uma pia no corredor. Joubert reforma o banheiro e passa a ser tratado com carinho pelas empregadas, até mesmo pela desconfiada Carmen. Sim, ele ainda está interessado fisicamente em Maria, como mostra uma cena de ciúme, mas não é apenas sexo que ele procura.

A esposa Suzanne percebe que há algo diferente no comportamento do marido mas, incapaz de ver as empregadas espanholas como rivais, começa a desconfiar de uma cliente do marido, uma dondoca chamada Bettina de Brossolette (Audrey Fleurot). Enquanto isso, o Senhor Joubert se torna um homem mais alegre, mais consciente das pessoas à sua volta e, no fundo, mais humano. O filme é sábio ao usar ou evitar os clichês do gênero e é generoso com os personagens. "As Mulheres do 6º Andar" está em cartaz no Topázio Cinemas, em Campinas.


sábado, 31 de dezembro de 2011

Melhores de 2011

Fazer listas é sempre complicado. Qual o critério? Como comparar uma animação americana feita com milhões de dólares com um filme europeu de baixo orçamento? Estabelece-se um número? Os dez melhores? Os vinte? O Câmera Escura escreveu 91 textos este ano a respeito de vários tipos de filme, com uma predileção por filmes fora do grande circuito. Há filmes produzidos em outros anos mas que passaram no Brasil ou foram vistos por nós este ano. Obrigado aos leitores e até o ano que vem.

- Os Dez

- A Pele que Habito - Pedro Almodóvar se reinventa, choca e cria uma das histórias de obsessão mais fortes do cinema.

- Melancolia - Lars von Trier pinta um quadro ultra romântico (não no sentido amoroso) sobre o fim do mundo, ao som de Richard Wagner.

- Árvore da Vida - Se Melancolia é o "Apocalipse", o filme de Terrence Malick vai até o "Genesis" para, sem medo de ser pretensioso, explicar o sentido da vida. Há quem ame e quem odeie o espetáculo visual do diretor.

- Meia-Noite em Paris - Woody Allen típico, sim, mas com um toque de mágica e arte que conquistou o mundo.

- Trabalhar Cansa - Juliana Rojas e Marco Dutra fazem um filme brasileiro que não é uma comédia nem tem atores globais e constroem um retrato pesado, com toques de sobrenatural, da classe média do país.

- Um Conto Chinês - Ricardo Darín, o ator argentino mais presente nas telas brasileiras nos últimos anos, enfrenta seus preconceitos na convivência com um hóspede do outro lado do mundo. Escrito e dirigido por Sebastián Borensztein.

- Um Sonho de Amor - A sempre ótima Tilda Swinton em belíssimo filme de Luca Guadagnino. Roteiro, direção de arte, fotografia, interpretações, tudo é apropriadamente exagerado neste ambicioso filme italiano.

- Cópia Fiel - Abbas Kiarostami faz um filme curioso e inteligente sobre identidades, conflitos amorosos e o conceito da Arte em uma tarde passada na Toscana, Itália. Com Juliette Binoche.

- O Garoto da Bicicleta - Os irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne continuam a acertar com seu estilo documental e direto nesta história sobre um garoto abandonado pelo pai e sua amizade com a bela Cécile de France.

- Homens e Deuses - Filme sóbrio, mas comovente, sobre um grupo de monges que vive na Argélia em paz com a comunidade muçulmana local, até a chegada de rebeldes assassinos. De Xavier Beauvois.

- Outros notáveis

- Medianeiras - A crítica deste filme argentino é das mais visitadas no blog. Uma meditação sobre a solidão moderna em qualquer cidade grande do mundo; no caso, uma Buenos Aires irreconhecível.

- Rock Brasília - Era de Ouro - Documentário de Vladimir Carvalho sobre o grupo de jovens de Brasília que reinventaram o rock nacional nos anos 80, encabeçados por Renato Russo e sua Legião Urbana.

- Tudo pelo Poder - O primeiro filme "sério" da leva do Oscar 2012 é dirigido por George Clooney. Com grande elenco encabeçado pelo homem do momento em Hollywood, o bom ator Ryan Gosling, como um assessor de imprensa enfrentando problemas éticos.

- Rango - Esta animação de Gore Verbinski retoma os westerns italianos de Sérgio Leone em um filme mais voltado a adultos do que a crianças.

- Abutres - Ricardo Darín, sempre ele, é um corretor de seguros sem escrúpulos que explora vítimas de acidentes automobilísticos em um filme noturno e seco de Pablo Trapero.

- A criança da meia-noite - Delphine Gleize mostra a vida difícil de um grupo de jovens acometido por um tipo raro e incurável de câncer de pele. Com Vincent Lindon.

- Os nomes do Amor - Michel Leclerc mostra a salada cultural e étnica que é a França de hoje, com vários problemas raciais e sociais. A herança do nazismo toca em um assunto também focado no bom "A Chave de Sarah", com Kristin Scott Thomas.

sábado, 5 de novembro de 2011

A Pele que Habito

Há diversos momentos de repulsa em A Pele que Habito. Momentos em que a sensação de se estar testemunhando algo errado se faz sentir. Uma coisa de pele. Ao mesmo tempo, este é Pedro Almodóvar, com seus maravilhosos movimentos laterais de câmera, com a trilha impecável (à Bernard Hermann) de Alberto Iglesias e fotografia de José Luis Alcaine. E as mulheres de Almodóvar; neste filme, na falta de uma Penélope Cruz, há Elena Anaya, que interpreta Vera, uma misteriosa mulher que habita um quarto de uma mansão em Toledo, Espanha. Vera pratica yoga, faz esculturas, vê documentários e lê muito; veste uma roupa que, como uma segunda pele, a cobre do pescoço aos pés. Ela é prisioneira ou se mantém por vontade própria na casa de Robert (Antonio Banderas)? Ele é um cirurgião plástico que está estudando um método revolucionário de fabricar uma pele artificial, usando métodos discutíveis.

Como em vários filmes de Almodóvar, A Pele que Habito é multifacetado e flerta com o gênero do suspense; este, com toques claros de "filmes B" de terror. Banderas é o "cientista louco" que quer revolucionar a medicina estudando diretamente com seres humanos; Vera é sua cobaia. Ou será que não é assim tão simples? Aparentemente ao acaso, diversas tramas paralelas se amontoam no roteiro, e o filme, por certo tempo, parece não ter rumo. Há um filho perdido que à casa torna, vestindo uma segunda pele na forma de uma fantasia de tigre, durante o carnaval. Há flashbacks que revelam que Robert já fora casado e tinha uma filha, sendo que a duas morreram de forma trágica. A esposa foi carbonizada em um acidente de carro; a filha, após ter sido estuprada, pulou para a morte da janela da mansão de Robert. Há também uma trama envolvendo Vicente (Jan Cornet), um rapaz que vai a uma festa e, drogado, tenta transar com uma garota linda no jardim, contra a vontade dela. Ela é Norma, a filha de Robert, que planeja uma vingança contra o rapaz.

O filme é, ao mesmo tempo, fascinante e indigesto. Há certo atropelo no roteiro, que Almodóvar escreveu baseado no livro "Tarântula", do francês Thierry Jonquet, que não tem a mesma elegância genial de Má Educação, por exemplo. Há também uma tendência forte para o bizarro, e sequências improváveis, como a volta do personagem Zeca (Roberto Álamo), para visitar a mãe Maria (a ótima Marisa Paredes), empregada do Dr. Robert. Em poucos e atropelados minutos descobre-se que ele é fugitivo da lei e Almodóvar cria uma sequência de sexo das mais bizarras de seu cinema, que não é econômico em cenas do tipo. O filme se revela genial da metade para o fim, quando as histórias paralelas se encontram e formam um quadro cruel e assustador. Robert é parte Hannibal Lecter, parte Scottie Feguson (personagem que James Stewart interpretou em Um Corpo que Cai, de Alfred Hitchcock) um homem tão obcecado com a imagem da antiga amada que tenta reconstruí-la.

O tema da sexualidade (e suas perversões) tão presentes nos filmes de Almodóvar, voltam com tudo em A Pele que Habito, mas não da forma cômica que é marca registrada do diretor espanhol. Os personagens são frios e cortantes como um bisturi. Só Vera tem alguns momentos mais passionais, como na incrível cena em que, aparentemente livre, ela entra em seu quarto e fica olhando para as paredes cobertas por inscrições, datas e desenhos feitos nos anos em que ali passou. Em cartaz no Topázio Cinemas.


PS: O trailer abaixo é muito ruim e não reflete o filme de forma adequada.